O Sr. Henrique Raposo diz que não é possível dialogar com ateus. Nós provamos que isso é uma inverdade.
I – O Sr. Henrique Raposo comete vários erros: primeiro, não há qualquer «pulsão religiosa» nos homens, há apenas desconhecimento e questões que se querem respondidas atribuídas a uma ideia de divino. Este conceito funciona como um escape que logo justifica o inexplicável e evita demais explicações. Isto não é «pulsão», é falta de paciência na capacidade que nós temos de resolver os grandes problemas que o universo nos coloca e que devemos encarar sempre como desafios. Depois, na ânsia de perseguir os «esquerdistas», esquece que há ateus de direita, de esquerda, do centro, de cima e de baixo. Bem, de cima talvez não, porque raramente algo de bom vem do céu. E nem sequer estamos a falar em deus, que é assunto que não deveria interessar a ninguém, de inócuo que é, mas de fezes de pombas, meteoritos, chuva torrencial, canícula e aviões com terroristas (fanáticos) aos comandos.
Insiste que Hitchens não deveria travestir a religião de fascismo. De facto, poucos são os pontos comuns das religiões com o fascismo e é um erro grosseiro se nos atrevermos a enumerá-los. Vejamos, são mesmo mínimos e não custa nada: quase todas apresentam normalmente um líder que cultiva uma imagem ridícula, preceitos e regras a serem cumpridos sem recurso, alianças forjadas (com outros regimes fascistas) quando convém, incentivos para lutar até à morte defendendo a causa, policiamento regular de quem não cumpre e, se alguém quiser abandonar o fascio na valeta, é o cabo dos trabalhos! A única diferença é que hoje, nos países ocidentais, temos a felicidade de optar pertencer ou não ao grupo. No entanto, se não nos chatearmos em demasia com isso, o nosso nome continuará lavrado nos livros empoeirados dos arquivos e fará sempre parte das estatísticas que são usadas, amiúde, com grande habilidade.
II – Novamente no mesmo argumento do fascismo. O Sr. Henrique Raposo esquece-se é do seguinte: que para ler os «originais» mais vale ler os clássicos e começar com «As Nuvens» de Aristófanes, por exemplo, que já no séc. V antes de um tal de Cristo, apesar de criticar duramente os filósofos ateus, demonstra com esse ataque a expressão e importância que estes tinham na sociedade helénica. Sempre houve, portanto, gente a viver da escrita de uma «novidade» que não o é; chama-se apenas «racionalidade» e, como parece comprovar um estudo científico publicado a semana passada, talvez inteligência. Esta, Sr. Henrique Raposo, existe desde que há homens e mulheres.
Ah, claro, fez-nos rir com a luta da religião contra os regimes totalitários, mas essa história está tão batida que já nem cola. Apenas dizer que são certamente de louvar (não sei se esta será a palavra indicada) os esforços que muitos religiosos empreenderam contra Hitler e Franco, mas todos nós sabemos que esses, falando em hierarquias, normalmente não eram os que assentavam o barrete cardinalício nas nucas, mas antes os que arrastavam penosamente as pobres sotainas. Onde contava ter o apoio dos religiosos, eles fecharam-se em copas e preferiram negociar, ficar em silêncio ou saudar o ditador com o bracinho no ar, em toda a sua graça. O Sr. Henrique Raposo esquece-se também de que, se houve padres, também houve milhares de ateus que lutaram pelos ideais da liberdade e que foram presos ou tiveram de se refugiar. [Apontamento: ler isto isto ao som de Béla Bartók]
III – Hitchens não deve nada a deus – ninguém deve. Nem sequer ao conceito, que é ao que se estava a referir. Deve ao código genético que herdou, à sua educação e à sua vivência pessoal. Se não existissem religiões, Hitchens estaria (e está, certamente) contra os que negam a eficácia das vacinas, por exemplo. Aliás, basta ver que a sua ascensão pública nada teve a ver com ateísmo. Disto se infere que Cristopher Hitchens nunca precisou de deus para ser quem é. Ele é simplesmente assim, um homem de causas e convicções fortes.
O contrário parece ser o caso do Sr. Henrique Raposo, que nos deixou ligeiramente preocupados quando afirma que não se admite ateu simplesmente por causa de homens «cool» como Hitchens e prefere afirmar-se agnóstico. É a mesma coisa que dizer: «Eu sou benfiquista, mas agora sou sportinguista porque está lá o Jesus. Se Jesus não fosse tão «cool», continuava benfiquista. Se não, ai Jesus!, ainda posso ficar como ele e começar a jogar muito pela esquerda!».
Os ateus, como em todos os grupos humanos, há-os intolerantes, activos, não dialogantes, tolerantes, dialogantes, escondidos na sombra ou a sofrerem muitas vezes pelo simples facto de o serem e não o poderem revelar. O que incomoda pessoas como o Sr. Henrique Raposo é que, se durante milénios andamos calados e perseguidos, agora, estamos finalmente protegidos sob a capa da Liberdade e, com a Internet e os novos media como ferramentas, conseguimos elevar mais um pouco a nossa voz neste mar irracional. É como ter numa sala aquele relógio muito antigo ao qual um dia damos corda e que começa a incomodar-nos com o barulho do pêndulo. Mas a verdade, Sr. Henrique Raposo, é que esse relógio é uma obra de arte e poderá muito bem indicar no futuro as horas a uma humanidade perdida.
A intolerância, diremos nós, é de quem não nos deixa falar, nos critica por qualquer coisinha que dizemos ou nos olha com desconfiança quando o tentamos fazer de igual para igual. Como num diálogo, sabe?
Cidade do Vaticano, 26 Jan. (RV) (…) O papa concluiu a homilia recordando que em 25 de Janeiro de 1959, exactamente cinquenta anos atrás, o bem-aventurado Papa João XXIII manifestou pela primeira vez o desejo de convocar “um Concílio Ecuménico para a Igreja Universal”. (…)
Saúdo a União de Ateus e Livres Pensadores de Espanha e congratulo-me com a chegada do autocarro ateu a Madrid onde os madrilenos podem ler: “Provavelmente Deus não existe. Então, deixe de se preocupar e desfrute a vida”.
Sendo pacífica a manifestação de cidadania, ao contrário das homilias homofóbicas do cardeal Rouco Varela ou dos mullahs islâmicos contra os infiéis, espero que a população madrilena tenha mantido o civismo, sem se deixar instrumentalizar pelos fundamentalistas que consideram a Espanha um protectorado do Vaticano.
Perante numerosas solicitações e ofertas de dinheiro, algumas aqui no DA, para importar esta iniciativa dou a minha opinião pessoal:
1 – Não temos ainda meios humanos e financeiros para, neste momento, pôr de pé uma iniciativa desta natureza em Portugal;
2 – As ofertas reiteradamente feitas impedem a sua aceitação por não se poder assegurar o êxito da iniciativa e não haver condições para, em caso de fracasso, devolver as importâncias recebidas;
3 – Saúdo todos os ateus e livres-pensadores e acompanha-os na inquietação com a agressividade das três religiões do livro – judaísmo, cristianismo e islamismo –, frequentemente detonadoras do ódio e fomentadoras de guerras.
O ateísmo tem rodas para circular contra o pensamento único e a intolerância religiosa porque « provavelmente Deus não existe» e não há motivos para temer o que não existe nem razões para o medo que impede as pessoas de desfrutarem a vida.
O Diário de uns ateus é o blogue de uma comunidade de ateus e ateias portugueses fundadores da Associação Ateísta Portuguesa. O primeiro domínio foi o ateismo.net, que deu origem ao Diário Ateísta, um dos primeiros blogues portugueses. Hoje, este é um espaço de divulgação de opinião e comentário pessoal daqueles que aqui colaboram. Todos os textos publicados neste espaço são da exclusiva responsabilidade dos autores e não representam necessariamente as posições da Associação Ateísta Portuguesa.