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23 de Novembro, 2018 Carlos Esperança

A ciência, os milagres e a santidade

Pensava eu, em meu pensamento, que os milagres cientificamente comprovados no laboratório do Vaticano, no mínimo de dois, eram as provas académicas de acesso à santidade que, comparadas com o mundo profano, equivaleria o primeiro milagre ao mestrado e o segundo ao doutoramento.

Pensava ainda, em meu pensamento, que a canonização, sem numerus clausus, atribuiria um alvará para novos milagres, sendo os dois primeiros as provas de exame no apertado filtro da canonização que, com o defunto ausente, fariam da Sagrada Congregação para as Causas dos Santos, a Sala dos Capelos da Universidade de Coimbra, com a dignidade de Prefeitura.

Compreende-se que os santos precisem de provas para poderem continuar no ramo dos milagres, sendo os primeiros obrados à experiência e os seguintes já com provimento definitivo. Isso justifica as alegadas exigências postas na comprovação científica dos prodígios pela Congregação oficial para não se repetir a exclusão do Livro dos Santos, como sucedeu a S. Guinefort que, apesar de mártir, foi exonerado quando se descobriu tratar-se de um cão e o templo, em sua honra, foi mandado arrasar pelo Papa de turno.

Um santo, depois do alvará de canonização, tem direito a biografia no Livro dos Santos, acompanhada da oração dedicada ao mesmo, de uma imagem clássica e do patronato e dia consagrado dento do culto católico. Não admira, pois, a exigência de três médicos que confirmem os milagres e a dificuldade acrescida dos defuntos em obrarem milagres de jeito, depois da evolução farmacológica e dos avanços médicos.

Exceto na oncologia, os milagres andam agora pelas varizes, furúnculos, queimaduras, moléstias da pele e, às vezes, pela fisiatria. Acontecem sempre na área da medicina e nunca na economia, física ou matemática, isto é, a santidade está confinada a medicinas alternativas.

Mas o que surpreende é a inércia dos santos reconhecidos e o frenesim dos candidatos. Lembro-me que Nuno Álvares Pereira, depois da brilhante cura do olho esquerdo de D. Guilhermina de Jesus, queimado com salpicos de óleo fervente de fritar peixe, e logo canonizado, nunca mais curou um simples furúnculo, hemorroides ou uma fratura do colo do fémur, o mesmo acontecendo com os milhares de canonizados dos três últimos pontificados.

A canonização, se a política da santidade se mantiver, deixa de ser o diploma para obrar milagres é passa a mero pergaminho com a jubilação assinada e com lacre do Vaticano.

21 de Novembro, 2018 Carlos Esperança

A Áustria e o véu islâmico

A Áustria tem um governo que integra a extrema-direita onde a xenofobia não é apenas a imagem que lhe está associada. A política contra os imigrantes, sejam eles refugiados, a fugir à fome ou à guerra, ou outros, à procura de trabalho, não têm uma vida fácil.

O racismo e a xenofobia jamais serão virtudes democráticas, mas nem todas as medidas que um governo desta natureza tome, são igualmente condenáveis.

O Parlamento austríaco, através dos partidos que formam o governo, aprovou hoje, dia 21, a proibição do véu islâmico nas escolas do ensino primário, abrangendo as crianças do sexo feminino, entre os seis e os dez anos.

Nota-se a intenção anti-islâmica da medida, mas ela devia ser uma decisão na defesa da laicidade, incluída na proibição de símbolos religiosos no espaço da escola pública. Se a defesa da laicidade fosse a prática dos governos europeus, sempre prontos à genuflexão pia, os símbolos ostensivos de qualquer religião deviam ser retirados do espaço público, sobretudo das escolas, onde a cidadania se deve sobrepor ao comunitarismo.

Há quem pense que a proibição das vestes eclesiásticas na via pública, fora das práticas religiosas autorizada, é um atentado à liberdade individual, tal como a proibição do véu islâmico ou da burka, e não imaginam que, no último caso, por cada mulher que deseja usar esses símbolos há dezenas a quem é imposto pelos maridos, pais e irmãos.

Longe de ser o direito que se exerce, é uma provocação com que se desafia a civilização que se repudia, e que abomina a integração. Sob o pretexto do respeito pelas liberdades de cada um, é a sujeição da mulher em contexto islâmico que se perpetua. A conivência dos países de acolhimento desperta a onda de racismo que cresce na Europa, e é o húmus onde a extrema-direita medra.

Uma escola que não eduque para a igualdade entre os sexos, a cidadania e a liberdade, não cumpre a função cívica que lhe cabe.

A proibição do véu islâmico devia ser encarada por todos os países laicos como uma obrigação equivalente à frequência escolar, às vacinas e normas de higiene.

Estou bem longe do governo austríaco e tão perto do apoio à proibição de hoje!  

17 de Novembro, 2018 Carlos Esperança

E Deus criou o Mundo…

Quando Deus era um anacoreta sombrio, farto de Paraíso e da solidão, matutou em seu pensamento apanhar o barro que, em dias de chuva, se colava às botas e lhe borrava a oficina.

Recolheu a argila, amassou-a e começou a dar-lhe forma. Percorreu-a com as mãos e moldou o boneco que a água do lago lhe refletia, nas raras vezes que tomava banho.

De vez em quando regressava ao lago para recordar a face. O corpo ia-o esculpindo a olhar para o seu, embevecido como todos os narcisos. Quando acabou, tal como fazia com outras peças, pressionou o indicador sobre a estátua e fez o umbigo.

Extasiado na contemplação, continuou a aperfeiçoar o corpo, deteve-se num empenho devoto no baixo ventre e, de tanto insistir, a estátua ganhou vida.

Estava feito o homem à imagem e semelhança do oleiro.

Como ocorre com artistas em início de carreira, Deus não sabia que tinha feito a obra da sua vida embora o pressentisse pela afinidade que lhe encontrava.

Foi então que resolveu retirar algum barro e, com o que lhe sobrara, fazer outro corpo, ainda mais belo, onde refletiu a geografia do Paraíso com vales acolhedores e montes suaves. Tinha criado a mulher e, sem o saber, dado início ao Mundo.

Então o velho cenobita, arrependido, desatou aos berros, praguejou, ameaçou e proibiu. Como tinha a paranóia das metáforas disse-lhes que não se aproximassem da árvore do conhecimento, isto é, um do outro, uma ordem que a natureza rebelde das criaturas não poderia acatar.

E, assim, de mau humor, enquanto expulsava Adão e Eva para a Terra, ficou a ruminar castigos, a congeminar torturas e medos para aterrorizar a humanidade. Demorou quatro mil anos – Deus é lento a refletir -, e mandou-lhes três religiões.

Moisés, Jesus e Maomé são os enviados de Deus que assustam a humanidade e o ganha-pão de parasitas que dividem o tempo a dar Graças, a ameaçar pecadores e a vender bilhetes para o Paraíso.

15 de Novembro, 2018 Carlos Esperança

JP2 – um Papa medieval

15-11-1980

Há 38 anos

João Paulo II reafirma a condenação da Igreja católica ao divórcio, aborto e relações sexuais pré-conjugais, numa comunicação em Colónia, RFA.

15 de Novembro, 2018 Carlos Esperança

A confissão e o crime

Por

ONOFRE VARELA

Num dos últimos textos que aqui publiquei (Gazeta de Paços de Ferreira) abordando crimes sexuais cometidos pela Igreja australiana, disse que «a Conferência Episcopal local fez saber que os sacerdotes não podem revelar abusos sexuais de que tenham tido conhecimento através da confissão, nem podem ser forçados a fazê-lo, porque violar essa norma “vai contra a fé e a liberdade religiosa”. Esta directiva religiosa desobedece à comissão governamental que desde 2012 investiga casos de abusos a menores em instituições religiosas, e que propõe sanções penais contra quem não denuncie este tipo de crimes».

O que então não disse, digo agora: os jornalistas também estão obrigados à confidencialidade, e por isso não divulgam as suas fontes de informação. Faz parte do seu código deontológico, protegê-las. Porém, os valores humanos sobrepõe-se a qualquer código seguido por uma classe profissional, e um jornalista não pode calar um crime hediondo quando dele tem conhecimento e a sua denúncia pode salvar vidas. Por uma questão de Humanidade e Justiça, deve comunicá-lo às autoridades competentes. Os padres que calam um crime, na convicção de “a confissão” ser assunto que não pode sair do triângulo “pecador-sacerdote-Deus”, estão a colocar-se ao lado do criminoso, consentindo que a vítima não seja ressarcida dos danos que sofreu, nem o criminoso seja julgado. Sendo Deus uma criação humana, calar um crime em seu nome… é calá-lo em nome da nada!…

O jornal espanhol El País dispôs-se a investigar crimes sexuais, e tem um canal aberto ([email protected]) para os leitores sabedores de algum caso que não tenha sido divulgado, poderem fornecer elementos para investigação jornalística.

O jornal já conta com mais de uma centena de relatos de abusos sexuais alegadamente cometidos por padres e que, até agora, permaneciam ocultos. Supostas vítimas de abusos sexuais cometidos em paróquias e colégios religiosos em várias épocas, desde os anos quarenta até aos últimos anos, contaram, por escrito, os seus dramas ao El País. Até agora não os tinham contado a ninguém, por vergonha ou por respeito aos seus pais que não queriam ver a sofrer. Há quem o faça agora porque os seus pais já faleceram, e porque a sua “impotência, raiva, angústia e dor, continuam vivas”.

Um dos testemunhos diz que “a raiva ainda me acompanha 53 anos depois; sofri abusos de um padre e sei que não fui o único”. Outros, disseram: “o director do colégio abusava de mim na secretaria”; “o arcebispo ameaçou que era a minha palavra contra a sua”; “o bispado silenciou os abusos que sofri”; “ameaçou-me de que, se contasse, me enviava para um internato”.

A Igreja Espanhola silenciou, durante décadas, os casos de pederastia que conheceu, e instruiu os tribunais eclesiásticos para que não registassem todos os casos.

Conseguir informações da Igreja é tarefa impossível para os jornalistas. As dioceses negam o fornecimento de dados. Só 17 responderam, com evasivas ou negativas, e 53 optaram pelo silêncio. A Máfia e a Cosa Nostra também funcionam assim…

(Texto de Onofre Varela, in Gazeta de Paços de Ferreira, na edição de 15 de Novembro de 2018)

14 de Novembro, 2018 Carlos Esperança

Sobre a existência de Deus

Não tenho a mais leve suspeita ou o menor indício da existência de Deus e, por isso, sou ateu.

Ontem num auditório da Universidade de Coimbra ficou provado que as religiões podem ser tolerantes e aceitarem o diálogo. É o caso da religião dos meus interlocutores

Joel Oliveira

Uma honra conversar sobre a fé cristã/ateísmo e a liberdade de expressão com o Prof. Carlos Esperança, Presidente da Associação Ateísta Portuguesa.
Hoje às 19h no Pólo Zero no Porto, o senhor que se segue é o meu amigo Rui André, um dos ateus mais inteligentes que eu conheço 

It is an honor to talk about the Christian faith/atheism and freedom of expression with Prof. Carlos Esperança, President of the Portuguese Atheist Association. Today at 7pm in Porto, the next gentleman with whom i will engage in conversation is my friend Rui Andre, one of the most intelligent atheists I know 

– Carlos Esperança
Agradeço o convite e felicito quem procura o contraditório sem fogueiras a crepitar no pensamento ou fatwa emitida contra os ateus.

Foi uma honra dialogar convosco.