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11 de Fevereiro, 2019 Carlos Esperança

Deus é maluco

A criação de Deus podia ter sido uma ideia interessante, mas foram toscos os arquitetos do projeto, desmazelados na execução os artífices, toscos os clérigos da sua preservação e restauro, e cínicos os pregadores da sua vontade.

8 de Fevereiro, 2019 Carlos Esperança

Marcelo, Panamá e recandidatura a Belém

“Saio daqui [Panamá] com uma grande vontade de, se Deus me der saúde e se eu achar que sou a melhor hipótese para Portugal, com uma grande vontade de me recandidatar”. […] “Tenho de ter saúde e tenho de ver se não há ninguém em melhores condições para receber o papa”.
(PR, no Panamá, após a participação nas Jornadas da Juventude católica, missa e sermão papal)

Podia alguém duvidar da descida de Cristo à Terra, mesmo sem perceber o que é subir ou descer, em relação ao Universo; podia alguém, que tivesse ouvido o atual PR em 26 de janeiro de 2014, durante a sua homilia dominical do “Jornal das 8”, da TVI, como comentador, defender um único mandato e dizer que “Dez anos para um Presidente é muito tempo”, e que “sujeitar um Presidente a uma reeleição nunca é positivo”, pensar que Marcelo jamais se recandidataria.

Seria como pensar que era outro Marcelo o atual PR, quem tivesse lido Esser Jorge Silva, sociólogo e investigador da Universidade do Minho, em entrevista à revista Visão (n.º 1351, de 24/31-1-2019), referindo que «alguns dos seus entrevistados, relataram, por exemplo, episódios de distribuição de dinheiro, por Marcelo, nas cozinhas dos restaurantes, durante a campanha de candidatura à Assembleia Municipal de Celorico de Basto (pág. 12), comparando tal atitude à das candidaturas de Valentim Loureiro.

A dúvida, a única dúvida sobre a sua recandidatura, que desde já saúdo, sem saber ainda quem será o meu candidato, é se não há alguém “em melhores condições para receber o papa”.

Sabendo que Marcelo o receberá em êxtase, genufletido e com beija-mão, e que haveria quem fosse capaz de beijar, de rastos, os pés ao Papa, fica a certeza de que Marcelo não abdicará de mais uma homenagem pia.

Com a reincidência fica mais curto o caminho do Paraíso e afiançada a assoalhada mais próxima dos taumaturgos e do anfitrião celeste. Um crente pode esbanjar indulgências, mas nunca uma ‘selfie’ com o CEO da sua religião.

Assim, fica dispensado de tocar à campainha da porta do Paraíso e de se sacrificar com a Vichyssoise, detestável sopa fria que os franceses adoram, para ter à espera quem lhe abra a porta, por ordem do anfitrião celeste.

7 de Fevereiro, 2019 Carlos Esperança

Culturas

Quando são incompatíveis, entre a modernidade e o respeito pelas culturas alheias, prefiro a primeira.

E nunca, absolutamente nunca, aceitarei uma cultura que não respeite a igualdade de sexos.

5 de Fevereiro, 2019 Carlos Esperança

Uau!… Vem aí o Papa… uau!…

Por

ONOFRE VARELA

Vi (todos nós vimos nos telejornais) uma cena patética protagonizada pelo presidente da República anunciando a vinda do Papa a Portugal, como se estivesse a anunciar ter saído o Euromilhões a dez milhões de portugueses!… A nossa república laica tem um presidente mais católico do que republicano, que rejubila com as coisas da Igreja como se fizessem parte da ementa pantagruélica que o alimenta (para sobremesa escolhe futebol)!

Muitos anos antes de Marcelo se candidatar à presidência da República, pasmei, num domingo, vendo que todas as televisões ocuparam a tarde de antena transmitindo em directo uma procissão que passeava um andor com a imagem seráfica da senhora de Fátima pela baixa lisboeta; e ele lá estava, num palanque, junto aos bispos que exibiam sorrisos beatos e teciam elogios àquele cortejo patético que transportava uma imagem, ao estilo daquela passagem bíblica que enfureceu Moisés ao ver que o seu povo hebreu promoveu um bezerro de ouro a entidade divina e organizou uma procissão com o mamarracho de ouro passeado em andor!

Deve estar tudo maluco!… Rejubilar porque camionetas, comboios e aviões vão despejar jovens inconscientes (como é próprio da juventude) em Lisboa para rezarem o terço… e o presidente da República já rejubila por antecipação?!… Provavelmente eu não serei deste mundo! Não encontro pinga de interesse nacional (como Marcelo diz ter) nesse encontro de jovens numa missa papal!…

Ouvi na Rádio Renascença a palestra habitual de um sacerdote, muito entusiasmado com a vinda dos jovens e do patrão da sua igreja a Lisboa, e não me pareceu mal aquele seu entusiasmo, por duas razões: primeiro, porque ele próprio tinha participado na organização do processo que haveria de ser contemplado com a vindo do papa; e depois porque a Rádio Renascença é da Igreja… está a jogar em casa e tudo quanto passa naquela antena tem o cunho católico. Por aí está tudo bem… mas a nível nacional, com tanta coisa séria a preocupar a sociedade portuguesa, com banqueiros ladrões, políticos desonestos, professores desempregados, enfermeiros e polícias descontentes, e uma juventude com o futuro comprometido por razões políticas e económicas que o governo não resolve, rejubila-se porque vem aí o Papa, com mocinhas e mocinhos, rezar o terço num fim de semana? Isto é verdade?!… É droga anestesiante, ou estou a sonhar?…

A importância das coisas obedece a uma hierarquia. Por muito importante que eu considere o jogo do pião, ele não se sobrepõe às verdadeiras importâncias do país, que são os problemas económicos e sociais que fazem o evoluir da sociedade. Aceito a importância que terá ver o papa para aqueles que o adoram e querem jogar o pião com ele… mas é igual a ver a Madona… também há quem a adore, embora não contribua para a felicidade dos portugueses, nem, tão pouco, para quem mora na rua onde ela comprou casa.

(Texto de Onofre Varela para a edição do jornal Gazeta de Paços de Ferreira do dia 7 de Fevereiro)

4 de Fevereiro, 2019 Carlos Esperança

No centenário de Fátima

(Em nome do Pai, do Filho e do Banco Novo)

Por mais que o atual Papa se esforce para dar à religião católica uma credibilidade que a distinga, pode diferenciar-se ele dos antecessores, pelas preocupações sociais e conduta intransigente em relação a ligações perigosas do Banco do Vaticano, mas não remove os alicerces da superstição ou põe em causa os negócios dos milagres.

A vinda do papa Francisco a Portugal, no dia 13 de maio de há dois anos, para assinalar o que imprensa pia denomina “Centenário das Aparições em Fátima”, foi a cumplicidade com um embuste urdido contra a República, primeiro, o comunismo, depois, durante a ditadura, e, desde então, ‘contra o ateísmo’ que, aliás, foi o lema da peregrinação de 2008.

A dimensão verificada da propaganda, cento e cinquenta iniciativas até 2017 e ainda uma exposição no Vaticano, em 2018, já faziaem prever uma colossal campanha publicitária sem precedentes nos tempos atuais.

O negócio começou com rumores, depois com anunciadas visões e, finalmente, com as aparições de uma Senhora mais brilhante do que o Sol, à semelhança de tentativas mais ou menos conseguidas em outras latitudes onde o credo romano se tornou hegemónico.

A visita do papa foi mais a de um diretor-geral internacional a promover os negócios da fé numa sucursal do que a de um líder religioso moderno a promover a sua higienização e a combater a superstição num país para cujo atraso contribuiu.

O bailado do Sol, as acrobacias de uma Senhora saltitante nas azinheiras e a aterragem de um anjo no anjódromo da Cova da Iria foram promovidos a dogmas, e as conversas imaginárias que a Senhora teve com a Irmã Lúcia, a factos históricos.

Já bastava a falta de espírito crítico que, como povo, nos prejudica, dispensávamos a festa do embuste na apoteose de uma data criada pela Igreja, na fase mais trauliteira, contra o regime republicano.

3 de Fevereiro, 2019 Carlos Esperança

AAP – Carta ao jornalista Henrique Monteiro (HM)

Senhor Henrique Monteiro

Na última quarta-feira publicou, no Expresso online, o artigo, “Recordações sobre o Estado laico”, censurando o Comunicado da Associação Ateísta Portuguesa (AAP), onde se critica a deslocação do PR a cerimónias religiosas, no Panamá. O referido comunicado, da responsabilidade da Direção, encontra-se na página oficial da AAP e mereceu, aliás, o interesse e acolhimento da generalidade da comunicação social.

HM transcreve no seu artigo: “A título particular e a expensas próprias, caberia a esta Associação respeitar e ignorar tamanha devoção. Participar em jornadas da Juventude, onde manifestamente a idade não o recomenda, ir à missa e assistir à benzedura de um templo católico, é um assunto que a AAP ignoraria se o enviado fosse um membro da Conferência Episcopal, mas que considera um grave atentado à neutralidade religiosa do Estado laico, quando perpetrado pelo Presidente da República”.

Desta transcrição conclui: «É difícil ser mais dogmático, sectário e, perdoe-se a ousadia, ignorante». Registo a sabedoria, imparcialidade e tolerância de HM, em contraste com a forma e substância do parágrafo que o enxofrou.

Estranho a hostilidade de quem sentiu a necessidade de se afirmar «não católico», como se tal facto fosse uma virtude, aumentasse a credibilidade ou interessasse aos leitores. Os ateus não se atribuem qualquer superioridade moral em relação aos crentes e neste comunicado não estava sequer em causa o ateísmo, mas a laicidade cuja violação pelo PR foi manifesta e constitui desrespeito de quem representa todos os portugueses.

Apreciei a sua ironia: «O que está errado nos ‘ateístas’ não é a sua fé na não existência de Deus, que é legítima», apenas me surpreendeu a necessidade de a explicar no final do artigo, desconfiado, talvez, da inteligência de quem o lê. Terá as suas razões.

HM critica a forma e o conteúdo do “comunicado”, mas quando afirma que «Embora não seja representativa em termos de associados, a Associação Ateísta Portuguesa representa um pensamento relativamente comum entre a esquerda mais radical», ignora o número de sócios, sem sequer procurar informar-se, o que é incúria, e atribui à AAP «o pensamento da esquerda mais radical», com a leviandade com que se refere à sua representatividade ou quando afirma que ‘o que irrita os ateus é que o PR seja católico e vá à missa’, numa dedução psicanalítica ao nível de um bruxo.

Quanto à ética, estamos conversados. Quanto ao dever de o PR respeitar a laicidade, não o entende HM, que ignora o conceito – neutralidade religiosa –, a que é obrigado quem representa todos os portugueses.

Quanto à Concordata, que HM refere, é um tratado que dificilmente respeita a CRP. Foi a cedência de Durão Barroso que tornou Portugal protetorado do Vaticano. A Marcelo serve-lhe para salvar a alma, a Henrique Monteiro para perder a credibilidade.

P. S. – Sabe que sou presidente da AAP e lembrar-se-á que conversávamos no Tweeter. Sabe bem que sou um moderado, tal como os membros da Direção da AAP, mas é mais fácil estar com o poder. E mais lucrativo.

Cumprimentos. CE

2 de Fevereiro, 2019 Carlos Esperança

Há 5 anos – A canonização de Santo Pereira

Uma onda de entusiasmo varreu a Pátria mas não havia necessidade de adjudicar qualquer milagre ao beato D. Nuno, para ser elevado a santo, pois «Urbano II abriu uma exceção para quem há mais de 200 anos fosse prestado culto e reconhecida, pelo povo, a santidade», exceção que o patriarca Policarpo tinha já confirmado aplicar-se-lhe.

Nuno Álvares Pereira renunciou, porém, à prerrogativa que o dispensava do milagre, para não ser acusado de favoritismo. Recusou a passagem administrativa. Iniciou-se no ramo dos milagres e logrou a cura do olho esquerdo da senhora Guilhermina de Jesus, de Ourém, que o havia danificado com óleo fervente de fritar peixe.

Assim, o intrépido guerreiro revelou-se um poderosos antídoto contra as queimaduras e passou por mérito próprio no exame de admissão à santidade, com provas de mérito irrefutáveis e a mesma indómita vontade de subir ao altares que o levou a desbaratar castelhanos em Aljubarrota.

Com quase seiscentos anos de defunção, conseguiu a santidade para maior glória da Pátria, vaidade do clero e euforia dos créus. Durante séculos foi o terror das crianças de Castela que recusavam a sopa, agora passou a ser o orgulho dos portugueses e a cunha sempre à mão para tirar bilhete para o Céu na Agência de Turismo Celeste da ICAR.

Surpreende que os papas anteriores tenham apagado o beato Pereira, que as sucessivas levas de bispos e cardeais tenham esquecido um santo desta dimensão, que desde 1431 os devotos o tenham ignorado nas novenas e que milhares de soldadores a quem caiu um pingo de solda num olho tenham recorrido àquelas horríveis obscenidades, em vez de dizerem «valha-me Santo Pereira», e aliviado a dor em vez de perderem a alma.

Foi preciso o olho clínico de JP II, para diagnosticar milagres e descobrir taumaturgos, para criar este grande santo. Teve várias nomeações no passado mas foi sempre preterido pela bajulação dos papas a Espanha e escrúpulos por alguns milhares de mortos e estropiados em Aljubarrota, minudências que lhe atrasaram a promoção.

Mas, em boa verdade, Nun’Álvares não merecia que lhe ultrajassem a memória com um milagre rasca nem que transformassem um herói num colírio santo.

1 de Fevereiro, 2019 Luís Grave Rodrigues

Crucifixo