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23 de Abril, 2019 Carlos Esperança

Sri Lanka – O terrorismo de religiões pacíficas

Matança da Páscoa católica

Os ataques a hotéis e igrejas dificilmente são alheios à rivalidade religiosa que se agrava nos Estados que descuram a neutralidade religiosa e a atenção ao sectarismo pio. Mais de 200 mortos e quase meio milhar de feridos foi o efeito de atos terroristas do domingo de Páscoa contra hotéis e 3 igrejas cristãs, duas delas católicas.

O budismo, que não é teísta, é a corrente dominante, seguida do hinduísmo, e em menor grau o islamismo e o cristianismo. Há muito que cresce a violência budista, que se nota na rivalidade entre monges e conventos, e na violência contra populações, sendo o caso extremo o genocídio dos muçulmanos rohingyas na Birmânia.

O hinduísmo, para além de manter o iníquo sistema de castas e o ódio a mulheres viúvas que ousem casar-se, onde o facto de não acompanharem os maridos defuntos à pira funerária já é motivo de censura, que só a repressão policial tem evitado, está a viver um surto de agressivo nacionalismo que a questão da Cachemira exacerba na Índia.
Dos monoteísmos é nossa obrigação conhecermos as taras comuns, as idiossincrasias de cada um deles e as das múltiplas seitas que proliferam.

A alegada promoção da paz pelas religiões não possui fundamentação histórica. No entanto, a defesa da paz regista fartos e abnegados sacrifícios de crentes, de onde se deve concluir que estes podem ser benevolentes, apesar da fé.

Há entre a piedade que as crenças exaltam e a ação prática que a fé inspira uma ligação que empurra os crentes mais embrutecidos para o proselitismo e extermínio dos crentes dos deuses da concorrência, designados por infiéis.

O carácter pacífico das religiões é uma enorme mentira. O esclavagismo, a misoginia, homofobia, o racismo, a tortura e a xenofobia são a herança plasmada nos livros gerados no tribalismo patriarcal da Idade do Bronze e que as sucessivas legiões de clérigos perpetuaram como vontade divina. E o mesmo se pode dizer, como se vê, do hinduísmo e do budismo.

A invenção de Deus, à imagem e semelhança dos homens que os criaram, podia ter sido uma ideia aliciante, mas fizeram dela um pesadelo que apela ao pior de que os homens são capazes.

Cabe aos Estados impor a neutralidade religiosa e reprimir os crimes estimulados pelos clérigos e perpetrados pelos crentes mais demenciados pela fé.

22 de Abril, 2019 Carlos Esperança

Conventos, ‘vida’ monástica e liberdade

As religiões têm casas de reclusão, a pretexto da piedade e da oração, onde encarceram débeis de vontade, fanáticos do divino ou devotos depressivos. Às vezes são as vítimas de famílias que lhes querem confiscar a herança, de coação ou de chantagem. Têm, em regra, uma hierarquia rígida, uma disciplina despótica e um tratamento desumano. Bem sabemos que é para maior glória de Deus e para gozo da Santa Madre Igreja.

Os conventos estão atribuídos a Ordens, consoante as patologias. Uns dedicam-se à contemplação, outros ao silêncio, vários à autoflagelação, quase sempre em acumulação de diversas perversões que, no caso da ICAR, são autorizadas pelo Papa e conduzem em regra o/a fundador/a à canonização.

Admitamos que as vítimas se encarceram de livre vontade, que o desejo do Paraíso as inclina para o masoquismo, que a ociosidade as anula, que a inteligência, a vontade e os sentimentos se consomem na estéril clausura e na violência dos votos. Aceitemos que há seres racionais a crerem que, algures, um deus aprecia a alienação, o sofrimento e a violência. Imaginemos um Deus que se baba de gozo com ambientes concentracionários despoticamente defendidos por madres ou frades ungidos do direito à tirania.

A título de exemplo lembro a Ordem das Carmelitas onde, só a título muito excecional, é permitido falar. E essa magnânima autorização tem fortes grades a proteger qualquer encontro. É nestes ambientes carcerários, privados de nome, de pertences e de memória, que exércitos de inúteis vestidos de forma bizarra se encontram ao serviço do Papa.

Na Irlanda, há anos, o Governo foi constrangido a averiguar o que se passava no campo de concentração «As irmãs de Maria Madalena», tendo fechado a espelunca e libertado as vítimas, condenadas a prisão perpétua pelas próprias famílias, por terem sido mães solteiras ou, apenas, demasiado bonitas, perigosas na sedução dos homens.

Será possível que os Governos democráticos, a quem cabe a defesa da Constituição, o dever de respeitar e fazer respeitar os direitos e liberdades dos cidadãos, se conformem com a renúncia à cidadania e não averiguem se é de livre vontade que bandos de frades e freiras façam de lúgubres conventos o mausoléu da vida?

21 de Abril, 2019 Carlos Esperança

O terrorismo de religiões pacíficas

A alegada promoção da paz pelas religiões, particularmente pelos monoteísmos, não possui fundamentação histórica. No entanto, a defesa da paz regista fartos e abnegados sacrifícios de crentes, de onde se deve concluir que estes podem ser benevolentes, apesar da fé.

Sendo inevitável a ligação entre as crenças e a ação, é natural que a piedade conduza à prática do que a fé inspira, ao exercício do que sugerem os livros sagrados, à luta contra os infiéis (os outros) e ao proselitismo. É útil a conclusão de que os livros sagrados não devem ser levados à letra, mas amenizar a alegada vontade do deus que os inspirou ou duvidar da sua capacidade de comunicação, não revela solidez da fé.

Dizer que o Islão, cuja demência se exacerbou com o fracasso da civilização árabe, nada tem a ver com o terrorismo, é como afirmar que as Cruzadas e a Inquisição não comprometeram o cristianismo ou que o judaísmo é alheio ao sionismo.

O carácter pacífico das religiões, bem como das crenças políticas de incómoda memória, é uma enorme mentira que urge desmascarar.

O esclavagismo, a misoginia, o racismo, a tortura e a xenofobia são a herança plasmada nos livros concebidos pelo tribalismo patriarcal da Idade do Bronze e que as sucessivas legiões de clérigos perpetuaram como vontade divina.

A Inquisição espanhola só pôs termo à perseguição dos hereges em 1834 e o sionismo é hoje, e cada vez mais, o detonador do ódio entre muçulmanos e judeus.

Não podemos ignorar que os versículos do Alcorão fundamentam o Estado Islâmico, o Boko Haram, a Al-Qaeda e outros heterónimos do Islamismo; e não esqueçamos que o nazismo e o fascismo, de natureza estritamente secular, beberam na teologia cristã (protestante e católica) o antissemitismo nascido da cisão do judaísmo, antissemitismo assimilado pela cópia grosseira dos monoteísmos anteriores – o Islão.

Sem crentes civilizados e pacíficos não haverá paz e não se pense que ela venha através de crentes de credos rivais ou de não crentes. Enquanto a rua islâmica exultar quando os ‘infiéis’ são imolados por devotos bombistas, não se pode acreditar no carácter pacífico do Islão. Só quando forem muçulmanos os denunciantes dos ‘irmãos’ que preparam os ataques suicidas se libertará a anacrónica religião da pulsão terrorista que a devora.

21 de Abril, 2019 Carlos Esperança

O milagre dos pastorinhos, Francisco e Jacinta

Francisco e Jacinta

Lembro-me do velho Hospital Distrital de Leiria e da magnífica escadaria de mármore partida a camartelo para se proceder a obras de remodelação, depois de retirada a foto imponente do virtuoso bispo D. Manuel de Aguiar sob cujos auspícios fora construído o edifício.

No respetivo piso, entre várias enfermarias, ficavam as Medicinas. Na de «Mulheres» havia uma mesinha de cabeceira que dava nas vistas pela parafernália de senhoras de Fátima, pastorinhos e outras imagens pias que a ornamentavam. Ficava junto à cama de uma paralítica que, durante a noite, se arrastava até junto das camas de outras doentes para lhes impedir o descanso.

Gozava essa internada da fama de má e da inimizade de outras doentes mas era a dileta do Diretor do Serviço, Dr. Felizardo Prezado dos Santos, enternecido com a devoção e extasiado com as suas imagens de santos e veneráveis.

Um dia, nas suas férias, o médico José Luís Alves Pereira deu-lhe alta por entender que não padecia de qualquer moléstia do foro da medicina interna, o que, no regresso, irritou o Dr. Felizardo.

A D. Emília, Emília de Jesus, voltou à enfermaria e foi, de novo, integrada no espaço que lhe servia de asilo e de local de devoção.

As transferências para Psiquiatria, no Hospital da Universidade de Coimbra, eram reservadas a períodos de maior necessidade. Segundo o psiquiatra, Marques Pena, a D. Emília padecia de uma enfermidade que a podia conduzir à cegueira, à paralisia ou a outras mazelas, por períodos de maior ou menor duração. No respetivo processo clínico dos Hospitais da Universidade de Coimbra hão de constar dados rigorosos se, acaso, um qualquer milagre não o fez, entretanto, desaparecer.

Mas voltemos a Leiria e à D, Emília de Jesus cuja paralisia já era reincidente e que foi curada por intercessão do Francisco e da Jacinta, bem necessitados de um milagre para a beatificação.

Graças à devoção, sarou de novo e passou a andar, tendo morrido pouco tempo depois, completamente curada. O milagre, depois de averbado nas provas de beatificação dos pastorinhos, que prestaram com distinção, deixou de interessar à Igreja, sendo discreto o funeral da D. Emília onde, a título meramente particular, se integrou o bispo de Leiria, D. Serafim Ferreira e Silva.

A divulgação do milagre da paralítica foi feita com pompa e circunstância pelos canais habituais, invocando os depoimentos de três médicos diferentes, nisto a Igreja católica é muito cética, unânimes a atestar a intervenção sobrenatural.

Por divina casualidade, a certificação do milagre foi atestada pelo Dr. Felizardo Prezado dos Santos, pela Dr.ª Maria Fernanda Brum, por coincidência esposa do primeiro, e pela psiquiatra Paula Cristina Amaral Brum Prezado Santos, filha de ambos, todos da Associação dos Servitas de Nossa Senhora de Fátima.

Digam lá, leitores, se, depois do que aqui se diz, ainda há quem duvide da veracidade do milagre! É preciso ser muito desconfiado. Leiam isto enquanto há testemunhas porque, um dia, há de constar que à D. Maria Emília Santos lhe cresceu uma perna amputada.

20 de Abril, 2019 Carlos Esperança

Semelhanças e diferenças

Voluntários crucificados nas Filipinas

Os cristãos que se fazem crucificar, nas Filipinas, distinguem-se dos suicidas islâmicos. Os primeiros são masoquistas e os segundos sadomasoquistas.

Só a superstição e a fé os aproximam na apoteose da demência.

19 de Abril, 2019 Carlos Esperança

Massacre de Lisboa de 1506

Há 513 anos, em 19 de abril, em Lisboa, uma multidão perseguiu, torturou e matou mais de 4000 judeus. O Pogrom de Lisboa ou Matança da Páscoa de 1506, nove anos depois da conversão forçada dos judeus em Portugal, resultou da acusação de serem a causa da seca, fome e peste que assolavam o país.
Em 1506 os judeus eram os suspeitos do costume e aos cristãos-novos nem a conversão forçada lhes permitia a tranquilidade. A sua perseguição era uma tradição que a intensa devoção dos católicos exigia e os padres estimulavam.
Depois viria a Inquisição, para dar cobertura legal às fogueiras purificadoras, e reunir hereges, bruxas, sacrílegos, apóstatas e outros inimigos da fé na incineração dedicada.Os livres-pensadores duvidam do mau-olhado, da feitiçaria e outros truques e defendem a laicidade com a mesma tenacidade com que os devotos queimavam hereges. Perdeu-se a tradição ibérica que os reis de Espanha, Fernando e Isabel, cultivaram e impuseram a D. Manuel I. Ficaram na História, conhecidos por Reis Católicos, muito devotos à Igreja e com especial alergia ao banho, que abominavam.
Hoje, apesar dos milagres que já obraram e do desejo de franquistas em canonizá-los, os papas têm resistido em reconhecer-lhes os milagres e em elevá-los à santidade.
Já não há devoção como antigamente, e a chaga da laicidade anda aí para perdição das almas e azedume dos católicos integristas, talibãs de Cristo-Rei, que gostariam de levar missas e orações aos hospitais, presídios, universidades, escolas e repartições públicas.
As Cruzadas foram a apoteose da fé, a Evangelização um momento alto do proselitismo e a Santa Inquisição um tribunal cujos métodos revelaram o desvelo dos inquisidores e a força da fé.
Razão tinha a Santa Sé em não aceitar a Declaração Universal dos Direitos Humanos, essa criação de ateus, livres-pensadores e outros malfeitores que impõem a igualdade de direitos para homens e mulheres, ao arrepio dos livros sagrados.

19 de Abril, 2019 Carlos Esperança

A laicidade, a Páscoa católica, a Justiça e as escolas públicas

O país foi, este ano, assolado por um violento ataque de fé que levou às escolas públicas a liturgia e as orações.

A abertura do Ano Judicial foi, este ano, abrilhantado por um figurante de vestes talares, um cardeal objeto de saudações generalizadas, o que faz temer o regresso do direito canónico ao Código Penal, com punição exemplar para os casos de adultério feminino e homossexualidade, proibição do divórcio e penas severas para os pecados, talvez com a benevolente redução penal para a pedofilia e a violência doméstica.

A Universidade de Coimbra deu o exemplo ao introduzir a missa, pela primeira vez, na cerimónia de posse do reitor. Na próxima posse de um novo reitor será já uma tradição.
Nos Hospitais públicos, além dos nomes de santos com que são crismados, pululam nos corredores das enfermarias crucifixos e senhoras de Fátima onde se acoitam bactérias e fungos que a água benta e as orações não erradicam.

Em Vieira do Minho, a atividade pascal, da iniciativa dos pais dos alunos, levou a missa ao Agrupamento de Escolas Vieira de Araújo; em Famalicão, o compasso visitou as 27 escolas do Agrupamento D. Maria II; em Viana do Castelo, os alunos das escolas de Lanheses, Arcos de Valdevez e Ponte de Barca participaram em cerimónias religiosas; em Bragança a comunhão pascal foi facultativa no Agrupamento de Escolas Miguel Torga e nos restantes agrupamentos do concelho também se realizou; em Vila Real, a missa aconteceu no horário normal, mas o subdiretor de Escolas Diogo Cão ressalvou que “é uma atividade como outra qualquer”; e, em Vila do Conde, no Agrupamento de Escolas Dr. Carlos Pinto Ferreira, na Junqueira, no último dia de aulas, alunos, professores e funcionários da EB 2,3 foram em cortejo até à igreja do Mosteiro de S. Simão da Junqueira para assistir à missa. (Fonte deste §: JN de 10-04-2019).

O regresso ou reintrodução da evangelização romana foi facultativa, diferente da sharia, em “escolas com autonomia” como se o caráter laico do Estado e a CRP permitissem as manifestações contrárias ao espírito e letra da Constituição, como se o constrangimento social não violasse a liberdade religiosa que, sendo inviolável, não pode expor quem se sinta coagido ou se recuse.

A Igreja católica goza de privilégios incompatíveis com a laicidade a que o Estado está obrigado. O Estado português tem obrigação de defender a igualdade entre os cidadãos declarando-se incompetente em questões de fé, obrigando-se a promover a neutralidade religiosa. É um abuso de qualquer religião a interferência na esfera pública, tal como a ingerência do Estado nas religiões.

A autonomia das escolas não pode servir de alibi para ferir a legalidade democrática e constranger a liberdade religiosa. A separação do Estado e das Igrejas é uma conquista civilizacional e a única garantia para evitar exigências de outros credos e prevenir novas guerras religiosas, de que a Europa tem trágicas tradições.

Sobre a violação da laicidade pelas escolas vale a pena ler o que escreveu um respeitado constitucionalista, Vital Moreira:

https://causa-nossa.blogspot.com/2019/04/laicidade-7-basta-de-farisaismo.html
18 de Abril, 2019 Carlos Esperança

Os crentes e a tolerância

O aparecimento de crentes tolerantes vai-se tornando uma constante a que urge estar atento. É um fenómeno das sociedades democráticas onde a secularização exerce a sua pedagogia. Tal como o ateísmo, a religião não faz ninguém bom, mas não estraga todos por igual. Os livros sagrados refletem a violência da época e a idiossincrasia de quem os escreveu, mas são poucos os crentes que os leem e menos os que os levam a sério.

A verdade revelada dos quatro livros escolhidos no consulado de Constantino teve mais a ver com os interesses do Império Romano do que com a fé do Imperador. Esses livros, evangelhos, refletiam interesses políticos que se tornaram essenciais para a organização política da ICAR e a conquista do poder temporal que logrou. O mesmo aconteceu com a Tora, primeiro, e o Alcorão, depois.

Curiosamente, ainda hoje a ICAR vai buscar aos evangelhos que ela própria declarou apócrifos factos e personagens a que atribui valor canónico. É o caso de Ana e Joaquim, proclamados santos e atribuídos a Jesus, como avós maternos cuja vida e existência os «verdadeiros» omitem.

Excetuando épocas de crise em que o sentido literal da Tora, Bíblia e Alcorão são objeto de um proselitismo infrene, a tendência vai no sentido da relativização dos textos e o cumprimento da vontade de Deus aligeira-se como se o próprio, suspeito de Alzheimer, ficasse sob suspeita.

Com crentes tolerantes e civilizados é possível alargar os espaços democráticos e levar o respeito pelos direitos humanos a regiões onde é desconhecido. Seria trágico que, por questões de assepsia, os ateus recusassem dar as mãos aos crentes, de qualquer credo, que sobrepusessem o espírito da paz à paranoia do proselitismo. Basta, para desgraça, que a inversa se verifique.

Quando a sabedoria, a diversidade cultural e a miscigenação aproximam os povos, aumenta no seio das diversas religiões, o pavor da perda do poder, o horror à extinção, a volúpia da hegemonia e a obsessão totalitária da verdade única.

O clero tem reflexos tribais, que urge conter com a laicidade, e tendências prosélitas que a separação da Igreja e do Estado atenuam. A tendência totalitária, que a sociedade civil deve refrear, precisa de uma vacina que permita a vitória da paz, da liberdade e do livre-pensamento. A laicidade é essa vacina e interessa a ateus, crentes e agnósticos.

A liberdade religiosa, reconhecida pela primeira vez, pela Igreja católica, no concílio Vaticano II, foi vista com azedume por João Paulo II e Bento XVI, mas a reafirmação recente, explícita e veemente, pelo Papa Francisco, dá à sua Igreja alguma autoridade moral.

17 de Abril, 2019 Carlos Esperança

Fake News

Por

ONOFRE VARELA

Está na moda a difusão de notícias falsas (referidas pelo termo inglês Fake News)… uma espécie de “informações” criadas com o propósito de enganar quem as receba por verdadeiras. 

Divulgam mentiras por verdades, para intoxicarem a opinião pública e induzirem a maioria de nós a pensar e a fazer como os seus promotores querem. Habitualmente usadas com fins políticos ou económicos para benefício de alguém ou algo, é um recurso usado por partidos políticos ou correntes de pensamento. 

As Fake News foram usadas nos EUA em benefício de Donald Trump, e no Brasil para levar Bolsonaro ao governo. Numa sociedade sã, defendendo interesses sociais colectivos e ecológicos, esses homens nunca seriam líderes se não fossem promovidos por narrativas enganosas e eleitos por gente, propositadamente, distraída. 

Para que as Fake News atinjam o alvo com eficácia, têm de ter algo de verdadeiro à mistura… algo que interesse à maioria de nós, levando-nos a aceitar todo o discurso como verdade, só porque uma parte dele é (ou parece) verídico. Repare-se nosenredos das telenovelas. Aquilo é pura ficção, mas retrata a vida social como nós a conhecemos, e muitos dos conflitos narrados nos episódios, já nós os vivemos de algum modo ou sabemos de quem os tenha vivido… mas é tudo mentira! É esta semelhança com a realidade que faz o interesse dos espectadores. 

Esta artimanha de misturar realidade com ficção, não é nova. As Fake News são velhas como o mundo, e a Bíblia é uma colecção enorme delas. À mistura com nomes de personalidades que a História nos diz terem existido, e de localidades reais, construíram-se narrativas falsas que, para além de as aceitarmos por verdadeiras, ainda se lhes acrescenta a maior falsidade que é a de terem sido ditadas por um deus!…

Um exemplo: Moisés é uma personagem do Antigo Testamento, atribuindo-se-lhe o êxodo (a fuga do povo hebreu do Egipto) e a espectacularidade das dez pragas que fizeram a rendição do faraó Ramsés II, a última das quais provocou a morte do próprio filho do faraó, o que nos mostra Deus como um ser infame, despótico e cruel. 

O problema desta narrativa está no facto de os casos que conta nunca terem existido!… Êxodos de hebreus, houve muitos… e as dez pragas narradas são tão espectaculares, provocaram tantos danos à sociedade egípcia, que, forçosamente, teriam de fazer parte da História do Egipto… que não as regista!… O que quer dizer que não existiram! 

A própria existência real de Moisés não está provada pela História, e o que se diz de, em bebé, ter sido recolhido de uma cesta abandonada no rio Nilo, e ter sido educado no palácio do Faraó… é cópia da história de vida de Sargão I, rei da Suméria, que viveu 600 anos antes de Ramsés II. Placas de argila com inscrições cuneiformes registam que Sargão I nasceu em segredo, filho de uma grande sacerdotisa que o abandonou à deriva num cesto nas águas do rio Eufrates, tendo sido resgatado por um homem que se abastecia de água e o criou. 

Esta estória do menino abandonado num rio também é contada como nota biográfica de outros poderosos da Antiguidade, como Ciro e Adashir, para sublinhar a capacidade que tiveram da superação do infortúnio, ascendendo a lugares cimeiros da sociedade, apesar de terem tido um nascimento tão miserável.

 (Artigo a publicar no jornal Gazeta de Paços de Ferreira de 18 de Abril de 2019)