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24 de Fevereiro, 2004 Carlos Esperança

Não há religiões tolerantes. Há crentes que, apesar da religião, conseguem ser

Bernardo Sanchez da Motta escreveu: Desculpe-me, Carlos Esperança, mas a sua forma de ver o Islão é extremamente redutora. Se você não consegue sequer vislumbrar a tela complexa do Islão actual, então não me parece que o seu comentário ao véu tenha muito fundamento ou credibilidade.

Por acaso sabe em que termos o Corão menciona o uso do véu pelas mulheres? Terá o Carlos perdido um pouco do seu tempo para ver EXACTAMENTE como o Corão define essa questão? A sua ideia de Islão vem dos “taliban”?

Ou está apenas a deixar a sua mente ser levada pela “pseudo-intelectualidade” dos preconceitos que os mass media impoem à mente “massificada” dos nossos contemporâneos?

A minha resposta:

Não sendo o véu uma imposição do Corão, não deixa de ser uma arma que os fundamentalistas islâmicos usam para desafiar o carácter laico do Estado francês.

Pode argumentar, caro leitor, que o Islão já foi tolerante. Mas prove-me que o Islão é capaz de:

– Renunciar à sharia;

– Permitir aos crentes que o abandonem;

– Defender a liberdade de ter qualquer religião e a de não ter;

– Pedir perdão pela fatwa contra Salman Rushdie;

– Enfim, se é capaz de renunciar à pena de morte, poligamia, discriminação da mulher e outros anacronismos e consentir, nas suas escolas, símbolos cristãos, judaicos ou ateus.

Não basta haver crentes tolerantes, é preciso que o carácter fascista das religiões seja erradicado.

23 de Fevereiro, 2004 André Esteves

The End of the World

Seguindo o mote da Mariana com a letra dos Muses, aproveito para colocar a letra de um happening da Laurie Anderson.

O texto é sugestivo… Mas ouvido da sua boca é inesquecível…

The End of the World – by Laurie Anderson

«Hi! This evening I’ll be reading from a book I just finished and since a lot of it is about the future, I’m going to start more or less on the last page, and tell you about my grandmother. Now she was a Southern Baptist Holy Roller and she had a very clear idea about the future, and of how the world would end.

In fire.

In fire.

Like in Revelations.

Like in Revelations.

And when I was ten my grandmother told me the world would end in a year. So I spent the whole year praying and reading the Bible and alienating all my friends and relatives. And finally the big day came. And absolutely nothing happened. Just another day.

Ooooaaaah!

Now my grandmother was a missionary and she had heard that the largest religion in the world was Buddhism. So she decided to go to Japan to convert Buddhists.

And to inform them about the end of the world.

And to inform them about the end of the world.

And she didn’t speak Japanese. So she tried to convert them with a combination of hand gestures, sign language and hymns, in English.

Ooooaaaah!

The Japanese had absolutely no idea what she was trying to get at. And when she got back to the United States she was still talking about the end of the world. And I remember the day she died. She was very excited. She was like a small bird perched on the edge of her bed near the window in the hospital. Waiting to die. And she was wearing these pink nightgowns and combing her hair so she’d look pretty for the big moment when Christ came to get her.

Ooooaaaah!

And she wasn’t afraid but then, just at the very last minute something happened that changed everything. Because suddenly, at the very last minute she panicked. After a whole life of praying and predicting the end of the world, she panicked. And she panicked because she couldn’t decide whether or not to wear a hat.

Ooooaaaah!

And so when she died she went into the future in a panic with absolutely no idea of what would be next.»

23 de Fevereiro, 2004 Mariana de Oliveira

Igreja Católica e os meios de comunicação estaduais

Andava eu muito bem a surfar na web quando dou por mim a olhar para a programação religiosa de Fevereiro nos média (como estão sempre a pensar em contas – do rosário, de dinheiro caído nos cofres de Fátima – deve ter havido confusão) . O espanto! O horror! Todos os domingos, às dez horas da manhã, há transmissão da missa dos estúdios de Lisboa… pela RTP1, a nossa televisão pública, e – para não perder embalagem ou para manter uns laivos saudosistas dos tempos missionários dos Descobrimentos – a RTP Internacional trata de enviar a (uma) mensagem para todo o mundo. Aos dias da semana, na 2:, há o programa Ecclesia e, no dia santo, 70×7.

Como se isto não bastasse, o serviço de radiodifusão estadual também embarca nesta onda de evangelização: Eucaristia aos Domingos e dias Santos, pelas 8:00h, na Igreja de S. João de Brito – Lisboa, na Antena 1, e, na RDP Internacional, Eucaristia também todos os Domingos e dias Santos – 11:30h, Igreja paroquial S. Estevão, Alfama – Lisboa.

Não me choca que existam programas religiosos nos meios de comunicação privados. A iniciativa privada é isso mesmo: privada e, desde que não se vá contra a lei, há liberdade de expressão. O problema é quando o serviço público de informação se presta a estas manobras propagandísticas gratuitas (sim, porque é uma prestação gratuita a favor da boa ICAR). O Estado e os seus organismos, incluindo a sua televisão e rádio, estão sujeitos à Constituição da República Portuguesa e, assim, ao princípio da laicidade. Ora, tal princípio diz que o Estado não deve favorecer nenhuma confissão religiosa. Ao permitir que se transmitam eucaristias (friso novamente: sem custos para a ICAR), há uma clamorosa violação de tal princípio.

22 de Fevereiro, 2004 Carlos Esperança

Um cronista do EXPRESSO disserta sobre Deus e o repolho

No Expresso de 22 de Fevereiro de 2004 o pio colunista João Pereira Coutinho insurge-se contra o projecto educacional inglês e faz alguns saborosos comentários.

Vale a pena transcrever (site inacessível) o que diz o devoto plumitivo, sob o título “Deus e o repolho”:

«A ideia (…) é mostrar aos petizes britânicos que, para lá das religiões “tradicionais” (leia-se “cristã”, “judaica” e “islâmica”) existe todo um mundo de crenças e não crenças que merece igual estatuto e igual reverência», para concluir que «se a escola elege como educação religiosa formas de descrença na divindade, seria de incluir outros tipos de adoração pessoal… como o masoquismo, o bestialismo e mesmo o filistinismo». E continua dizendo que «para sermos realmente tolerantes… o aluno deveria ser convidado a adorar um texugo – ou um repolho – com igual respeito e devoção», para terminar, profetizando, que «No espaço de algumas gerações, teríamos um sistema politeísta que, abrangendo Deus e o repolho, produziria uma sociedade mais humana, mais culta e incomparavelmente mais tolerante».

Sem me deter na falta de consideração para com o repolho (escreve Deus com letra maiúscula) merece alguns comentários o devoto:

1 – Não é função da escola transmitir um sistema de crenças, até porque teria de optar por um entre muitos, e o laicismo é uma condição para a democracia;

2 – Comparar Deus a um texugo ainda se aceita (embora não haja provas de que o primeiro existe), pertencem ambos ao reino Animal; mas comparar Deus a um repolho é fazê-lo migrar para o reino da Botânica (inaceitável num devoto);

3 – Na ironia em relação ao politeísmo (se acaso sabe o que seja) parece transparecer muita fé na humanidade, cultura e tolerância que exorna as religiões «tradicionais», que tem por boas.

Todos sabemos como as 3 religiões do livro praticam a humanidade, defendem a cultura e garantem a tolerância. Os bispos católicos e os ayatollahs são o paradigma. As teocracias são um modelo a que devemos regressar.

O piedoso plumitivo parece uma besta perfeita, mas não o designarei assim, por três razões: em primeiro lugar porque sou educado, depois porque não o conheço e, finalmente, ninguém é perfeito.

22 de Fevereiro, 2004 jvasco

Crença, Racionalidade e Fé

Devo dizer que me irrita um pouco esta mania dos crentes de considerarem que os Ateus “têm a certeza” de que Deus não existe. Alguns tê-la-ão (existem até “12 provas da inexistência de Deus”, que é uma obra interessante), mas ser Ateu é NÃO ACREDITAR em Deus. E eu não acredito, tal como não acredito no Pai Natal. MAS não tenho a certeza que nenhum dos dois não exista, tal como não tenho a certeza que f=ma, tal como não tenho a certeza que as formigas não são na verdade um civilização avançada, ou que as bactérias tenham uma inteligência inferior à dos seres humanos. Se formos ao limite, eu não tenho a certeza de NADA.

Por isso eu acredito em coisas. Acredito que estou no Universo, acredito que f=ma, acredito que o Pai Natal não existe, etc… Qual é o critério? É a plausibilidade. Até agora todos os corpos cairam. O que é que é mais provável?

a)Existe uma lei que faz com que os corpos caiam

b)foi tudo uma gigantesca coincidência.

Eu acredito em a), sem ter (no limite) a certeza.

É possível que todas as leis físicas, todos os computadores, máquinas, técnicas agrícolas, etc… tenham funcionado por uma gigantesca coincidência. Posso imaginar que na verdade todos os corpos andam aleatoriamente, e a força da gravidade que nós pensávamos ver (bem como a electromagnética, a nuclear forte e fraca) foi tudo uma coincidência. Uma coincidência que fez com que eu (e toda a vida como a conhecemos) existisse. Isso é possível. Porque é que eu não acredito nisto?

PORQUE escolho acreditar na hipótese mais plausível. É só isso.

Tento descobrir a hipótese mais plausível a partir dos dados que tenho ao meu dispor, pensar sobre eles, e acreditar naquilo que é mais plausível.

A FÉ é o oposto: é acreditar em algo INDEPENDENTEMENTE do seu grau de plausibilidade.

Quando Jesus (alegadamente…) diz a Tomé que a crença deste não vale tanto como a dos outros que não necessitaram de o ver, ele está a defender a FÉ: as pessoas não deviam escolher aquilo em que acreditam com base nos indícios. Acreditar em Cristo depois de o ter visto é “fácil”, não é preciso “FÉ”.

Mas a racionalidade está contra isso. Nós devemos precisamente acreditar mais ou menos em algo EM FUNÇÃO do grau de plausibilidade.

E é isto que distingue os Ateus dos crentes. É este o cerne da diferença.

22 de Fevereiro, 2004 Carlos Esperança

Ecossistema religioso ameaçado – frades e freiras em vias de extinção

O Expresso de ontem, sob o título «Religiosos à procura da vocação» traz um artigo de Mário Robalo com excelentes notícias.

Ficamos a saber que «As congregações religiosas portuguesas estão a perder membros (padres, freiras e monges) a um ritmo vertiginoso». O rejuvenescimento das 146 instituições de “vida consagrada” é desanimador – segundo palavras do jornalista –, porque mais de metade não tem nenhum candidato em formação.

Nos últimos 5 anos o número de «consagrados» passou de 10.000 para 8.600, tendo 50% mais de 60 anos.

Actualmente 6660 mulheres e 1953 homens encontram-se enclausurados nas 146 congregações. Esta foi a libertação a que a ICAR os condenou.

Congregação religiosa é uma associação de mulheres ou homens que, depois de fazerem votos de pobreza, castidade e obediência, vive em comunidade – diz o jornalista.

Todos sabemos que é feroz a obediência, moderada a pobreza e relativa a castidade mas o perigo reside nos 114 estabelecimentos de ensino que possuem e nos 39.169 alunos que os frequentam.

Os religiosos gostam de se flagelar e de orar mas dessas actividades lúdicas não vem qualquer mal ao mundo.

22 de Fevereiro, 2004 Mariana de Oliveira

Ópio do Povo

A religião é o suspiro da criança acabrunhada, o coração de um mundo sem coração, assim como também o espírito de uma época sem espírito. Ela é o ópio do povo.

Karl Marx

21 de Fevereiro, 2004 Carlos Esperança

Os treinos da selecção nacional para o Euro 2004

Vem hoje no Expresso (pg. 25) que o treinador Scolari deu um importante passo na preparação dos jogadores: pô-los a «rezar em conjunto». O pai-nosso foi a arma escolhida para subornar o Altíssimo e, assim, alterar a verdade do jogo.

Sabe-se que o pai-nosso é uma droga que as análises não acusam, mas não há a mais leve suspeita sobre a sua eficácia.

O prestigiado treinador sabe que um placebo pode ser útil e, por isso, recorre ao pai-nosso. Não é justo, contudo, que deixe mal colocado o deus em que os jogadores acreditam ou, em caso de improvável vitória, com o ónus vergonhoso de se ter deixado subornar por umas orações colectivas.