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2 de Julho, 2004 jvasco

Cristianismo e Homofobia

O artigo anterior foca um assunto bem pertinente: a homofobia cristã.

Tal homofobia não é simplesmente fruto de uma tradição folclórica ultrapassada ou de um clero dessincronizado com a actualidade. Não: tal homofobia está defendida na Bíblia, várias vezes e de várias formas.

A Bíblia anotada do céptico tem uma lista de 23 citações que o mostram claramente. Cá estão as traduções de alguns exemplos:

“Os actos homossexuais são uma abominação aos olhos do Senhor” Leviticus 18:22

“Os homossexuais devem ser executados” Leviticus 20:13

“As mulheres não devem usar roupa masculina – é uma abominação aos olhos do Senhor.” Deutronimo 22:5

1 de Julho, 2004 Mariana de Oliveira

A aberração das uniões

O ministro da Justiça, Juan Fernando López Aguilar, anunciou recentemente que em Setembro entrará em vigor a uma lei que permitirá aos casais homossexuais casar-se legalmente a partir do início de 2005.

A esta decisão reagiu a hierarquia da Igreja Católica espanhola. O Bispo de Mondoñedo-Ferrol, D. José Gea Escolano, afirmou ver «como uma aberração» que o Governo espanhol pretenda legitimar no próximo ano as uniões de casais homossexuais, lê-se na Agência Ecclesia. Por seu turno, D. Gea Escolano disse que tal iniciativa suporia praticamente a destruição da família e do matrimónio tal e como se entende. Claro que o matrimónio tal como se entende tem sofrido modificações ao longo das últimas décadas resultantes de um princípio da igualdade democrática entre ambos os sexos e independentemente deles. Os senhores bispos, ao que parece, continuam enredados numa concepção de união troglodita que vê apenas como participantes o homem (em primeiro lugar, obviamente), a mulher e Deus numa alegre ménage à trois.

O ministro da Justiça, muito eloquentemente, respondeu às provocações ICARianas dizendo que o Governo expressou à Igreja e ao Papa o seu respeito pelos fiéis, mas também o compromisso do Executivo com uma sociedade plural, «onde existem diferentes atitudes que merecem uma consideração igualitária».

1 de Julho, 2004 Ricardo Alves

Uma vitória para a laicidade

O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos deliberou anteontem que a proibição do uso do véu islâmico não viola nem a liberdade religiosa nem a liberdade de expressão tal como são definidas na Convenção Europeia dos Direitos do Homem. O Tribunal rejeitou assim o recurso de uma estudante turca que fora excluída da Universidade de Istambul por se recusar a tirar o véu islâmico durante aulas e exames.

No comunicado do Tribunal, pode ler-se que «a liberdade de manifestar a religião pode ser restringida a fim de preservar os valores democráticos e os princípios invioláveis da liberdade de religião e da igualdade dos cidadãos perante a lei», que «as escolas podem tomar medidas para prevenir que certos movimentos religiosos fundamentalistas pressionem os estudantes que não praticam a fé da mesma forma e os que não têm a mesma fé», e ainda que «o Tribunal não perdeu de vista que existem movimentos políticos extremistas, na Turquia, que procuram impor a toda a sociedade os seus símbolos religiosos e a sua concepção de sociedade baseada em princípios religiosos». O Tribunal considerou, portanto, que a laicidade e a igualdade entre os sexos são valores que prevalecem sobre a liberdade de expressão e de religião, particularmente quando estão em causa as pressões de grupos extremistas.

1 de Julho, 2004 Carlos Esperança

No país da senhora de Fátima

Juizes do Supremo Tribunal de Justiça, numa sábia decisão, reduziram em 4 anos a pena de prisão do indivíduo que matou a tiro a mulher, na presença de um filho de seis anos.

A douta deliberação teve em conta as obrigações não cumpridas da mulher, obrigações que a santa madre igreja (ICAR) sempre aconselhou para a prossecução da espécie.

Assim, os juizes Conselheiros tiveram em atenção que a vítima «(…) após final de Março de 2002 (dois meses antes do crime), passou a não querer manter relações sexuais com ele, circunstância que permitirá a afirmação de que nem só do lado do arguido terá havido violação dos deveres conjugais” – lê-se no Jornal de Notícias.

Segundo o mesmo jornal «os juizes prosseguem depois com o mesmo raciocínio e consideram que a ausência de sexo “pode até ajudar a explicar as dúvidas surgidas naquele espírito pouco iluminado sobre a infidelidade dela».

Claro que a obrigação da mulher se disponibilizar para o homem é um ensinamento da ICAR de que a cultura moderna se afastou, mas há ainda quem zele pela moral e os bons costumes.

Pode um ateu admitir a recusa de sexo por um dos cônjuges, pode um ímpio aceitar que a infidelidade ou a suspeita fiquem impunes, pode um herege julgar que os direitos são iguais para homens e mulheres, mas Deus, na sua infinita sabedoria, pretende a ordem em vez do caos, a obediência da mulher em vez da soberba e, sobretudo, que aceite todos os filhos que o tal Deus lhe queira dar.

A defunta tinha 26 anos e apenas três filhos. Não se defendeu que devia ter sido abatida a tiro, mas as razões aduzidas foram consideradas pertinentes para a redução da pena.

Falta uma referência ao catolicismo na Constituição Portuguesa. A de 1933 trazia.

30 de Junho, 2004 Mariana de Oliveira

O segredo profissional e o estranho art. 135 CPP

O art. 135º do Código de Processo Penal estabelece, no seu n.º 1, o seguinte: os ministros de religião ou confissão religiosa, os advogados, os médicos, os jornalistas, os membros de instituições de crédito e as demais pessoas a quem a lei permitir ou impuser que guardem segredo profissional podem escusar-se a depor sobre os factos abrangidos por aquele segredo. Isto não choca – os ministros de religião ou confissão religiosa são profissionais que, em virtude do exercício dessa profissão, estão em contacto com informação privilegiada e pessoal sobre o arguido.

Este segredo profissional pode ser levantado por ordem do Supremo Tribunal de Justiça se tal for justificado face às normas e princípios aplicáveis da lei penal, nomeadamente face ao princípio da prevalência do interesse preponderante. Tal quebra do segredo profissional não se aplica ao segredo religioso (n.º 4 do art. 135º CPP). Não consigo divisar qualquer tipo de razões para que esses profissionais sejam considerados especiais face aos restantes. Estamos num Estado de Direito Democrático onde o princípio da laicidade e o princípio da igualdade ocupam lugares preponderantes como corolários do próprio princípio democrático. A redacção actual do art. 135º é inadmissível.

29 de Junho, 2004 jvasco

Keith Maupin – mais uma vítima da religião?

Todos sabemos o peso que o fanatismo religioso de Bush (e de outros nomes importantes na casa branca) teve na decisão absurda de invadir o Iraque (houve motivações económicas e eleitorais, e essas terão sido mais importantes, mas as religiosas podem ter feito a diferença…).

Agora, quando se tenta pôr termo a toda a asneira que lá se passou, a religião também exerce um papel decisivo em atrasar a pacificação da região.

Um grupo que se auto-intitula “O poder perdurador contra os inimigos de Deus e do Profeta“, executou Keith Maupin. Este pequeno passo na espiral de violência que lá se vive não vai ajudar os iraquianos, e não lucra a ninguém. Muitos iraquianos estão cegos pela raiva que (justificadamente?) têm aos norte-americanos, e essa raiva é potenciada pelo seu fanatismo.

Era interessante que o problema estupidamente criado ficasse resolvido sem um banho de sangue, mas o fanatismo religioso torna ainda mais difícil que isso aconteça.

29 de Junho, 2004 jvasco

Como nasce um milagre

As diferentes religiões alegam a ocorrência de fantásticos milagres.

Quando nos referimos ao panteão helénico ou egípcio (e outras religiões mortas), ninguém duvida que o relatos como “Poseidon espetou o seu tridente na rocha criando assim esta nascente!” ou “Zeus disfarçou-se de forma igual ao noivo, engravidando a rapariga enquanto este estava ausente…” correspondem a histórias tão verdadeiras como “Isis chorou nos campos de trigo e as suas lágrimas deram origem às primeiras oliveiras”.

Independentemente do número de testemunhas e da convicção com que estas, no passado, relataram as ocorrências, hoje todos fazem uma análise razoável e racional dos milagres das religiões mortas, pois todos têm o distanciamento devido.

Quanto às religiões vivas, isso não se passa. Por maior que seja a falta de indícios objectivos, por menor que seja a plausibilidade do milagre, não faltam crentes que os testemunhem, e crédulos que acreditem.

Como é que surgem tão facilmente testemunhas de eventos que nunca ocorreram?

Há pessoas pouco fiáveis enquanto testemunhas, e há uma história engraçada a esse respeito:

Alinhamento anti-gravitacional:

Em 1976 o astrónomo britânico Patrick Moore anunciou na rádio BBC 2 que as 9h e 47min um evento astronómico único aconteceria e que as pessoas poderiam experimentar elas mesmas em suas casas. O planeta Plutão iria passar atrás de Júpiter causando um alinhamento gravitacional que poderia diminuir a força da gravidade na Terra. Moore avisou os ouvintes que se eles pulassem no momento exacto do alinhamento planetário eles poderiam experimentar uma estranha sensação de flutuação. Quando a hora do suposto fenómeno chegou, a BBC recebeu centenas de ligações de pessoas que afirmavam ter sentido alguma coisa. Uma mulher até descreveu que ela e seus onze amigos se levantaram das cadeiras e flutuaram pela sala.

Mas a notícia do tal alinhamento não passou de uma brincadeira de primeiro de Abril!

29 de Junho, 2004 Mariana de Oliveira

Casamento: Evolução do direito português IV

Depois do 25 de Abril foram conduzidas negociações com a Santa Sé com o objectivo de uma revisão da Concordata. Daqui resultou o Protocolo Adicional à Concordata de 7 de Maio de 1940 (aprovado para ratificação pelo Decreto n.º 187/75, de 4 de Abril), assinado na cidade do Vaticano, a 15 de Fevereiro de 1975, que deu uma outra redacção ao art. XXIV da Concordata: o novo texto salienta o grave dever dos cônjuges que celebram casamento católico de não pedirem o divórcio. Trata-se, agora, de um mero dever de consciência, de um dever perante a Igreja e não perante o Estado.

Assim, estavam reunidas condições para se modificar a questão do divórcio no direito interno e foi isso que aconteceu com o Decreto-lei n.º 261/75, de 27 de Maio, que, no art. 1º, revogou o art. 1790 do Código Civil, que não permitia aos tribunais civis decretar o divórcio nos casamentos católicos.

O Protocolo Adicional manteve expressamente em vigor todos os outros artigos da Concordata (art. 2º), nomeadamente o art. XXII, segundo o qual o Estado Português reconhece efeitos civis aos casamentos celebrados em conformidade com as leis canónicas, desde que a acta do casamento seja transcrita nos competentes registos do estado civil, e o art. XXV que prescreve que o conhecimento das causas concernentes à nulidade do casamento católico e à dispensa do casamento rato e não consumado é reservado aos tribunais e repartições eclesiásticas competentes.

Desta forma, o direito português continuou a consagrar a segunda modalidade do casamento civil facultativo. Com efeito, quanto ao aspecto fundamental da sua dissolução por divórcio, o casamento, civil ou não, passou a ser regido por uma única lei – a do Estado – independentemente da sua forma de celebração.

A etapa seguinte da evolução do direito português é a Constituição de 1976, que, no art. 36º/2, atribui competência à lei civil para regular os requisitos e os efeitos do casamento e da sua dissolução, por morte ou divórcio, independentemente da forma de celebração. A referência aos requisitos do casamento como uma das matérias em que a lei civil seria exclusivamente competente, sugere a ideia de que a Constituição tenha querido derrogar os arts. XXV e 1625º do Código Civil, mas essa intenção não transparece dos debates parlamentares nem tem sido atribuída ao legislador constitucional, continuando a entender-se, na prática, que o conhecimento das causas respeitantes à nulidade do casamento católico e à dispensa do casamento rato e não consumado é reservado aos tribunais e repartições eclesiásticas competentes.

28 de Junho, 2004 jvasco

Morte e luz ao fundo do túnel

A Skeptical Enquirer que o André referiu no artigo anterior é uma revista de referência. Já tinha lido numerosas alusões ao trabalho excelente que praticam nas mais diversas obras e contextos. Mas… nunca tinha dado nenhuma espreitadela ao site deles. Quando li o artigo anterior decidi fazê-lo.

Entre outras coisas interessantes, acabei por descobrir um artigo sobre aquelas experiências “próximas da morte” em que o sobrevivente diz ter visto uma luz ao fundo de um túnel escuro. O conceito está devidamente mediatizado e mistificado, mas seria curioso ver o que é que a Ciência tem a dizer sobre essa questão. Há um artigo desta revista que explora esse problema de um ponto de vista científico, e que venho, por isso, aconselhar a todos.

28 de Junho, 2004 André Esteves

New Age e Cepticismo, o espaço entre duas culturas

No Skeptical Enquirer de Maio [Em Inglês], podemos encontrar um artigo bombástico. Uma das mais respeitadas e ouvidas gurus do movimento New Age, apresentou a sua conversão pública ao espírito céptico.

Depois de 35 anos pertencendo ao movimento New Age, que sustenta a existência de auras, chakras, espíritos guia, poderes dos cristais, a existência de um ciclo «espiritual» na vida do mundo (Era do Aquário, Kali Yuga, etc.) e outras tantas modas espirituais, e de ter escrito pelo menos 4 livros considerados como influentes nesta comunidade mística, Karla McLaren escreve uma apologia pública da sua decisão de adoptar uma atitude céptica perante as crenças New Age.

No seu artigo, mais que criticar a falta de rigor e pensamento céptico por parte dos «Aquarianos», procura estabelecer pontes de comunicação entre as duas culturas. Afirma que com os anos, construíram-se mitos de parte a parte, que irá agora procurar eliminar.

Um dos mitos, por exemplo, é que na cultura New Age, existe a ideia de que os cépticos não são capazes de viver um mundo com mistérios. Pelo contrário, ela afirma, são os cépticos que apreciam um mundo misterioso e que o exploram sem preconceitos. Afirma também, que pelo contrário, encontrou na cultura New Age, o espírito inverso: tudo tem que ter uma explicação, mesmo que não tenha pés e cabeça, mudando com as modas, as personalidades e o comércio todos os 6 meses.

Karen critica também a comunidade céptica por passar uma imagem de crítica ácida aos espíritos menos exigentes, em contraponto a um espírito de apoio e amor fraternal New Age. Afirma que, na realidade, ao longo dos últimos anos, ao penetrar no mundo dos cépticos, encontrou seres humanos que se preocupavam com os seus interlocutores, tanto como ela. Refere por exemplo, o caso do famoso mágico Randi, que apesar de ter uma temível reputação nos meios New Age, responde e acompanha com preocupação e atenção a cartas escrevinhadas por espíritos confusos. As mesmas cartas que ela recebia como autora de livros New Age e que lhe suscitavam a mesma resposta com esses seres humanos.

Além disso, afirma que há um diferença de linguagem, que separa as duas culturas. Por exemplo, Karen só se deu conta de que fazia leituras a frio dos seus clientes, depois de ter lido e visto material céptico sobre o assunto. Afirma ela, que a prática não é vista como fraudulenta na comunidade New Age, porque é um método que se absorve inconscientemente por osmose cultural entre os vários membros da comunidade e que por isso não se dão conta que falsificam as suas próprias teorias do mundo.

Vale a pena ler. Talvez seja o começo de coisas interessantes…