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22 de Julho, 2004 Carlos Esperança

Dependências

«Preferia que víssemos as pessoas religiosas… como fumadores.

Pessoas que têm um problema, com as quais temos de ser tolerantes».

Daniel Dennet, filósofo norte-americano

(citado pela revista Visão, hoje)

22 de Julho, 2004 jvasco

O nosso símbolo

Texto da página www.ateismo.net:

Criado em 1963 pela American Atheists, este é um logotipo internacional simbolizando o ateísmo. Um símbolo da ciência, da abstração do pensamento e um símbolo da universalidade, o átomo foi escolhido por ter sido uma redescoberta da ciência contemporânea, com origens nos pensadores gregos da antiguidade. Assim, o passado da humanidade, o presente que nós construímos, e o futuro que nos reserva estão presentes neste símbolo.

O átomo era, na altura em que o símbolo foi concebido, a partícula mais pequena da matéria. Ao mesmo tempo, o átomo está presente em todo o universo. É a partícula de um elemento, e a propriedade desse mesmo. É a unidade e a totalidade.

Uma das órbitas do átomo é aberta, para dizer que apesar de continuarmos na nossa jornada pela busca do conhecimento e da verdade, não temos ainda todas as respostas. A própria órbita vertical aberta representa a letra «A» de «ateísmo», e ao centro da mesma está a inicial do país que hospeda a associação ateísta, neste caso adoptado pelo Ateísmo.net com sede em Portugal.

Vejam isto e muito mais na página-mãe deste diário (a partir do qual ele surgiu).

22 de Julho, 2004 Carlos Esperança

Notas piedosas

Forças Armadas – D. Januário Torgal Ferreira, bispo das Forças Armadas e de Segurança, crismou 40 militares (rapazes e raparigas) no Campo Militar de Santa Margarida e celebrou também 2 baptismos. [Januário Torgal Ferreira sublinha que -eles têm ali um padre à mão – e que lhes faz «uma proposta»].

Imaginem que, em vez de um padre, estava lá um passador de droga.

O turismo e a promoção da fé – Não querendo Maomé ir à montanha vai a montanha a Maomé. Neste caso é a ICAR que serve missas ao domicílio na diocese espanhola de Valência, mais de 350 missas ao fim de semana, «entre as toalhas e os chapéus de sol», esclarece a Agência Ecclesia.

As campanhas de prevenção da SIDA aguardam o fim da liturgia.

ICAR ataca – «Uma delegação da Santa Sé deslocou-se ao Vietname de 27 de Abril a 2 de Maio, tendo-se encontrado com membros do ministério dos negócios estrangeiros e do partido comunista local». O Vaticano conseguiu aumentar a quota de seminaristas.

As boas relações entre as duas ditaduras são abençoadas por Deus ou, no mínimo, por JP2.

21 de Julho, 2004 Carlos Esperança

O Vaticano e os escândalos sexuais

Desanimado com o perfil inquietante de tantos papas da Igreja católica (ICAR), sempre quis encontrar algum cujas qualidades o recomendassem.

Elegi João XXIII como um homem bondoso, amigo do diálogo, amante da paz e sinceramente amargurado com o passado da ICAR. Dediquei-lhe consideração e estima e julguei-o possuidor de elevados padrões éticos.

Calcule-se a estupefacção perante um documento secreto da sua autoria, em latim, que ameaçava de excomunhão os fiéis que denunciassem à justiça crimes sexuais cometidos por padres. Apesar de enviado a todos os bispos, a ICAR negou a existência de tal documento, mentira que se insere na matriz genética do Vaticano, até ser confrontada com um exemplar, datado de 1962, com o selo do papa João XXIII.

O silêncio, a intriga e a mentira são tradições da Cúria romana. Quem é que vai agora acreditar na boa fé do papa actual, JP2, ao mandar um bispo a investigar o escândalo sexual num seminário católico próximo de Viena e que está a abalar a Áustria?

Claro que não é a investigação que move a ICAR mas, apenas, a limitação dos danos.

21 de Julho, 2004 jvasco

Para que serve este blogue?

Algures nos comentários, o Ricardo Alves deu a resposta perfeita:

“Para propagar o espírito crítico e o cepticismo, combatendo a superstição e o dogmatismo.

Para promover a laicidade do Estado, defendendo que as leis civis sejam decididas democraticamente e não por imposição de lóbis clericais ou outros.

Para trabalhar pela emancipação individual, contra as peias que dificultam o pensamento.”


Fica esclarecido.

21 de Julho, 2004 jvasco

O Satanismo é uma Religião?

De acordo com o Dicionário Livre, há vários tipos de satanismo na nossa sociedade (quem diria…):

-Satânicos revoltosos, revoltando-se contra o cristianismo na sociedade moderna, com a visão tradicional cristã do satanismo.

-Satânicos filosóficos, também conhecidos por satânicos modernos, que não adoram Satã ou qualquer demónio, mas ao invés procuram inspiração nos vários deuses “negros” e mitos, ou no arquétipo de Satã. A auto-divinização surge nalguns membros deste movimento.

-Satânicos religiosos, também conhecidos por satânicos tradicionais, que acreditam num “Principe das Trevas” (um nome mais genérico que Satã), que adoram, e de acordo com o qual vivem as suas vidas.

  No que respeita ao primeiro e ao terceiro tipo, estamos conversados: são religiões com as suas mitologias e as suas crendices. São religiões mais inofensivas do que o cristianismo, mas só mesmo devido à sua menor dimensão. 

No que respeita ao segundo tipo, é uma estranha mistura entre uma perspectiva filosófica e um conjunto de rituais simbólicos e esotéricos. Quando li em mais pormenor a perspectiva filosófica, considerei-a um pouco bizarra, e, mesmo tendo concordado com alguns pontos, discordei de muitos outros. Mas coloca-se a questão: será este satanismo uma filosofia (bizarra, mas) ateia, ou será uma forma de religião? Este debate também decorreu na Sociedade Terra Redonda (servidor com problemas no momento em que escrevo), e foi muito animado. Foi inconclusivo. Quem considera, como eu, que a descrença numa entidade superior e na metafísica caracteriza um ateu, considera qualquer satanismo uma religião. Considera que um satânico nunca será ateu. Quem considera que o ateísmo é apenas a descrença numa entidade superior, considerará que estes satânicos também são ateus.

19 de Julho, 2004 Carlos Esperança

Santana Lopes (PSL) rezou na televisão

Acompanhado de uma câmara, para filmar a persignação e as rezas, o primeiro-ministro deslocou-se hoje à campa de Sá Carneiro. Deus podia estar ausente e, assim, ficou documentada a fé, para memória futura.

Não se sabe se PSL foi agradecer o milagre que o guindou ao poder, sufragar a alma do extinto ou cumprir penitência por pecados próprios, mas mostrou aos padres e ao País que é homem que sabe pôr-se de joelhos.

Se PSL for tão competente a governar como hábil a rezar, a Pátria está salva.

Vem aí a prosperidade em troca de ave-marias e padre-nossos.

Está assegurada a retoma por intercessão celestial.

E, se por desatenção divina, persistirem as desgraças que nos bateram à porta, o destino das almas fica melhor acautelado.

Se o Presidente da República não fosse ateu, a tomada de posse do XV Governo teria direito a bênção – a maior bênção de pastas de sempre.

19 de Julho, 2004 Ricardo Alves

A hierarquia das igrejas em Portugal

A hierarquia tradicional das igrejas em Portugal, anterior à proposta de Lei de Liberdade Religiosa de Vera Jardim (de 1999), resumia-se ao reconhecimento estatal de uma única igreja, a ICAR, que gozava de vários privilégios conferidos pela Concordata de 1940, celebrada entre o ditador fascista Oliveira Salazar e o Papa pró-fascista Eugenio Pacelli.

O objectivo de Vera Jardim, plenamente atingido com a Lei de Liberdade Religiosa(LLR) aprovada em 2001, consistia em conceder a algumas outras igrejas parte dos privilégios de que gozava a ICAR, não beliscando no entanto a predominância da ICAR. Assim, a LLR exclui arbitrariamente uma igreja do seu campo de aplicação (a ICAR, ver artigo 58º) e introduz uma «Comissão de Liberdade Religiosa» (artigos 52º a 57º da LLR) para «ajudar o Estado» na tarefa que José Policarpo designou, à época, como «separar o trigo do joio», ou seja, decidir quais são as boas e as más religiões. Esta autêntica «Comissão de Opressão Religiosa» seria constituída por um Presidente (a nomear pelo Conselho de Ministros), «cinco pessoas de reconhecida competência científica» (a nomear pelo Ministro da Justiça), três membros indicados pelas igrejas não católicas tendo em conta a sua «representatividade» (e nomeados pelo Ministro da Justiça) e dois membros nomeados directamente pela Conferência Episcopal Portuguesa, apesar de a ICAR ser, recordemo-lo, a única igreja a que a LLR não se aplica.

A 17 de Março de 2004, Celeste Cardona deu posse à primeira «Comissão de Liberdade Religiosa». A título de representantes das «confissões minoritárias» foram nomeados um evangélico da AEP, um muçulmano e uma judia; a título de «especialistas», foram nomeados três professores próximos da ICAR e ainda um ismaelita e um hindu por participarem no «diálogo ecuménico e interconfessional» organizado pela ICAR. A interpretação do critério da «representatividade» ficou assim clara: embora qualquer IURD ou Maná (para nada dizer das Testemunhas de Jeová) tenha mais seguidores do que as associações judaicas ou muçulmanas (segundo o censo de 2001, haverá em Portugal menos de 2000 judeus e cerca de 12000 muçulmanos), as boas relações dos dirigentes destas últimas religiões com a ICAR asseguram-lhes lugares na Comissão.

Chegados a este ponto, o leitor interroga-se, avisadamente, sobre a importância que poderá ter esta Comissão… Os artigos 53º e 54º da LLR estabelecem-lhe as funções e a competência: emitir pareceres sobre o reconhecimento das igrejas pelo Estado e sobre os acordos a celebrar entre estas e o Estado, podendo assim as igrejas instaladas na Comissão dificultar o acesso de outras igrejas aos tempos de emissão na comunicação social, ao ensino nas escolas públicas e aos benefícios fiscais! Constituiu-se desta forma uma hierarquia das igrejas, através da qual a ICAR, coadjuvada pelas igrejas que decidiu co-optar para a Comissão, pode recomendar ao Estado quais são as boas e as más religiões. Além disso, a Comissão emitirá um «relatório anual» sobre os «novos movimentos religiosos», uma atribuição que faz lembrar o Tribunal do Santo Ofício… Situação actual comparável, entre os países da UE, existe apenas na Grécia, onde um local de culto não pode abrir sem a autorização prévia da Igreja Ortdoxa Grega…

Numa República verdadeiramente laica, nada disto seria necessário. Um Estado laico deve ser incompetente em matéria de religião. A «correcta» convicção religiosa ou não religiosa é um assunto da consciência de cada cidadão, no qual o Estado não deve interferir, limitando-se a garantir que, dentro dos limites legais, cada cidadão seja livre de crer ou não crer, de praticar ou não praticar, e que seja tratado em plena igualdade com os demais cidadãos independentemente da sua convicção. Decidir qual é a «boa» opção filosófica é evidentemente uma liberdade individual, e decidir associar-se com pessoas que pensam da mesma forma é uma escolha na qual nenhum grupo de cidadãos deve ser tratado de forma desigual face a outro grupo.

19 de Julho, 2004 Carlos Esperança

É tempo de Deus entrar de baixa

Os clérigos dizem que os ateus não foram «tocados pela fé». E, sempre que podem, não deixam de tocá-los, como quem toca uma alimária que recusa estugar o passo ou um boi que pretende esquivar-se ao açougue.

Não se detêm a reflectir como é possível que, havendo um único Deus verdadeiro – como alegam -, o dito Deus seja, conforme a latitude, mais cruel, estúpido ou prepotente; de acordo com o regime político, capaz de punir os homens com a pena de morte ou ter de aguardar, cinicamente, para os condenar depois às perpétuas penas; consoante o período histórico, fomentar guerras santas ou resignar-se à liberdade e ao desprezo que lhe votam as criaturas cuja criação lhe atribuem.

Se Deus não fosse o pretexto para a intolerância, a prática de crimes e a crueldade, mereceria aos ateus a mesma simpatia dos deuses gregos ou romanos, das lendas e das fantasias que se perpetuaram de geração em geração.

Quem será capaz de explicar as idiossincrasias que levam Deus a babar-se de gozo com as penitências, as genuflexões, as orações, os jejuns, as flagelações ou as peregrinações? Que mania o leva a reprimir a sexualidade, a ofender a dignidade da mulher ou a ditar a moda no vestuário? Deus consegue ter todas as taras dos homens e nenhuma das suas virtudes.

Na coutada da Igreja Católica (ICAR) Deus era um entusiasta de churrascos para hereges, bruxas e judeus e revelou aos empregados imaginativos instrumentos de tortura com que se deliciava a observar os esgares de dor enquanto um padre os confortava com a exibição da cruz; no Médio Oriente pela-se por decapitações e amputações e atinge o divino gozo com as vergastadas públicas ou as lapidações de adúlteras; na Índia o senhor Deus lá do sítio ainda hoje não compreende que uma viúva recuse acompanhar o defunto à pira funerária.

Há quem leve Deus a sério e lhe agradeça o mal que faz.

18 de Julho, 2004 Carlos Esperança

A vida está difícil. A fé é que salva… alguns



A Igreja católica (ICAR) tem vindo a perder clientela, que muitos atribuem ao anacronismo das suas propostas e ao carácter autoritário do seu clero. É uma explicação insuficiente, quiçá errada, e perigosa. O islão é ainda mais retrógrado e não lhe faltam prosélitos, mártires e conversos. Numa análise empírica dir-se-ia que, quanto mais reaccionária é uma igreja maior é o seu poder de sedução, quanto mais violento e cruel é o seu Deus, mais dóceis e piedosos se tornam os crentes. As aparências escondem o carácter decisivo que o controlo do aparelho de Estado e dos meios de produção exercem sobre a fé.

Pode ver-se como, no Islão, os aparelhos militares, políticos e administrativos se encontram nas mãos do clero, sem prescindirem do aparelho repressivo que estimula a fé, quando esta vacila.

 Qualquer religião que perca o domínio económico e o aparelho de Estado, agora que o conhecimento deixou de ser monopólio eclesiástico, perde influência e tende a exercer um papel residual na sociedade.

Claro que as superstições e alguma apetência pelo fantástico serão sempre aproveitadas para conduzir as ovelhas ao redil da salvação. A ignorância e o desespero fazem o resto. 

 

Isto é válido para as religiões com alvará e para as que se estabelecem nas esquinas dos bairros pobres. Os métodos não variam muito, apenas a sofisticação.