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29 de Dezembro, 2004 Carlos Esperança

Os fantasmas do Vaticano

Há temas, ditos fracturantes, que a ICAR gostaria de silenciar. O aborto, a eutanásia e o casamento de homossexuais são os que mais a crispam e apaixonam. E, no entanto, não podem ser ignorados nem perpetuamente adiadas as soluções legais.

A moral não é universal nem legitima a imposição de todas as normas e, muito menos, a punição pela sua violação. O divórcio, por exemplo, que é um mal, não pode ser proibido e só a intolerância religiosa e a cumplicidade da ditadura o limitou e, na prática, impediu, até ao regresso à democracia. O adultério é certamente iníquo e, no entanto, ninguém de são juízo se atreveria a propor uma punição legal, mas é bom lembrar que foi esse o crime que levou Camilo Castelo Branco ao cárcere.

Os que hoje se opõem à descriminalização do aborto são os mesmos que, já depois do 25 de Abril, não aceitavam que o risco de vida da mãe, as malformações fetais e a violação fossem motivos legítimos para a interrupção voluntária da gravidez, como se a lei impusesse a obrigação e não, apenas, consagrasse a permissão.

O mesmo acabará por acontecer com a eutanásia e com os casamentos dos homossexuais, cujo precedente existe em vários países europeus, apesar do terrorismo ideológico com que os adversários se opuseram. Convém repetir que é um direito que se consagra e não uma obrigação que se impõe.

O que surpreende nos adversários das alterações legais liberalizadoras, ou da simples discussão, não são as opiniões que perfilham, é o ódio que nutrem pelas ideias que colidem com as suas.

Há pessoas para quem a liberdade religiosa se confunde com o direito ao proselitismo e a exigência de conversão dos réprobos. Não lhes passa pela cabeça que a conversão e a apostasia, a ortodoxia e a heterodoxia, a devoção e o agnosticismo, a beatice e o ateísmo são direitos que se inserem na liberdade religiosa que, até hoje, só a laicidade do Estado conseguiu tornar efectiva.

29 de Dezembro, 2004 jvasco

A maioria dos crentes

Sou da opinão que a generalidade dos crentes não são pessoas transcendentais.

Sou da opinião que a generalidade dos crentes não gosta lá muito de pensar em religião (evita a missa, a não ser para casamentos e funerais), e que pensa pouco sobre Deus, sobre o mistério da criação, sobre aquilo que Deus é.

A generalidade dos crentes na nossa sociedade, creio eu, não tem uma ideia muito concreta sobre aquilo que é Deus, nem deixa que a sua religião influencie muito o seu dia-a-dia.

A generalidade dos crentes não quer ter muitas dúvidas ou pensar muito sobre porque é que o Universo é como é: aprenderam dos pais que Deus existe, e têm dele uma ideia vaga de velho barbudo e bondoso, que criou o Universo e que castiga os adúlteros e criminosos.

A ideia que têm do Universo, por ser tão vaga e tão pouco questionada, parece fazer sentido.

Eles preferem não falar de religião. Respeitam as opções religiosas dos outros, claro! E conversas sobre religião só trazem discussões que não levam a nada…

Além disso, não querem questionar aquilo em que acreditam, nem experimentar a incerteza de mudar radicalmente a forma de ver o mundo.

Muitos são crentes para não terem de duvidar nem se questionar como faziam quando tinham 9 anos.

Muitos são crentes para não terem de duvidar nem se questionar, nunca mais.

28 de Dezembro, 2004 Carlos Esperança

Desolação, horror e tragédia

O maior sismo dos últimos 40 anos, seguido de um violento maremoto, levou aos países do sudoeste asiático a morte, a destruição e o desespero. Um domingo macabro.

Dezenas de milhares de mortos, inúmeros desaparecidos, uma multidão de feridos e estropiados é o resultado de uma tragédia que as condições precárias de países pobres se encarregam de ampliar. A fome, a falta de água potável, a cólera e outras doenças vão dizimar uma grande parte do milhão de desalojados vítimas da tragédia.

Falar de Deus nestas alturas não é apenas um acto gratuito, é uma obscenidade cruel para quem sabe que há meios para prevenir a dimensão destas tragédias e minorar o sofrimento dos sobreviventes.

Perante a desgraça vem-me à memória uma balada de Paul Ford: «Se todos os homens do mundo quisessem dar-se as mãos…».

27 de Dezembro, 2004 Mariana de Oliveira

Contra a homofobia dos bispos

Vários grupos de defesa de lésbicas, gays e transexuais espanhóis manifestaram-se pela necessidade de o «Fiscal General del Estado» actuar oficialmente contra a Conferência Episcopal Espanhola pelo seu último documento aprovado relativo ao casamento homossexual.

Os porta-vozes destes grupos expressaram a sua indignação pelos termos empregados no texto redigido pelos bispos que, segundo a sua opinião, incitam à homofobia. Neste sentido, reclamam que o governo espanhol promova a aprovação de uma norma que condene este comportamento e que impeça a ICAR de proclamar, por exemplo, que a homossexualidade é «um comportamento intrinsecamente mau do ponto de vista moral».

A presidente e porta-voz da «Federación Estatal de Gays y Lesbianas» sublinhou que os bispos têm «uma atitude muito pouco cristã que incita à violência, ao ódio e à homofobia».

Esta atitude de condenação dos LGBT’s pela hierarquia católica levou milhares de madrilenos destas orientações sexuais a solicitar a desbaptização.

O presidente de outra associação, a «Asociación de Transexualidad Clínica de Madrid», chegou a afirmar que «temos de considerar se não é mesmo conveniente denunciar os acordos entre a Igreja e o Estado porque o Vaticano está a imiscuir-se nos assuntos internos da Espanha», referindo-se à posição dos bispos face aos projectos legislativos para a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Para tornar as coisas mais interessantes, a Conferência Episcopal espanhola iniciou ontem uma campanha contra o casamento homossexual e o seu direito à adopção que foi «celebrada por 69 dioceses do país, com a distribuição de sete milhões de desdobráveis nas paróquias espanholas, nos quais se indica que ‘no matrimónio, Deus une homem e mulher para que, formando uma só carne, possam transmitir a vida humana’».

É assim que a Igreja Católica Apostólica Romana promove a tolerância e a igualdade.

27 de Dezembro, 2004 Palmira Silva

Espírito natalício

A maioria dos creús acredita que a religião é condição sine qua non para a existência de um sistema moral, ou seja, insinua que o ateísmo é incompatível com a moralidade. Na realidade tais afirmações não passam disso mesmo, insinuações sem qualquer suporte experimental, são dogmas de fé que não carecem demonstração. E, aliás, os dados das prisões norte-americanas, que mantêm registos das religiões professadas pelos presos, indicam que os ateístas nas cadeias são apenas 0,21%, uma percentagem marcadamente inferior aos estimados 8-16% ateístas na população americana.

Para além da superioridade moral conferida pela verdade absoluta de dogmas revelados que não questionam, outra característica dos crentes consiste no paradoxo de se considerarem perseguidos se não puderem impor as suas crenças e dogmas. As suas prelecções de tolerância esgotam-se na imposição do seu proselitismo e os exemplos de intolerância em relação aos que não partilham as suas crendices são uma constante na História.

Um exemplo recente demonstra a vacuidade da apregoada tolerância cristã e do amor ao próximo, que era suposto caracterizar especialmente o tal espírito natalício.

Numa escola preparatória em Boulder, Colorado, os piedosos e promissores crentes de palmo e meio perseguem fisica e verbalmente os que não professam a fé cristã ou não a professam com o fervor adequado, acreditando em heresias ateístas como o evolucionismo. Os pais de vários alunos, vistos pelos colegas como perigosos ateus ou pagãos, queixaram-se em vão da perseguição de que estes eram alvo. Um dos abominados ateus de 13 anos chegou a ser preso por ter declarado num momento de desespero que ou o deixavam em paz ou suicidava-se e levava com ele todos os que o perseguiam. Apenas depois de outra aluna se ter tentado suicidar pelo mesmo motivo as autoridades escolares investigam finalmente o problema.

26 de Dezembro, 2004 lkrippahl

Foi Natal.

Recentemente muitos celebrámos um dia que se associa à mitologia Cristã. É certo que esta celebração é muito mais antiga, originalmente ligada ao solstício de Inverno, mas marca hoje em dia um dos acontecimentos principais para os Cristãos: o nascimento do seu deus. O único que o rivaliza é a Páscoa, também uma celebração muito anterior ao Cristianismo, mas que agora marca a morte do seu deus.

E isto dá que pensar. Parece que os principais marcos do Cristianismo são o nascimento e a morte do seu deus. O próprio credo Católico parece resumir a história de Jesus a isto:

«Creio em Deus Pai todo-poderoso, Criador do Céu e da Terra; e em Jesus Cristo, seu único Filho, Nosso Senhor; que foi concebido pelo poder do Espírito Santo; nasceu da Virgem Maria; padeceu sob Pôncio Pilatos; foi crucificado, morto e sepultado; desceu aos Infernos; ressuscitou ao terceiro dia; subiu aos Céus; está sentado à direita de Deus Pai todo-poderoso, de onde há de vir a julgar os vivos e os mortos. Creio no Espírito Santo; na Santa Igreja Católica; na Comunhão dos Santos; na remissão dos pecados; na ressurreição da carne; na vida eterna. Amén.»

Não terá esta história coisas mais importantes que um nascimento milagroso, uma morte dolorosa, e uma ressurreição?

Há vinte séculos foram escritas muitas histórias acerca de Jesus. A Bíblia Católica contém quatro evangelhos seleccionados especificamente pela forma como se encaixam, para minimizar contradições. Mas mesmo estas, selecção limitada, não foram escritas com intuito de serem crónicas rigorosas da vida deste personagem. Foram escritas como expressões de ideologia, que codificassem os princípios deste movimento religioso.

Mesmo que não possamos dizer se existiu um Jesus de facto, se era um personagem composto de vários episódios que tenham acontecido a várias pessoas, ou se era apenas um personagem metafórico e imaginário, o facto é que houve um grande esforço filosófico e literário por detrás destas obras, quer dos evangelhos quer das várias cartas escritas pelos fundadores do Cristianismo. Vejamos alguns.

«Amarás o teu próximo como a ti mesmo» Gal.5:14. Inovador na altura, e muito actual hoje em dia. Não só amar, mas respeitar os outros como a nós próprios. Igualdade, liberdade, fraternidade. Uma ideia central na nossa sociedade moderna. Infelizmente, não para a Igreja Católica, onde as mulheres são discriminadas e onde uns são mais iguais que os outros.

«Então Jesus entrou no templo, expulsou todos os que ali vendiam e compravam» Mat 21:12. O Jesus desta história era obviamente contra a comercialização da religião. Mais, as suas críticas aos Fariseus, os seus ensinamentos que a oração devia ser privada, a sua rejeição da autoridade religiosa de então, da soberba das vestimentas, do ritual repetitivo e pouco sincero, tudo isto transmitia uma ideia que pode ser facilmente projectada na nossa sociedade moderna: a religião como algo pessoal e privado, e que deve estar separada do poder político e económico. Mais um ensinamento importante que a Igreja Católica esqueceu. A Igreja Católica controla vastos fundos mas não paga impostos. Uma Concordata com o Estado Português confere-lhe poderes à margem da lei do nosso país. O ritual público, a hierarquia da Igreja, a própria forma como os seus líderes se vestem vão contra estes ensinamentos. Se Mateus ressuscitasse hoje, o comércio em Fátima matá-lo-ia de desgosto.

«Aquele dentre vós que nunca pecou atire-lhe a primeira pedra» Jo. 8:7. O perdão. A tolerância. Não julgar os outros só porque os nossos valores são diferentes. Mais um importante exemplo, mais um princípio fundamental na nossa sociedade multi-cultural, que a Igreja Católica prefere ignorar. A homossexualidade, a contracepção, a crítica sã, entre outras, são sistematicamente condenadas pela Igreja Católica. Até o ateísmo, pois mesmo que já não nos queimem em vida (felizmente!) ainda nos condenam ao fogo eterno por rejeitarmos o seu deus.

Como ateu não me fio na alegada origem divina destes ensinamentos. Mas, como ateu, sei que não precisamos de deuses para ter boas ideias, e respeito estas ideias que tiveram os autores do Novo Testamento.

Por isso entristece-me que uma organização como a Igreja Católica, supostamente a guardiã destes valores, prefira focar os aspectos supersticiosos dum nascimento milagreiro, ou o acto eticamente questionável de crucificar um inocente para salvar pecadores, ou exigir aos crentes que afirmem repetidamente que acreditam “na Santa Igreja Católica”.

Aproveitando o espírito natalício Cristão, pedia um favor aos Católicos. Quando disserem o Credo, substituam a afirmação de crença na Igreja pela crença na igualdade, na fraternidade, e no respeito pelos valores e crenças dos outros. Não só ficará o vosso credo mais próximo da ideia original, mas ajudarão o Cristianismo, outrora na vanguarda destes valores, a recuperar um pouco do seu grande atraso em relação à nossa sociedade.

26 de Dezembro, 2004 Mariana de Oliveira

Homo-reprovação

A Conferência Episcopal Espanhola divulgou um documento, redigido aquando da «Jornada de Familia y Vida 2004» e das comemorações do dia da Sagrada Família, onde, uma vez mais, reprova o «comportamento homossexual» e pede aos católicos que se posicionem claramente contra o projecto de lei do governo que aprova os casamentos homossexuais.

Os sacerdotes espanhóis, desta forma, continuarão a sufragar a doutrina da hierarquia católica que diz, por exemplo, que «a inclinação homossexual, ainda que não seja em si mesma pecaminosa, deve ser considerada como objectivamente desordenada».

A nota episcopal afirma que a homossexualidade «é uma tendência, mais ou menos forte, para um comportamento intrinsecamente mau do ponto de vista moral. É o comportamento homossexual o que é de per si eticamente reprovável». Mas os bispos acalmam as hostes dizendo que «haverá de julgar com prudência a sua culpabilidade». Entretanto, há que notar que a ICAR entende que o pecado se faz por actos ou pensamentos portanto, a não ser que os homossexuais não pensem a sua sexualidade, não têm salvação possível.

Apesar da Conferência Episcopal considerar que estes indivíduos «têm os mesmos direitos que as demais pessoas», continua a entender que, no que diz respeito à equiparação da união homossexual ao casamento, «a duas pessoas do mesmo sexo não lhes assiste nenhum direito de contrair matrimónio entre elas». Portanto, descodificando, os únicos direitos que são comuns a todos são o direito à castidade e à abstinência.

Ora bem, se a Igreja não quer que os homossexuais se casem de acordo com os seus ritos, o problema é com aquela instituição e com os seus membros. O que a ICAR não deve fazer é impor as suas convicções e a sua moralidade a um Estado laico e à lei. Não é de estranhar, então, que se diga que «não se pode praticar o catolicismo e a homossexualidade ao mesmo tempo». Ah, e não nos podemos esquecer do que diz Levítico acerca dos sodomitas.

26 de Dezembro, 2004 Carlos Esperança

Por que rezam os que sofrem?

O sudoeste asiático foi hoje assolado por um violento sismo, seguido de gigantescos maremotos que já mataram mais de 4 mil pessoas.

Faz hoje um ano que um terramoto devastou a cidade iraniana de Bam que provocou, oficialmente, a morte de 31.884 pessoas e fez cerca de 18 mil feridos, muitos deles estropiados, e cinco mil órfãos.

Todos os dias as catástrofes assolam a humanidade, umas vezes por causas naturais, muitas outras pela incúria dos homens, pelo modelo de desenvolvimento errado e pela explosão demográfica.

É preciso não ter sentimentos para viver indiferente aos dramas que diariamente afligem a humanidade, ser completamente insensível para ignorar as tragédias que se abatem sobre o Planeta, quase sempre sobre os mais pobres e tementes a Deus. Só um egoísmo feroz permite alhear as pessoas das soluções que possam minorar os horrores que batem à porta de milhões de desgraçados que, segundo o cinismo eclesiástico, são a vontade de Deus.

É com respeito e revolta que vejo hoje as imagens dos sobreviventes do terramoto de Bam, dos infelizes que, todos os dias, por todo o mundo, choram a tragédia que lhes bateu à porta e permanecem em longas orações a um Deus cruel e vingativo, como quem agradece o mal que lhe fizeram, como quem teme que lhes faça ainda pior.

O negro que esconde os corpos que sofrem, os corpos dobrados, os joelhos magoados, os rostos doridos, são uma dolorosa metáfora de quem se cansou de olhar para o Céu e vê como único destino da sua pobre condição prostrar-se de joelhos, rojar-se no chão, debitar orações e continuar refém do constrangimento social e do poder do clero que em todas as religiões se alimenta do medo, da ignorância e do sofrimento.

Às vezes penso que a oração é a blasfémia dos cobardes e a blasfémia a oração de quem não teme a liberdade.

Apostila – (17H00). Já estão contabilizados mais de 8.000 mortos, incluindo dois portugueses.

26 de Dezembro, 2004 Carlos Esperança

Cunhas a JC

A ICAR marcou indelevelmente a sociedade portuguesa cujo atraso é, em boa parte, obra sua. Já Antero de Quental definiu de forma notável as «Causas de decadência dos povos peninsulares», decadência que parece acentuar-se na faixa mais ocidental.

JP2 ao pedir a Cristo «que não abandone o Homem» está convencido de que a cunha subserviente é útil ou comporta-se com hipocrisia para se dar ares de uma influência que não tem, para impressionar os fregueses espalhados pelo mundo. No pedido, JP2 aproveitou para informar JC de que a humanidade precisa dele. No seu peculiar jargão disse «Recordai-vos de nós, Filho eterno de Deus. A humanidade inteira, marcada por tantas provas e dificuldades, necessita de Ti». Ou Cristo não sabe disso, e precisa que o Papa o lembre, ou sabe, e não o leva a sério. Para os ateus é ponto assente que um cadáver não vê, não ouve, não sente e, sobretudo, não aceita cunhas.

Mas o mais surpreendente foi o pedido à entidade patronal para as igrejas do Oriente e Ocidente e os seus líderes, «para que a luz que receberam, a comuniquem com liberdade e com valor a todas as criaturas». Este acto, de quem disputa o mercado das almas à concorrência, só pode ser encarado como profundo cinismo e fingimento de uma bondade que dois mil anos de proselitismo desmentem.

Os apelos à paz e os pedidos pelos doentes, crianças da rua e outros desgraçados bem sabe JP2 e o seu séquito que são inúteis e que não se resolvem com orações ou apelos públicos a JC, durante a missa, apesar dos meios técnicos usados, incluindo telefones de última geração que, pela primeira vez, transmitiram a Missa do Galo.

JP2 deve lembrar-se de que, segundo a sua superstição, Deus faria bem melhor em evitar as desgraças do que esperar que o Papa lhe peça para as tornar um pouco menos obscenas. Evitava o espectáculo deprimente de enganar os simples com promessas que não pode cumprir, pedidos a quem não ouve e a criação de expectativas vãs a quem já tem do sofrimento um razoável quinhão.

O resto são as habituais lamúrias pela protecção da vida, desde a concepção, obsessão doentia de quem se desinteressa da explosão demográfica que ameaça o Planeta e sabe que quanto maior for a miséria mais a devoção se acentua.

25 de Dezembro, 2004 Carlos Esperança

O Patriarca de Lisboa e o Vaticano

A diocese de Lisboa é, pelo número de habitantes e pela sua importância política, a principal filial do Vaticano em Portugal, conferindo ao seu titular o título de «Cardeal», cujo barrete é concedido no primeiro consistório a ter lugar após a nomeação para o cargo. O actual feitor, José Policarpo, é um bispo inteligente e bem preparado que, segundo o último «EXPRESSO», terá sido indigitado para integrar o governo central da ICAR, com sede no Vaticano. Fala-se mesmo na possibilidade de suceder a Karol Vojtyla, conhecido pelo pseudónimo de João Paulo II, cujo prazo de validade se aproxima do fim.

A forma como se organiza o único Estado totalitário da Europa é um assunto de reduzida relevância para o ateísmo, mas o modo como parasita os países que procura reduzir à condição de protectorados é um problema de cidadania que, no caso de Portugal, interessa aos portugueses. A suspeita de que a carreira profissional do patriarca Policarpo possa ter sido feita à custa da capitulação do Estado português perante o Estado do Vaticano é uma probabilidade a merecer profunda reflexão e repúdio.

No mesmo número do EXPRESSO (site indisponível) lê-se que no art. 23.º da Concordata ficou acordado a criação de uma comissão bilateral que compromete o Governo português a «proceder às acções necessárias para a identificação, conservação, segurança, restauro e funcionamento» dos bens culturais da Igreja, «em igualdade de oportunidade com os bens do Estado». Ou seja, o Governo português converte-se na companhia de seguros que cobre os riscos do património imobiliário da ICAR, à custa do erário público.

Não sabemos se há algum pacto secreto em que a ICAR se compromete a proceder às anunciadas beatificações e canonizações de defuntos autóctones, prescindindo dos dispendiosos emolumentos que costuma cobrar. De qualquer modo, os privilégios de que goza a ICAR são indignos de um Estado laico, vergonhosos para quem capitulou perante um Estado estrangeiro – o Vaticano -, escandalosos para quem os reivindicou e aceita.

Todas as Igrejas estão no direito de exigir tratamento igual e a futura Associação Ateísta Portuguesa não deixará de o fazer em relação à sua sede e em apoio das outras religiões.