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5 de Janeiro, 2005 Carlos Esperança

Mártires da ICAR

As Igrejas pelam-se por mártires. Os santos têm baixa cotação e poucas se dedicam à criação e exploração. A ICAR entrou na era industrial com JP2, um caso de superstição obsessiva e doentia fixação em cadáveres, a quem atribui virtudes passadas e poderes perenes. Para fabricar um santo basta inventar dois milagres e cobrar os pesados emolumentos do processo canónico. Para produzir mártires urge encontrar algozes adequados à transformação das vítimas em mito.

Os mártires podem ser dementes que procuram o Paraíso ou infelizes que estão à hora certa no lugar errado com parasitas de Deus à espera de explorarem a desgraça. Os suicidas islâmicos estão no primeiro caso, os missionários que caíram entre canibais fazem parte do segundo. Estes, em vez de serem amados pela eucaristia que levavam eram apreciados por si próprios, como manjar divino, em ávida antropofagia.

O nacionalismo e a fé andam de mãos dadas. A vontade divina coincide muitas vezes com a do príncipe e este é habitualmente um agente predestinado. A glória terrena facilita-lhe a bem-aventurança eterna. A rainha Santa Isabel fez aquele milagre das rosas, um milagre de que uma tia avó, húngara, certamente lhe enviara a receita para Aragão. Além do nome, herdou-lhe, com o truque, a santidade.

Nuno Álvares Pereira andou aí, depois de muitas humilhações nas provas para santo, a ser ultrapassado pelas bentinha de Balasar, os pastorinhos de Fátima e outros pios cadáveres com milagres comprovados e devoções firmadas. Faltou-lhe o martírio que infligiu aos castelhanos e a coragem da Cúria Romana para enfrentar Espanha. Agora que já poucos acreditam em milagres encomendaram-lhe um para dinamizarem a estatuária e colocarem nas igrejas uma peanha mais.

Destinados à santidade, o Vaticano, bairro que também usa a alcunha de Santa Sé, acaba de publicar a lista dos empregados mártires em 2004: 12 sacerdotes, 1 missionário, 1 religiosa e 3 leigos. As mortes são de lamentar mas o seu aproveitamento para fins de propaganda é uma macabra operação de marketing de que a ICAR se aproveita. O Cardeal Crescenzio Sepe, prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos, recorda este «generoso tributo de sangue de muitos irmãos e irmãs para o crescimento da Igreja no mundo».

Morrer ao serviço de Deus é garantir o Paraíso – prometem os padres com a mesma convicção com que na praça nos garantem a excelência da hortaliça e no talho a saúde do animal de que nos cortam os bifes.

4 de Janeiro, 2005 Carlos Esperança

O Diário Ateísta e os seus críticos

Face ao artigo «Ainda a respeito do Diário Ateísta» de Filipe Alves, publicado na Terra da Alegria, blogue que integra o segmento da Teosfera do DA, dado que me refere expressamente repetidas vezes, apraz-me esclarecer e comentar algumas afirmações, de forma sucinta:

1 – O nome, Carlos Esperança, corresponde efectivamente ao «blogger» cuja foto, idade e morada aparecem clicando no nome que se encontra na lista de colaboradores do DA e é o mesmo que deu a entrevista à Agência Lusa sobre a criação da Associação Ateísta Portuguesa de que é activista.

2 – O Diário Ateísta (DA) existe baseado na liberdade de expressão, direito recente em Portugal, aparecido há 30 anos sobre os escombros de uma ditadura cuja longevidade a cumplicidade da ICAR prolongou. Convém referir que o ensino da religião católica era obrigatório nas escolas do Estado e a sua prática severamente exigida e fiscalizada pelos Directores das Escolas do Magistério aos futuros professores.

3 – Na opinião de Filipe Alves, o DA integra pessoas «moderadas e bem educadas», donde parece excluir-me, mas, na sua diversidade, o DA não inclui ninguém que não aceite a «Declaração Universal dos Direitos Humanos», frequentemente postergada por todas as religiões, como um conjunto de princípios que é dever observar.

4 – Não tenho legitimidade para falar em nome do DA, mas, na qualidade de ateu praticante e militante, garanto que me empenho para que os homens e mulheres de todo o mundo possam abraçar qualquer religião, tenham a permissão de mudar e o direito de não professarem qualquer uma.

5 – A violência que atribuo às religiões baseia-se na perseguição e penas infligidas aos que as abandonam ou que as não praticam de acordo com a vontade do clero. A apostasia e a blasfémia são «crimes» exclusivamente de natureza religiosa que todos os credos se esforçam por criminalizar e que só a vitória da laicidade subtraiu ao braço da lei. Mas, de violência, estão a Tora, a Bíblia e o Alcorão cheios.

6 – Não pretendo «converter» ninguém ao ateísmo. O proselitismo é uma tara exclusiva da evangelização a que as religiões se dedicam. Chegam ao ponto de baptizar crianças recém-nascidas sem o mínimo respeito pela autodeterminação religiosa das pessoas, entrando em concorrência pela hegemonia, sem hesitarem no recurso à guerra. Não falo da Idade Média, falo do milénio que há pouco começou, da Europa, do catolicismo, do islão, do protestantismo e da Igreja Ortodoxa.

7 – Dizer que não há publicações católicas fundamentalistas é ignorar centenas de publicações paroquiais que pululam pelo país e cuja leitura faz corar de vergonha qualquer crente urbano ou alfabetizado. Falo de publicações actuais e não no diário «Novidades», órgão do patriarcado de Lisboa que desapareceu após o 25 de Abril. Podia ainda referir as posições do poderoso cardeal Joseph Ratzinger da cúria romana.

8 – Reconheço que também há crentes tolerantes mas, apesar da linguagem vigorosa que uso, fui incapaz de referir às autoridades democráticas o padre da Covilhã que em 1961 me denunciou à PIDE e era incapaz de ficar indiferente à prisão ou ao assassinato de um crente. Ao contrário, a Igreja portuguesa silenciou crimes desses, cometidos durante a ditadura, com a excepção honrosa de um único bispo, António Ferreira Gomes, que pagou com o exílio a honradez.

9 – A tolerância existe mais nas atitudes do que nas palavras. Pode considerar-se tolerante uma igreja que exige uma concordata que reserva para si privilégios que nega às outras religiões? Que pretende servir-se das escolas públicas para se promover? Que reservou direitos para a sua Universidade que nenhuma outra, particular, possui?

10 – Acerca de Deus, sobre quem os crentes fazem recair a suspeita de ter criado o mundo, não há o mais leve indício da sua existência nem o mais insignificante esforço da sua parte para provar que, depois disso, tenha feito o que quer que seja. Assim, não é possível provar a sua não existência mas cabe-lhe a ele fazer prova de vida.

Correcção – «A religião quer-se como o sal na comida, nem de mais nem de menos» são palavras de António Alves Martins, bispo de Viseu no reinado de D. Luís, palavras frequentemente apagadas da sua estátua, durante a ditadura salazarista, e de novo repostas clandestinamente por anónimos. Para mim, a religião está como o sal para os hipertensos – a mais pequena dose é prejudicial, mas o bispo acreditava em Deus. Ninguém é perfeito.

3 de Janeiro, 2005 fburnay

Ética ateísta

Conhece, quem é obrigado ao silêncio, o poder de quem cala. Pior é que dizer mentiras não deixar alguém falar. Pior ainda é advogar o direito ao abuso para combater o abuso do direito. E aquele que pensar que nada há de mais abjecto do que obrigar os outros a ficar calados porque o nosso discurso ofende mesmo sem ser insulto, desengane-se: pior que tudo isto é castrar o valor da nossa opinião porque aquilo que ofende não se prende apenas naquilo que dizemos mas naquilo que pensamos. Não estou a falar de sociedades teocráticas, não estou a falar de cruzados, não estou a falar de ditaduras nem de déspotas sem escrúpulos. Estou a falar de pessoas comuns. Porque, ateus ou não, podemos ser todos Galileus.

O meu direito a ser ateu é e sempre foi garantido entre aqueles que conheço. Já as razões pelas quais eu sou ateu, essas, são por vezes obrigadas a ficar escondidas dos ouvidos de muitos porque são intoleráveis. O facto de eu achar que os outros, e não eu, estão enganados, não é para eles uma opinião que importa debater para perceber quem é que está errado – é arrogância que não merece ser ouvida. Aquilo a que chamamos verdade, quer a conheçamos, quer não, chega a ser para alguns uma questão de perspectiva! E, sendo para essas pessoas uma questão de perspectiva, eu estou tão errado para os outros como os outros o estão para mim, de facto. É deste tipo de pessoas que os tiranos gostam.

Que haja instituições – não interessa quais – que façam o que eu descrevi, não me causa espanto. Mas ver falar aqueles de quem gosto, sem que se apercebam, a língua dos obtusos e dos violadores de direitos humanos é simplesmente assustador. E o hediondo disto tudo é que há quem não faça a menor ideia das implicações daquilo que diz. Pode parecer exagerado mas de facto todas essas coisas, que quando explícitas causam revolta, estão também presentes na ingenuidade do cidadão comum: do polícia ao juíz, do condutor ao peão, do aluno ao professor, da criança ao adulto. É a ingenuidade que boicota a cidadania, que distorce a justiça, que se arroga ao direito de calar quem acha que deve, que relativiza o absoluto e que absolutiza o relativo, que dita o que é bom ou mau, tudo isto na maior das plenitudes de espírito e paz interior. Ela está nas cabeças dos crentes que seguem os seus líderes sem os questionar, está na boca daqueles que se manifestam nas câmaras da Assembleia da República, está nas manchetes distorcidas dos jornais, está nas aulas de professores despreocupados, está na condescendência dos intelectuais, está no “simples” acto de quem bebe e conduz!

É por isso que acho que o Ateísmo possui uma componente ética. Porque sei que, apesar da natureza humana poder ser tudo menos aquilo que eventualmente desejaríamos, se pode procurar o fulcro que torna humana a sociedade. Podemos, todos juntos, construir uma sociedade melhor. Isso é aquilo que todos queremos, não é relativo. A noção daquilo que faz da sociedade melhor, isso sim, importa debater e nunca impôr. Isto tem tudo a ver com Ateísmo. Ateísmo não de ser simplesmente ateu mas de ser ateísta, que é o que eu sou. O Ateísmo que, na sua posição descrente e laica garante um lugar para todos aqueles que amam o seu deus. Um Ateísmo que defende valores de cidadania não pode ser uma ideologia sem valores. Aqueles que acusam o Ateísmo de defender ideais que, na sua elaboração, têm a mesma estrutura que os valores dogmáticos das religiões, estão enganados. O Ateísmo, na sua elaboração ideológica, admite sempre o seu próprio questionamento e nunca impõe dogma nenhum. Não admira que por isso seja tão consonante com a Ciência, com a Democracia e com a Cidadania em particular. Não é de estranhar que surja mais naturalmente no seio de comunidades críticas, dialogantes e sem complexos. Da diferença entre desejo e fé, entre esperança ingénua e convicção crítica é que nasce o báculo da Democracia – não de ouro na mão de um mas por direito, na mão de todos.

3 de Janeiro, 2005 Carlos Esperança

No Sri Lanka só a fé ficou incólume

Há catástrofes cuja dimensão semeia a desolação e o pânico. A dor extrema conduz à inacção ou ao desespero. Não há meio termo. A revolta, a angústia e o medo espalham-se no ar que cheira a morte e transporta pesadelos sombrios.

A televisão mostra-nos milhares de cadáveres juncando o chão, mortos que urge remover depressa para evitar que as epidemias lhes juntem outros. A morte, na sua obscena dimensão, deixa de interessar. São os vivos, espoliados de tudo, sem família, sem abrigo, sem água potável, sem alimentos, sem presente nem futuro, corpos desnudados, fantasmas vagueando sem destino, a respirar o ar que cheira a morte, são esses vivos a quem a tragédia bateu à porta que esperam solidariedade e a rapidez do nosso apoio.

As praias do Índico, que há dias regurgitavam de vida num ambiente idílico, são hoje cemitérios que rodeiam um continente mais pobre, desesperado e lúgubre. Mas sempre que o cheiro dos cadáveres se adensa logo as aves de repina se aproximam.

No Sri-Lanka, onde a agitação da terra e a fúria do mar se conjugaram para arrasar um país e dizimar a população, estátuas de Buda, de cimento e gesso, sobraram intactas, quando, à sua volta, tudo ficou destruído. Até um templo resistiu ileso.

Tanto bastou para que a tragédia fosse confiscada em benefício da religião. «As pessoas não vivem de acordo com as virtudes religiosas. Por isso, a natureza dá-lhes alguns castigos porque não seguem o caminho de Buda. As pessoas têm de aprender a lição», diz Sumana, um monge budista. – lê-se no «Público» de hoje. Não foi apenas o templo e alguns budas que resistiram ilesos – a crueldade, a ignorância e a chantagem reforçaram os alicerces.

No Sri-Lanka, como no resto do mundo, os abutres estão sedentos de carne putrefacta. A morte é o alimento predilecto das religiões e o medo o argumento para a conversão e submissão ao poder do clero. Perante a sinistra interpretação eclesiástica só a erradicação do fantasma de Deus pode fazer algo pela libertação da humanidade.

Apostila – Uma menina inglesa, de dez anos, com os conhecimentos científicos adquiridos na aula de geografia, apercebeu-se da iminência da catástrofe e conseguiu que uma centena de pessoas fugisse da praia. Salvou mais gente a sabedoria de uma criança do que a fé de todos os adultos.

1 de Janeiro, 2005 Carlos Esperança

Feliz 2005



O Diário Ateísta agradece e retribui calorosamente os votos formulados por todos os que nos desejaram um feliz 2005.

E não podemos deixar de saudar igualmente todos os que nos visitaram em 2004 e contribuíram para o sucesso alcançado em treze meses de existência do Diário Ateísta.

Esperamos continuar a merecer as visitas dos leitores, sem nos responsabilizarmos pelo destino da alma dos que procuram este destino blasfemo.

31 de Dezembro, 2004 Mariana de Oliveira

Mais um

Daqui a uma horas acaba mais um ano. Um ano pautado por muitos atropelos a direitos, liberdades e garantias e, mais recentemente, pela tragédia no Índico, mas nem tudo foi mau – a lei do véu francesa que impediu (espera-se) o avanço de um islamismo castrador da individualidade da mulher (ok, isto é muito discutível), a China mostra sinais de tolerância com a nova lei da liberdade religiosa e, algo mais caseiro, a Associação Ateísta Portuguesa está franco andamento.

Em nome de toda a equipa do Diário Ateísta, desejo-vos umas boas entradas – a rezar, agarrados a uma garrafa de álcool ou a alguém – e que 2005 seja um ano ímpar.

31 de Dezembro, 2004 Mariana de Oliveira

Cada cavadela, cada minhoca

Para acabar o ano em beleza, D. Jacinto Botelho, presidente da Comissão Episcopal da Família da CEP, considerou a decisão do governo espanhol de equiparar as uniões homossexuais ao casamento como «uma provocação à Igreja e aos valores da família».

O padre considera que «é, no mínimo, provocatório e é um escárnio à doutrina fundamental da Igreja. Não sei o que estará por trás mas não há dúvida nenhuma que estará certamente essa mentalidade laicista, que esquece os valores fundamentais e, possivelmente, será o reflexo de uma programação contra a Família, contra os valores essenciais, contra o progresso da própria sociedade».

Claro que a decisão do governo espanhol é provocatória da doutrina fundamental da ICAR porque esta doutrina é intolerante e sexista e o projecto de lei pretende exactamente o contrário, pretende reconhecer uma situação pertencente a uma realidade social que, actualmente, tem dignidade jurídica e, como tal deve ser reconhecida pelo legislador. Ora, a lei e o Direito não são subsidiários de uma moral religiosa de determinado grupo. Os tempos em que a lei suprema era a que emanava de Deus (entenda-se de alguns que se auto-proclamavam seus intérpretes) já se ultrapassaram há muito.

A Igreja Católica não tem qualquer legitimidade para impor os seus valores fundamentais e a sua visão da família a uma sociedade plural e multicultural. Esta atitude prepotente da ICAR provoca urticária a qualquer um! Há semanas que aqueles senhores de batina bafienta se divertem a remexer esta questão. Já chega! Já se viu que a sua opinão não vai vingar e que, desta vez, ganhou a tolerância.

31 de Dezembro, 2004 Mariana de Oliveira

Ateísmo de hastes: Zwei

O segundo artigo do Renas e Veados sobre o ateísmo e a sua relação com a religião (especialmente com a Igreja Católica Apostólica Romana), cuja autoria pertence ao Boss, foca as injustas acusações de intolerância com que frequentemente os ateus se deparam. A nós nunca nos «ocorreu proibir as religiões, a liberdade de culto ou construção de templos», antes pelo contrário, achamos muito bem que exista liberdade de religião e de culto. Por quem são? Construam igrejas à vontade (desde que sigam os planos de ordenamento de território e demais legislação de edificações)! No entanto, se criticamos o que quer que seja relativo a qualquer aspecto da crença, caem-nos em cima apontando o dedo acusador: «Intolerantes!». Como diz o autor, a única intolerância é não aceitar como válido os argumentos apresentados e considerados sagrados.

Continuando, como muito bem sublinha o Boss, «curiosamente quando se trata de criticar as opções ateístas não há qualquer comedimento, o tal que se pede exige aos ateus» e fornece um bom exemplo com um texto do Assumidamente. E segue dizendo que «a hegemonia religiosa da sociedade em que vivemos, [que] distorceu a noção de respeito pela opção religiosa alheia, considerando desrespeito tudo o que não seja a subserviência ou alheamento acrítico». E continua: «Ao mesmo tempo em que é legítimo e vulgar acusar os ateus de pessoas a quem falta algo, pobres de espírito ou mesmo imorais, como se a moralidade fosse algo sobrenatural ao alcance apenas de videntes. E nós ateus estamos habituados a tolerar estes discursos, e a ser comedidos nas respostas – erro crasso, parece-me». De facto é um erro. Temos de mostrar aos crentes e à sociedade em geral que o ateísmo tem um sistema de valores alternativos àqueles apresentados pelas religiões, valores esses assentes numa compreensão alargada da sociedade integrando, sem discriminações, todos os cidadãos independentemente do que são e do que pensam. Há que refutar a ideia que apenas a religião está na base da ética e da moral.

Todos os ateus devem juntar a sua voz ao que é dito: «Num mundo em que é tão mais fácil seguir o rebanho, é de aplaudir aqueles que rejeitam a facilidade de acreditar numa verdade, optando por encarar uma mentira. E é precisamente isto que tornam tão mais lúcidos os ateus, e tão perigosos os religiosos. Constatar uma mentira estimula a denúncia, a crítica, a honestidade racional como via para a construção de um mundo melhor. A crença numa verdade leva a loucuras, à tentação da imposição da verdade aos outros, a intolerância para quem ousa questionar a verdade».

30 de Dezembro, 2004 Mariana de Oliveira

Ateísmo de hastes: Ein

Dois artigos surgiram, ontem e hoje, no Renas e Veados que, pela proximidade com as posições do Diário Ateísta, importa comentar.

A posição de base, publicada no primeiro texto de João O., é idêntica à nossa: «Somos descrentes. Ou seja, não alimentamos qualquer crença religiosa. E somos felizes por não as ter. Apesar disso, não me parece que alimentemos alguma posição anti-católicos ou anti-pessoas religiosas, ou seja, contra quem mantem uma fé ou uma crença em qualquer religião, deus(es) e cultos afins». Também nós não cremos numa entidade divina superior ou metafísica. Como já esclarecemos várias vezes, nada temos contra os crentes. Convivemos pacificamente com eles, temos muitos amigos crentes, não nos fechamos num círculo e não nos relacionamos somente com ateus.

João O. continua: «este blog não compactua com posições reacionárias e anti-direitos humanos, nomeadamente a da ICAR no que toca aos direitos civis, sociais e políticos das pessoas. E aqui condenamos de forma veemente esta instituição. Por tudo o que ela significa e pela sua influência. Por ser uma monarquia teocêntrica, patriarcal e sexista. Como também não nos cansamos nem cansaremos de condenar as posições atentatórias à laicidade do Estado, os privilégios que o Estado confere a esta instituição por via da negociata concordata, nem os seus alinhamentos iguais aos da direita mais reaccionária. Também por questões históricas, como inquisições, apoios a ditaduras, apoios (velados ou explícitos) a genocídios e outras atrocidades em que esta malta participou». E eis que as nossas posições se encontram novamente. Não temos nada contra os crentes – cada um acredita no que quer -, mas não renunciaremos ao direito de nos indignarmos contra uma organização que perseguiu e continua a perseguir, quer pela condenação do aborto quer pela proibição de métodos contraceptivos, mulheres, condena homossexuais, defende a sua moralidade como sendo a única e verdade e negoceia tratatos internacionais por baixo da mesa. Mas, antes de nos acusarem de só «atacarmos» a ICAR, esclareço desde já que somos contra qualquer instituição religiosa que promova tais valores.

Um outro ponto que João O. foca é o poder que a ICAR tem de «difundir a sua doutrina sem travões(…) usando da sua influência eleitoral, decidindo quer como eminências pardas, quer como formadores de opinião, os destinos de todos», católicos ou não.