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2 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

Espanha

Se José Luís Zapatero discutisse em Conselho de Ministros a politização das homilias, a má benzedura da água destinada aos ofícios religiosos e a deficiente transubstanciação das hóstias, por incompetência dos actuais párocos das dioceses espanholas ou pela má qualidade da farinha usada;

Se o presidente do Governo pusesse em dúvida o processo alquímico que transforma o pão e o vinho no corpo e no sangue de Cristo, o que só a fé e o paladar requintado descortinam, certamente se diria que tinha ensandecido.

Se o primeiro ministro de Espanha, eleito democraticamente, desconfiasse da eficácia terapêutica das bênçãos dadas aos doentes pelo Papa, que se esquece de benzer-se a si próprio ou, se o faz, prova a inutilidade dos sinais cabalísticos em que insiste;

Se da agenda governamental fizesse parte a averiguação sobre a substância activa da eucaristia, as virtudes do incenso, o poder purificador da absolvição e o benefício da missa e se mandasse determinar a eficácia de detergentes como a confissão e o baptismo na limpeza da alma, João Paulo II tinha o direito de reclamar.

Se Zapatero, num programa de combate à SIDA mandasse substituir os preservativos por pacotes de indulgências papais, com data de fabrico, prazo de validade e lote de produção poderia ser canonizado mas trairia os interesses dos cidadãos por cuja saúde tem obrigação de velar.

Já o Papa, exímio na produção de indulgências, experiente na concessão de bênçãos, uma autoridade na criação de cardeais e na produção de santos não tem o direito de consagrar o mundo à Virgem Maria e, muito menos, de se pronunciar sobre o valor do preservativo. Pode proibi-lo aos padres e freiras, recusá-lo a si próprio, dissuadir o uso aos fiéis e impedir a circulação no Estado pontifício do Vaticano.

O Papa pode abdicar, por uma questão de honra, dos grossos subsídios que o Governo espanhol concede à ICAR mas não pode nem deve sabotar um programa de combate à SIDA. E sabe-se que é mais eficaz o preservativo no combate à SIDA do que a oração no combate ao pecado.

1 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

Resposta ao padre Joaquim Cardozo Duarte

Sob o título «A crescente preocupação de João Paulo II por Espanha», Diário as Beiras de 27-01-05, o vosso colaborador Joaquim Cardozo Duarte (JCD) anatematiza o país vizinho e o seu legítimo Governo numa reincidência obsessiva.

Na beata sedução pelas palavras de Sua Santidade, que condenou «a difusão de uma mentalidade inspirada no laicismo e a restrição da liberdade religiosa», JCD não viu a intromissão intolerável nos assuntos internos de um país soberano, não notou que a liberdade religiosa está assegurada na Constituição, tal como o laicismo que o anterior primeiro-ministro, ligado ao Opus Dei, ignorou, e esqueceu-se de referir que, perante tão graves e injustas afirmações, a Associação de Teólogos João XXIII considerou as declarações papais como prova da sua falta de condições para dirigir a Igreja.

O Papa pretende manter a obrigatoriedade do ensino religioso nas escolas, uma prática que colide com a Constituição espanhola, a liberdade religiosa e a democracia, por muito que custe a quem detém o monopólio. Liberdade religiosa não é o direito de tornar uma religião obrigatória.

JCD exalta a «longa e bela história de séculos», «essa interligação, de felicidade e amor, entre a fé católica e a missão do sucessor de Pedro», mas esquece a Inquisição Espanhola – a mais cruel de todas -, a evangelização da América latina, com a exterminação dos índios, a feroz e brutal perseguição aos judeus pelos reis católicos e a ditadura de Franco que, além dos crimes horrendos, manteve, até ao fim, a pena de morte pelo garrote.

Quanto à legislação sobre o aborto, o matrimónio e a família, que tanto aflige JCD e a Igreja, o Estado espanhol não impõe modelos, apenas dá liberdade de escolha.

José Blanco, influente dirigente do PSOE, lembrou que «está excluída qualquer doutrina religiosa como fonte inspiradora do ordenamento jurídico, pois não se pode exigir que as normas jurídicas, que a todos obrigam, sejam ditadas por princípios religiosos que apenas vinculam quem os professa».

São posições assim que distinguem as democracias das teocracias.

Texto publicado no «Diário as Beiras», 28-01-05

1 de Fevereiro, 2005 pfontela

A outra face

Da Polónia chega-nos mais uma prova de respeito católico pela liberdade. Neste caso foi a liberdade de expressão que sofreu um golpe. Jerzy Urban editor de um jornal semanal foi condenado a pagar $6500 por publicar um artigo em ridicularizava o papa (o titulo era sugestivamente «Sadomasoquismo Andante» e apelidava o papa de Brezhnev do Vaticano e velho impotente). Um pormenor interessante é que Urban foi o porta voz do último governo comunista polaco (ironias…).

Apesar de podermos concordar ou discordar com as críticas e a escolha de palavras do sr Urban a verdade é que dentro de um país da União Europeia um cidadão foi punido por partilhar uma ideia. A alta popularidade do papa e influência do Vaticano na Polónia tornaram possível este tipo de situação confirmando a opinião de muitos secularistas europeus que o Vaticano não tem qualquer respeito intrínseco pela liberdade e que a outra face que lhe conhecemos em outras regiões é apenas uma contenção que lhe foi imposta pronta ser descartada assim que os ventos mudem.

31 de Janeiro, 2005 Carlos Esperança

Opus Dei rejuvenesce quadros

Paulo Teixeira Pinto vai suceder a Jardim Gonçalves à frente do banco Milleniumbcp.

Monárquico e Opus Dei, vai à missa todos os dias.

31 de Janeiro, 2005 Carlos Esperança

José Saramago

«Sou simplesmente um ateu, que nem sequer é capaz de conceber, mesmo só como construção mental, a possibilidade da existência de um Deus».

José Saramago, «Única», Expresso nº. 1683, 29-01-05
30 de Janeiro, 2005 jvasco

As danças da chuva e a seca no Alentejo

O sentimento religioso perde-se nos tempos. Para lidar com o imprevisível, com o que não conhece, com a perplexidade perante um mundo complexo cheio de fenómenos aleatórios, o homem projectou as suas aspirações em seres imaginários com capacidades muito superiores às suas, com explicações relativamente simples para os fenónemos naturais, e respostas reconfortantes para os mistérios pertubantes.

Um caso exemplar é o das danças da chuva. Desesperados porque precisam de chuva, dispostos a sacrifícios para a obterem, mas impotentes face aos caprichos da natureza, várias tribos primitivas desenvolveram rituais nos quais se tentava apaziguar ou convencer os Deuses a serem generosos ou misericordiosos. É óbvio que o impacto das danças na pluviosidade foi nulo, mas isso não impediu os povos de continuarem, ano após ano, geração após geração, em pontos muito dispersos do globo, a manterem esses rituais. O clero local era claro: quando se dançou e não choveu, o ritual não foi feito com convicção suficiente; quando se dançou e choveu, a chuva ocorreu graças ao ritual. O reforço comunitário, a memória selectiva, o post hoc, validação subjectiva, negação e outro tipo de análise supersticiosa e falaciosa permitiu manter vivos estes rituais curiosos.

Mas muito curiosa é a forma como esses ritos são transpostos para a sociedade ocidental. No www.ateismo.net é possível encontrar uma notícia que a Mariana Pereira da Costa destacou da agência Eclesia no dia 25 de Janeiro:

«O Bispo de Beja, D. António Vitalino, já alertou o clero da diocese para que ‘se ponha uma intenção especial sobre a seca no Alentejo e que esteja atento aos casos de maior gravidade’.

Era hábito no Alentejo fazerem-se procissões onde se pedia ‘bom tempo e boa colheita’. As ‘chamadas rogações’, disse o bispo. Liturgicamente estão previstas, só ‘que esse costume foi-se perdendo’. Com o ambiente de secularismo ‘as pessoas pensam mais nos subsídios da União Europeia do que em Deus’.»

Recomendo vivamente o comentário que se segue, também sobre este assunto.

Como nos mostrou a tragédia no sudeste asiático, o homem ainda está sujeito aos caprichos da natureza. No entanto, cada vez tem mais poder para a inter-agir com ela, bem como para lidar com as suas consequências.

Cada vez mais, importa encarar estas questões com uma atitude racional. Importa prestar atenção às consequências do efeito de estufa para que não seja o homem a causar os desastres e cataclismos de que pode padecer. Importa saber onde contruir diques, saber onde contruir barragens, saber quais os planos hidrológicos adequados,

quais os impactos ambientais.

E, claro, fazer investigação. Fazer evoluir o conhecimento. Já se começa a compreender os mecanismos da chuva ao ponto de a poder provocar artificialmente. Como evitar a seca tremenda sem causar desequilíbrios ambientais? É importante manter a investigação nestas áreas.

E também importa saber quem mais precisa de apoio, como maximizar a protecção, como minimizar os riscos. Tudo isto com uma atitude racional.

Não com danças da chuva!

Mas o que o Bispo pede, no fundo, é oposto.

29 de Janeiro, 2005 Palmira Silva

A religião e o Holocausto: II

«The descendents of those who hated Jesus, who condemned him to death, who crucified him and immediately persecuted his pupils, are guilty of greater excesses that those of their forefathers …. Satan helped them invent Socialism and Communism …. The movement for freeing the world from the Jews is a movement for the renaissance of human dignity. The Almighty and All-wise God is behind this movement.»

Padre Franjo Kralik «Why are the Jews Being Persecuted» artigo na Acção Católica croata, Maio de 1941.

God, who directs the destiny of nations and controls the hearts of Kings, has given us Ante Pavelic and moved the leader of a friendly and allied people, Adolf Hitler, to use his victorious troops to disperse our oppressors… Glory be to God, our gratitude to Adolf Hitler and loyalty to our Poglavnik [fuhrer], Ante Pavelic.” Carta Pastoral de 1941 do Arcebispo de Zagreb Aloysius Stepinac, beatificado pelo Papa João Paulo II em 1998.

Depois das ondas de indignação despertadas pelo meu post sobre o envolvimento das Igrejas protestantes com o regime nazi, reconhecido recentemente por estas, acho que se torna indispensável reiterar que estes posts servem como aviso para a necessidade absoluta da laicidade do Estado e relembrar quão fácil é usar a religião para os mais ignóbeis fins. Como podemos testemunhar no século XXI.

O envolvimento do Vaticano com os nazis e seus regimes satélites não nega o facto de que muitos católicos, padres, freiras ou simples leigos, combateram heroicamente os nazis e foram solidários com os judeus e outros perseguidos. Mas é inegável que o silêncio ensurdecedor das altas cúpulas do Vaticano, de Pio XI e especialmente de Pio XII, o Papa nazi para muitos, incomodou e incomoda muitos crentes. Que tentam ver nesse silêncio uma expressão de diplomacia, que afirmam que se Pio XII tivesse falado abertamente contra os nazis o horror do Holocausto teria atingido dimensões ainda maiores.

Pessoalmente tenho dificuldade em acreditar nessa explicação que não só ignora os factos que apresento no post seguinte como também é contrariada pela actuação do Vaticano noutros conflitos da época. Nomeadamente essa contenção não foi seguida pelo Papa Pio XI, que em 1936 exorta os católicos espanhóis a lutarem lado a lado com Franco na «difícil e perigosa tarefa de defender e restaurar os direitos e a honra de Deus e da Religião».

A Igreja de Espanha declarou-se imediata e entusiasticamente do lado de Franco, nomeadamente através da pastoral «Las dos ciudades» do bispo de Salamanca, Enrique Pla y Deniel (nomeado cardeal por Pio XII em 1946, sem dúvida em reconhecimento pelos bons serviços prestados), datada de Setembro de 1936. E não podemos esquecer que em Julho de 1936, tinha começado uma rebelião contra o governo democraticamente eleito da Frente Popular.

Uma rebelião, que se transformou na Guerra Civil Espanhola, tornada possível em grande parte pelo apoio do Vaticano, de Mussolini e de Hitler, tendo este último enviado tropas em apoio de Franco. Em Abril de 1937, os aviões alemães da Legião Condor bombardeiam e destroem pela primeira vez na história uma cidade a partir do ar. Foi a cidade de Guernica, na província espanhola do País Basco, imortalizada por Picasso. Para recordar a estupidez de uma guerra que causou um milhão de vítimas e o exílio de centenas de milhares de espanhóis.

Para além se ser negada pela atitude de muitos responsáveis católicos em países satélites do regime de Hitler. Mal as forças alemãs marcharam sobre Viena em Março de 1938 o Cardeal Theodore Innitzer, arcebispo de Viena, entrou em contacto com Hitler. Três dias depois envia instruções aos seus subordinados: «The faithful, and those who have the care of their souls, must rally unconditionally to the Führer and the great German state. The historic battle against the criminal illusion of Bolshevism and for German security, for work and bread, for the power and honour of the Reich and for the unity of the German nation, manifestly has the blessing of divine Providence.» Duas semanas depois o episcopado austríaco emite um comunicado de apoio ao plebiscito sobre a incorporação da Aústria no III Reich (que teve o apoio de 99,73% dos votantes) em que se pode ler «On the day of the plebiscite it is clearly our national duty, as Germans, to declare in favour of the German Reich, and we likewise expect all Christian believers to correctly understand their duty to the nation.»

Em Março de 1939, a Alemanha invade as regiões checas. A Eslováquia forma então um país separado, sob a tutela alemã e com um regime pró-nazi, chefiado pelo católico monsenhor Josef Tiso, que foi executado em 1947 pelos crimes cometidos, indefectível até ao fim de Hitler.

Ante Pavelic, lider católico dos Ustase, tornou-se lider (poglavnik) do Estado Independente da Croácia depois de Hitler ter invadido a Jugoslávia em 1941. Pavelic pretendia exterminar um terço dos sérvios (ortodoxos), expulsar outro terço e converter ao catolicismo os restantes. Tudo sob o ar benévolo do Vaticano, que desculpava os massacres cometidos como sendo «teething troubles of a new regime» (expressão usada pelo secretário de estado do Vaticano, Monsenhor Domenico Tardini). Apenas quando a vitória aliada era um facto consumado o Vaticano denunciou o genocídio levado a cabo em boa parte por membros do clero católico. E Ante Pavelic nunca enfrentou um tribunal de guerra, sendo-lhe oferecido santuário pelo Vaticano no mosteiro de San Girolamo, indo depois para a Argentina onde foi conselheiro de segurança de Juan Peron, até uma tentativa de assassínio o fazer fugir para a Espanha de Franco onde morreu em 1959. A cumplicidade do Vaticano na fuga de Pavelic, com um espólio de guerra considerável, está a ser alvo de uma acção legal que pretende a devolução do dinheiro do tesouro da Croácia transferido ilicitamente para o banco do Vaticano.

Sobre as atrocidades cometidas pelo regime católico Ustasa ou Ustasha, o massacre de 600 000 sérvios, 30 000 judeus, e 26 000 ciganos, os livros indicados são elucidativos, o último escrito por um sobrevivente do campo de concentração de Jasenovac, dirigido até 1943 pelo frade franciscano Miroslav Filipovic-Majstorovic.

E não esqueçamos que em Outubro de 1941, enquanto os exércitos nazis ultimavam a invasão de Moscovo, Pio XII pedia aos católicos para orarem pela rápida realização da promessa da Senhora de Fátima de «conversão da Rússia». No ano seguinte, no dia 31 de Outubro de 1942, após Hitler ter declarado que a Rússia Comunista tinha sido «definitivamente» derrotada, Pio XII, numa mensagem de Jubileu, cumpriu a primeira das exigências daquela «Senhora», «consagrando o mundo inteiro ao seu Imaculado Coração».

«Convert or Die: Catholic Persecution in Yugoslavia During World War II» Edmond Paris

«The Yugoslav Auschwitz and the Vatican» Vladimir Dedijer

«Witness to Jasenovac’s Hell» Ilija Ivanovic


Freiras marchando com soldados Ustasa
29 de Janeiro, 2005 Carlos Esperança

Lágrimas de crocodilo

O enviado de João Paulo II a Auschwitz, Cardeal Jean-Marie Lustiger, lembrou as posições do Papa contra o anti-semitismo, de forma especial «por parte dos cristãos» – diz a Agência Ecclesia.

Vamos desmascarar o tartufo enquanto o islão afirma o seu ódio sem preconceitos.

O sionismo agressivo e expansionista, a funcionar como demência simétrica do fascismo islâmico, não pode servir de alibi ao silêncio que muitos gostariam de fazer sobre o holocausto e ao branqueamento dos crimes a que o anti-semitismo conduziu.

Recordar os reis católicos de Espanha e a crueldade cristã com que perseguiram, espoliaram e queimaram judeus, é apenas referir o zelo apostólico e a selvajaria da fé.

O islamismo é um decalque grotesco do cristianismo a que falta a influência da cultura helénica e do direito romano. À medida que os mercenários de Alá se dão conta do crepúsculo da sua civilização falhada, acirram os crentes e atiram-nos para o martírio a troco de umas orgias no paraíso onde serão alimentados com rios de mel para satisfazerem as fantasias sexuais com setenta virgens que lhes reservam os mullahs. Só as mulheres devem continuar a conformar-se com a burka, a submissão e o opróbrio.

A cegueira religiosa, alimentada pelos parasitas de Deus, conduz os crentes (cristãos, muçulmanos e judeus) a confiar nos livros sagrados, como se estes fossem certidões notariais, reclamando territórios que a vontade divina lhes legou sem admitirem, ao menos, após séculos, o direito por usucapião. Deus é um pretexto para crimes que o poder, a ambição e a inveja reclamam.

O Papa João Paulo II vem agora condenar o anti-semitismo e arvorar-se em campeão da luta contra o anti-semitismo. É o descaramento de quem beatificou Pio IX que chamava «cães» aos judeus e protagonizou um dos mais ignóbeis actos de anti-semitismo. Pio IX foi cúmplice no rapto de um menino judeu de seis anos, Edgardo Mortara, sob o pretexto de ter sido baptizado in extremis por uma criada, após o nascimento. Foram impotentes os pais para recuperar o filho raptado pela polícia papal e de nada valeu a indignação mundial. Encarcerado num mosteiro terá acabado por ser ordenado padre.

S. João Crisóstomo considerava bordéis as sinagogas e o imperador Constantino odioso o povo judeu.

O zelo canónico posto pelos cruzados na sua exterminação, à ida e à vinda da Terra Santa ficaram como marco indelével da crueldade racista e religiosa.

Não foram os nazis os primeiros a instituírem o gueto e a obrigarem os judeus ao uso de um distintivo amarelo. Coube ao Papa Paulo IV, no séc. XVI, essa infâmia.

A oração pelos «pérfidos judeus», que fazia parte da liturgia da Sexta-feira Santa do Missal Romano, manteve-se depois do holocausto. Foi João XXIII que acabou com essa devota manifestação de ódio.

Quem protegeu proeminentes nazis procurados por crimes contra a humanidade e lhes facilitou refúgio nas ditaduras sul-americanas de forte influência católica?

Deixemos, por hoje, o papa de Hitler. Pio XII merece centenas de artigos.

28 de Janeiro, 2005 jvasco

Transexualidade

Filipa, filha de Nené, ex-futebolista do benfica, nasceu com corpo de rapaz. Após anos de luta conseguiu fazer uma operação para mudar de sexo. Hoje é manequim.

Este é um caso recente, mas não é o único. Filipa teve a sorte de ter sido apoiada pelos pais, que compreenderam a sua situação e tentaram ajudá-la da mehor forma.

Nem sempre é assim…

E se a intolerância para com estas sistuações poderia existir independentemente da religião, a verdade é que as religiões do livro têm um impacto social tal que agrava seriamente o drama vivido pela Filipa e por outras e outros que vivem situações similares.

E se as religiões na actualidade deixassem de dar sentenças sobre as opções particulares das pessoas (seja a respeito do preservativo, do casamento homossexual, da transexualidade ou de muitas outras questões), ao invés de fazer tudo para impedir, mesmo a quem não é crente, de viver a sua vida como quer (o caso espanhol em relação ao casamento homossexual é exemplar a esse respeito)?

Curiosidade engraçada: vejam os primeiros cerca de 40 comentários à notícia (os que lá estavam na altura que coloquei este artigo), e observem o único comentário intolerante face à decisão da Filipa. Eu sei que nem todos os crentes são assim, mal seria. Mas não deixa de ser curioso 🙂

Agradeço ao João Paulo, da lista despertar, a informação sobre esta notícia.

27 de Janeiro, 2005 Palmira Silva

A religião e o holocausto: I

« The Government, being resolved to undertake the political and moral purification of our public life, is creating and securing the conditions necessary for a really profound revival of religious life (…) The national Government regards the two Christian confessions as the weightiest factors for the maintenance of our nationality. It will respect the agreements concluded between it and the federal States. Their rights are not to be infringed.(…) The Government of the Reich, which regards Christianity as the unshakable foundation of the morals and moral code of the nation, attaches the greatest value to friendly relations with the Holy See, and is endeavoring to develop them..»

– Adolf Hitler, discurso no Reichstag em 23 Março de 1933

Um post do Carlos criou veementes protestos, nomeadamente a acusação de mistura de alhos com bugalhos, ou seja, a mistura da religião católica com o horror do Holocausto. Na realidade acho que o post do Carlos nos recordou quão fácil é usar a religião para os mais ignóbeis fins. E é um alerta para que os eventos que tão tristemente relembramos hoje não se venham a repetir. A intolerância disfarçada com as roupagens da fé não deixa de ser intolerância mas é certamente mais «aceitável» para os crentes. Porque acima da razão e da crítica deve estar a obediência a Deus e aos seus representantes na Terra, os exegetas que interpretam à sua conveniência os textos ditos «sagrados».

As causas da II Guerra são, como é óbvio, complexas e diversas mas não devemos ignorar o papel desastroso que a religião teve nos acontecimentos que culminaram no Holocausto. O ódio de Hitler pelos judeus foi incutido pela sua religião, a visão exegética da religião católica dominante, e reforçado pela cultura germânica da época. A sua obsessão pela exterminação dos judeus, o «eixo do mal» para Hitler, era a sua forma de realizar o trabalho de Deus. Muitos altos dignitários das igrejas cristãs viam o trabalho de Hitler, não só na eliminação dos judeus mas também no combate ao comunismo soviético, como divinamente inspirado. Os nazis apresentavam-se como mais que um partido político, como um movimento que pretendia abranger todos os aspectos da vida quotidiana, em que a religião tinha um papel preponderante. O próprio Hitler usa a sua fé católica como inspiração para os seus inúmeros discursos, para o «Mein Kampf» de triste memória e como justificação para todo o mal que cometeu.

O Holocausto foi aceite sem grande contestação pelo povo alemão porque foi precedido por uma intoxicação da opinião pública contra os judeus por parte não só da propaganda nazi, como das igrejas protestantes, e por partidos católicos na Áustria e na Alemanha. Com o beneplácito da Igreja de Roma, como veremos no post seguinte.

A laicidade na Alemanha nunca foi sequer considerada antes da segunda guerra mundial. Por exemplo, os jovens que se formavam nas Escolas Militares alemãs do final do século XIX juravam obediência a Deus e ao Kaiser. Aliás é essa promiscuidade, a aliança entre a Igreja – Estado na Alemanha que inspira Nietzsche para o seu livro «O Anticristo». Mas um factor decisivo foi a celebração, em 1917, do quarto centenário das Teses de Martinho Lutero. O evento, infelizmente, tornou-se um veículo de idolatria de Lutero como um herói alemão, encarnando o espírito germânico. O anti-semitismo manifestado por Lutero foi assim facilmente utilizado na cooptação da Igreja Protestante como instrumento do Estado nazi.

Em 1920, o Partido dos Trabalhadores Alemães, precursor do Partido Nacional Socialista, adoptou um manifesto de 25 pontos, obviamente anti-semita, que limitava a liberdade religiosa, permitindo-a apenas na medida em que não ferisse os sentimentos raciais alemães, adoptando o que foi chamado de «Cristianismo Positivista».

Em 1928 surgia o movimento do Cristianismo Germânico, associado às Igrejas Protestantes da Alemanha, oficializado posteriormente em 1932. O líder do movimento era o Pastor Ludwig Muller, o chefe da Gestapo a partir de 1939, investido bispo da Igreja do Reich em 1933.

Em Julho de 1933, o Cristianismo Germânico ganhou as eleições nas igrejas protestantes com 70% dos votos e elaborou uma proposta de constituição para uma nova Igreja do Reich, muito desejada por Hitler, formada por todas as 28 igrejas regionais protestantes, reconhecida oficialmente pelo Reichstag em 14 de Julho. Da facção perdedora,o Evangelho e a Igreja, emergiram os religiosos que se opuseram a Hitler, que são agora usados como confirmação da oposição das Igrejas a Hitler, quando na realidade eram apenas uma honrosa minoria.