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23 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

A canonização de Nuno Álvares Pereira

Como o Diário Ateísta tinha previsto, e escrito, estava encomendado o milagre para elevar o beato Nuno Álvares Pereira à santidade. Desta vez não é de borla, precedente aberto para com os pastorinhos de Fátima, mas será fácil ressarcir a Igreja portuguesa do numerário esportulado por tão boa causa com a venda de artigos religiosos. O novo santo, não sendo conhecido no ramo, é todavia muito popular, como herói, nos manuais escolares do ensino básico.

Em rigor, segundo afirmou o patriarca Policarpo, que tem muito mais confiança nos santos cuja vida se esqueceu, do que naqueles cujas patifarias ainda estão frescas, Nuno Álvares Pereira não precisava de obrar nenhum milagre, pois já é considerado santo pelo povo português há mais de 200 anos, o que lhe permitiria a elevação administrativa.

Mas sabe-se como a ICAR é exigente nesta questão dos milagres. Ou há milagre a sério ou vai-se a santidade. Neste caso apareceram em pouco tempo sete milagres, ramo a que o Beato Nuno nunca se tinha dedicado. Durante séculos esteve a apodrecer inutilmente sem aliviar um desgraçado de uma moléstia para se redimir dos castelhanos que matou sem zelo religioso, na defesa de vários condados e numerosas mordomias que a vitória em Aljubarrota lhe granjeou.

Assim, no próximo mês de Março, dos «sete possíveis milagres» vai ser enviado o que a Congregação para as Causas dos Santos escolheu, por ser mais fácil de provar. Trata-se do processo de cura do olho esquerdo (se fosse o direito tinha o mesmo valor) de uma mulher residente em Ourém, que ficou queimado com óleo que saltou de uma frigideira a ferver. Já existem vários documentos médicos que confirmam a doença e a cura, «inexplicável segundo a ciência», de acordo com o descaramento da ICAR.

Apostila 1 – A Ordem dos Médicos e o Ministério Público não investigarão eventuais falsas declarações.

Apostila 2 – A Associação de Produtores, Exportadores e Vendedores de Azeite (APEVA), apesar do azedume por o milagre ter tido origem com óleo, desiste de reivindicar a queimadura com azeite, para não atrasar a elevação do Condestável à santidade.

23 de Fevereiro, 2005 Mariana de Oliveira

Não ao monopólio

O Supremo Tribunal de Justiça alemão considerou improcedente o pedido da diocese de Karlsruhe que reclamava a proibição do título da colecção «Pro Fide Catholica», de uma editora bávara que publica livros críticos para a Igreja. Nesta colecção publicaram-se livros como «Karol Woityla als Familienvater» («Karol Woityla como pai de família») e «Falsche und Echte Papstweissagungen» («Predições papais verdadeiras e falsas»).

Aquele tribunal superior decidiu que a Igreja apenas tem o direito de reivindicar o uso da palavra «católico», tanto em alemão como em latim, quando esta é referida à denominação de instituições e a actos eclesiásticos.

Assim, os juízes entenderam que a ICAR não tem o monopólio sobre o termo em questão. Portanto, na Alemanha, poder-se-á recorrer à designação «católico» à vontade sem correr o risco de se ser perseguido judicialmente por «violação da marca registada».

22 de Fevereiro, 2005 pfontela

O crime do padre

Um novo filme de Bollywood (a Hollywood Indiana) está sob ataque de grupos católicos. O filme aborda a relação amorosa de um padre com uma rapariga com metade da sua idade e, como não podia deixar de ser, a reacção do sector católico foi a habitual – gritos de «Heresia» e «Blasfémia».

Segundo Joseph Dias, o secretário geral do fórum secular católico (dado o carácter do Vaticano o nome do fórum só pode ser uma piada), a religião é algo de pessoal e que não pode ser usado para divertimento ou fins comerciais (já estou a ver a máquina de fazer dinheiro que é Fátima a ser desmontada…). Em resumo: a única coisa que salvou o filme foi o facto de a esmagadora maioria da população indiana não ser cristã.

É preocupante o número cada vez maior de crentes (dirigidos pelas respectivas hierarquias) que pede o regresso da figura do censor religioso. A livre expressão saiu-nos muito cara. Seria de esperar que mesmo os crentes a valorizassem mais, parece que a sua memória é cada vez mais selectiva.

21 de Fevereiro, 2005 Palmira Silva

O Papa ensandeceu!

Monty Python, «The meaning of Life»

O último livro do Papa João Paulo II, a publicar na quarta feira pela editora do costume, a Rizzoli, e que reflecte a obsessão deste Papa em acabar com a laicidade, está já a levantar celeuma e protestos um pouco por todo o mundo. E suponho acabar por revelar-se contraproducente para os objectivos de uma Igreja de Roma que não se contenta em ditar normas anacrónicas para os seus crentes e que quer estender tentáculos de poder a todos. O tiro no pé reside na comparação, ignóbil e insane, entre o Holocausto e o aborto e na condenação da democracia.

Na sua ânsia em mostrar que os ditames da Igreja devem estar subjacentes ao Direito, obviamente não laico, e em atacar acefalamente a democracia, não ratificada pelas «leis divinas», João Paulo II escreve que «It was a legally elected parliament which allowed the election of Hitler in Germany in the 30s. The same Reichstag gave Hitler the power which opened the way for the political invasion of Europe, the creation of concentration camps, the introcution of the so-called ‘final solution’ to the Jewish question which led to the extermination of millions of sons and daugthers of Israel.».

Assim, depois de afirmar que não aceitar os ditames dos Evangelhos é uma nova forma de totalitarismo e que este novo totalitarismo está «insidiously hidden behind the appearance of democracy», conclui que «We have to question the legal regulations that have been decided in the parliaments of present day democracies. The most direct association which comes to mind is the abortion laws …». Acrescentando que «Parliaments which create and promulgate such laws must be aware that they are transgressing their powers and remain in open conflict with the law of God and the law of nature.»

Claro que o piedoso Papa se esqueceu de mencionar que Hitler chegou ao poder com o precioso auxílio do Partido Católico, Zentrum, liderado pelo monsenhor Klaas, que foi íntimo colaborador de Eugenio Pacelli (depois papa Pio XII) nos anos 20 e de outros partidos cristãos tal como manifestou o pio Pacelli depois das eleições para o Reichstag em 1932 «É expectável e desejado que, como o Zentrum, e o Bavarian People’s Party, assim também os outros partidos que se sustentam nos princípios cristãos e que agora incluem também o Partido Nacional Socialista, nesta altura o partido mais forte no Reichstag, usarão todos os meios de forma a impedirem a bolchevização cultural da Alemanha, que está em marcha pelo mão do Partido Comunista.»

Para além deste branqueamento imperdoável do papel dos partidos cristãos em geral e católicos em particular na ascensão ao poder de Hitler, o Papa dos cristãos menoriza de uma forma vergonhosa o genocídio nazi, insulta, com a habitual e expectável tolerância cristã, todos os que não consideram sagrado um óvulo fertilizado ou um embrião, chamando-lhes implicitamente neo-nazis. Claro que o insulto explícito a todas as mulheres que alguma vez abortaram apenas segue a norma de uma Igreja misógina que ainda hoje considera que a mulher se deve remeter a um papel menor como expiação do pecado original de uma Eva que a ciência já provou nunca ter existido!

Quero ver o que será dito amanhã na conferência de Imprensa convocada para apresentar o livro! Não podem imputar o imperdoável dislate a delírios provocados pela doença de Alzheimer já que no mês passado o insigne Cardeal de Colónia, Joachim Meisner, fez exactamente a mesma comparação, acrescentando à lista Stalin e Herodes, por mercê da sua mítica matança de recém-nascidos (que a História desmente!

21 de Fevereiro, 2005 Ricardo Alves

O que é uma seita?

Ninguém declara espontaneamente que o seu grupo religioso é uma seita. Seitas, para qualquer crente, são sempre outras religiões (ou algumas das outras), necessariamente condenáveis. O problema é que aquilo que se condena existe muitas vezes na religião de quem condena. Ser seita ou religião depende do ponto de vista.
Se não, vejamos: a palavra «seita» é usada habitualmente, por crentes ou ateus, em duas acepções.
Numa primeira acepção, mais abrangente, uma seita é qualquer grupo que disside da religião maioritária num dado local e momento histórico, geralmente seguindo um líder carismático. Nesse sentido, quase todas as religiões são seitas, embora umas tenham tido um sucesso maior do que outras. O cristianismo, por exemplo, será uma seita que dissidiu da religião judaica seguindo JC (na versão eclesial e mítica) ou Paulo de Tarso (na versão céptica, e dado que não existem provas históricas da existência de JC). Recorde-se que o islão foi tratado de «seita maometana» pelos cristãos pelo menos até ao século 16, e que as «seitas protestantes» (que seguiam Lutero,Calvino, etc.), dado o seu sucesso, passaram rapidamente a ser referenciadas como religiões. No entanto, dada a carga pejorativa associada ao termo, o seu uso deixa de ser corrente quando o número de seguidores e a continuidade histórica de um grupo religioso lhe conferem «respeitabilidade». Todavia, embora seja pouco comum, é estritamente correcto afirmar que o catolicismo é uma seita (de sucesso) e não é impossível que a IURD ou a Igreja Maná deixem de ser referidas como «seitas» num futuro mais ou menos próximo.
Numa segunda acepção, mais restrita, uma seita é um grupo religioso que exerce um controlo apertado sobre os seus seguidores. Esta definição é mais vaga do que parece, pois quase todas as religiões exercem, de alguma forma, controlo sobre os seus membros, estando as diferenças no grau de controlo. O catolicismo tem uma vasta gama de preceitos para os seus seguidores, e através (por exemplo…) da confissão, verifica se os seguem. No entanto, sente-se actualmente a necessidade de usar um termo (e em português tem sido «seita») para grupos mais fechados, que controlam mais aspectos da vida dos indivíduos e dos quais, portanto, não se sai facilmente. Ao contrário do que se pensa, estes grupos, incluindo os que conseguem levar alguns dos seus membros ao suicídio (Templo do Sol, Porta do Céu, Al-Qaeda) não são, historicamente, uma novidade. Existe muita discussão sobre se se deve ou não controlar as actividades destes grupos. Alguns países elaboram relatórios oficiais que pretendem alertar os seus cidadãos para o «perigo» destes grupos que efectuam «lavagens cerebrais» e que exigem aos seus membros a ruptura dos laços sociais (familiares ou profissionais). E no entanto, quase todas as religiões apelam a um «renascer» que pode ser olhado como «formatação mental», e quase todas exigem alterações na vida dos seus seguidores. As diferenças são de grau ou de modo.

Uma seita pode ser, portanto, qualquer grupo religioso que induza os seus membros a fazer algo que eu não aprovo. O que dá para tudo.

21 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

Paulo Portas fala com Deus

«Pedi a Deus que me fizesse ver o tempo em que devia sair».
(Declarações de Paulo Portas no rescaldo da derrota eleitoral de ontem, em que anunciou a sua demissão de presidente do CDS/PP)

Nada disse sobre quando, como e onde teve a referida conversa.

Presume-se que terá sido durante a missa privada à irmã Lúcia ou na missa em que participou entre o acto de votar e o anúncio dos resultados eleitorais.

Fica por explicar por que motivo não falou com Deus antes de ter ido para o Governo.

21 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

O embuste de Fátima

Vale a pena ler o artigo do «Público», de Luís Filipe Torgal, sobre os depoimentos contraditórios da irmã Lúcia sobre as «aparições de Fátima».
A canhestra montagem dos milagres é demasiado vulnerável mas a farsa precisa de ser desmascarada. É uma obrigação cívica e o contributo necessário para a erradicação da superstição, do atraso cultural e da exploração de populações crédulas pela cupidez da Igreja católica.

20 de Fevereiro, 2005 Mariana de Oliveira

O verdadeiro problema do Islão

Hugo Macedo deixou-nos uma sugestão de leitura imperdível: a entrevista de Faouzi Skali ao «Público».
«Faouzi Skali», lê-se no artigo, «52 anos, sufi, antropólogo e professor da Universidade de Fez, em Marrocos, é o fundador e director do Festival das Músicas Sacras do Mundo, e foi eleito pela ONU, em 2001, como uma das 12 figuras mundiais que mais contribuíram para o diálogo entre culturas e civilizações. O seu actual projecto é criar em Fez um centro de diplomacia intercultural e inter-religiosa, aberto a todas as culturas do mundo. É autor de diversas obras sobre o sufismo».

Nesta entrevista, Skali explica o que é o sufismo e fala sobre os problemas do Islão, nomeadamente da promiscuidade entre a religião e a política – que, a seu ver, «hoje, o verdadeiro problema no mundo muçulmano é definir a relação entre religião e política» -, do terrorismo islâmico e da relação com o Ocidente.

Pela análise equilibrada, de um ponto de vista de um muçulmano, do que se passa no mundo é um texto que vale a pena ler.

20 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

A dança da chuva no Santuário

Com eficácia superior às danças dos índios, a ICAR, atenta à calamidade da seca, já tomou a decisão de resolver o problema. Um crucifixo em bom estado de conservação, um turíbulo experimentado, velas de tamanho adequado e uma oração com provas dadas são garantia do êxito que um dia virá.
Para que os créus que nos visitam possam aumentar a eficácia das manobras em curso no Santuário de Fátima, aqui deixamos a «Oração para pedir chuva» esperando que Deus, perante tamanha devoção, não exagere a graça e prejudique ainda mais a difícil situação.

Oração para pedir a chuva – no final do Rosário no Santuário de Fátima:
«Como o nosso país está a viver um período de seca prolongada, o Santuário de Fátima decidiu passar a rezar uma oração para pedir a bênção da chuva para o país. A prece será feita no final de cada recitação do Rosário neste santuário mariano.
Será rezada a oração do Papa Paulo VI, composta em 1976, quando se abateu sobre o continente europeu um período de seca prolongada.

Oração
Deus, nosso Pai, Senhor do Céu e da terra
Tu és para nós existência, energia e vida.
Criaste o homem à Tua imagem
a fim de que com o seu trabalho ele faça frutificar
as riquezas da terra
colaborando assim na Tua criação.

Temos consciência da nossa miséria e fraqueza:
nada podemos fazer sem Ti.
Tu, Pai bondoso, que sobre todos fazes brilhar o sol
e fazes cair a chuva,
tem compaixão de todos os que sofrem duramente
pela seca que nos ameaça nestes dias.
Escuta com bondade as orações que Te são dirigidas
com confiança pela Tua Igreja,
como satisfizeste as súplicas do profeta Elias
que intercedia em favor do Teu povo.

Faz cair do céu sobre a terra árida
a chuva desejada
a fim de que renasçam os frutos
e sejam salvos homens e animais.

Que a chuva seja para nós o sinal
da Tua graça e da Tua bênção:
assim, reconfortados pela Tua misericórdia,
dar-te-emos graças por todos os dons da terra e do céu,
com os quais o Teu Espírito satisfaz a nossa sede.

Por Jesus Cristo, Teu Filho,
que nos revelou o Teu amor,
fonte de água viva, que brota para a vida eterna.
Amen».

19 de Fevereiro, 2005 Carlos Esperança

Dilúvio da modernidade

Por mais que a comunicação social se esforce por explicar cientificamente como se forma um maremoto e por mais difícil que seja, para quem tem parcos conhecimentos na matéria, compreender o fenómeno, que se revela tão devastador, não passa pela cabeça de um cidadão equilibrado que a tragédia recente, ocorrida em países do Índico, possa ser da responsabilidade de um deus facínora, vingativo e cruel.

Todavia, em Marrocos, movimentos islamistas com representação parlamentar acreditam, e obrigam a acreditar, que Deus enviou o maremoto como castigo e até conhecem as motivações divinas: o turismo sexual. Não importa que a devastação tenha chegado a lugares onde tal turismo não exista, são efeitos colaterais de um advertência divina contra os pecados humanos que Deus não abdica de castigar.

O aproveitamento da ignorância e a exploração do medo é um hábito ancestral do clero que a humanidade, na sua difícil e penosa caminhada para o espírito científico, tem sabido combater. Desde o dilúvio às pragas, dos terramotos às epidemias, da lepra à guerra, das doenças à condenação ao inferno, o castigo divino é uma arma que as religiões usam para transformar os homens num bando de beatos, tímidos e assassinos.

Nada há mais irracional do que o julgamento religioso, mais violento do que o critério divino interpretado pelos seus padres, mais sórdido do que os castigos infligidos para agradar a Deus. Ontem matavam-se judeus por causa da usura, as bruxas pelo mau olhado, os infiéis pelo falsidade da sua religião. Já em Sodoma e Gomorra, Deus não suportou a felicidade dos seus habitantes e arrasou as cidades. Hoje os seus clérigos viram as populações analfabetas e crédulas contra as prostitutas, os homossexuais e quaisquer outros onde a violência possa exercer-se para fazer catarse do sofrimento e da miséria.

A religião é uma pandemia planetária, cruel, perversa e mentirosa.