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11 de Abril, 2005 Mariana de Oliveira

E, assim, acontece

Depois de, na passada sexta-feira, os peregrinos presentes nas cerimónias fúnebres de João Paulo II terem reclamado a sua imediata beatificação, os «milagres» não demoraram a ser noticiados.

Uma família mexicana afirma que o falecido papa curou miraculosamente o seu filho, que sofria de leucemia, em 1990. Cura milagrosa esta apoiada pela diocese de Zacatecas, no Norte do México. O rapaz, agora com dezanove anos, Heron Badillo diz que está convencido «de que foi um milagre». «Sua Santidade tocou-me a face, e fez-me baixar a cabeça. Eu tinha quatro anos e estava muito doente, mas fui salvo». Segundo o que se conta, a família de Heron ter-se-á aproximado de João Paulo II no aeroporto de Zacatecas por intermédio do bispo da diocese, Javier Lozano Barragan. «Ele estava gravemente doente, o médico já o havia condenado, mas eu tinha esperança que a visita do Papa o pudesse salvar. E foi isso que se passou», explicou o pai de Heron.

O outro milagre foi visto pelo secretário pessoal do ex-papa, Stanislav Dziwisz. De acordo com este senhor, João Paulo II terá salvo um americano que sofria de um tumor no cérebro administrando-lhe a comunhão. Ainda para mais, o curado não era cristão, mas sim judeu.

A beatificação de João Paulo II – que, seguramente, será célere – será muito conveniente para a Igreja Católica uma vez que imortalizará toda a propaganda com que fomos bombardeados na semana passada e que fez passar a imagem de que o antigo papa foi uma figura que trouxe progresso e felicidade para a Humanidade… o que é, no mínimo, controverso.

11 de Abril, 2005 Carlos Esperança

Habemus Pontificem

Agora que terminou o circo mediático em volta das exéquias fúnebres do Papa JP2, a ICAR prepara o lançamento do próximo.
Desta vez o Papa morreu de morte natural, não há a falência do Banco Ambrosiano a comprometer a Cúria romana e o arcebispo Marcinkus, que financiou a candidatura de Karol Vojtyla através do banco do Vaticano, encontra-se esquecido numa diocese americana fugido à justiça italiana com a cumplicidade de JP2 que negou a extradição do seu antigo protector.

O Espírito Santo está de férias e o Opus Dei encontra-se no centro da intriga, dos golpes e influências que hão-de levar o colégio cardinalício a entregar o poder nas mãos do novo papa, sem que qualquer escândalo se vislumbre no horizonte. O consumo de cereais para o fabrico de hóstias baixou drasticamente.

Os conclaves têm histórias pouco edificantes e duração indeterminada. Júlio II foi eleito após algumas horas. Para eleger Gregório X o conclave arrastou-se 1095 dias. Desta vez não se prevê grande demora e é provável que no dia 18 próximo seja escolhido o novo gerente porque há negócios urgentes da ICAR à espera de despacho.

Dos 117 cardeais que vão sentar-se na Capela Sistina apenas três não devem o barrete cardinalício a JP2 que foi substituindo os que eram abatidos ao activo por bispos dóceis, conservadores e subservientes. A ICAR de hoje é mais monolítica do que a que Wojtyla confiscou em seu proveito para maior glória de Deus e proveito do Opus Dei, de quem fez prelatura pessoal, e de outras seitas mais ou menos fanatizadas.

Os órfãos de JP2, que tanto choraram o defunto, serão os mais histéricos a manifestar o júbilo pelo seu sucessor, cujo perfil é o seguinte:

Católico do sexo masculino, cardeal, sem escândalos públicos ou vícios conhecidos, bem visto pela prelatura Opus Dei, preferencialmente italiano, conservador, poliglota e que finja acreditar em milagres e aparente acreditar em Deus.

Habemus Pontificem.

10 de Abril, 2005 pfontela

Dúvidas

Uma peça de teatro, de nome «Doubt» (Dúvida), que tem como pano de fundo o drama de uma freira que tem que decidir se deve ou não denunciar um sacerdote católico que ela acredita abusar rapazes ganhou o famoso prémio Pulitzer. No relatório encomendado pela ICAR no ano passado foi tornado público que nos últimos 50 anos mais de 4000 sacerdotes foram acusados de abusos sexuais, sendo que no total estariam envolvidas cerca de 10000 crianças. Na segunda metade deste período JP2 esteve à frente da ICAR como monarca absoluto e fez pouco ou nada para impedir estes crimes ou trazer justiça às vítimas.

Actualização: de notar que um dos escolhidos pela cúria para fazer as exéquias do papa foi o cardeal Law (responsável pela ocultação de casos de abuso). A cúria falou.

10 de Abril, 2005 Palmira Silva

Evolução ou regressão?

«Se me perguntarem qual é a minha convicção mais íntima sobre o nome que será dado a este século, se será ‘século do ferro’, do ‘vapor’ ou ‘da electricidade’, responderei sem hesitar que será chamado o século da visão mecanicista da natureza, o século de Darwin».
Ludwig Boltzmann (1844-1906), que estabeleceu a Mecânica Estatística e sistematizou o conceito de Entropia, formulando uma interpretação estatística para a 2ª Lei da Termodinâmica, aquela que os criacionistas alegam insistentemente inviabilizar a evolução biológica.

O fundamentalismo cristão que ressurge um pouco por todo o mundo ocidental tem como principal inimigo a abater o ateísmo e aquilo que descrevem como perigosas ideias ateístas, nomeadamente o que é designado por muitos o mito da Criação ateu, isto é, o evolucionismo. Os criacionistas, que aparentam nutrir um grande pavor pela realidade inegável da evolução biológica e se lançaram numa cruzada anti-evolucionista, tentam manipular conceitos científicos de forma a verem satisfeitos aos seus dogmas. As principais «teorias» criacionistas já foram amplamente abordadas no Diário Ateísta, mas, em benefício dos nossos leitores mais recentes, apresento alguns dos posts sobre o assunto no final deste.

O grande problema dos criacionistas reside no facto de que o trabalho teológico que tentam apresentar como científico não é reconhecido pela comunidade científica e é sistematicamente recusado quando o submetem à avaliação dos pares em qualquer revista científica. Claro que para os criacionistas os culpados são os pares que, segundo um estudo publicado em 1998 na revista Nature, são esmagadoramente ateus ou agnósticos. Dos cientistas inquiridos, membros da Academia National de Ciência dos Estados Unidos, apenas um pouco mais de 7% declararam acreditar na existência de Deus. Não conheço estudos análogos realizados noutros países mas os autores do livro «The Psychology of Religious Behaviour, Belief and Experience» Benjamin Beit-Hallahmi e Michael Argyle mencionam que a ausência de crença nos laureados com o Nobel, quer em ciência quer em literatura, é muito elevada.

Uma vez que não conseguem negar as evidências científicas e refutar o evolucionismo, os fanáticos fundamentalistas tentam evitar a exposição da população em geral à verdade científica que derruba muitos dos pilares em que assentam as três religiões do livro: a criação do homem (e da mulher a partir do homem, que assim tem um papel subserviente ditado pelo Criador) e o pecado original. Em muitos estados dos Estados Unidos foi retirado o evolucionismo dos curricula escolares ou é apresentado como uma teoria alternativa ao criacionismo. Na Flórida saiu recentemente uma lei em que um professor que fale da evolução pode ser processado pelos respectivos alunos.

Para além, claro, de anatemizarem toda a investigação científica que possa conduzir a resultados desastrosos para os prosélitos da fé. Nomeadamente retirando financiamento para projectos científicos perigosos para a fé e multiplicando-se os apoios, estatais e privados, para projectos pseudo-científicos que reforçem os dogmas religiosos.

E para quem pensa que estas anormalidades fundamentalistas só acontecem nos Estados Unidos recordemos que Silvio Berlusconi queria retirar o evolucionismo dos curricula escolares e só cedeu depois de uma semana de protestos massivos e que na Sérvia, sob os auspícios da ministra da Educação Ljiljana Colic, o ensino da evolução esteve suspenso por uma semana por uma determinação ministerial que apenas o permitia se em paralelo fosse ensinado o criacionismo.

O quadro negro do desenho inteligente
Os dinossauros de Deus
De volta ao Genesis
Ainda o princípio antrópico, I: pescadinha de rabo na boca
Ainda o princípio antrópico, II: a posição «cientificamente correcta»

9 de Abril, 2005 Carlos Esperança

A aldrabice da fé e a fé de um aldrabão

Um dia andava Deus na sua divina ociosidade e pensou em seu pensamento: «O Diário Ateísta diz mal de Mim e dos empregados que tenho em comissão de serviço no planeta Terra». E o senhor Deus, habituado à ociosidade, com pouca imaginação, pensou, pensou e nada lhe ocorreu para pôr cobro à liberdade de expressão. Apenas sentiu um desejo de vingança para fazer jus às características com que os homens o criaram.

Passou então pelo Céu o Papa recém falecido, curvado das genuflexões, com um odor pestilento a incenso, a rezar continuamente, e o Senhor lhe disse: «acaba lá com essas rezas e deixa-me pensar». E, enquanto o senhor Deus continuava no penoso sacrifício de pensar, lembrou-se o Papa recém falecido de perguntar o que apoquentava Deus.

Foi então que Deus pensou fazer uma viagem de Vespa (uma moto muito popular nos anos sessenta do século passado) e lhe disse: «Arranja-me uma Vespa». Como o Papa era muito piedoso e julgava que Deus era o criador do Céu e da Terra queria ir buscar-lhe algo mais precioso e pediu a um Papa mais antigo que ajudasse a demover o Senhor de um pedido tão modesto e o convencesse a pedir algo de mais valioso.

Quando o Senhor viu o Papa recém falecido acompanhado do Papa mais antigo, exclamou: «Como estás senil! Pedi-te uma Vespa e trazes-me uma besta!». Nisto, o senhor Deus lembrou-se de que uma besta era o que lhe convinha. Não podendo mandar à Terra um cadáver com muitos anos, por causa do cheiro e do aspecto, lembrou-se de uma besta muito devota, que vivia em Portugal, e deu-lhe a seguinte inspiração:

«Vai ao Diário Ateísta, usurpa a identidade e o endereço dos colaboradores e confunde os visitantes. Não preciso de dizer o que hás-de escrever. És suficientemente néscio para não precisares de mim. Os ateus não se deixam enganar mas os crentes confundem-se e continuam a acreditar que Eu existo». E o estulto foi e fez o que o Senhor lhe disse. E ainda julgou ouvir:

«Em verdade, em verdade te digo: bem-aventurados os pobres de espírito».

9 de Abril, 2005 Carlos Esperança

O legado de João Paulo II

A morte não é a benzina que apaga as nódoas. Não é falta de respeito criticar Hitler, Stalin, Franco, Mussolini, Pio IX, Khomeini, Brejnev, Salazar ou João Paulo II. Como não será crime condenar amanhã Pinochet, Saddam ou Bin Laden.
A bondade das pessoas não está à mercê dos decretos pontifícios ou das opiniões dos poderosos. A voz pública não coincide obrigatoriamente com a que se publica.

Após o último comício realizado sob os auspícios de JP2 que, nem no funeral, prescindiu dos banhos de multidão com que alimentou o narcisismo e promoveu a religião que administrava, há multidões de órfãos que em breve ultrapassarão o luto com o novo «pai» que os cardeais, iluminados pelo Espírito Santo e influenciados pelo Opus Dei, lhes vão arranjar.

Contrariamente ao meu amigo e companheiro do Diário Ateísta, João Vasco, não registei no longo e autoritário pontificado de JP2 aspectos positivos. No entanto, há coisas boas que deixa – uma igreja monolítica que, após o autoritarismo, tem tendência a desagregar-se; santos em tanta quantidade que vai ser fácil desmascarar o passado pouco glorioso e recomendável de muitos deles; milagres a rodos cuja puerilidade vai fazer corar de vergonha os crentes pensantes; o ressentimento dos teólogos e dignitários católicos que amordaçou e cuja pressão vai destapar a panela fechada por JP2, com a ajuda da Cúria.

JP2 foi um misto de estrela pop e de aldrabão de feira. Virou os holofotes todos para si. Foi o eucalipto que secou tudo à sua volta. Veremos como os próximos tempos serão tempo de desagregação e de lutas dentro da ICAR. Nem tudo é mau, de facto.

O erro que mais frequentemente se comete é ver em JP2 o Papa do diálogo ecuménico. Ele não procurou reconhecer a verdade dos outros, apenas tentou hegemonizar a sua. Nunca defendeu a liberdade de crer e de não crer, só quis o regresso a um tempo em que era perigoso não acreditar. Desde a morte de Pio XII que a ICAR nunca mais tinha proibido um livro. Voltou a censura com JP2. Ele nunca foi um arauto da liberdade, apenas foi um adversário de alguns tipos de ditaduras. O pretenso diálogo não resultou da bondade e da tolerância, estabeleceu-se na base dos preconceitos misóginos, autoritários, homofóbicos e de ânsia do poder clerical. Foi isso que aproximou os clérigos das religiões do livro em luta contra o livre-pensamento e a laicidade.

JP2 deixa uma Igreja mais medieval, supersticiosa, fanática e troglodita do que a que herdou de João Paulo I, papa durante 33 dias, falecido na sequência do anúncio da fiscalização das contas do Banco do Vaticano, piedosamente chamado IOR (Instituto das Obras Religiosas). Alguém pergunta por que razão JP2 se negou a extraditar o arcebispo Marcinkus, presidente do IOR e arguido na falência do banco Ambrosiano? Quanto pagou o Vaticano por essa monumental burla e por que razão defendeu o cúmplice? Quem deu o dinheiro para as grossas indemnizações e acabou por tornar-se prelatura pessoal de JP2? Ou deveria o papa falecido chamar-se «(J)P-2»?

9 de Abril, 2005 jvasco

Sabotagem da livre-expressão

O Diário Ateísta existe há cerca de ano e meio, tendo vindo sempre a crescer significativamente. Até agora sempre mantivemos um sistema de comentários no qual não existia qualquer forma de censura. Crentes, ateus e agnósticos diziam tudo o que queriam, faziam as críticas que achavam devidas, participavam com mais ou menos nível. Gostaria tanto que o civismo de todos os participantes fosse, pelo menos, o suficiente para manter esse sistema indefenidamente…

No entanto, é triste que um comentador sem escrúpulos tenha decidido prejudicar o debate a todos. Alguém que não sabe argumentar, que não é capaz de exprimir os seus pontos de vista, mas que fica revoltado com a expressão daqueles que são diferentes dos dele, decidiu, em toda a sua intolerância, quebrar as regras mínimas que permitiam o diálogo entre todos.

Assim sendo, começou a assinar os seus comentários como «Carlos Esperança» e «Ana», para que todos pensassem que as ignomínias que escrevia eram da autoria de um membro do nosso blogue e de uma comentadora frequente.

É uma pena que nem todos saibam lidar com a liberdade de expressão.

8 de Abril, 2005 jvasco

O lado positivo do legado de João Paulo II

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Existe um lado positivo no legado de João Paulo II.

Não custa nada dizê-lo, e seria errado não o esperar. Afinal ele foi o líder de uma das mais poderosas instituições do planeta, com um impacto tão grande no resto da humanidade, que ao longo do seu longo pontificado fez muitas coisas boas e muitas coisas más. Afinal de contas, ao contrário daquilo que vários cristãos evangélicos acreditam, o Papa não é o anti-Cristo.

Então porque é que nós, os autores deste blogue, nunca escrevemos isso mesmo?
Pela minha parte, que até agora não escrevi nada sobre o Papa, desde que morreu, vejo uma razão óbvia: não é preciso. O lado positivo do legado de João Paulo II tem sido repetido até à exaustão pelos meios de comunicação social, numa fúria revisionista Orwelliana, esquecendo todos os aspectos negativos do seu legado.

É por essa razão que, neste blogue, se têm referido exclusivamente os negativos. Por uma questão de equilíbrio, de reposição da verdade, de ver ambos os lados da moeda. Queremos ser livres pensadores.

Não negamos, portanto, que João Paulo II tenha feito coisas positivas (um exemplo é a sua contribuição assinalável para o diálogo inter-religioso, que acaba por ser, indirectamente, uma contribuição louvável para a Paz)
Mas queremos que se fale sobre tudo: as coisas boas e as coisas más.

Queria deixar isto bem claro.

8 de Abril, 2005 Carlos Esperança

O gozo de Deus

Deus, a julgar pelo que dele dizem os padres, deve andar eufórico a rebolar-se de gozo no Paraíso. Já não lhe bastava a companhia das almas que conseguiu antecipar com terramotos, guerras e doenças que enviou à Terra, teve ainda o brinde suplementar de receber recentemente alguns dos seus filhos mais dilectos.

Fique o Paraíso onde ficar, já lá chegou a Irmã Lúcia, de quem a mãe de Jesus era visita frequente, o Papa JP2 que a comunicação social transformou num santo homem e o príncipe Rainier III que governou o Mónaco 55 anos sem ter de suportar o incómodo jacobino de eleições.

Por outro lado, a comunicação social rendeu-se aos encantos do cadáver do representante de JC na Terra. Exibiu tantos cardeais que fez da púrpura a cor da moda; ouviu tantos bispos e monsenhores que transformou a voz da ICAR na voz do povo; transmitiu tantas missas, orações, terços e novenas que o mundo trocou o trabalho pela oração e a razão pela fé.

A força da ICAR fez sentir-se nas excursões de devotos que se dirigiram a Roma com o zelo dos muçulmanos em relação a Meca. A ansiedade de tocar o ataúde do Papa polaco foi tanta quanto a sofreguidão dos judeus ortodoxos às marradas no Muro das Lamentações.

Há muito que não se gastavam tantas velas com um só defunto, que o barulho dos sinos não azucrinava tanto os tímpanos, enfim, há muito que Deus não incomodava tanto. Nós, os ateus, ficámos siderados com tamanha devoção. Quatro milhões de devotos a caminho de Roma, em homenagem ao Papa, ultrapassaram os três milhões de portugueses que rejubilaram com a vitória de um tal Castelo Branco num concurso educativo da TVI – «A Quinta das Celebridades» – canal que piedosamente foi concedido ao Patriarca de Lisboa e que as vicissitudes do mercado levaram, então, à falência.

Antigamente a ICAR convertia os relapsos com a ameaça do Inferno e o temor dos autos-de-fé. Hoje, atrai-os com o brilho dos espectáculos fúnebres que encena com meticulosa e garrida coreografia. São dois mil anos de manha posta ao serviço da sobrevivência e da conquista do poder. Deus, na sua inexistência, é um mero pretexto para o êxito do negócio.

8 de Abril, 2005 Carlos Esperança

A morte de Rainier III

A morte de JP2 prejudicou gravemente a projecção mediática de outro espectáculo fúnebre encenado para Rainier III.
O Diário Ateísta não pode deixar de registar a morte de «um príncipe de direito divino», como o próprio se considerava.
Não surpreende que, na ausência da democracia, quem manda se desculpe, admira que quem obedece aceite a justificação.

O Mónaco é um país a fingir onde o príncipe defunto tinha o poder a sério. Autoritário e carrancudo conseguiu fazer-se amar pelos súbditos (na monarquia não há cidadãos) a quem proporcionou um raro bem-estar graças à indústria bancária e aos lucros dos casinos, especialmente o de Monte Carlo.

É natural que um príncipe de origem divina tenha transformado o Mónaco num Paraíso…fiscal. Deo juvante (Com a ajuda de Deus) – divisa familiar dos Grimaldi -, governou os sete mil monegascos (cerca de 20% dos habitantes do principado) cujo bem-estar depende da falta de escrúpulos com que afluem dinheiros de origem duvidosa de todo o Planeta.

O Príncipe, grande amigo de JP2, de quem recebeu uma bênção especial poucos dias antes do abençoador e do abençoado morrerem, foi sempre um excelente católico, temente a Deus e cumpridor dos sacramentos. Deus, por sua vez, pagou-lhe a devoção em numerário pelo que deixa uma enorme fortuna.

Os filhos, Carolina, Alberto e Stéphanie, além da sólida educação católica, sofreram marcada influência das hormonas. Assim, além da eucaristia, que sempre frequentaram, não se furtaram aos prazeres da carne. A igreja e a enxerga alternaram, a piedade e a libertinagem conviveram e uma das filhas preferia ter no quarto o guarda-costas ao oratório.

Nota: O catolicismo é a religião de Estado no Mónaco de acordo com a Constituição de 1962, em vigor.