João Paulo II tornou-se intocável para o bando de beatos que lhe exaltam as virtudes que poucos notaram e lhe escondem os defeitos que todos viram.
O Papa retrógrado que se opôs ao planeamento familiar, que contribuiu para o avanço da Sida com a paranóica obsessão contra o preservativo, que odiou o sexo com o mesmo vigor com que Maomé perseguiu o toucinho, que ajudou a derrubar o muro de Berlim mas protegeu ditaduras de direita, esse Papa é hoje um santo proclamado por multidões histéricas à procura do sobrenatural.
O Papa que condenou a invasão do Iraque (o Papa da Paz, como é alcunhado), não condenou os Governos que a apoiaram onde se contavam os seus mais fiéis admiradores (Portugal, Espanha, Itália e Polónia). Não terá sido um caso de dupla personalidade ou mais uma manifestação da duplicidade habitual do Vaticano?
O Papa que discriminou as mulheres, silenciou teólogos, foi autoritário e absolutista, que procurou impor os seus preconceitos à humanidade, que combateu a laicidade, chamou loucos aos ateus e passou o pontificado em fanático proselitismo, defendeu sempre os seus bispos mais fanáticos e ostracizou os mais liberais.
Nestes dias que correm, entre os cardeais conciliares circulam mais intrigas do que hóstias, sussurram-se mais calúnias do que orações, nota-se mais a pesada mão do cardeal Ratzinger do que a leveza do voo do Espírito Santo.
Cada um dos cardeais está ansioso para que lhe saia o prémio que dará direito ao poder absoluto vitalício, aos permanentes microfones, aos banhos de multidão e a um enterro com milhões de pessoas a chorarem por contágio e desequilíbrio emocional.
A tiara pontifícia tem um estranho brilho e constitui uma obsessão cardinalícia mas os interesses políticos da seita pesam muito na escolha do premiado.
Para os mais beatos, que ficaram embevecidos com os cinco milhões de fiéis que foram a Roma certificar-se se JP2 tinha efectivamente deixado arrefecer o céu da boca, é bom lembrar que outros ditadores tiveram um enterro igualmente apoteótico:
José Estaline – 5 milhões; Ayatollah Khomeini – 5 milhões; Gamal Abdel Nasser – 5 milhões, enquanto Gandhi «só» teve 2 milhões e a lady Di se ficou por 1,5 milhões.
Fonte: Visão de 14-04-2005.
Claro que dos outros não há notícias de milagres, enquanto de JP2 há imensos, feitos à mão, com a hóstia ou com o simples olhar. Um taumaturgo dos diabos.
No Blasfémias, João Miranda interpela o Diário Ateísta sobre várias questões.
«Putting the smackdown on heresy since 1981»
O «papável» escolhido pela cúria romana para celebrar a missa realizada no funeral de João Paulo II, o honorável prelado à frente da ex-Inquisição, a Congregação da Doutrina da Fé, Cardeal Joseph Ratzinger, vai à frente nas intenções de voto do colégio eleitor. Aliás, já em Janeiro a revista Time indicava Ratzinger como o candidato com mais hipóteses. Descobri recentemente a página do seu clube de fãs, devotos e tolerantes católicos que certamente apreciam a forma vigorosa como ele tem defendido a pureza da fé e da doutrina católica e anatemizado «hereges» e ateus.
A concretizarem-se estas previsões o arqui-conservador Ratzinger será certamente um digno sucessor do finado Papa!
A urgência da canonização do Papa Wojtyla é um desejo irreprimível dos numerosos órfãos que deixou. De facto, ele bem merece. Canonizou gente muito pior.
«Deus já escolheu» [o futuro Papa].
(Afirmação do Sr. José Policarpo em carta à diocese de Lisboa)
Não se percebe a necessidade da deslocação a Roma de tantos cardeais. Bastava um telegrama do Céu, com a assinatura de Deus, a comunicar a decisão.
«Entrai pela porta estreita; porque larga é a porta, e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que entram por ela; e porque estreita é a porta, e apertado o caminho que conduz à vida, e poucos são os que a encontram»
Mateus 7:13
O Deus da mitologia cristã é conhecido pelos crentes por ser um Deus perfeito, de amor e de bondade. Também é conhecido por ser um Deus omnisciente, omnipresente e omnipotente. Creio que tudo isto está em evidente contradição com as escrituras sobre as quais essa mitologia é baseada.
Basta considerarmos o seguinte: o Inferno é, de acordo com essas escrituras, um lugar de sofrimento terrível e eterno. De acordo com essas escrituras, é o destino da maioria da humanidade. Assim sendo, o Deus da mitologia cristã decidiu, quando criou o mundo, fazer a maioria da humanidade por si criada sofrer um castigo terrível e eterno.
Qualquer cristão argumentará que não é bem assim: «não é Deus que condena as pessoas ao Inferno, Ele apenas lhes dá a Liberdade para escolherem, ele quer que elas escolham o céu!». Mas a verdade é que esse Deus já sabe a escolha que a maioria daqueles que criou vai fazer. Já sabe que qualquer um deles se vai eternamente arrepender da sua escolha, e que qualquer um deles preferia nunca ter existido, a ter sido criado tendo o sofrimento eterno como destino. Ainda assim Deus decidiu criá-los a todos. Quanta maldade, quanta crueldade é que tal acção representaria? Uma infinita maldade. Uma infinita crueldade. Ideal para a megalomania da mitologia cristã, que insiste em chamar a tal Deus, «um Deus de amor».
Imaginemos a seguinte imagem: um indivíduo teve, ao longo da sua vida, 13 filhos. A cada um destes, quando tinham 2 anos, deu-lhes a seguinte escolha: «Que é que preferes, estes espinafres, ou este bolo? Podes escolher o que quiseres, mas peço-te que não escolhas o bolo, pois será muito mau para ti, e eu ficarei triste». Estando o bolo envenenado, e sendo da natureza das crianças de dois anos preferirem doces a espinafres, ligando pouco a certas recomendações, 12 dos 13 filhos morreram. O filho que não morreu foi muito amado e recebeu todo o carinho e amor do pai.
Acharemos nós que este pai é amoroso e carinhoso? Considerá-lo-emos um bom pai?
Ele queria que todos os filhos escolhessem os espinafres, mas tinha de lhes dar a «Liberdade» para escolherem. Que maior prova de amor? Ele sofreu por todos os filhos que morreram, chorando amargamente. Ele acarinhou e protegeu o filho que fez a escolha certa durante toda a sua vida.
Não!
Este pai é horrível! Doentio!
De uma falta de amor indescritível!
Mas infinitamente pior é o Deus da mitologia cristã. Pois o pai do exemplo, mata os seus filhos, algo infinitamente menos cruel do que presenteá-los com o sofrimento eterno.
E o pai do exemplo, pode supor que muitos filhos vão escolher o bolo, mas o Deus da mitologia Cristã sabe que a maioria daqueles que criou escolherão o caminho do Inferno, e ainda assim tendo (pela sua omnipotência) o poder de criar apenas aqueles que vão escolher a salvação, preferiu criar todos.
Ainda bem que um Deus assim não existe.
A Igreja Católica Apostólica Romana (ICAR) gosta de impôr as suas regras a todos: crentes e não-crentes.
Veja-se, por exemplo, esta notícia muito curiosa: em Timor, o governo quer tornar facultativo o ensino da religião. A ICAR reage acusando o governo de «atentar ‘contra a convicção e referências fundamentais dos timorenses’, ao mesmo tempo que ‘minimiza a Sagrada Escritura’» .
Não parece familiar? Por cá, quem pretende que as escolas públicas não tenham crucifixos pendurados nas paredes, é considerado por alguns um «fanático ateu» que quer impôr a laicidade aos outros. Do outro lado do planeta, um governo que quer tornar facultativo o ensino do cristianismo é acusado de «atentar contra a Igreja». Só muda o cenário, o teatro é o mesmo.
Deus não está aqui mas vai andar por aí, pelas caixas de comentários, a escrever pias inanidades, a mostrar a face intolerante, o ódio fanático e rudimentares conhecimentos de português, com pseudónimos ou sob anonimato.
Deus não está aqui mas tem umas santas alimárias sempre prontas a repetir o que diz o Papa, câmaras de eco de uma burla monumental com dois milénios de existência, prontas a jurar que Deus curou o olho esquerdo de D. Guilhermina, cego com óleo fervente a fritar peixe, por intercessão de Nuno Álvares Pereira.
Deus não está aqui mas não falta quem garanta tê-lo visto curar o tumor cerebral de um judeu que chupou uma hóstia das mãos de JP2, um caso raro de milagre para clientes de outro Deus, na pessoa de um blasfemo que se atirou ao corpo e sangue de JC sem a purificação do baptismo e uma confissão bem feita.
Deus não está aqui mas vão andar por aí o Opus Dei, a Comunhão e Libertação e um exército colossal de cardeais, bispos, padres e beatos que dispõem de somas gigantescas de dinheiro, poder e influência; que não hesitam em recorrer a armas iníquas para promover a mercadoria que nunca viram mas cuja existência juram; que lutam com a convicção de um cientista e o fanatismo de um crente.
Deus não está aqui mas vai andar por aí a máquina colossal de propaganda que aceitou pacificamente a criação de 448 santos e 1338 beatos entre bem-aventurados de conduta duvidosa, comportamentos pusilânimes e acções reprováveis e que nem duvidou dos milagres que cadáveres em avançado estado de decomposição fizeram para maior glória de Deus e proveito da Santa Madre Igreja.
Deus não está aqui mas vai andar por aí a ICAR e os seus vassalos açulados contra o laicismo, a liberdade e o ateísmo.
Há regiões do ocidente onde historicamente a religião sempre exerceu grande influência, e na maior parte dos casos (se não todos) essa influência traduziu-se pela infiltração das esferas do poder político e pela criação e manutenção duma ortodoxia violentamente repressiva. Um desses casos é a Irlanda, um país que recentemente viveu um verdadeiro milagre económico, sendo sempre o exemplo citado para outros seguirem. Veio a público um estudo em que ficou claro que esta evolução económica foi acompanhada de uma evolução social.
A percentagem de Irlandeses que diziam ter confiança nas igrejas (sendo que na Irlanda igrejas é quase sinónimo de ICAR) baixou entre o período de 1990 a 2000 de 72% para 52%. E a percentagem daqueles que acreditam que a religião possui respostas para os problemas morais também baixou, de 42% para 30%. As posições de oposição a outros temas seguiram pelo mesmo caminho: aborto (de 53% para 51%), drogas leves (de 88% para 72%), homossexualidade (de 52% para 37%) e divórcio (de 31% para 26%).
Não se pense que a Irlanda em 10 anos passou a ser um paraíso liberal, trata-se ainda de um dos países onde a ICAR tem mais peso e onde a tradição ainda pesa sobre os costumes, mas fica claro que a situação está a mudar a um ritmo acelerado. Se a Irlanda mudou (e ainda está a mudar) então ainda existe esperança para outras fortalezas do clericalismo e do fanatismo.
O Diário de uns ateus é o blogue de uma comunidade de ateus e ateias portugueses fundadores da Associação Ateísta Portuguesa. O primeiro domínio foi o ateismo.net, que deu origem ao Diário Ateísta, um dos primeiros blogues portugueses. Hoje, este é um espaço de divulgação de opinião e comentário pessoal daqueles que aqui colaboram. Todos os textos publicados neste espaço são da exclusiva responsabilidade dos autores e não representam necessariamente as posições da Associação Ateísta Portuguesa.