Segundo o «Diário de Notícias» a Igreja Católica está insatisfeita com a educação sexual que se pratica nas escolas portuguesas. Sei que a obsessão da ICAR pelo sexo a faz acompanhar com pio desvelo o que, neste campo, se tem ou não tem passado.
Não duvido, aliás, da importância do problema que vivi como pai, professor e cidadão. Só duvido de que a ICAR seja recomendável para abordar o problema.
Quem não apresenta soluções para além da castidade, do ódio ao preservativo e do horror à contracepção, além das piedosas mentiras de que o preservativo provoca a SIDA ou a masturbação conduz à cegueira, não merece confiança.
Mas numa sociedade livre tem todo o direito de manifestar-se, direito que não existe em sociedades de forte domínio clerical. São, aliás, desejáveis os contributos da ICAR para a educação sexual e a referência às suas próprias experiências individuais e colectivas.
Com direito igual ao da ICAR também nós, cidadãos e ateus, não estamos satisfeitos com a educação sexual praticada nos seminários católicos e nos conventos da ICAR.
Quem aconselha uma noviça a lidar com a menstruação, a fazer a palpação da mama, a lidar com o desejo sexual ou sobre a contracepção? Quem acompanha uma madre superiora no período difícil da menopausa? Quem ajuda uma carmelita descalça a ver-se livre das visões de um santo nu? Quem esclarece que as velas se destinam a alumiar os santos e a virgem Santíssima?
Que cursos frequentaram os membros da Conferência Episcopal Portuguesa para se julgarem autoridades em matéria sexual? Não basta o onanismo da adolescência ou experiências furtivas em camaratas onde eram obrigados a dormir com as mãos fora da roupa, vigiados por um preceptor ou acariciados por ele. Muito menos a repressão sexual de uma vida ou o doutoramento em castidade e oração se tornam cartas de recomendação.
A Igreja Católica durante séculos procedeu à castração de miúdos pobres, para lhes conservar a voz. E não só. A vocação para a educação sexual vem de longe.
Dos bispos portugueses só o arcebispo resignatário de Braga, Eurico Dias Nogueira, tem experiência assumida em matéria sexual, pois – segundo as suas próprias palavras -, aprendeu mais em meia hora a ver «O Império dos Sentidos» do que no resto da sua vida.
Morreu o humanista insubmisso e generoso, o sonhador da liberdade. O Diário Ateísta recorda e homenageia o homem que olhava serenamente para a morte: «O problema da morte nunca me preocupou muito, nem do ponto de vista espiritual nem filosófico. Por uma razão: eu encaro a morte como uma necessidade biológica, tão necessária como o respirar». Que apenas temia a perda de dignidade: «Temo que o sofrimento atinja a minha dignidade. Não a morte. Penso que ter uma morte digna é um direito que todo o homem tem e deve ser respeitado.»
Porque, como afirmou na entrevista que concedeu ao Expresso, por ocasião do centenário do seu nascimento, a dignidade humana foi o ideal por que lutou toda a sua vida. «Como não pode haver dignidade se não houver liberdade, naturalmente que eu lutei pela liberdade. Lutei contra todos os regimes prepotentes, lutei contra todas as ditaduras».
Também como tributo a este cidadão exemplar, o Diário Ateísta continuará a sua modesta contribuição para que se concretize o vaticínio de Emídio Guerreiro:
«O terceiro milénio será, na minha opinião, o milénio da desalienação humana. O homem criou mitos, depois confiou atributos a esses mitos, depois sujeitou-se a eles. Agora vai-se libertar deles.»
O papa Bento XVI apresentou ontem uma versão reduzida do catecismo da Igreja Católica, preparada pelo seu alter-ego Joseph Ratzinger. Em 598 perguntas e respostas, o livro sintetiza o ensino sobre a fé cristã, a moral individual e o pensamento social.
O capítulo que parece ter mais interesse, por ter mais relação com o dia-a-dia dos crentes, é o dedicado aos Dez Mandamentos (celebrizados pelo realizador Cecil B. DeMille) onde são abordadas as questões da moral cristã. O mundialmente conhecido «Não matarás» traduz-se na proibição de matar, estendendo-se a temas como o aborto, a eutanásia, o suicídio, mas também a necessidade de criar condições de paz no mundo.
O compêndio considera como comportamento imoral «toda a iniciativa como a esterilização ou contracepção, que impedem a procriação», e recorda que os católicos divorciados e que se voltaram a casar não podem receber a comunhão. Entre outras, são consideradas “imorais porque se dissociam do acto de procriação [o] adultério, masturbação, pornografia, prostituição, actos homossexuais».
Para além disso, caso alguma lei de um Estado soberano viole estes preceitos morais, o livro entende como legítimo o recurso à desobediência civil.
Mais uma vez temos o reiterar de posições cripto-conservadoras de uma Igreja Católica que pretende ser moderna e tolerante, mas que, no entanto, continua a perseguir ou a excluir as mesmas pessoas.
Depois da Nota sobre a Educação da Sexualidade, hoje constatamos que a Conferência Episcopal Portuguesa é uma organização multifacetada capaz de opinar sobre os mais diversos assuntos, nomeadamente sobre o estado das finanças públicas.
O documento, intitulado «Um olhar de responsabilidade e de esperança sobre a crise financeira do país» e que se configura como um «oportuno relembrar alguns aspectos da doutrina social da Igreja, que devem inspirar o comportamento dos cristãos e de quantos procuram o melhor para o país», afirma que as medidas anunciadas pelo governo «ameaçam penalizar ainda mais aqueles que já são mais sacrificados, pela situação de pobreza ou de falta de trabalho, pela doença e pela desajustada carga fiscal».
O texto realça as «exigências do bem comum» e «a prevalência do bem de toda a colectividade sobre interesses pessoais ou corporativos» e pede ajuda aos cidadãos «quer pagando os impostos justamente distribuídos, quer empenhando-se criativa e solidariamente no implementar de soluções».
No entanto, a Nota Pastoral, apesar dos constantes apelos à generosidade, nada refere sobre a possibilidade de a Igreja, por livre e espontânea vontade, proceder ao pagamento de impostos sobre os seus rendimentos por forma a contribuir para o aumento das receitas do Estado.
A Conferência Episcopal Portuguesa divulgou uma Nota sobre a Educação da Sexualidade na qual reitera que, «no campo da sexualidade, como noutros, compete à família decidir as orientações educativas básicas que deseja para os seus filhos, decorrentes dos seus valores, crenças e quadro cultural».
Os bispos admitem que «a cooperação da família com a escola potencia a aprendizagem dos alunos e promove um desenvolvimento mais adequado». No entanto, «os pais têm o direito e o dever de educar os filhos, inclusive no referente à sexualidade» sendo este exercício «anterior à intervenção de outras instituições, para além da família, designadamente a escola. Essa responsabilidade, inalienável e insubstituível, envolve o período da vida dos filhos desde o nascimento à idade adulta». Noutro ponto do texto, lê-se ainda que «as outras instituições nunca podem substituir os pais, mas devem ajudá-los no cumprimento da sua missão educativa». A intervenção da escola na área da sexualidade não pretende substituir-se aos pais nesta questão, pretende apenas colmatar falhas graves de conhecimentos básicos sobre as relações sexuais entre seres humanos. Falhas essas que colocaram Portugal com um elevado número de infectados com HIV, sem contar com todas as outras doenças sexualmente transmissíveis.
O documento da Conferência Episcopal refere também a questão dos manuais escolares da disciplina. Em causa, diz a nota, está o documento Educação Sexual em Meio Escolar: Linhas Orientadoras. De acordo com o texto, «os conteúdos e ideias que se pretendem veicular, as metodologias propostas e a bibliografia sugerida como base de trabalho, que serviram de suporte àquelas iniciativas, colidem com a sensibilidade e as convicções do público referido». A partir do momento em que, num livro escolar, aparece a figura de um aparelho reprodutivo a sensibilidade de um católico está gravemente afectada e ficará mais ainda se esse mesmo livro fornecer uma lista de zonas erógenas.
Não se ficando por aqui, a Nota sobre a Educação da Sexualidade entende que «a educação da sexualidade não se resume a mera informação sobre os mecanismos corporais e reprodutores, (…) reduzindo a sexualidade à dimensão física possível de controlar com vista à prevenção contra o contágio de doenças sexualmente transmissíveis e o surgimento de gravidezes indesejadas» e que uma tal concepção «deturpa» a sexualidade «isolando-a da dimensão do amor e dos valores», e abre as portas à «ausência de critérios éticos, e à aceitação, por igual, de múltiplas manifestações da sexualidade, desde o auto-erotismo, à homossexualidade e às relações corporais sem dimensão espiritual porque o amor e o compromisso estão ausentes».
Portanto, podemos concluir que a Conferência Episcopal Portuguesa entende que a disciplina de Educação Sexual é bem-vinda, desde que respeite as sensibilidades dos católicos porque, caso contrário, a sociedade será transformada num bando de masturbadores-homossexuais-fornicadores.
Nós, ateus, não somos contra as uniões de facto nem contra o matrimónio do clero católico. Eventualmente somos contra o seu excessivo património cuja proveniência seja suspeita. E, em absoluto, somos contra a obrigatoriedade do seu casamento.
Esse acto que os padres católicos têm o hábito de benzer, e que em nenhuma circunstância permitem repensar, deve ser-lhes permitido e nunca imposto.
As uniões de facto entre padres, ou entre estes e freiras, ou de freiras entre si, é um direito que nós, ateus, defendemos, sem imposições. Temos simpatia pelos casamentos mistos, um padre e um padeiro, uma freira e uma professora, um bispo e um torneiro mecânico, uma madre superiora e um alfaiate, por exemplo. Mas, repito, sem que seja obrigatório.
Em coerência, defendemos igualmente uniões entre mullahs e cónegos católicos, rabis e monges ortodoxos, freiras e pastores evangélicos, arcebispos e suicidas islâmicos, entre dignitários de ambos os sexos e de qualquer religião, embora desconhecendo os riscos do cruzamento de um bonzo com uma freira carmelita e muitas outras combinações que não têm sido objecto de ensaios duplo-cegos estatisticamente significativos.
Os papas modernos perderam o hábito da procriação, contrariamente aos seus santos antecessores da Idade Média cujos rebentos algumas vezes ocuparam a cadeira do progenitor. Ultimamente a provecta idade e os preconceitos têm-nos impedido da multiplicação que a bíblia preconiza.
Se um Papa romano quiser tomar por companheiro/a um chofer de táxi ou a superiora das Reparadoras do Imaculado Coração de Maria, o geral do Opus Dei ou um gerente do Banco Ambrosiano é um direito que não lhe deve ser coarctado. Mas sempre, repito uma vez mais, se for da livre e expontânea vontade de ambos.
Já quanto ao preservativo deve ficar ao critério dos casais eclesiásticos. Se acham que ofende ao seu Deus, enjeitem o adereço e rezem para que nada lhes aconteça. O Senhor, na sua infinita misericórdia, há-de poupar os ministros do culto à sífilis, à hepatite, à blenorragia e à SIDA que os frequentadores dos bares de alterne arriscam.
Quanto à interrupção da gravidez, deve ser respeitada aos casais clericais a renúncia, ainda que o feto resultante de uma piedosa cópula entre um cónego sexagenário e uma freira balzaquiana mostre sinais ecográficos de malformações congénitas ou uma análise aponte para o nascimento de um mongolóide.
Em suma, os ateus respeitam a vontade do clero católico sem pretender impor-lhe os seus valores, com respeito pelas suas convicções e autodeterminação sexual.
Em troca, os ateus exigem que a ICAR respeite as convicções e os valores alheios.
Devo fazer um comentário sobre o artigo anterior: ser padre e ateu é possível. Padre, ateu e honesto é que não.
O Diário de uns ateus é o blogue de uma comunidade de ateus e ateias portugueses fundadores da Associação Ateísta Portuguesa. O primeiro domínio foi o ateismo.net, que deu origem ao Diário Ateísta, um dos primeiros blogues portugueses. Hoje, este é um espaço de divulgação de opinião e comentário pessoal daqueles que aqui colaboram. Todos os textos publicados neste espaço são da exclusiva responsabilidade dos autores e não representam necessariamente as posições da Associação Ateísta Portuguesa.