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9 de Outubro, 2005 Palmira Silva

Guerras da evolução II

As guerras da evolução continuam acesas nos Estados Unidos. Nesta altura os olhos dos fundamentalistas cristãos estão focados na pequena cidade de Harrisburg, Pensilvânia, onde decorre desde 26 de Setembro mais um julgamento IDiota. Neste caso, contrariamente ao que se passou no Kansas, não é a evolução que está em julgamento mas sim a decisão unilateral do Conselho Escolar de Doverde introduzir o Desenho Inteligente nos curricula de ciência. Decisão que conta com a oposição dos professores locais de ciências que, como seria de esperar, consideram que a IDiotia não é ciência. Os queixosos, que incluem as associações laicas American Civil Liberties Union e Americans United for the Separation of Church and State, asseveram que a IDiotia é apenas um cavalo de Tróia que pretende de facto promover a religião e criacionismo cristãos nas escolas públicas de Dover, em clara violação da Constituição americana.

Até agora os testemunhos são demolidores para os fanáticos cristãos! Não só foi testemunhado que o Conselho escolar discutiu Deus, religião e criacionismo antes da alteração em Outubro de 2004 do curriculum de biologia que prevê o ensino da IDiotia como, tal como já tinha sido referido no Diário Ateísta, foi confirmado que o livro recomendado no novo curriculum, supostamente IDiota, «Of Pandas and People», é de facto originalmente um livro criacionista puro e duro em que o termo criacionismo foi substituido por IDiotia, em que Deus foi substituído pelo tal misterioso «designer» e foram cortadas as passagens bíblicas originais.

Deveras interessante foi o testemunho de John Haught, um professor de teologia na Universidade de Georgetown, chamado a depôr para esclarecer as diferenças filosóficas entre ciência e religião, já que a tarefa (impossível) do advogado de defesa do Conselho Escolar, Richard Thompson, é argumentar que a IDiotia é ciência e não religião. O testemunho foi completamente contraproducente para o efeito até porque algumas perguntas de Thompson foram autênticos tiros no pé. Nomeadamente o argumento de que Deus poderia ter feito o genoma dos homens e macacos parecer semelhante e, como tal, o conceito de que estamos relacionados por um ancestral comum é «mera conjectura»! Ou seja, a pergunta de Thompson estabeleceu claramente a diferença entre uma teoria genuinamente científica (fundamentada em factos) e uma explicação religiosa (essa sim mera conjectura sem qualquer suporte experimental).

Se a vida evoluiu segundo uma padrão hierárquico em que novas espécies derivam de espécies já existentes preservando variabilidade genética, então deveremos encontrar os mesmos padrões a nível genético em espécies próximas nesta hierarquia. Se o homem e o chimpazé partilham um ancestral comum devem apresentar genomas semelhantes, como apresentam de facto. Se recuarmos na cadeia ancestral (usando as árvores filogenéticas propostas por dados anatómicos, genéticos e fósseis) devemos encontrar genomas cada vez mais diferentes à medida que recuamos na árvore da evolução, uma vez que os genomas tiveram mais tempo para divergir e acumular diferenças. E é exactamente o que encontramos. A teoria da evolução é consistente com todos os dados disponíveis e é portanto falsificável. O ancestral comum para o homem e o macaco caíria por terra se a análise genética das espécies não o corroborasse. A IDiotia teria exactamente a mesma resposta se, por acaso, os genomas do homem e do chimpazé fossem radicalmente diferentes: os desígnios insondáveis de Deus«designer»! Desígnios que são «corroborados» por quaisquer dados e os seus opostos já que são insondáveis (aka não falsificáveis)… isto é, assentes em lucubrações/conjecturas teológicas e não em ciência, aliás são a antítese da ciência!

Para os nossos leitores que se questionarão sobre o tempo aparentemente inusitado que devotamos à IDiotia criacionista, considerada por muitos uma idiossincrasia norte-americana, recordamos que não só na velha Europa já foram tentadas manobras de introdução das IDiotias nos curricula de ciências como em Portugal, supostamente um estado laico, o criacionismo é parte integrante da anti-constitucional disciplina de Moral e Religião. Ou seja, os nossos jovens desde tenra idade são expostos e encorajados nas escolas públicas a pensamento anti-científico, acéfalo e acrítico. Apresentado como tal mesmo por alguns membros da hierarquia da Igreja Católica…É uma questão de interesse nacional que seja abolida esta disciplina das escolas públicas ou, pelo menos, que seja garantido que os nossos jovens não são contaminados com criacionismos apresentados como «verdades absolutas», que dificultam e muitas impedem o desenvolvimento da tão necessária capacidade de raciocínio lógico, crítico e científico!

A ser discutido o criacionismo cristão em salas de aulas públicas que o seja em conjunto com outros mitos da Criação nas disciplinas apropriadas: História ou Filosofia. Assim os nossos jovens aperceber-se-ão claramente da diferença entre realidade factual e ficção mitológica!

8 de Outubro, 2005 Palmira Silva

«Palavra de Deus» não deve ser levada à letra


A hierarquia da Igreja Católica britânica produziu uma publicação didáctica descodificando não só a velha de 40 anos Constituição Dogmática sobre a Revelação Divina do concílio Vaticano II, Dei Verbum, mas também outros documentos emanados do Vaticano, que discorrem longa, maçadora e prudentemente sobre as ressalvas em relação à «inenarrância» bíblica. Na prática, os bispos ingleses, galeses e escoceses deram a sua chancela a muitas afirmações que aqui no Diário Ateísta provocaram indignadas reacções dos nossos mais católicos leitores.

Assim, para além de reconhecer o perigo que a interpretação literal de algumas passagens da Bíblia suscita, por exemplo, causando o anti-semitismo que grassou na «santa» Igreja por via da praga contra os judeus expressa em Mateus 27:25, e de rejeitar como os delírios que de facto são todas as sandices apocalípticas do livro da Revelação, o «Presente das Escrituras» explica aos fiéis que algumas partes da Bíblia não correspondem de facto à verdade. Advertindo os leitores das sagradas escrituras que não devem esperar encontrar nelas um «exactidão total», mais concretamente os dignitários britânicos concedem, contrariamente ao que foi durante tantos séculos uma «verdade absoluta» católica, que «Não devemos esperar nas Escrituras uma total exactidão científica ou precisão histórica completa». Uma evolução louvável se considerarmos que há apenas um século o santinho Pio X condenava vigorosamente a aplicação de técnicas críticas que visavam testar a consistência histórica (inexistente) da Bíblia.

Considerando que o «Presente das Escrituras» condena o fundamentalismo cristão pela sua intolerância intransigente, insiste que os primeiros onze capítulos do Génesis não são uma narrativa histórica, que numa evidente exibição do tão execrado relativismo diz que a Igreja deve interpretar os Evangelhos de forma apropriada ao nosso tempo e que a Bíblia só é verdadeira nas passagens que dizem respeito à salvação humana (o que quer que isto seja) diria que esta exegese britânica não terá muito sucesso na comunidade católica, especialmente além mar, onde o fundamentalismo criacionista merece «honras» de capa na Time.

E estaria disposta a apostar que Bento XVI, que enfrenta dores de cabeça consideráveis neste sínodo, que já conheceu um visitante indesejado (link com registo grátis), Gregorios III Laham, presente na sua qualidade de patriarca dos católicos Melkite, que afirmou logo no preâmbulo que «O celibato não tem fundamento teológico», dispensa em absoluto este «presente envenenado, que dispara «fogo amigo» sobre as «verdades absolutas intemporais e universais» da Igreja de Roma…

8 de Outubro, 2005 Palmira Silva

Mais contratempos para Bush

Uma lei inesperada, proposta inesperadamente por um senador republicano foi aprovada no Senado norte-americano por uma esmagadora maioria, 90 votos a favor contra 9 nove votos contra. A adminstração de Bush já ameaçou vetar a lei, que pretende banir o uso da tortura em prisioneiros das forças armadas americanas.

A lei, proposta pelo senador republicano John McCain, que foi torturado no Vietname, pretende evitar o tratamento «cruel, desumano e degradante» de prisioneiros sob a alçada da Defesa norte-americana, que ganhou fôlego com o escândalo de Abu Ghraib e alegações semelhantes na prisão de Guantanamo Bay, surge como um adenda à lei que permite o gasto de 440 mil milhões de dólares na Defesa e se Bush vetar a adenda terá de vetar toda a lei. Nestas condições é provável que as ameaças de veto por parte do presidente norte-americano não se concretizem, já que nesta hipótese as forças americanas no Iraque e Afeganistão ficariam com falta de dinheiro em meados de Novembro.

Num país em geral e numas Forças Armadas em particular tão cristãs que o pai (judeu) de dois cadetes processa a Força Aérea americana por impôr o cristianismo nas suas escolas, é estranho não só que o Deus que tanto sussurra incubimentos divinos no ouvido de Bush não tenha uma palavrinha a dar sobre o uso da tortura como o apregoado amor cristão ao próximo não os coíba de tais práticas…

8 de Outubro, 2005 Palmira Silva

Sashimi versão cristã

«Temos de ser realistas em relação ao que a Bíblia diz sobre medo e não recearmos partilhar a nossa fé na escola» é a posição do pastor Anthony Martin da First Assembly of God Church, em Florence, Alabama. E como «Não podemos deixar que o medo regule as nossas vidas» o denodado pastor recorre a métodos inovadores para marcar cruamente as suas prelecções sobre medo.

Assim, a semana passada os participantes das ousadas iniciativas do pastor, que pretende que os jovens se entreguem a Cristo e desenvolvam um relacionamento mais profundo com ele, digeriram uma lição (intragável, diria eu) sobre medo, em que os jovens foram convidados a engolir… peixes vivos!

Quiçá para Martin não incorrer nas desventuras do padre Arthur Michalka, que foi obrigado a pedir desculpas pela sua lição in promptu sobre o valor do sofrimento, todos os adolescentes que participaram na degustação estavam devidamente munidos de autorizações paternais…

8 de Outubro, 2005 Palmira Silva

A missão

São George contra o dragão aka eixo do mal.

Um programa da BBC que irá para o ar segunda feira provocou uma reacção oficial da Casa Branca, nomeadamente um comunicado de imprensa em que o porta-voz, Scott McClellan, afirma serem absurdas as afirmações de um dignitário palestiniano de que G. W. Bush afirmou estar a cumprir uma missão «divina» quando decidiu invadir o Afeganistão e o Iraque.

De acordo com Nabil Shaath, o ministro dos Negócios Estrangeiros palestiniano aquando da cimeira israelo-palestiniana de Sharm el-Sheikh, quatro meses antes da invasão do Iraque, durante esta Bush revelou detalhes do seu fervor religioso, já abordados no seu livro autobiográfico, «A charge to keep».

Segundo Shaath, Bush terá dito, entre outras devotas revelações, que: «Sou conduzido por uma missão de Deus. Deus disse-me ‘George vai e luta contra estes terroristas no Afeganistão’. E eu fui. E então Deus disse-me ‘George, vai e acaba com a tirania no Iraque’. E eu fui.» afirmando em relação à cimeira «E outra vez, senti as palavras de Deus vindo a mim, ‘Vai e faz os palestinianos terem o seu estado e faz os israelitas terem a sua segurança e leva a paz ao Médio Oriente’. E, por Deus, eu vou fazê-lo».

Estas alegações, vigorosamente negadas pela Casa Branca, serão difundidas no âmbito de um documentário em três episódios da BBC, que analisa as tentativas de paz no Médio Oriente na perspectiva dos seus intervenientes directos. O líder palestiniano Mahmoud Abbas, que participou na cimeira de 2003 no Egipto, aparece igualmente no documentário a reforçar a motivação religiosa das «cruzadas contra o eixo do mal» de Bush. Aliás, imediatamente após a cimeira, o periódico israelita Haaretz revelava que, segundo Abbas, Bush terá dito: «Deus disse-me para lutar contra a al Qaida e eu lutei contra ela, depois deu-me instruções para ir contra Saddam, o que eu fiz, e agora estou determinado a resolver o problema no Médio Oriente.»

Assim, não se percebem as objecções da Casa Branca à divulgação da história, até porque G. W. Bush reafirmou inúmeras vezes o seu papel de cruzado divino. Papel perfeitamente entendido e interiorizado pelo seu Departamento de Defesa, nomeadamente pelo general William “Jerry” Boykin, o sub-secretário da Defesa encarregue da caça a bin Laden, que considera ainda que os terroristas tentam destruir a América porque «somos uma nação cristã e o inimigo é um tipo chamado Satanás» considerando que «o nosso inimigo espiritual só pode ser defendido se lutarmos contra ele em nome de Jesus».

Boykin, um fanático cristão que vê Satanás até em manchas escuras de fotos (de Mogadishio, capital da Somália), afirmou ainda que Bush, que foi eleito em 2000 sem a maioria dos votos, que foram para Al Gore, não foi posto na Casa Branca com o voto popular mas sim nomeado por Deus.

Curiosamente os países integrantes do «eixo do mal» são, juntamente com o Vaticano, os grandes aliados dos Estados Unidos noutra cruzada, esta contra o uso de preservativo como forma de prevenção contra a SIDA…

7 de Outubro, 2005 Carlos Esperança

Os talibãs da ICAR

À semelhança do islão os sicários da ICAR andam ressabiados e vão a Roma tirar o curso de mujaidine para praticar a guerra santa contra os Governos que defendem a liberdade religiosa e a laicidade do Estado.

São tão cobardes como os talibãs e mais pérfidos. Usam a intriga em vez da bomba e a pressão social em vez do atentado, mas, se precisam de um braço homicida, escondem-se atrás do braço, sem deixar de proteger o autor. Há bispos croatas a abrigar assassinos reclamados pelo Tribunal Penal Internacional.

A assembleia geral da ICAR, convocada por B16 e denominada «sínodo» (concílio mais reduzido e curto), abriu no último Domingo, em ambiente crispado, com alusões ao Apocalipse e com o ditador vitalício a confrontar 256 bispos e cardeais de 118 países com a falta de padres e perda de clientela.

Os bispos presentes deverão pronunciar-se, durante três semanas, sobre a privação da eucaristia aos políticos católicos que apoiam o direito ao aborto e aos divorciados que voltem a contrair matrimónio sem anulação do anterior.

O tema central será a debilitada equipe de vendas, com défice de sacerdotes, devendo as reverendíssimas criaturas avaliar a eventual influência do celibato no recrutamento.

No fundo é uma reunião do estado-maior da ICAR para decidir a estratégia das batalhas a travar na guerra religiosa.

Adenda – O sínodo ainda foi convocado por JP2 e não por B16, como, por lapso, afirmei. A verdade acima de tudo. Para mentir bastam as religiões.

6 de Outubro, 2005 Ricardo Alves

Afonso Costa nunca disse a frase que lhe atribuíram

«[Afonso Costa] teria dito, em mais de um lugar e de uma ocasião, que com a Lei da Separação se propunha extinguir a religião católica em Portugal, em duas ou três gerações.
(…)
Segundo os autores da campanha, a frase teria sido proferida em três locais diferentes: em Lisboa, na sede do Grémio Lusitano (Maçonaria), em Braga e no Porto, respectivamente em 26 de Março, 24 e 25 de Abril de 1911. (…) Acontece, (…) que do discurso proferido por Afonso Costa no Grémio Lusitano, dada a natureza desta agremiação, não há relato jornalístico, a não ser a versão fantasiada do “Tempo”, logo desmentida por jornalistas que, não nesta qualidade mas como membros do Grémio, assistiram à sessão. Quanto aos discursos que proferiu, nas datas atrás indicadas, em Braga e no Porto, dos quais há relatos nos jornais de Lisboa e do Porto, não figura em qualquer deles a frase e, pelo contrário, figuram afirmações que são o contrário daquela que, sem provas, lhe atribuíram.
(…)
Não há relato jornalístico da frase atribuída ao dr. Afonso Costa e há, publicado na Imprensa, o desmentido.
(…)
“Os reacionários, à falta de argumentos, atribuíram-me a intenção de, servindo-me da Lei da Separação, querer acabar com a religião católica entre nós ao fim de duas ou três gerações! (…) A verdade não é que a República queira mal à religião católica ou outra, mas que aquela entrou numa fase de decadência, em Portugal e na Europa, por culpa dos seus servidores. Isto escrevi eu já em 1895 no meu livro «A Igreja e a Questão Social». A Lei da Separação, em vez de ferir a religião católica, pretende que ela viva à margem da agitação política e procure ressurgir, pura e respeitável, pela fé e bondade dos seus sacerdotes”.
(…)
Repetimos o que ele disse no Grémio Lusitano e foi textualmente o seguinte: “Com o seu aspecto mercantil degradante, consequência da influência dos jesuítas, aspecto a que emprestaram o seu selo as congregações e a Companhia de Jesus, a continuar esta situação, em breve a religião católica se extinguiria”.
»
(Excertos do texto das páginas 147-163 do livro «Desfazendo Mentiras e Calúnias», de Carlos Ferrão.)
5 de Outubro, 2005 Carlos Esperança

Diário de Notícias de hoje

Uma viagem sobre os privilégios da ICAR e a forma como mantém a hegemonia.

Vários artigos com interesse e as posições de Luís Mateus, presidente da Associação República e Laicidade, do bispo Januário Torgal e do anacrónico cónego João Seabra, entre outros.

Por mim não havia Concordata

A importância de haver crucifixos nas escolas

Padres com monopólio na assistência religiosa oficial

«Sorriem mas nunca baixam a guarda»

Variações católicas sobre a tolerância

4 de Outubro, 2005 Carlos Esperança

Carta ao Diário as Beiras

Senhor Director,

Solicito que, com a habitual benevolência com que os meus textos são recebidos pelo «Diário as Beiras», autorize a publicação do que agora envio na sequência do artigo de António Rosado, de hoje.

Apresento-lhe os meus melhores cumprimentos.

Coimbra, 2005-10-04
Carlos Esperança

Organizado pelo Conselho da Cidade de Coimbra e Pro Urbe, em 27 de Setembro último, houve um debate público no Auditório da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra com os quatro candidatos autárquicos.

Perguntei publicamente, na qualidade de membro da Associação República e Laicidade, se os candidatos se comprometiam a arranjar um local condigno para os mortos que não fossem católicos, bem como um forno crematório para quem preferisse a incineração ao enterro.

Obtive a compreensão dos quatro candidatos e, para além do crematório que o Dr. Carlos Encarnação aproveitou para anunciar, foram unânimes em reconhecer a necessidade de um espaço condigno onde ateus, agnósticos e outros pudessem ser velados, sem imposição de símbolos religiosos.

No dossiê «Autárquicas» de 4 de Outubro, sob o título «A morte também é tema de campanha» leio, perplexo: «No bairro onde se situa o maior cemitério do concelho, foi reivindicada uma capela mortuária e prometido um forno crematório».

Faz falta uma capela mortuária numa cidade onde sobram catedrais, igrejas, capelas e outros pios locais onde jorra água benta e emana incenso?

Os que em vida tiveram uma pituitária alérgica ao cheiro das velas, tímpanos avessos às orações e olhos apáticos às sotainas, não têm direito a local digno, liberto de iconografia religiosa, onde os familiares e amigos estejam ao abrigo do latim e do cantochão?

É de um espaço neutro, liberto da omnipresença católica, que a cidade de Coimbra precisa. E foi isso que foi prometido.

Nem outra coisa é de esperar de quem exerce o poder num país laico, mesmo de quem acredita que a devoção abre as portas do Paraíso. É uma exigência cívica de respeito pela Constituição e pelos outros.