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13 de Dezembro, 2005 fburnay

Momento Zen de Segunda-Feira (I)

Para João César das Neves não há almoços grátis. Mas fantasias gratuitas, sem ponta por onde se lhe pegar nem qualquer consideração pelos leitores, há e com fartura.

O opinador do Diário de Notícias presenteou-nos desta vez com um artigo sobre Ciência… Ou melhor, sobre aquilo que acha que a Ciência é, num misto de contradições, absurdidades e tiros nos pés.

Este ano correu alegremente o Ano Internacional da Física. Centenas de pessoas e de cientistas, divulgando a Física, dedicaram-se a relembrar e a dar a conhecer o annus mirabilis de Einstein, 1905, em que este publicou três importantes artigos que iriam mudar a História da Física e da Ciência.

Começando logo por aqui, JCN fala-nos de quatro artigos. São três os principais, sendo cinco no total. JCN chama à publicação de Einstein um «facto espantoso, que revoluciona a forma como vemos a matéria». A matéria? Revoluciona a nossa visão do Universo, certamente, e da matéria em particular. Depois fala de «teorias da relatividade» (ênfase no plural) quando somente a Relatividade Restrita faz parte desse conjunto – a Teoria da Relatividade Geral só estaria completa posteriormente.

Isto mostra a completa ignorância de JCN sobre os artigos de Einstein e suas implicações. Não me passa pela cabeça exigir de JCN um conhecimento detalhado da Física subjacente mas pedia-lhe, no mínimo, algum cuidado na substanciação daquilo que diz. Uma rápida pesquisa na Internet seria suficiente para dissolver estas gralhas… Sugestão: procurar ‘world+year+physics’ no Google. Não é aterradoramente simples? Viva a era da informação…!

O aplicado elucubrador segue descrevendo o estado civilizacional da Humanidade, anterior a Einstein, fascinada com a Ciência e que tão prontamente se desiludiu com a chegada da nova Física e seus derivados tecnológicos. Quanto à pulverização das «certezas evidentes», JCN deve estar a referir-se à vitória das Mecânicas Relativista e Quântica sobre a Mecânica Clássica. A questão que se põe aqui é que a Mecânica Clássica era tida pelos cientistas da altura como poderosa o suficiente para descrever matematicamente o Universo. É certo que se enganaram – mas os corolários clássicos ainda são utilizados correntemente em diversas aplicações da engenharia. A forma como JCN descreve o processo de falsificação do conhecimento é típica de quem não compreende a Ciência, acabando na situação caricata de apontar defeitos onde eles não existem.

De seguida JCN diz-nos que «a era nascida em 1905 veria muitos cientistas, incluindo Einstein, ansiosos por desaprender resultados desse progresso». O que quer JCN dizer com “desaprender”? Se a leitura que pretende fazer é a de que os resultados de alguns proveitos técnicos gerados pelo conhecimento científico, como a bomba nuclear, criaram algum remorso em cientistas como Einstein, então JCN está enganado. Einstein nada teve a ver com a bomba. E por muitas questões que esse tipo de problemas traga à sociedade isso nada tem a ver com desaprender seja o que for. Por muito que todos os cientistas envolvidos no projecto Manhattan se tenham arrependido, o que eles criaram foi conhecimento – a bomba foi criada por militares e posta em uso por políticos.

12 de Dezembro, 2005 Palmira Silva

Crónicas do Cavaleiro da Pérola Redonda

J. C. das Neves brindou-nos hoje com mais uma das suas crónicas inenarráveis. Neste puro delírio tomista, o inefável cavaleiro da Pérola Redonda não defende directamente a sua dama, a Igreja de Roma e seus ditames, mas fá-lo indirectamente com um ataque ao «dragão» que, desde Agostinho de Hipona, ameaça a sua hegemonia e autoridade: o uso da razão, mais concretamente a ciência.

O fazedor de opinião do Diário de Notícias aproveita para o seu ataque inano à ciência o facto de que decorre ainda o ano Internacional da Física. Ano em que se celebra o centenário do Annus Mirabilis de Einstein. Denominado assim porque em 1905, ainda funcionário do gabinete de patentes de Berna, Einstein publica não quatro como o excelso professor indica mas sim cinco artigos memoráveis* que mudaram para sempre a ciência.

E aparentemente o professor estava um pouco baralhado quando debitou a opinação em análise porque não só Einstein não «concebeu em 1905, quase de raiz, a mecânica quântica» como praticamente até à sua morte manteve um conflito permanente com a mecânica quântica, MQ. Conflito cuja expressão mais conhecida é um artigo que escreveu em 1935 com Podolsky e Rosen, onde se propunham demonstrar a grande inconsistência da MQ. O assunto é conhecido, no meio científico, como o Paradoxo EPR (de Einstein, Podolsky, Rosen).

Depois deste pouco auspicioso começo, o «filósofo», ou melhor, «téologo» da ciência tenta incutir no seu leitor (nesta altura perdido de riso se tiver um mínimo de cultura científica) a dúvida sobre a bondade do conhecimento científico. Lançando-se em lucubrações sobre a a vontade de Einstein, que morreu a trabalhar na sua teoria unificada, em «desaprender» ciência, aparentemente por causa da bomba atómica. Lucubrações completamente sem fundamento e teria sido útil ao spin doctor do DN ler qualquer coisinha sobre Einstein antes de se lançar nas suas habituais efabulações.

Nas palavras de Einstein a um historiador «Sugere que em 1905 eu devia ter previsto a possível construção de bombas atómicas. Tal era impossível, dado que a possibilidade da reacção em cadeia dependia da existência de dados empíricos que não podiam ter sido antecipados em 1905… E mesmo que tal conhecimento estivesse disponível, teria sido ridículo tentar esconder uma conclusão particular da teoria da relatividade restrita. Uma vez que a teoria existia, a conclusão existia».

Uma dos mimos com que J. C. das Neves nos obsequia neste indescrítivel artigo é a promoção de um economista keynesiano a «um dos seus (ciência) mais astutos observadores». Nomeadamente um representante de uma ciência não exacta que se socorre de termos e conceitos de uma ciência exacta, a física, para elaborar uma versão «respeitável» da «teoria» dos ciclos que tenta explicar as crises que o mundo capitalista atravessa e conjecturar sobre as várias «forças» actuantes. Na realidade ainda hoje alguma economia pede emprestada respeitabilidade à física, sendo um dos campos da moda actualmente a econofísica, tema de um workshop na Universidade de Évora em 27 de Janeiro próximo. Parecer-me-ia um pouco arriscado propor como um astuto observador da «assustadora» (J.C. das Neves dixit) física alguém que se socorre desta para se impor no seu próprio campo…

Fiquei na dúvida se J.C. das Neves é frequentador do Diário Ateísta porque o seu parágrafo seguinte poderia ser debitado por um qualquer dos crentes que comenta todos os assuntos em apreço com alusões a Pol Pot, Mao ou Stalin. Ou seja, por uma razão qualquer obscura J. C. das Neves promove a ciência o marxismo-leninismo usando-o como mais um papão para denegrir a ciência, essa malvada relativista que ousou destronar as verdades «absolutas» da Santa Madre Igreja, por exemplo a insustentável leveza das almas nos limbos!

Os verdadeiros motivos de J. C. Neves na escrita deste conjunto de inanidades revelam-se quasi no fim da opinação. Num parágrafo em que mais uma vez mistura ciências exactas com ciências sociais (não exactas) o ilustre spin doctor tenta lançar a confusão sobre os temas «fracturantes» sobre que tantas vezes nos mimoseou com as suas pérolas redondas de raciocínio. Nomeadamente o aborto e a homossexualidade. Em que tenta menorizar os argumentos científicos a favor do aborto ou que desmistifiquem os preconceitos homofóbicos da Santa Madre Igreja.

Imediatamente antes do seu final apoteótico (ou apopléctico?), em que carpe ter a ciência no século XIX substituido a religião nas respostas às questões da humanidade e sugere que a ciência é mortal (!?) para o homem, J. C. das Neves tem um lapso de lucidez. Não obstante ter indicado o «culpado» errado, que na realidade é o ressurgimento de fundamentalismos religiosos anacrónicos, a sua análise do problema dos tempos modernos está certa: esta nova fase místico-religiosa traduz-se no crescimento do «desprezo pela atitude racional e avança o misticismo e a magia, prosperam os charlatães e a mixordice intelectual», como são exemplo a super abundância de milagres produzidos pelo anterior Papa ou a recuperação do exorcismo pela Igreja católica. E concordo em absoluto que «Estão em risco séculos de avanços do conhecimento». Mais concretamente todos os séculos que medeiam desde o Renascimento, em que saímos da longa noite obscurantista imposta pela Igreja de Roma, até hoje!

*Os cinco artigos são publicados a um ritmo alucinante. Assim, em Abril Einstein publica um artigo que será igualmente a sua tese de doutoramente sobre a determinação das dimensões de moléculas (e em que prova inequivocamente a existência destas, algo que não era consensual à altura); em Março foi publicado o artigo que lhe valeu o prémio Nobel em que explica o efeito fotoeléctrico; em Maio um artigo sobre movimento browniano; em Junho um artigo intitulado «Electrodinâmica dos corpos em movimento» em que apresenta aquilo que hoje em dia chamamos relatividade restrita e finalmente em Setembro um suplemento ao artigo da relatividade em que pela primeira vez aparece a equação que é talvez o ex-libris de Einstein: E=mc2.

12 de Dezembro, 2005 Mariana de Oliveira

Debate

Próxima quarta-feira, 14 de Dezembro
Debate sobre
LAICISMO E LAICIDADE
com
Luís Mateus e Ricardo Alves
da Associação Cívica República e Laicidade
na Companhia de Teatro
A Barraca

Depois da representação da peça «O Mistério da Camioneta Fantasma».O espectáculo tem início às 21.00 horas.

Bilhete simples: 12,50 euros
50% para os associados e amigos da Associação Cívica R&L.

Marcações para o 213965360 ou 213965275 até às 19:00 horas de quarta-feira.

Para mais informações: http://abarraca.planetaclix.pt/, [email protected] ou [email protected].

12 de Dezembro, 2005 Carlos Esperança

Santíssima Trindade

Em tempos da beata ditadura salazarista, por lei de 1936, um Cristo sofrido tornou-se obrigatório nas escolas, ladeado por um idiota vestido de oficial general e pela figura sinistra do antigo seminarista de Santa Comba Dão.

Na 3.ª classe do ensino primário era obrigatório ensinar às criancinhas o dogma da Santíssima Trindade que, não sendo originalidade da ICAR nem do cristianismo, contribuía para o embrutecimento infantil e bovinidade dos professores que tinham por missão explicá-lo.

Dizia-se que «eram três pessoas iguais, distintas e uma só verdadeira». Todas eram uma e era Deus. Além de dogma era mistério. Além de mistério era estúpido, mas alimentava a fé.

A ICAR, no seu instinto comercial, deitou fora o Pai, encerrou num pombal recôndito o Espírito Santo e dedicou-se à comercialização do Filho. Segmentou o mercado e passou ao negócio da cruz, com ou sem atleta.

Depois de ter amadurecido o produto, em vez de impingir os outros dois artistas da tríade, criou o culto mariano. Passou a vender Nossas Senhoras como os tasqueiros vendem tremoços para acompanhar a cerveja.

Reparem, pios leitores, que o Pai apareceu a Moisés a ditar-lhe uns mandamentos no Monte Sinai e nunca mais regressou. Aconteceu o mesmo a alguns satélites artificiais.

Quanto ao Espírito Santo, os próprios cardeais não o vêem há várias épocas de caça.

Só o JC aparece de vez em quando a alguns bem-aventurados, como aconteceu à Irmã Lúcia que recebeu uma visita em Tuy. Quem aparece com frequência é a Virgem, que a tradição e as vantagens do negócio conservam imaculada, quase sempre a pessoas de instrução rudimentar e excessiva fé.

Mas agora o que está a dar são os santos, especialistas em cunhas a Deus, aptos a curar o mau olhado, a evitar possessões demoníacas e a render emolumentos ao Vaticano.

A fé é um negócio que alimenta a voragem do padres, a credulidade dos infelizes e a superstição de muito boa gente.

12 de Dezembro, 2005 Ricardo Alves

«A religiosidade nas escolas»

O EXPRESSO de 3-12-05, a propósito da persistência de crucifixos em salas de aula de escolas públicas, refere declarações do gabinete da ministra Lurdes Rodrigues e de um responsável sindical, afirmando que essas situações se verificam exclusivamente na região Norte de Portugal e que não ultrapassam a vintena – o título da notícia é mesmo: «Só 20 escolas têm crucifixos».

Ambas as informações são factualmente incorrectas e uma simples consulta ao repertório produzido pela Associação República e Laicidade permitiria verificar que existem escolas com símbolos religiosos permanentes distribuídas pela região Norte, pela região Centro, pela região de Lisboa e pela do Alentejo e, sobretudo, permitiria perceber que essas situações foram citadas a título meramente exemplificativo, sendo muitas outras aí deliberadamente omitidas para proteger a privacidade das pessoas que fizeram chegar a informação à associação.

Acrescente-se que a Associação República e Laicidade considera a medida entretanto tomada pelo Ministério da Educação – mandar retirar crucifixos de salas de aula a pedido explícito de encarregados de educação – claramente insuficiente: está constitucionalmente garantido aos cidadãos portugueses o direito de não serem, por forma alguma, postos na situação de terem que revelar convicções (positivas ou negativas) que mantenham, designadamente em matéria religiosa, e o exercício desse direito, que não se compadece com a postura agora adoptada pelo Governo, requer a retirada de todos os símbolos religiosos das salas de aula, garantindo assim, a par da não confessionalidade da escola pública, a separação entre o Estado e as igrejas e a igualdade entre todos os cidadãos independentemente das suas convicções em matéria de religião.

Ricardo Alves (membro da Direcção da A.R.L.)

(Texto publicado no Expresso de 10/12/2005 como carta de leitor.)
11 de Dezembro, 2005 Palmira Silva

Primeira Presidente chilena?

O poder quasi absoluto da Igreja Católica no Chile, um país onde o divórcio só é possível desde o ano passado, está prestes a conhecer o seu primeiro contratempo desde o assassinato em 1973 do presidente Salvador Allende durante o golpe de direita, chefiado pelo general Pinochet, um católico exemplar.

De facto, o resultado das eleições de hoje é quasi o equivalente a uma revolução pacífica, inesperada neste país sob tão marcada influência da Igreja de Roma. Assim, os resultados preliminares indicam que Michelle Bachelet, mãe solteira, de 54 anos, que nas suas próprias palavras encarna «todos os pecados capitais – socialista, a filha do seu pai, divorciada e ateísta» será muito provavelmente a primeira presidente chilena, tendo neste momento, com cerca de 13% dos votos apurados, quase tantos votos como a soma dos votos nos dois candidatos de direita, o empresário Sebastian Pinera e o ex-presidente da câmara de Santiago o ultra conservador Joaquin Lavin. Amanhã saberemos se haverá segunda volta e quem disputará a presidência com Michelle Bachelet, que a manterem-se as tendências actuais e contra a maioria dos prognósticos e ajuda divina, será Sebastian Pinera.

O pai que ela menciona como um dos seus pecados capitais foi um general progressista da Força Aérea chilena que fez parte do governo de Salvador Allende em 1972 e que morreu de ataque cardíaco quando torturado pelos algozes de Pinochet, um ano depois do golpe de estado.

Michelle e a mãe foram enviadas para o infame centro de tortura Villa Grimaldi mas as suas ligações com os militares evitaram que tivessem o destino de tantos milhares de chilenos desta época negra do país e partiram para o exílio.

Em 2000 o presidente Ricardo Lagos, nomeou Michelle ministra da Saúde, cargo que abandonou dois anos depois quando passou a ocupar a pasta da Defesa.

Talvez a razão do sucesso inesperado de Michelle seja bem resumido pela apreciação de Isabel Allende, filha de Salvador Allende e prima da escritora com o mesmo nome «Michelle reflecte um realidade há muito escondida no Chile, não a falsa imagem da família perfeita ou do político modelo».

Realidade que se revelou no voto secreto que cada eleitor depositou na urna, fora do escrutínio dos devotos católicos que tentaram demover os chilenos do voto em Michelle Bachelet «denunciando» a sua afinidade com o infame, anti-católico e ditatorial(?) Zapatero!

11 de Dezembro, 2005 Palmira Silva

Guerras da religião acesas na Rússia

A vertente totalitária e intolerante da Igreja Ortodoxa russa ficou expressa numa carta escrita por um alto dignitário desta igreja, o arcebispo Nikon de Ufa e Sterlitamak, que descreveu Krishna, o deus máximo dos hindus, como um «demónio maligno» e «um lívido jovem lascivo».

A carta, dirigida ao presidente da câmara de Moscovo, Yuri Luzhkov, pretendia que este proibisse a construção de um templo a Krishna em Moscovo afirmando que tal seria «uma desgraça idólatra erigida à glória do perverso e malicioso ‘Deus’ Krishna». Alguns dos argumentos utilizados pelo prelado soam familiares já que na carta se faz igualmente um apelo à tradição e à cultura cristã do país e se invocam os sentimentos «feridos» do povo: «A construção do templo (uma obscenidade satânica que pretendem construir mesmo no coração da Rússia ortodoxa cristã) a Krishna ofende os sentimentos religiosos e insulta a cultura religiosa milenária da Rússia onde a esmagadora maioria das pessoas, cristãos e muçulmanos inclusive, consideram Krishna um demónio maligno, o poder personificado do Inferno que se opõe a Deus».

Sem qualquer surpresa, o teor da carta despoletou uma onda de protestos a nível internacional.

O Hindustan Times descreveu a carta como «evidenciando uma assombrosa ignorância sobre a religião mais antiga do mundo» para além de «ser evidente que a Igreja Ortodoxa Russa está ainda imbuída nos tempos negros da exclusividade religiosa, que não tem lugar na sociedade de hoje, cada vez mais pluralista».«Chamar satânico a Krishna não só é sacrílego aos olhos dos hindus como é claramente ridículo uma vez que, como qualquer estudante do hinduísmo sabe, Krishna é famoso como caçador de demónios»

Como contraste, Bimal Krishna, secretário geral do National Council of Hindu Temples britânico, frisa que os hindus respeitam o mítico fundador da religião cristã realçando que «Nós respeitamos todas as religiões. E achamos que o arcebispo poderia ganhar uma perspectiva nova da sua própria fé cristã se lesse as palavras de Krishna no Bhagavad-Gita (uma clara alusão à influência hindu na mitologia cristã).»

Ramesh Kallidai, secretário geral do Hindu Forum britânico afirma ainda «Os motivos para se espalhar semelhante ódio são claros – é uma tentativa de discriminar e perseguir a comunidade hindu na Rússia e impedi-la de construir um templo. É inacreditável que um líder de uma igreja tão poderosa possa fazer estas tentaticas tão infelizes e dogmáticas para instigar tensões entre diferentes religiões. Isto é completamente contrário a todos os princípios de coexistência e cooperação que religiões antigas e tolerantes como o hinduismo defendem».

Assim, para além da guerra dos crucifixos e demais símbolos cristãos com os muçulmanos que a parcialidade do governo russo em relação à religião cristã despoletou, a intolerância e totalitarismo cristãos russos conseguiram antagonizar mais uma religião. Esperemos que as chamas de (mais) uma guerra religiosa não tenham sido irremediavelmente ateadas!

11 de Dezembro, 2005 Palmira Silva

Rescaldo das eleições no Egipto

Allah is our objective. The Prophet is our leader. Qur’an is our law. Jihad is our way. Dying in the way of Allah is our highest hope. Muslim Brotherhood ou a Irmandade do Islão

A Irmandade do Islão revelou-se o maior partido da oposição nas recentes eleições realizadas no Egipto com 19% dos votos expressos, o que se traduz em 88 lugares num parlamento de 454 deputados.

O jornal pro-governamental Al-Gomhuria publicou um artigo de título «Os Mullahs estão a chegar!», afirmando que embora a Irmandade tenha realizado uma campanha baseada não em religião mas em assuntos práticos, o seu slogan «O Islão é a solução» indica uma agenda escondida de intolerância social, repressão das mulheres e hostilidade às minorias religiosas (como os cristãos coptas, alvos de violência muito recentemente).

Por seu lado a votação alcançada pela Irmandade mereceu um artigo congratulatório no Tehran Times, que assegura que os ventos de mudança despoletados por esta eleição assolarão todo o mundo muçulmano, e exponenciarão a «tendência de países árabes e islâmicos a olharem para soluções religiosas para os seus problemas».

Na realidade os resultados desta eleição são preocupantes, especialmente se atentarmos à história desta Irmandade, a grande fonte de inspiração de Osama bin Laden, nomeadamente através dos escritos de um fundamentalista desta organização, Sayyid Qutb, enforcado em 29 de Agosto de 1966, após uma tentativa de assassínio do presidente Nasser pela Irmandade. De igual forma, na Universidade Rei Abdel Aziz em Jiddah, Bin Laden, segundo colegas, foi muito influenciado por um dos seus professores, Abdullah Azzam, um palestino que foi um importante membro da Irmandade Muçulmana.

Quando da sua formação por um professor wahabita em 1928, Hassan al-Banna, a Irmandade era um movimento religioso, que se opunha ao domínio britânico do Egipto, mas que se ocupava essencialmente com programas sociais, de educação e de evangelização. Nas duas décadas seguintes ganhou um braço político, o partido da Irmandade do Islão, Hizb Al-Ikhwan Al-Muslimoon, que acusava o governo egipcio de ser muito brando com os sionistas. A sua actividade terrorista em território egipcio iniciou-se quando se demonstrou inevitável a formação do Estado de Israel. O movimento foi banido e em Dezembro de 1948 um membro da Irmandade assassinou o primeiro-ministro egípcio, Mahmud Fahmi Nokrashi.

O presidente Nasser, baniu o movimento em 1954, depois de uma (entre várias) tentativa de assassinato por parte de membros da Irmandade. Milhares de membros refugiaram-se na Síria, Jordânia, Líbano, Sudão e na Arábia Saudita. Onde continuaram a sua tarefa de evangelização e onde o grupo continuou a crescer agora também fora das fronteiras egípcias, sendo hoje um dos mais importantes movimentos islâmicos. Grupos como o al-Jihad e al-Gama’at al-Islamiyya no Egipto, o HAMAS na Palestina e vários grupos mujahideen no Afeganistão são spin-offs da Irmandade.

A Irmandade renunciou «oficialmente» à violência nos anos 70 (com uma «breve» interrupção em 1981 quando quatro membros assassinaram o presidente Anwar-as-Sadat) e desde então tem apresentado um discurso «moderado» de forma ao seu braço político poder integrar o processo democrático do Egipto, ainda a sua base principal. Por outro lado criou uma rede alargada de serviços sociais que lhe permitiu conquistar o apoio da população mais carenciada. A semana passada viu coroados de êxito os seus esforços… Agora que é a 2ª força política no Egipto iremos certamente assistir a uma radicalização do discurso dos seus representantes.

Não são necessários quaisquer dotes de presciência para prever um futuro próximo complicado naquela já conturbada zona do globo! Especialmente porque a Irmandade sempre afirmou ser o seu objectivo o estabelecimento da lei islâmica ou Sharia…