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9 de Abril, 2006 Palmira Silva

Os mártires cristãos nos Estados Unidos

«Com ou sem religião existem pessoas boas fazendo coisas boas e pessoas más fazendo coisas más. Mas para que pessoas boas façam coisas más é necessário serem religiosas» Steven Weinberg

No último post abordei a imagem de marca do cristianismo, a encenação e invenção de perseguições inexistentes contra os cristãos. Para os fundamentalistas cristãos americanos essas perseguições são consequências da abominável «cultura» que trivializou matérias tão inadmissíveis como as uniões de facto, a homossexualidade, o sexo, os contraceptivos e o aborto, a tolerância em relação a apóstatas e, especialmente, foi concretizada em abominações como a recente proposta de alteração das leis anti-discriminação nas escolas da Califórnia.

De facto, as associações fundamentalistas cristãs estão em pé de guerra e a mobilizar as suas hostes contra uma proposta de alteração da lei SB 1437 que acrescenta o género e a orientação sexual à versão anterior:

«Nenhum professor dará instrução nem nenhum supervisor escolar de distrito apoiará alguma actividade que se reflicta negativamente em pessoas devido à sua raça ou etnicidade, género, deficiência física, nacionalidade, orientação sexual ou religião».

Para os teocratas esta proibição da mui cristã discriminação de mulheres e homossexuais é uma perseguição, uma opressão da Igreja reiteradamente carpida em prime time e nas primeiras páginas dos jornais:

«Nós estamos enfrentando, como nunca no passado, esta hostilidade contra o povo de Deus» bramiu o «perseguido» pastor Herbert Lusk, que recebeu mais de 1 milhão de dólares de financiamento federal ao abrigo dos programas baseados na fé de Bush. Este «mártir» cristão continuou advertindo:

«Não brinquem com a igreja porque a igreja já enterrou muitos críticos [suponho que todos menos os cristãos recordam alguns desses críticos, vítimas do zelo inquisitorial dos cristãos] e todos os críticos que ainda não enterrámos estamos a tratar dos preparativos do seu funeral».

Na realidade esta pretensão imbecil dos teocratas seria risível se não fosse preocupante. No país que dizem ser hostil em relação ao «povo de Deus», os ateístas são o único grupo que é socialmente aceite discriminar nos Estados Unidos. Numa sondagem conduzida pela Universidade do Minnesota verificou-se que os ateístas são a minoria em que os americanos menos confiam, com níveis de confiança inferiores aos que mereceram muçulmanos ou mesmo os odiados homossexuais.

Na realidade o estudo dos sociólogos do Minnesota era desnecessário, basta pensar que em muitos Estados americanos um motivo perfeitamente válido para decidir a custódia de crianças é a falta de religiosidade, sendo igualmente comuns os casos em que os juizes obrigam pais ateístas a dar educação religiosa aos filhos!

Como um dos membros do Supremo Tribunal mais citado como exemplo pelos teocratas, o juiz Joseph Story, perorava em meados do século XIX, para os cristãos americanos é obrigação do Congresso combater o ateísmo. A liberdade religiosa que afirmam estar em perigo e dizem defender, não se estende à liberdade de não professar uma religião. Aliás, sempre que algum crente se diz defensor da liberdade de religião em qualquer parte do mundo refere-se sempre à liberdade para a «sua» religião; nunca alguém viu um crente defender o direito ao ateísmo, o inimigo execrado e perseguido por todas as religiões!

Podemos apenas imaginar a guerra movida pelo exército cristão e as hordas ululantes em orgias de fé que se mobilizariam se alguma vez um único pai cristão fosse privado da custódia de um filho com base na sua fé!

Ou se, como no Texas, cuja Constituição (Artigo I, Secção 4) permite claramente a discriminação de ateístas em cargos públicos, «ninguém será excluído de uma posição pública com base nos seus sentimentos religiosos, desde que reconheça a existência de um Ser Supremo», o cristianismo fosse causa legítima de despedimento ou impedimento na contratação.

9 de Abril, 2006 Palmira Silva

A Espuma dos Dias

Elizabeth A. Castelli, professora de estudos religiosos no Barnard College e autora de «Martyrdom and Memory: Early Christian Culture-Making», analisa num artigo indispensável a conferência «Guerra aos Cristãos», organizada pela Vision America, uma organização que entre outras mui cristãs barbaridades, advoga pena de morte para abortistas, homossexuais e adúlteros.

O objectivo da dita conferência, realizada em Washington nos passados dias 27 e 28, consistia em «contribuir para uma genuína revitalização da fé cristã na América e na promoção de um adequada compreensão do papel da igreja na vida americana». Pelo teor da conferência dir-se-ia que este papel é um papel bélico porque um dos temas recorrentes foi a necessidade dos cristãos pegarem em armas para combater o demo e as suas muitas faces (que incluem os cristãos que não sentem o divino apelo às armas). Como bem evidenciado pelo grito de guerra de Ron Luce, o presidente e fundador da Teen Mania, uma organização revivalista cristã dirigida a instilar ódio aos infiéis nos jovens americanos. Inenarrante e cristãmente inspirado na Bíblia, mais concretamente em Juizes 19, o devoto ululou «Despedaçem a concubina*. Despedaçem a concubina. Despedaçem a concubina. Despedaçem a concubina.»

No artigo, demasiado extenso para comentar na sua totalidade pelo que recomendo vivamente a sua leitura, pode apreciar-se em todo o seu esplendor o ex-libris do cristianismo, a mania da vitimização e perseguição, nomeadamente na elevação a mártir de Tom «Chicote de Deus» DeLay, o antigo líder republicano do Congresso, grande promotor de uma «perspectiva bíblica» da política já que «Apenas o cristianismo permite uma forma de perceber as fronteiras morais e físicas» do «sentido da vida», que anunciou há dias a sua demissão do Congresso, depois de dois dos seus principais colaboradores se terem declarado culpados de várias acusações de corrupção no escândalo Jack Abramoff.

Como não podia deixar de ser um dos temas «quentes» duma conferência em que os pressupostos são que Deus deu os Estados Unidos aos cristãos para que estes aí estabelecessem uma nação baseada nos ditames da Bíblia, assentou nos malefícios da «cultura» e da «tolerância», ambas as palavras com uma conotação tão depreciativa que devem figurar proeminentemente no léxico do vernáculo fundamentalista cristão. Cultura e tolerância que afastam os Estados Unidos do seu grandioso destino porque para os devotos cristãos a crescente teocratização dos Estados Unidos é apenas um compromisso inaceitável já que o muro de separação igreja – estado ainda não ruiu completamente. E não podem existir compromissos quando a «verdade absoluta» e Deus são invocados.

A homossexualidade foi igualmente um tema que ocupou boa parte do tempo dos conferencistas, com leituras gráficas de sites homossexuais, uma abominação que a tal monstruosa «cultura» disfarça com termos como gay ou homossexuais e que Lou Sheldon da Traditional Values Coalition pretende ver substituidos por «sodomitas» e «os pervertidos».

Como termina Elizabeth Castelli o que ressalta desta conferência, um apelo explícito a um levantar de armas pelos cristãos numa guerra religiosa contra o Demo, personificado especialmente pelo sistema judicial norte-americano, é extremamente preocupante. Com o governo federal e muitos governos estaduais completamente dominados por teocratas, o único obstáculo à instalação da nação «bíblica» é o sistema judicial que mantém alguma independência, não obstante a cristianização recente do Supremo Tribunal. Parafraseando Castelli «Quando os poderosos pretendem ser impotentes e usam esta pretensão e um suposto mandado divino para autorizar um ataque sem tréguas a uma instituição política estamos certamente em terreno perigoso»

*Juizes 19:29 Quando chegou em casa, tomou um cutelo e, pegando na sua concubina, a dividiu, membro por membro, em doze pedaços, que ele enviou por todo o território de Israel.

9 de Abril, 2006 Palmira Silva

Justiça islâmica no Irão

A polícia iraniana deteve uma menina de 10 (dez!) anos no aeroporto de Teerão por estar incorrectamente vestida, mais concretamente por o manto que, conjuntamente com o lenço islâmico, todas as mulheres são obrigadas a usar, ser demasiado curto. A pena por tal crime é normalmente 100 chicotadas mas as ímpias que a tal se atrevam podem ainda ser condenadas até 10 meses de prisão.

Mais sorte teve um mullah que assassinou a sangue-frio e pelas costas um jovem no metro de Karadj (um subúrbio de Teerão ) e que foi condenado a … 3 anos de prisão por comportamento irresponsável!

Para a justiça islâmica que condenou um jornalista, Akbar Ganji, a seis anos de prisão (já terminados mas Ganji continua incarcerado) por «insultar éditos e figuras religiosas, ameaçar a segurança nacional e disseminar propaganda contra o regime islâmico», ou seja, escrever um livro, e condena as mulheres adúlteras a morte por apedrejamento (os homens recebem 100 chicotadas), as ofensas aos ditames do seu «profeta» são certamente mais gravosas que o assassínio de um mero humano, especialmente quando perpetrado por um mullah!

8 de Abril, 2006 Palmira Silva

Islamização crescente da Indonésia


Em breve as paradisíacas águas de Bali poderão refrescar apenas veraneantes modestamente vestidos como exemplificado por este modelo.

De facto, as autoridades indonésias preparam uma lei, a ser aprovada em Junho, que prevê pena de prisão de 10 anos e multa de 45 000 euros para quem exiba «indecentemente» em público umbigos, coxas ou ancas – alguns fundamentalistas querem incluir ainda os ombros nas partes anatómicas indecentes.

O projecto de lei, que se aplica igualmente a qualquer exibição da tentadora carne em papel ou em filme, pretende criminalizar qualquer comportamento considerado lascivo pelos piedosos fundamentalistas. Assim tudo o que possa ser considerado como ofensa à «decência» ou incitador de «luxúria», como um simples beijo em público, a popular dança erótica balinesa, o dingdut, ou mesmo roupa justa ou sugestiva será proibido. Casais não casados vivendo juntos ou a homossexualidade serão igualmente anátemas.

O projecto de lei, mais um na senda da islamização crescente do país, na prática servirá para impôr o código de conduta e vestuário islâmicos em todo o território da Indonésia incluindo locais como a Papua, onde é normal as mulheres exibirem os seios e os homens usarem apenas uma tanga ou o Bali, em que a maioria da população é hindu, e em que o estilo de vida tradicional está nos antípodas do que desejam os virtuosos religiosos.

Vários grupos religiosos e culturais por toda a Indonésia têm protestado veementemente esta proposta de lei que na prática tornará violações da lei, puníveis com pena de prisão e multas pesadas, numerosas tradições culturais.

No Bali os protestos foram especialmente audíveis especialmente por parte da comunidade artística porque, como afirmou um dos promotores de uma das manifestações, «As artes e crenças religiosas balinesas nunca consideraram a sensualidade e a sexualidade como uma coisa impura, moralmente repreensível. Pelo contrário, a sensualidade e a sexualidade são tratadas como componentes naturais, integrantes das nossas vidas como seres humanos».

O desrespeito pelas tradições locais e a imposição a todos da lei islâmica é ainda manifestado em muitos outros acontecimentos, como por exemplo o que aconteceu na bienal internacional de Jacarta ou na prisão em Java de Yusman Roy. O crime deste último, considerado «espalhar o ódio», foi a blasfema leitura de orações na língua local, Bahasa, em vez de árabe…

8 de Abril, 2006 Palmira Silva

Fundamentalismo em alta no sistema educativo britânico

O sindicato que representa o maior número de professores na Grã-Bretanha, o National Union of Teachers, avisou na quinta-feira que os fundamentalistas religiosos estão a ganhar controle das escolas nomeadamente através dos curricula aprovados pelo governo.

Uma moção a ser debatida na conferência anual do National Union of Teachers pede o fim do financiamento público de escolas confessionais e pede legislação «para prevenir a influência crescente das organizações religiosas na educação e ensino e o ensino de criacionismo ou desenho inteligente como uma alternativa válida à evolução».

De facto, como já tinha referido, a introdução, a verificar-se no próximo ano lectivo, do criacionismo nos curricula de ciências britânicos é extremamante preocupante.

Igualmente preocupante, especialmente quando consideramos que o Reino Unido, a par dos Estados Unidos, é um dos dois países ocidentais líderes no desastroso campeonato da gravidez adolescente e doenças sexualmente transmissíveis nesta faixa etária, são as notícias que as escolas católicas vão substituir os programas de educação sexual por programas de abstinência.

O programa, igualmente a ser introduzido no próximo ano lectivo, pretende seguir à letra as posições dos celibatários do Vaticano em matéria de sexo e relações pessoais. Embora sejam omissos em relação às recomendações de Ratzinger de que «é um dever cortar qualquer comunicação com pessoas que tenham se afastado da doutrina católica», o que certamente contribuirá para uma integração social muito católica dos jovens, os dignitários católicos informaram que se restringirão estritamente aos ditames do Vaticano no restante. Para isso, estão a preparar a formação dos professores encarregues de tal aberração, uma suposta educação sexual nas escolas católicas que consistirá em lavagens cerebrais destinadas a incutir nos jovens a sacralidade de óvulos e espermatozóides e que sexo só no casamento.

Como diz Michael McGrath, director do Scottish Catholic Education Service, «Nós daremos informação sobre o que é a contracepção … mas não iremos promover qualquer forma de contracepção artificial. O aborto não faz parte da educação sexual, mas claramente todas as escolas católicas irão promover a santidade da vida humana e não irão promover o aborto».

Como indica um artigo publicado no British Medical Journal os programas de abstinência «associam-se a um aumento do número de gravidez entre os casais dos jovens que os seguiram». De igual forma, a UNICEF é bastante inequívoca nas suas recomendações. Usando como exemplo a Suécia, que mudou a sua política de educação sexual de forma radical em 1975, explica a diminuição drástica de doenças sexualmente transmitidas e gravidez na adolescência neste país: «Abandonaram-se as recomendações de abstinência e de praticar o sexo exclusivamente no casamento, a educação contraceptiva tornou-se explícita e criou-se uma rede nacional de clínicas para jovens, concretamente para fornecer de forma confidencial orientação aos jovens sobre métodos e tratamentos contraceptivos… Durante as duas décadas seguintes, o índice de nascimentos em adolescentes baixou em 80%». As doenças sexualmente transmitidas, em contraste com os crescentes índices do RU e EU, baixaram neste país cerca de 40% nos anos 90.

Esperemos, a bem dos jovens que tenham a infelicidade de frequentarem estas escolas e da paz e integração sociais, que a moção do National Union of Teachers seja aprovada e seguida pelo governo britânico, ou seja, que tenha finalmente fim o financiamento público de escolas confessionais.

8 de Abril, 2006 Carlos Esperança

Centenário de S. Francisco Xavier (2)

(Foto do enviado do Diário Ateísta a Goa)

O 5.º centenário do nascimento de Francisco Xavier foi assinalado ontem, em Espanha, pelo cardeal mais reaccionário da Península Ibérica, Antonio María Rouco Varela, representante de B16 (déspota vitalício da ICAR), com a presença do rei.

Hoje, na Cordoaria Nacional, em cerimónia presidida por Freitas do Amaral, celebra-se em Portugal, com um dia de atraso, o nascimento do jesuíta.

Do programa, consta uma conferência sobre «A vida e a obra de S. Francisco Xavier» e um espectáculo de música e danças tradicionais de Goa, pelo grupo Ekvât, que encerra a sessão cultural e musical.

O cadáver de Francisco Xavier (na foto) é a metáfora de uma igreja que jaz morta e apodrece.

7 de Abril, 2006 Carlos Esperança

O centenário de S. Francisco Xavier

(Foto do enviado do Diário Ateísta a Goa)

Francisco Xavier nasceu em Navarra, faz hoje 500 anos, numa região espanhola onde o Opus Dei tem hoje uma Universidade, um hospital e imenso património financeiro e imobiliário. O Opus Dei é actualmente o que foi a Companhia de Jesus nos seus tempos áureos – uma ordem religiosa poderosa, prosélita, rica e temida.

Francisco Xavier entrou na Companhia de Jesus, alfobre de santos, apóstolos e mártires que evangelizaram o mundo. Como o deus antropomórfico dos cristãos era verdadeiro, coube a Francisco Xavier levá-lo ao domicílio a Goa, Molucas, Temate, ilha de Moro, Malaca e Japão, ao serviço do rei D. João III.

Escapou a China à sua evangelização porque Deus, carecido de almas, o chamou à sua divina presença antes de lhe arrebanhar mais fiéis.

Francisco Xavier continua morto desde Dezembro de 1552, mas é um dos santos mais prestigiados da ICAR. JP2 considerou-o «o apóstolo mundial dos tempos modernos» e apontou-o como exemplo para os missionários e para a acção evangelizadora da Igreja.

Apóstolo do Oriente e Padroeiro das Missões são alguns epítetos do taumaturgo cujo prestígio resistiu à perda do Estado Português da Índia, designação que o salazarismo atribuiu aos restos de um império onde Portugal semeava a fé e recolhia especiarias.

As comemorações do 5.º centenário do nascimento de Francisco Xavier são de grande importância para o marketing da ICAR.

Em nota pastoral, os bispos portugueses garantiram que «celebrar o V Centenário de Francisco Xavier, ilustre fundador da Companhia de Jesus, renovará nas comunidades cristãs a busca confiante da vontade do Pai, o zelo apaixonado pelo Reino inaugurado por Cristo e a responsabilidade de todos na actual largueza da missão impulsionada pelo Espírito Santo» – informou a agência Ecclesia.


Os CTT colaboraram com a emissão de dois selos comemorativos mas a falta de fé, em Goa, fez com que o corpo de Francisco Xavier, que se manteve em excelente estado de conservação durante séculos, apodrecesse nos últimos anos.

Deus esqueceu-se dele ou a ICAR perdeu a receita.

7 de Abril, 2006 Palmira Silva

Evolucionismo: mais um elo encontrado

A revista Nature desta semana dá mais uma machadada nas pretensões neo-criacionistas ou IDiotas dos fundamentalistas cristãos que pretendem que um misterioso «designer», isto é Deus, criou a vida na Terra não exactamente como a conhecemos mas com uma reduzida margem de manobra que contempla apenas a micro-evolução ou evolução dentro de uma espécie.

Os grupos de investigação de Edward Daeschler da Academy of Natural Sciences em Filadélfia, Farish Jenkins da Harvard University e Neil H. Shubin da Universidade de Chicago descrevem em dois artigos a sua descoberta de um fóssil de uma espécie (quasi) tetrápode, a que chamaram Tiktaalik roseae do nome Inuit para um peixe de águas pouco profundas. Este fóssil com 375 milhões de anos foi encontrado nos sedimentos de um antigo leito de um rio, no Ártico canadiano, a cerca de 1000 km do Pólo Norte.

Os cientistas afirmam que esta espécie é um elo na evolução de alguns peixes para animais terrestres. O Tiktaalik apresenta escamas ósseas e barbatanas mas as barbatanas dianteiras estão no processo de transformação em membros; o seu esqueleto interno apresenta a estrutura de um braço, incluindo ombro, cotovelo e pulso com barbatanas em vez de dedos. A equipa procura ainda no local um exemplar mais completo que permita avaliar o parte posterior do esqueleto da espécie.

Esta descoberta está a provocar alguma agitação nas hostes criacionistas americanas, que pretendem falsamente não existirem espécies transicionais. Nomeadamente multiplicam-se em acusações de «cientifismo», disparates sortidos e citações biblícas no post sobre o tema do blog da Nature.

6 de Abril, 2006 lrodrigues

A Tentação

Era, na realidade, uma mulher muito bonita.

Procurara-me porque pretendia divorciar-se do marido.
Casada há pouco mais de seis anos e com um filho de cinco, a decisão do divórcio era irredutível e, disse-me, tomada há já longo tempo.
As negociações com o advogado do marido foram até invulgarmente simples, e em muito pouco tempo tínhamos conseguido o divórcio por mútuo consentimento.

No final, embora ela não tivesse de o fazer, penso que adivinhou a minha curiosidade e acabou por me contar o que tinha conduzido à ruptura do seu casamento.

Como o marido era um fervoroso católico, casara-se pela igreja muito nova e ainda virgem, numa cerimónia muito bonita e cheia de gente bem.
Ela e o marido tinham combinado “mandar vir” um filho logo após o casamento e, de facto, menos de um ano depois nascera o único filho do casal.

Só que, logo pouco depois do nascimento do filho, começou a notar um notório afastamento do marido. O sexo desapareceu subitamente das suas vidas e o marido passou até a dormir no sofá da sala.
A primeira coisa que pensou foi que o marido era afinal homossexual; mas o problema não era esse.

Ao fim de muitas insistências, repetidas até ao logo de vários anos, o marido acabou um belo dia por lhe contar toda a verdade:
Não só era um piedoso católico como era até membro da Opus Dei.
Ora, como tinha combinado com a mulher não terem por enquanto mais filhos, o marido não queria manter com ela um relacionamento sexual como uma frequência tal que pudesse ser interpretada como pecado ou que não tivesse a procriação como objectivo primordial.
A pílula, o preservativo ou qualquer outro método anticoncepcional estavam absolutamente fora de questão, porque, como é bom de ver, constituíam um pecado e estavam proibidos pela Igreja.

A sua decisão de dormir no sofá da sala tinha uma explicação muito mais simples: como reconhecia que a mulher era muito bonita, não queria dormir com ela para não cair em tentação.

Durante algum tempo a mulher tentou ainda lutar pelo seu casamento, mas há já um bom par de anos acabara por desistir, face à intransigente persistência do marido.

Pois é:
Estou absolutamente convicto que este piedoso e fervoroso católico, ainda por cima membro da Opus Dei e tão fiel às suas convicções, quando morrer vai entrar direitinho para o Céu.

Mas, pelo que a mulher me contou ainda, sei também que vai entrar, sim, mas com um grande par de cornos…

(Publicado simultaneamente no «Random Precision»)