Poucos dias antes do segundo aniversário dos ataques terroristas em Bruxelas, a 22 de março, o governo belga passou a gerir a Grande Mesquita, até aí nas mãos de entidade da Arábia Saudita.
25 de Março, 2018 Carlos Esperança
Crimes em nome de Deus
As religiões, ao longo da História, destruíram impérios, devastaram povos e desenharam fronteiras. A fé arruinou nações, impediu a liberdade e esmagou a felicidade dos povos. Deus foi sempre o pretexto para destruir inimigos e cometer os mais hediondos crimes, com o álibi de satisfazer a sua vontade.
Deus está, de facto, para azar dos homens, em toda a parte. O deus mais verdadeiro é o que tem mais devotos, armas e o fanatismo a seu favor. Sempre que deus está em alta, a liberdade estiola; quando os homens adoram o seu deus, odeiam os alheios. Os crentes rogam os seus favores com o mesmo fervor com que acalentam o ódio ao deus alheio.
É por isso que a democracia fenece onde a religião floresce, a liberdade mingua onde a fé prolifera e o progresso estiola onde a piedade medra.
Não há democracia onde a religião domina o aparelho de Estado. Os direitos do homem não são respeitados onde o poder temporal e o religioso se confundem. Foi na base da separação de poderes e, sobretudo, na separação da Igreja e do Estado, que os modernos Estados de direito se construíram. Foi a laicidade que permitiu o pluralismo ideológico, opondo uma barreira de proteção à vocação totalitária das religiões.
Quando parecia que o Estado laico se tornara paradigma das nações civilizadas, quando a sociedade multicultural se convertia em modelo de convivência cívica, quando os preconceitos étnicos e culturais pareciam derrotados pela instrução, inteligência e sensibilidade dos povos civilizados, os demónios totalitários despertaram ao som das orações e fortaleceram-se com jejuns, pregações e liturgias.
A Holanda, a doce Holanda, era o exemplo de convivência cívica entre etnias diversas e diferentes culturas, um oásis de tolerância entre distintas opções políticas e religiões divergentes. Em 2003 ficou em choque, quando Pim Fortuyn, um político da direita populista foi assassinado. Depois, com o assassínio do cineasta Theo Van Gogh, após a denúncia que fez da forma como o Islão trata as mulheres, e dos requintes de crueldade com que o fanático religioso o tratou, tornou-se periclitante a manutenção da sociedade multicultural holandesa. Até hoje.
Incendeiam-se os templos e a opinião pública, e o racismo e a xenofobia crescem. A extrema-direita, que vive da intolerância, explora frustrações, instila o medo, manipula paixões e acicata ódios. A hostilidade aos estrangeiros desenvolveu-se. A fé das pessoas cultas e civilizadas nas sociedades multiculturais vacila. O fascismo islâmico rejubila com a intolerância de que é alvo. As religiões precisam de mártires. Os deuses querem sacrifícios. Os templos convertem-se em quartéis onde se faz a recruta para a guerra santa. Os homens entram em desvario ao serviço da esquizofrenia divina. A religião tem de ser contida. Os Direitos do Homem têm de ser defendidos. A igualdade entre os sexos tem de ser salvaguardada. A democracia precisa de ser salva. Há que erguer um dique à fé que corrompe, intimida e mata.
Os três últimos lustros acordaram o mundo árabe, no ocaso da sua civilização falhada, para uma vingança cega que a demente invasão do Iraque, em 2003, estimulou.
Desde então, não param de surgir devotos inebriados pelo martírio, em busca de virgens e rios de mel, na vertigem sangrenta de quem procura extinguir infiéis do seu deus para garantirem a paz eterna e as delícias de uma vida para além da que prematuramente prescindem.
E não há um antídoto compatível com a civilização que herdámos e nos cabe defender!