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Categoria: Vaticano

23 de Dezembro, 2009 Carlos Esperança

Quem acredita?

O papa João Paulo II foi enganado pelo ex-ditador chileno Augusto Pinochet durante uma visita a Santiago em 1987, segundo revelações feitas pelo cardeal Roberto Tucci em uma entrevista concedida ao jornal L’Osservatore Romano, do Vaticano.

Comentário: Ainda está fresca a memória dos esforços de JP2 para evitar a prisão do seu amigo Pinochet em Inglaterra.

18 de Dezembro, 2009 Carlos Esperança

O Vaticano tem razão

Vaticano proíbe casamentos entre baptizados e não baptizados

Às vezes a Igreja católica tem razão. A proibição de casamentos entre baptizados e não baptizados é um direito que lhe assiste. Qualquer associação privada tem o direito de impor regras aos seus associados. Era só o que faltava, obrigar a Igreja católica a gastar água benta com ateus ou crentes de outras religiões!

Não faria sentido uma associação de vegetarianos abrir as portas à confraria da chanfana ou uma associação ateísta aceitar elementos do Opus Dei.

O código canónico disciplina a conduta dos associados e o Papa é, na religião católica, o guardião supremo da legalidade que o regulamento impõe. Pode-se dizer que os poderes do pontífice são excessivos, mas o Vaticano não é uma democracia nem Bento XVI um democrata. À Igreja católica só adere quem quer, embora seja uma conquista recente e que custou muitas vidas ao longo dos séculos.

A única diferença entre as religiões e as outras associações é a natureza dos estatutos. Nas primeiras há o hábito de lhes atribuir origem divina e nas outras a obrigatoriedade de os submeter a sufrágio em assembleias gerais.

Não se devem criticar as exigências das Igrejas para quem quer usufruir dos seus rituais. O que não se lhes deve tolerar é que imponham os seus códigos a quem as despreza, que pretendam submeter o Estado à sua prepotência ou os cidadãos aos seus preconceitos.

Está em discussão a proposta de lei que permite o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Seria intolerável que a Assembleia da República impusesse à Igreja a obrigação de os celebrar canonicamente, tal como é inadmissível que a Igreja use os devotos para impedir a igualdade dos cidadãos perante a lei.

Quem quer ser respeitado, tem de respeitar os outros. O Estado não deve intrometer-se nos matrimónios canónicos e a Igreja não pode impedir os casamentos civis.

É nesta separação da Igreja e do Estado que reside a laicidade e a garantia da defesa dos princípios democráticos que nos regem.

13 de Dezembro, 2009 Carlos Esperança

Alguns dados sobre João Paulo II, em vias de beatificação

A morte de JP2 relembrou a dor e sofrimento que atingiu a URSS quando o pai da Pátria, José Stalin, exalou o último suspiro e recorda o histerismo demente que rodeou a morte do ayatola Khomeini em todo o mundo árabe, particularmente no Irão. Em comparação, a morte de Salazar foi chorada de forma contida, mas os déspotas produzem emoções mais fortes do que os democratas.

O absolutismo papal, restaurado com o apoio entusiástico do Opus Dei, da Comunhão e Libertação e de outros movimentos integristas, fez de JP2 o Papa da «Contra-Reforma», anti-modernista, infalível e retrógrado, que substituiu os anacrónicos autos de fé pela comunicação social e pela diplomacia.

O Papa da Paz, como os sequazes o alcunharam, apoiou a Eslovénia e a Croácia (maioritariamente católicas) e a Bósnia e o Kosovo, nações muçulmanas, contra a Sérvia cuja obediência à Igreja Ortodoxa constituía um entrave ao proselitismo papal que tem nos ortodoxos a principal barreira ao avanço do catolicismo para leste.
A protecção aos padres que participaram activamente no genocídio no Ruanda foi mais um desmentido do boato sobre o alegado espírito de paz e justiça que o animava.

A intervenção de JP2 a favor da libertação de Pinochet, quando foi detido em Londres, foi coerente com a beatificação de Pio IX, do cardeal Schuster, apoiante de Mussolini e do arcebispo pró-nazi Stepinac. O auge da ignomínia foi a meteórica canonização do admirador de Franco e fundador do Opus Dei, Josemaria Escrivá de Balaguer.

JP2, ele próprio profundamente supersticioso e obscurantista, chegou a ser obsceno na forma como inventou milagres para 448 santos e 1338 beatos cujos emolumentos contribuíram para o equilíbrio financeiro da Santa Sé e para o delírio místico dos fiéis fanatizados.
Da prática do exorcismo à exploração de indulgências, da recuperação dos anjos à aceitação dos estigmas como sinal divino (canonizou o padre Pio), tudo lhe serviu para alimentar uma fé de sabor medieval e uma moral de conteúdo reaccionário.

O horror que nutria pela contracepção, o aborto, a homossexualidade e o divórcio são do domínio da psicanálise. O planeamento familiar era para o déspota medieval um crime. A SIDA era considerada um castigo do seu Deus e, por isso, combateu o preservativo, tendo o Vaticano recorrido à mentira, afirmando que era poroso ao vírus (2003).
O carácter misógino, o horror à emancipação da mulher, a crença no seu carácter impuro, foram compensados pelo culto doentio da Virgem, recuperado da tradição tridentina.

Como propagandista da fé, pressionou Estados, condicionou a política de numerosos países, ingeriu-se nos assuntos relativos ao aborto, à eutanásia e ao divórcio e acirrou populações contra governos democraticamente eleitos. Apoiou comandos anti-aborto, estimulou a desobediência cívica em nome dos preconceitos da ICAR, influenciou a redacção da Constituição Europeia, e chegou ao despautério de pedir aos advogados católicos que alegassem objecção de consciência e se negassem a patrocinar o divórcio.

O Papa da Paz condenou a atribuição do prémio Nobel da Literatura a José Saramago; envidou todos os esforços para obter o Nobel da Paz para si próprio, que justamente lhe foi negado; excomungou o teólogo do Sri Lanka, Tyssa Balasuriya por ter posto em causa a virgindade de Maria e defendido a ordenação de mulheres; perseguiu ou reduziu ao silêncio Bernard Häring, Hans Küng, Leonardo Boff, Alessandro Zanotelli e Jacques Gaillot; marginalizou Hélder da Câmara e Oscar Romero; combateu o comunismo e pactuou com as ditaduras fascistas. João Paulo II morreu uns dias depois de o Vaticano ter proibido a leitura ou a compra do «Código Da Vinci» do escritor Dan Brown e sem nunca ter censurado a fatwa que condenou à morte o escritor Salmon Rushdie.

O Papa que morreu, segundo a versão oficial, no dia 02-04-2005 (soma = 13), às 21h37 (soma = 13), curiosidades «assinaladas» pelo bispo de Leiria/Fátima, não pode ser o algoz da liberdade, o déspota persecutório, o autocrata medieval, o ditador supersticioso e beato que conhecemos. É capaz de ser outro papa o que consternou chefes de Estado e de Governo, que alimentou os noticiários de todo o mundo, que rendeu biliões de ave-marias e padre-nossos, que ocupou milhões de pessoas a rezar o terço, vestígio do Rosário da Contra-Reforma, que recuperou graças ao apoio da Virgem Maria que também o promoveu nas suas aparições na Terra.

O Papa que morreu era talvez uma pessoa de bem que, modestamente, ocultou tal virtude. Foi celebrado por dignitários políticos, religiosos e outros hipócritas que, na morte, lhe enalteceram as virtudes e calaram os defeitos. Foi o cadáver que milhares de abutres aguardavam para exibir e explorar numa derradeira campanha de promoção da fé católica.

Foi, todavia, o mesmo Papa que anatematizou os ateus, fez inúmeras declarações contra o laicismo, silenciou teólogos, beatificou fascistas e combateu o planeamento familiar. A sua obsessão era reduzir o mundo a um casto bando de beatos, tímidos e idiotas, sempre de mãos postas e de joelhos. O livre-pensamento, a modernidade , o prazer e a liberdade foram os seus inimigos figadais.