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Categoria: Religiões

6 de Março, 2014 Carlos Esperança

A Europa, o franquismo e a memória

«Enquanto houver valas por exumar, haverá feridas abertas». Esta é a frase que Julián Rebollo, neto e sobrinho de vítimas do franquismo, repete com a mesma convicção e veemência no Parlamento Europeu e em Madrid, todas as quintas-feiras, na Porta do Sol. (El País, de hoje).

O Governo espanhol, onde a tralha franquista se alberga e dedica aos negócios, não está interessado em investigar o violento genocídio que o franquismo, de mãos dadas com a Igreja católica, levou a efeito.

Como foi possível à Europa, vencido o nazi/fascismo, esquecer as ditaduras ibéricas e deixar os ditadores a martirizar os seus povos? Como é possível privar a Espanha, ainda hoje, da inteligência, audácia e determinação do juiz Baltasar Garzón, afastado, em puro zelo fascista, da judicatura sem que um sobressalto cívico agite a consciência europeia e a memória perante a impunidade dos responsáveis pelos 150.000 desaparecidos, 30.000 crianças roubadas e 2.000 valas comuns em quase quatro décadas de ditadura?

Juntar a voz à de todos os espanhóis que exigem descobrir as valas dos seus pais e avós e à de Jordi Gordon, porta-voz da Plataforma pela Comissão da Verdade, é o dever dos europeus que se esqueceram do martírio dos povos ibéricos.

Há uma petição de 700 mil pessoas a pedir justiça, a exigir que os crimes do franquismo sejam conhecidos. Não é um ato de vingança que está em curso, é um módico de justiça para os que morreram sob as bombas da aviação nazi em Guernica, foram assassinados nas ruas espanholas por criminosos franquistas ou fuzilados nos campos de touros.

Nós, portugueses, que sabemos como os Viriatos ajudaram Franco na sublevação, como o Rádio Clube o apoiou, Salazar se comprometeu, e a GNR entregava os fugitivos para serem fuzilados, temos a obrigação de juntar a nossa voz, no Parlamento Europeu, à voz dos que pedem a descoberta da verdade lutando contra o esquecimento.

É preciso fechar as feridas abrindo as valas que os Tribunais espanhóis, a Igreja católica e o PP querem definitivamente encerradas. Bruxelas é o lugar para exigir justiça.

3 de Março, 2014 Carlos Esperança

Legionários de Cristo: a oportuna ‘ressurreição’ pré-pascal…

Por
O silêncio apostólico que tem envolvido os ‘Legionários de Cristo’ parecia ser a antecâmara da dissolução desta tenebrosa organização, depois de conhecidas as múltiplas tropelias do seu fundador – padre Maciel.
A decisão do actual papa em nomear um novo director e prosseguir com a actividade desta congregação link, apesar dos crimes (civis, entenda-se) já denunciados, reflecte as dificuldades como a ICAR lida com o Mundo, nas situações difíceis e intoleráveis.
 Trata-se de um escândalo de tal modo grave que o anterior responsável pelo Vaticano (B-16) foi ‘obrigado’, em 2010, a nomear um ‘delegado pontifício’ (Mons. Velasio De Paolis link)  para administrar esta estranha ‘Legião’ que, na prática, foi uma dos sustentáculos (a par da Opus Dei) do pontificado de João Paulo II.
O Mundo ‘acreditou’ que, perante o descalabro visível e a enormidade dos crimes, o ‘delegado’ (oriundo da Prefeitura para os Assuntos Econômicos da Santa Sé) seria o natural representante da Cúria na comissão liquidatária desta instituição católica. Na verdade, esboroada toda a sua missão apostólica assente em colégios e missões, restavam os avultados aspectos económicos inerentes à ‘crapulosa’ e miserável acção destes ‘legionários’.
Aliás, o comunicado sobre esta instituição e objectivamente sobre o trabalho do padre Maciel, documento que antecede a nomeação do delegado pontifício é, para um documento oriundo do Vaticano, muito claro: “Os comportamentos muito graves e objectivamente imorais do P. Maciel, confirmados por testemunhos irrefutáveis, representam às vezes verdadeiros delitos e manifestam uma vida sem escrúpulos e privada de autêntico sentimento religioso… link”.
Muita gente esperava a dissolução desta instituição onde os actuais membros não deixam de mostrar alguma nostalgia e admiração pelos ‘bons tempos’ do falecido padre Maciel link¸ link. Mas por detrás desta ‘montra’ estão duas questões fundamentais: o poderio económico desta instituição e a capacidade em municiar a ICAR com milhares de seminaristas/ano.
Dificilmente o Vaticano consegue escamotear uma infame situação: o padre Maciel esteve à beira da beatificação link.
Conhecida é também a incapacidade da Cúria para controlar e evitar os crimes (é disso que se trata) em algumas (e não só dos ‘Legionários’) congregações. Sob o ponto de vista de trajectória histórica é plausível admitir que desde há largos anos (décadas) o Vaticano conhecia o execrável comportamento do ‘comandante’ desta ‘Legião’, mas os proventos que daí vinham eram ‘irrecusáveis’ e davam ‘jeito’ (orçamento anual superior a 500 milhões de euros).
Este ano, em Abril, Francisco deverá canonizar JP II. A reabilitação da Legião serão as ‘matinas’ desse ofício santificador para um indefectível protector desta congregação e um relapso encobridor dos seus crimes a troco de ’30 dinheiros’.
Nada que acrescente especial valor à actual administração do Vaticano que diariamente usa os media. Esta é indubitavelmente uma resposta ‘vulgar’, acintosa e inaceitável da ICAR às acusações que foram objectivamente formuladas por organismo da ONU link.
Uma resposta totalmente condicionada pela torrente de dinheiro que flui desta congregação para o Vaticano, não sendo ‘aconselhável’ bulir, estrangular ou exorcizar.
É  a velha e pia doutrina do ‘Per omnia saecula saeculorum”…
2 de Março, 2014 Carlos Esperança

Aconteceu em 2 de março de 2001

 

Há 13 anos, um país assolado pela miséria, minado pela fanatismo, lacerado pela fome, onde as mulheres foram proibidas de acesso à educação e à saúde, teve de observar os rigorosos preceitos islâmicos e renunciar aos mais elementares direitos, com frequência à própria vida.

Poderia ter acontecido em diversos locais do planeta, mas aconteceu num país com uma cultura antiquíssima cujo poder foi assaltado pelos tristemente célebres estudantes de teologia, vulgo talibãs, quando dois budas gigantes esculpidos em pedra nos séc. II e V foram destruídos com mísseis e espingardas automáticas para não serem adorados falsos ídolos que “insultam o islamismo”. Aconteceu no Afeganistão.

Em todos os tempos e em várias religiões houve bárbaros que entenderam que os livros ou diziam o mesmo que o livro sagrado, e eram inúteis, ou diziam coisas diferentes, e eram prejudiciais.

A inteligência, a sensatez e a sensibilidade não são apanágio de uma só cultura, mas são contrárias à mais funesta de todas as misturas: a fé, a ignorância e o proselitismo. É esta mistura perversa que faz a infelicidade dos povos, a miséria das nações e a tragédia das sociedades que se desfazem em asfixiante submissão.

Destroem progressivamente o património cultural, da mesma forma selvagem com que suprimem as liberdades cívicas. E, enquanto a fome, a doença e a miséria devastaram a população, bloqueada pelo terror, o mundo urbanizado assistiu, impotente na sua raiva, a ver postergados os mais elementares valores que são o traço comum da civilização.

Os povos não são donos absolutos do património que detêm e são obrigados a responder pela sua guarda. Os déspotas, que exercem o poder de forma antidemocrática, terão de responder pelos dislates e crimes que cometem. E serão homens a julgá-los, sobretudo àqueles que se julgam com mandato divino.

Provavelmente o direito de ingerência encontraria então plena justificação. Perante as hordas de selvagens que um pouco por todo o lado conquistam o poder com armas que as grandes potências nunca deixaram de fornecer, exige-se uma nova ordem que liberte do caos e do crime organizado multidões que tiveram a desdita de nascer no sítio errado sob o jugo de tenebrosos trogloditas.

Este crime foi perpetrado em 2 de março de 2001. Há 13 anos. Hoje, o Afeganistão está, de novo, a ser abandonado à demência talibã.

Bamiyan_Buddha 1931

27 de Fevereiro, 2014 Carlos Esperança

Falta de pudor

O Ministro do Interior de Espanha, Jorge Fernández Díaz, concedeu a mais alta condecoração policial à Virgem María, concretamente a Nuestra Señora María Santísima del Amor, possivelmente pelo seu silêncio em relação aos escândalos do Governo.

Texto completo en: http://actualidad.rt.com/actualidad/view/120967-policia-espanola-medalla-virgen

El Ministerio del Interior de España concede una medalla a la Virgen
actualidad.rt.com
El ministro del Interior de España, Jorge Fernández Díaz, concedió la más alta condecoración policial a la Virgen María, concretamente a Nuestra Señora María Santísima del Amor.
25 de Fevereiro, 2014 Carlos Esperança

A Ucrânia, a anarquia e o futuro

Não me sinto capaz de tomar partido na rebelião popular, atiçada do exterior, num país em ruínas. A pobreza extrema, uma agricultura destruída no que foi o celeiro da Europa, a divisão étnica e a tradição autoritária e antidemocrática estão na origem de confrontos, que ameaçam continuar, para vingar o sangue já derramado.

Não vale a pena, agora, recordar as matanças e as migrações forçadas por Estaline que alteraram a matriz étnica e cultural do segundo maior país da Europa.

O que não entendo é a explosão do nazismo em apoio aos partidos que anseiam a união à Europa, como se a Rússia fosse um país africano e os nazis indefetíveis partidários da União Europeia. Também não entendo o apoio de alguma esquerda às forças pró-russas como se Moscovo fosse um soviete dirigido pelo comunista Ieltsin.

A disputa entre potências capitalistas, com a Rússia a ser alvo do apetite da Nato, pode provocar uma hecatombe e debilitar o poder russo. De certeza, altera-se a correlação de forças, com a NATO contida nos limites atuais, uma derrota para a Europa que serve de ponta de lança aos EUA, ou expandida até à fronteira russa, com a derrota de Moscovo.

É curioso ver comunistas a defenderem o poder sufragado em eleições e os reacionários a apoiarem histericamente a insurreição e atos de justiça popular, posições corajosas de quem está longe do conflito.

Debilitar a Rússia é acender o rastilho das antigas repúblicas soviéticas onde o fascismo islâmico pretende a desforra e a sharia, enquanto a Turquia se orienta, a recitar o Corão, em direção a Meca e as primaveras árabes mergulham na anarquia e nas cinco orações.

Com os erros da meteorologia euro/americana a anunciar primaveras árabes, temo que a Rússia fique à mercê de irrefreáveis hordas islâmicas que, no ocaso da civilização árabe, exacerbam a devoção e a demência.

E não haverá inocentes.

24 de Fevereiro, 2014 Carlos Esperança

Momento zen de segunda_24-02-2014

João César das Neves (JCN) intitula a homilia de hoje, no DN, “Liberdade, igualdade e amor” numa síntese constrangida entre a Revolução Francesa e a sacristia. Depois de debitar umas trivialidades sobre as revoluções “ britânica de 1688, americana de 1776, francesa de 1789 e seguintes”, sem dizer, talvez por pudor pio, quais foram as seguintes, demorou a chegar à sua obsessão, antes de afirmar que “a luta cultural deslocou-se para questões de sexo e limites da vida”.

Este homem é um escravo do sexo obcecado com a castidade e um defensor da vida que começa nos óvulos ou nos espermatozoides, julgando que a ejaculação, durante o sono, é um genocídio involuntário. Acordado, é um pecado.

A êxtase religioso atinge-o quando afirma que “Vêem-se os conceitos, as lógicas e os métodos que os antigos aplicavam à nobreza, escravatura, pena de morte, proletariado ou racismo, utilizados em assuntos eróticos e hospitalares».

Só quem esteja acostumado ao devoto percebe a linguagem exotérica e a piedade que o devora antes de continuar a leitura: “ O direito ao aborto e à eutanásia tomam o lugar do direito ao voto; a emancipação de mulheres ou jovens vem na vez dos escravos; o doente terminal ou o homossexual surge na posição do operário ou negro. Casamento é contrato; adopção, sociedade”.

JCN lamenta que ao direito ao voto seja acrescentado o direito ao aborto e à eutanásia; que após a abolição da escravatura se emancipem as mulheres; que o casamento seja um contrato e não um sacramento; enfim, é um fóssil do Concílio de Trento.

Há pérolas de que não quero privar os leitores. Ei-las: “Dentro da fraternidade familiar, liberdade e igualdade tomam sentidos estranhos. Por isso, divórcio, aborto ou eutanásia só retoricamente libertam; de facto, matam. Fora da metáfora não existe igualdade entre jovem e velho, homem e mulher, casamento e união de facto, pais e filhos, amor conjugal e promiscuidade, sexo e perversão».

A obsessão do sexo é, em JCN, síndrome de privação. E termina com uma frase banal: “A família é o que sempre foi e será. Ela constitui o verdadeiro mundo sempre novo.”

«Bem aventurados os pobres de espírito…», como diz a Igreja de JCN.