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Categoria: Catolicismo

11 de Junho, 2010 Carlos Esperança

ICAR – Como se faz um milagre

Imagine, caro leitor, que um pobre diabo, sem emprego nem casa, sem pão e sem futuro, combinava explorar a superstição popular com um dos muitos doentes a quem o médico coloca no processo «doença incurável», para lhes serem pagos os transportes do local de residência até ao hospital.

Imagine que o doente «incurável», depois de curado, se metia na Igreja a agradecer à avó do primeiro, defunta há muitos anos e devota em vida, por tê-lo curado, alegando que lhe beijou a foto a preto e branco e que rezou duas ave-marias enquanto lhe pedia a cura.

Imagine que era numa dessas aldeias onde a luz chegou há pouco e a fé se instalou há muito, que sendo grande o analfabetismo não lhe faltou o padre, que não tinha telefone mas lhe sobravam devotas e que a população se transferia para casa da miraculada (os milagres são mais frequentes em mulheres) armada de terços e sôfrega de ave-marias.

Quando começassem a ficar as primeiras peças de ouro e as velas a enegrecer o tecto da casa, não faltariam devotos vindos de longe nem o padre a sugerir que a Igreja não se pronunciava. A paróquia seria referida pelo bispo com ar de quem punha em dúvida o prodígio para mais tarde poder dizer que não foi a Igreja que impôs o milagre mas o milagre que se impôs à Igreja.

Se, então, os brincos, cordões de ouro e outras jóias ou euros dos crédulos começassem a ser distribuídos entre os dois conluiados, a miraculada e o que teve a ideia, a Igreja logo denunciaria a tramóia e ameaçaria os crentes com as perpétuas penas do Inferno se persistissem no culto. Se, pelo contrário, a paróquia conseguisse arrecadar o pecúlio, não faltariam vozes que apregoassem o milagre e nunca mais escasseariam flores na campa da defunta avó nem mimos e promessas do Paraíso na casa da miraculada.

Só o desgraçado da ideia teria de ir tentar outro expediente.

Um milagre reconhecido pela Igreja é uma fonte de rendimento, caso contrário é um assunto de polícia.

9 de Junho, 2010 Ricardo Alves

Padre pedófilo sai da prisão e vai celebrar missa

Aconteceu em Espanha: cumprida a pena de prisão por abuso sexual e agressões a uma criança de dez anos, o sacerdote católico Luis José Beltrán Calvo saiu e foi dar missa. Não sofreu, e aparentemente não sofrerá, qualquer sanção eclesial. E nem sequer há garantias da hierarquia da ICAR de que se evite o seu contacto com crianças.

7 de Junho, 2010 Carlos Esperança

Os negócios da fé e a exegese católica

Nunca percebi, nem me sabem explicar os que levam a sério o Vaticano, como é possível a uma alma caída no Inferno viajar para o Paraíso sem transportes negociados entre dois destinos turísticos que, em princípio, estão de relações cortadas.

Ao longo da história aconteceu a alguns excomungados morrerem com bilhete marcado para o Inferno e acabaram reintegrados no número dos bem-aventurados e conduzidos aos altares, para bem da fé e dos negócios respectivos.

Não sendo compreensível que um santo aprovado com um mínimo de dois milagres se alcandorasse aos altares e se mantivesse eternamente a frigir em azeite nas profundezas do Inferno, é difícil saber como pode ser resgatado das perpétuas penas para as delícias celestiais igualmente definitivas.

Bem sei que Joana d’Arc, depois de queimada viva, seria reabilitada e canonizada cinco séculos depois mas a infalibilidade dos papas só existe depois de Pio IX um desalmado cuja encíclica Syllabus ainda hoje arrepia o mais insensível dos trogloditas.

O que agora perturba alguns créus é a excomunhão com que João Paulo II condenou às eternas tormentas Monsenhor Lefebvre e os seus sequazes para agora ser discretamente recuperado pelo actual pontífice.

O bando de Lefebvre é declaradamente partidário do Concílio de Trento, de posições fascistas e do mais primário e execrável anti-semitismo, o que faz da Fraternidade Sacerdotal São Pio X a comunidade menos recomendável para servir de modelo ético.

Não se percebe como pode agora o bispo Lefebvre, depois de amaldiçoar em latim a temperatura do Inferno viajar para o Céu pela mão da actual santidade de turno no Vaticano – Bento XVI.

São insondáveis os mistérios daquele bairro de 44 hectares!

31 de Maio, 2010 Carlos Esperança

Momento zen de segunda_31-05-10

Tudo indica que João César das Neves (JCN) esteve demasiado tempo mergulhado em água benta quando lhe impuseram o baptismo e que a substância não identificada que altera a água normal passou a barreira hematoencefálica do neófito.

Na homilia de hoje, em que a assinatura de Cavaco Silva surge no Diário da República a promulgar a lei que permite o casamento entre pessoas do mesmo sexo, atitude que só o nobilita, JCN ameaça-nos, num excesso de raiva, com o modelo chinês para substituir as democracias ocidentais. Ninguém diga ao bem-aventurado que a China foi o país que tornou o aborto obrigatório quando ele nunca se conformou que deixassem de prender as mulheres que o praticam, às vezes em circunstâncias dramáticas.

Ao PR compara-o a Pilatos, à maioria da AR chama «um grupito de deputados» e à decisão que garante direitos individuais e fazia parte de compromissos eleitorais que os eleitores sufragaram, acusa-a de ter mudado a definição de casamento quando apenas integrou os que excluía por mero preconceito beato.

JCN, que apenas considera legítimo o acto sexual para a reprodução, afirma que esta lei se insere numa «vasta campanha de promoção do erotismo, promiscuidade e depravação a que se tem assistido nos últimos anos». Não vale a pena discutir com JCN porque é uma inspiração divina igual á que o leva a acreditar que Nuno Álvares Pereira curou o olho esquerdo de D. Guilhermina de Jesus, queimado com salpicos ferventes de óleo de fritar peixe.

Anda tão desnorteado o bem-aventurado que julga haver na AR deputados capazes de «apoiar coisas abstrusas, como a proibição de touradas ou rojões, imposição da ordenação sacerdotal de mulheres ou a obrigatoriedade de purificadores atmosféricos».

Dentro do espírito marialva de JCN, a defesa das touradas tem a mesma legitimidade dos rojões».

Enfim, a água benta deu-lhe cabo dos neurónios e eu, que não a distingo da outra, não posso provar os malefícios que um sinal cabalístico faz à água normal.

Amem.

24 de Maio, 2010 Carlos Esperança

COPÉRNICO revisitado pela ICAR…

Por

E – Pá

Micolaj Kopernik, mais conhecido por Nicolás Copérnico [ou “Copernico” – sem acentuação – como pronunciou Cavaco Silva de visita à Polónia], foi um astrónomo polaco, grande impulsionador da teoria heliocêntrica, tendo influenciado de modo determinante a Astronomia no séc. XVI – é considerado o “pai” da Astronomia moderna – com a publicação da obra “De Revolutionibus Orbium Coelestium” […Sobre as revoluções dos corpos celestes ].

Esta obra científica viria a inspirar um outro grande vulto da Astronomia, Galileu Galilei, que – um século mais tarde – desenvolveu a concepção heliocêntrica do Universo, baseando-se nas teorias de Copérnico.

Na verdade, a concepção heliocêntrica defendida no livro de Copérnico é muito antiga. Remonta ao séc. III aC (Aristarco de Samos ) que apesar de não a referir expressamente, causou escândalo nos meios filosóficos, sendo acusado de “impiedade” [qualidade do que é ímpio] por Cleanto, um filósofo estoicista.

Vários séculos após, i.e., no século XVI, a ICAR [ainda] defendia a “teoria geocêntrica”, derivada de enviesadas interpretações bíblicas, da assimilação de concepções aristotélicas e da consagração do modelo ptolomaico do sistema solar.
De facto, a teoria geocêntrica servia a concepção universalista do poder emanado de Roma, sendo um sustentáculo para a afirmação do poder papal. O centro do Universo seria a Terra [onde os papas pontificavam] e tudo girava à sua volta.

Copérnico, conhecedor da ortodoxia científica e da rigidez doutrinária da ICAR [além de astrónomo tinha formação clerical], e dos vastos poderes inquisitórios, só publicou o seu livro quando sentiu aproximar-se o fim da sua vida [1543].
Aliás, as suas cautelas em relação à proverbial senda persecutória da ICAR a tudo o que é inovador levaram-no a tomar insólitas atitudes, por exemplo, recusar o convite da Igreja com vista à elaboração de um novo calendário com a escusa de ser um ignorante do movimento dos astros, quando dedicava grande parte do seu tempo em observações e cálculos astronômicos …

Estas atitudes e escusas evitaram a sua perseguição directa já que pertencendo às “famílias clericais tradicionais” [órfão aos 10 anos foi educado por um tio bispo], desempenhou, paralelamente à sua actividade cientifica, funções eclesiásticas na qualidade de cónego. Por outro lado, mesmo na época das trevas, era incómodo perseguir um morto…

Na verdade, a primeira reacção da Igreja Católica – ao contrário do Copérnico esperava – teria sido um misto de surpresa e curiosidade. A alta hierarquia religiosa, dominada pela influência da Companhia de Jesus [jesuítas], chegou a insinuar a Copérnico que desenvolvesse as suas novas ideias…

Claro, que esse desejo de desenvolvimento manifestado pela ICAR não passava de uma pura mistificação. Pouco tempo depois de publicar “De Revolutionibus Orbium Coelestium”, fruto de decénios de investigação pessoal, mantida em silêncio, Copérnico falecia [dois anos antes do Concílio de Trento].

Passado um século, Galileu Galilei, um brilhante astrónomo que divulgou e desenvolveu a teoria heliocêntrica de Copérnico e simultaneamente, um homem profundamente religioso, pagou, à ortodoxia religiosa, esta factura [adiada].
Galileu, foi investigado por um tribunal presidido pelo cardeal Roberto Francisco Belarmino [jesuíta], homem culto e moderado que evitou as mais drásticas consequências [a fogueira].
Aliás este cardeal, posteriormente tornado santo, tem um percurso eclesiástico, no mínimo curioso. No seguimento da morte do papa Paulo V, realizou-se em 1621 o conclave para a eleição do seu sucessor. O colégio cardinalício era dominado pelos chamados “cardeais sobrinhos”, i.e., familiares do papa em exercício nomeados cardeais. O cardeal Borghese, sobrinho de Paulo V, seria o homem que escolheria o próximo papa, tendo indicado para o cargo o cardeal Campori. Estava seguro desta sucessão já que tinha “arrebanhado” 29 cardeais nomeados pelo seu tio [Paulo V, um borghese]. O conclave não correu bem e os arregimentados purpurados mudaram de opinião, não concretizando os combinados acordos. Seguiu-se o escrutínio e o acima citado cardeal Roberto Francisco Belarmino obteve o maior número de votos [como aliás já tinha sucedido no anterior conclave de 1605 que pôs termo ao domínio da família Médici e catapultou os Borghese na posse da tiara pontifícia].
O cardeal Roberto Francisco Belarmino, na altura com 78 anos, recusou a dignidade papal, dando origem à posterior eleição de um papa de transição, um idoso e doente cardeal que tomou o nome de Gregório XV. À luz da doutrina religiosa não se entende como pode um cardeal rejeitar a iluminada intervenção do “divino Espírito Santo”, teologicamente responsável pelas escolhas do sacro colégio cardinalício. Desconheço se esta bizarra situação é um caso único ou se existem outros precedentes.

Depois desta deriva, voltemos às concepções heliocêntricas do Universo.

Em 1615 o Tribunal do Santo Ofício declara o heliocentrismo herético e a teoria de que a Terra se move “teologicamente errada”.
Galileu é condenado à prisão domiciliar perpétua, mas a reacção da cúria romana não fica por aí.
Os livros de Galileu entram para o Index Librorum Prohibitorum e, passado um século após a sua publicação, o livro de Copérnico [“De Revolutionibus Orbium Coelestium”] é repescado e tem o mesmo destino.

Em 1623, um novo conclave elegeu Urbano VIII, um amigo pessoal de Galileu. Este papa concede a graça [uma piedosa oportunidade] ao astrónomo de Pisa, no sentido de este escrever uma obra onde dissertaria sobre as suas teorias.
Galileu escreve, então, o livro “Diálogo sobre os dois grandes sistemas do mundo” onde confronta os 2 sistemas: Ptolemaico e Coperniciano.
Esta publicação tem o condão de irritar profundamente o papa que se sente ofendido. Em consequência, a “santa” Inquisição, julga e condena Galileu a abjurar publicamente suas opiniões… etc. [segue-se a conhecida saga de Galileu na defesa da verdade científica …].

Em pleno séc. XX a Igreja católica retratou-se de alguns dos danos que causou à Humanidade com as suas “verdades teológicas”. Galileu foi um dos visados nessa pretensa reconciliação com a Ciência.
Desconheço se Copérnico também foi objecto de algum pedido de desculpas oriundo do Vaticano.

Todavia, neste mês de Maio e no ano da graça de 2010, a ICAR decicdiu homenageá-lo e, Copérnico, foi transladado da tumba rasa no pavimento da catedral de Fromborg – depois dos seus restos mortais serem confirmados por análises de ADN – para um elaborado e faraónico sepulcro [em granito negro e duas toneladas de peso], colocado em lugar de destaque no referido templo [sob o altar-mor].

Essa cerimónia foi presidida pelo representante do papa na Polónia, arcebispo Jozef Kowalczyk, que oficiou uma imponente cerimónia religiosa.

Enfim, um homem da ciência que no passado foi considerado, pela mesma Igreja [que hoje oportunisticamente o homenageia], um herege, embuído de satânicas ideias revolucionárias…

A evidência da mais pura hipocrisia e o testemunho histórico de uma incontornável e farisaica falsidade.
O Mundo assistiu atónito a mais esta manobra da ICAR. Será sempre assim no seio desta milenar instituição.

Per omnia saecula saeculorum…