Loading

Categoria: Catolicismo

11 de Dezembro, 2018 Carlos Esperança

Catolicismo

O pecado só existe até à absolvição. Absolvem-se uns aos outros e atacam em conjunto.

O pecado só existe até à absolvição. Absolvem-se uns aos outros e atacam em conjunto.

6 de Dezembro, 2018 Carlos Esperança

Hoje, no 40.º aniversário da Constituição espanhola (6-12-2018)

A Constituição Espanhola de 1978 foi ratificada em referendo a 6 de dezembro de 1978, sancionada pelo rei a 27 de dezembro e publicada no Boletim Oficial do Estado, 2 dias depois, pondo fim ao período de transição.

Era ainda o tempo de todos os medos, o medo dos fuzilamentos cujo eco ressoava nas praças de touros, o medo do garrote, o medo das brigadas assassinas, ao cair da tarde, que muitos ainda recordavam, o medo da ressurreição do ditador, o medo dos sequazes, chamados à negociação, com pinças, o medo de desobedecer à vontade do ditador e ao rei que ele impôs.

Adolfo Suárez, falangista que entrou na política pela mão de Fernando Herrero Tejedor, um falangista ligado ao Opus Dei, que o apoiou antes e depois da morte do genocida, foi um liberal pragmático que compreendeu o fim de uma era e teve o mérito de reunir falangistas convertidos à democracia, social-democratas, liberais e democrata-cristãos nas eleições de 15 de junho de 1977, as primeiras depois de 1936, que venceria ao leme de uma coligação de direita com poderes constituintes.

Foi um referendo, a forma de passar de contrabando o que se quer e o que se recusa, com todos os medos ainda presentes, que legitimou uma Constituição que fez a transição pacífica da ditadura e manteve no poder o aparelho franquista e na Igreja os cúmplices, nas dioceses e paróquias, com o Opus Dei, força que deu força aos genocídios, a manter vivo o respeito pelo franquismo, que ora ressurge.

A Constituição impôs dissimuladamente o regime que o ditador fascista quis, com o rei que escolheu e educou. As sucessivas sondagens, que davam preferência à República sobre a monarquia, como confessou Adolfo Suárez, presidente do governo de Espanha de 1976 a 1981, e primeiro presidente democrático após a ditadura, levou a que a Constituição fosse referendada com a monarquia dentro.

A Constituição permitiu a transição possível face ao medo de confrontar a herança de Franco no país onde o franquismo manteve o poder nas forças armadas e de segurança, nas autarquias e no aparelho de Estado, nos Tribunais e sacristias, recordado ainda das centenas de milhares de mortos e vindictas franquistas.

Não era fácil impor a um aparelho de Estado indemne, moldado pela Falange, uma Constituição que consagrou o regime pluripartidário. E isso foi conseguido. As futuras alterações cabem aos espanhóis, mas, por ora, é de celebração a instauração do regime pluripartidário a que deu origem quando ganham terreno o fascismo e a nostalgia da mais cruel ditadura da Europa.

E os bispos já comandam o regresso à ditadura.

2 de Dezembro, 2018 Carlos Esperança

A Irmã Lúcia e os folhetins dos segredos

Lúcia de Jesus dos Santos ou Irmã Maria Lúcia de Jesus e do Coração Imaculado, Irmã Lúcia, para os mais chegados, fez a 1.ª comunhão aos 6 anos e aos 14 tornou-se reclusa, como pensionista, na escola das Irmãs de St. ª Doroteia, em Vilar, próximo do Porto.

A 3 de janeiro de 1944, já com letra aprimorada e intimidade com o divino, escreveu, a pedido, a “Terceira Parte do Segredo de Fátima”, quando ainda usava o pseudónimo de Maria das Dores e vivia enclausurada em Tui, Espanha.

Já era então vasto o currículo místico, com amplo traquejo no campo das visões, desde as entrevistas com a Virgem, que saltitava de azinheira em azinheira, até aos rodopios do sol, transformado em bola de fogo, a brilhar em numerosas cores, e à viagem ao Inferno onde encontrou o Administrador do Concelho de Ourém, a frigir como merecia, por, em vida, ter faltado à missa.

A Terceira Parte do Segredo de Fátima foi um ponto alto da sua bibliografia pois era a profecia que o papa João Paulo II, na sua superstição, entendeu ser a seu respeito. Esse recado celeste vai agora ser investigado por uma professora catedrática de Coimbra, Maria José Azevedo Santos, não porque tenha a santidade no apelido, mas por ser uma cientista em Paleografia, Diplomática e Codicologia, ciências terrenas que hão de ajudar a compreender as idiossincrasias do Paraíso.

A Congregação para a Doutrina da Fé, ex-Santo-Ofício, de passado pouco estimável, é a possuidora do valioso documento, ora emprestado, pelo prazo de 1 ano, ao Santuário de Fátima onde integrará a exposição «Segredo e Revelação», evento que acordará paixões pias e êxtases místicos.

Espera-se que no acervo dos alvitres da Senhora do Rosário – nome com que a virgem se apresentou aos pastorinhos –, não faltem as cartas que a experiente vidente dirigiu a Marcelo Caetano pedindo legislação adequada para a altura das saias e o tamanho das mangas dos vestidos femininos.

Sabe-se que a Ir.ª Lúcia está no Céu porque, no dia do seu funeral, o Papa João Paulo II e o futuro Papa Bento XVI disseram que ela iria para o céu e Deus seria incapaz de os contrariar.

25 de Novembro, 2018 Carlos Esperança

Guarda — Cidade Natal

O pio autarca, Álvaro Amaro, decidiu que entre 1 e 25 de dezembro deste ano a Guarda seja “cidade Natal”. O Jornal do Fundão, desta semana, diz que é uma reincidência, com comunicado, onde o edil declara que “a Guarda brilha mais alto com a cidade Natal”, um slogan capaz de erguer presépios em cada esquina e atrair turistas a todos os becos.

A ideia não é original, já Fernando Ruas, há anos, proclamou Viseu “capital do Natal”, o que hilariou autóctones e forasteiros. Álvaro Amaro, mais modesto, retirou a “capital” à lucubração litúrgica, e manteve o brilho das boas ideias com um slogan à sua altura.

O grande timoneiro teve uma ideia brilhante e, ao contrário do poeta, “Natal é quando um homem quiser”, decidiu amputar seis dias ao mês do Natal das gentes cristãs.

Se a fúria litúrgica for contagiosa, como a gripe ou a tuberculose, os autarcas do distrito correm atrás dos rituais e teremos Seia, cidade da Páscoa; Gouveia, cidade do Advento; Pinhel, cidade da Quaresma; Sabugal, cidade da Semana Santa; e, esgotados os tempos litúrgicos, as outras autarquias confiscam as festividades cristológicas.

Meda será a cidade da Epifania; Sabugal, cidade do Batismo do Senhor; Foz-Coa, cidade da Apresentação do Senhor; Trancoso, cidade d’A Ascensão do Senhor; Fornos de Algodres, vila do Pentecostes; Aguiar da Beira, vila da Santíssima Trindade; Celorico da Beira, vila do Sagrado Coração de Jesus; Figueira de Castelo Rodrigo, vila do Cristo Rei; ficando a minha querida Almeida, a vila do Corpus Christi.

Ámen.

Apostila – Aproveitei para recordar aos meus leitores mais pios os tempos litúrgicos e as festas cristológicas que as minhas catequistas me ensinaram, por entre terrores do Inferno e ameaças de tuberculose e cegueira originadas por pecados que ignorava ainda.

6 de Novembro, 2018 Carlos Esperança

Franco e a memória histórica

Abra-se o Google, procure-se uma enciclopédia, leia-se um pouco da História do século XX , e Franco está sempre entre os mais inclementes e frios assassinos da Humanidade.

Como pode, pois, uma família que se locupletou com os roubos que o ditador lhe legou, reclamar do opróbrio do presumível ascendente a honra de que se ufana e condicionar o Estado espanhol na tardia reparação que deve às centenas de milhares de vítimas, com a trasladação do cadáver para um sítio discreto?

A transição pacífica para a democracia permaneceu cheia de equívocos, com o medo a espreitar dos quartéis, as estátuas do ditador a decorarem as praças e as academias, e o franquismo a manter-se vivo no paço real, nos tribunais, nas escolas e nas igrejas.

Quando o ditador morreu, o rei que ora é julgado pela opinião pública por comissões em negócios, fuga de capitais e branqueamento de capitais, defendido de uma investigação por uma iníqua imunidade perpétua, deu-lhe como túmulo um monumento faraónico no Vale dos Caídos, um monumento de exaltação da vitória fascista sobre a República e de afronta às centenas de milhares de vítimas da sedição contra o regime legal.

Mais tarde, quando a viúva faleceu, Filipe Gonzalez deu-lhe, em terreno do Estado, um túmulo digno de figuras históricas que honram o passado de Espanha. Estes equívocos alimentaram o ego e a cleptomania dos descendentes, indiferentes aos crimes que não cometeram, mas de que se honram.

Hoje, quando a Igreja católica se tornou mais cauta, como sucede com todas as instituições, em democracia, e procura esquecer o seu passado sombrio na ditadura, é surpreendente como os herdeiros de Franco ainda detêm poder para estorvarem a reparação histórica que a democracia exige e os familiares das vítimas merecem.

Por que motivo Hitler, Mussolini, Pétain, Tiso, Salazar, Mosley ou Pinochet, bem como outros facínoras europeus de países colaborantes dos dois primeiros, ou Tojo Hideki, no Japão, não têm monumentos fúnebres a perpetuarem-lhe a memória?

Certamente, os familiares também haviam de gostar, mas, contrariamente a Franco, não tiveram sucessor imposto nem condições que o permitissem.

A urgência da trasladação dos restos mortais de Franco é uma questão de salubridade política e de justiça histórica.

2 de Novembro, 2018 Carlos Esperança

A bênção do Multibanco

A caixa do Multibanco

Compreendo a bênção do gado para evitar moléstias que o dizimam, embora considere o ato mero placebo, assim como a bênção das armas dos países de determinada religião, para que o deus dos autóctones as ajude a matar os inimigos de um deus diferente.

Habituei-me cedo a ver crentes convocados para as novenas quando apertava a canícula e o renovo estiolava, às vezes com efeitos devastadores de uma trovoada a dizimar o que sobrava, talvez por excesso de rezas ou devoção a mais dos mendicantes.

As medalhinhas e santinhos ficavam valorizados com os sinais cabalísticos que o padre desenhava para os abendiçoar, mas as caixas multibanco não faziam parte da memória da minha infância, nem a água benta aspergia alfaias mecânicas porque, se as havia, não tinham ainda substituído a enxada, o arado e a foice ou não eram conhecidas.

Foi, pois, com enorme júbilo que tomei conhecimento do batismo católico de uma caixa multibanco, com o alto patrocínio da Câmara Municipal de Vila do Conde, depois de a anterior, certamente não abençoada, ter sido explodida e assaltada. À explosão violenta, com fins criminosos, procedeu bem o presidente da Câmara ao promover uma explosão de fé, com fins piedosos, à guisa de exorcismo.

A inauguração da caixa de multibanco com a bênção do padre da freguesia pode não ser demonífugo bastante para novo crime, mas o exorcismo patrocinado pelo edil e oficiado pelo abade, se não faz bem à alma dos paroquianos é uma bênção para o fígado dos incréus.

 

30 de Outubro, 2018 Carlos Esperança

Espanha – 30 de outubro de 1975

Há 43 anos, o maior genocida da História da Península Ibérica decidiu que Juan Carlos passasse a ser o chefe de Estado interino de Espanha, sob o pseudónimo de príncipe.

Francisco Franco fez da discricionariedade o método de decisão e da violência a arma do poder vitalício. O terror que infundiu condicionou o futuro de Espanha e o da posterior democracia cuja existência nunca admitiu ou sonhou.

O vil assassino, que morreu confortado com todos os sacramentos e rodeado de uma multidão de cúmplices do clero e das Forças Armadas, legou a Espanha um descendente de uma extinta monarquia, que mandara educar nas madraças da Falange.

A ditadura clerical-fascista extinguiu-se com a peçonha que a criara, mas o fascismo e o clero que a apoiou manteve-se incólume e resiste nos paços episcopais, paróquias, Forças Armadas e policiais, órgãos do poder e universidades que oferecem diplomas aos dignitários da direita.

A transição pacífica para a democracia poupou a Espanha a aventuras sangrentas de que só a desesperada tentativa do “23-F” foi exceção, sendo os cérebros, com escassos neurónios, os generais Milans del Bosch e Alfonso Armada, condenados a 30 anos de prisão que só em parte cumpriram.

O fracasso do golpe de Estado, de que muito provavelmente sairia chefe do Governo o general Alfonso Armada, foi atribuído ao alegado repúdio do rei. Foi uma excelente ideia para salvar a monarquia, mas não é crível que o general Alfonso Armada, que previamente informou os EUA e o Vaticano, cujas reações se desconhecem, encabeçasse um golpe contra o seu ex-pupilo. As cumplicidades civis não foram investigadas e só o líder franquista dos “sindicatos verticais”, Juan García Carrés, foi preso.

Enquanto se procuram silenciar as notícias sobre as valas comuns, onde jazem as centenas de milhares de vítimas do franquismo, fria e metodicamente assassinadas, depois de consolidado o poder contra a República democraticamente sufragada, a monarquia continua em Espanha, metida à sorrelfa na Constituição.

Os reis de Espanha são os chefes de Estado que o genocida escolheu e impôs.

Hoje, 43 anos depois de um dos últimos atos discricionários do sociopata que deteve o poder durante décadas, não podemos deixar de execrar o último ditador peninsular e denunciar as condições em que a monarquia foi reinventada.

Viva a República!

28 de Outubro, 2018 Carlos Esperança

O cardeal do Rio de Janeiro e a Igreja católica

Ontem, percorri o mural de um padre católico ‘amigo’, que partilhou o meu texto «Brasil – Subsídios para a História da Pulhice Eclesiástica», antecedido de críticas vigorosas ao cardeal Orani Tempesta e omisso quanto ao que escrevi. E no Funchal!

Numerosos leitores seus, com uma única exceção, de apoio a Bolsonaro, execraram a conduta do cardeal e a da Igreja a que mostravam pertencer, sem a mais leve censura ao conteúdo ou à forma do que escrevi.

É de elementar justiça identificar o carácter polissémico do catolicismo e o percurso que grande parte dos seus crentes e clérigos fizeram. Não provam a existência de Deus, mas tornam a sua Igreja um culto melhor frequentado do que o de várias Igrejas evangélicas, sem merecer a torpeza de ser associada à implacável intolerância a que o islamismo está a conduzir os seus crentes.

Tiro, pois, o meu chapéu ao papa católico e a numerosos padres que procuram conciliar a crença com o respeito pelos direitos humanos e a militância por uma sociedade mais justa e tolerante, alheios à companhia de ateus e outros livres-pensadores onde, aliás, se encontram também homens e mulheres pouco recomendáveis.

Não pode, no entanto, a civilidade e humanismo de alguns sectores que acertam o passo com a modernidade e o humanismo, desculpar os primatas paramentados que o Concílio de Trento continua a formatar, especialmente os purpurados que João Paulo II legou.

É frequente um bispo perder a cabeça pelo barrete cardinalício, mas é imoral abdicar do cérebro pelo poder clerical e a cumplicidade com ditadores. Orani Tempesta, cardeal do Rio de Janeiro, voltou a recordar-me o epíteto de Camilo a Frei Gaspar da Encarnação, «uma santa besta», com fortes suspeitas de que este primata purpurado não seja santo.

Na Igreja católica, onde cada gesto assume marcado valor simbólico, a assinatura de um compromisso com o torturador fascista não é apenas a cumplicidade entre dois fascistas, é a nódoa na Igreja, presa aos seus preconceitos e vulnerável aos ataques de que é alvo.

O cristianismo, protestante e católico, tal como as gerações que hoje votam, esqueceram o nazi/fascismo, popular na década de trinta do século passado, mas só a Igreja pode ser responsabilizada pela amnésia da sua própria cumplicidade. E pela reincidência.

27 de Outubro, 2018 Carlos Esperança

Brasil – Subsídios para a História da Pulhice Eclesiástica

 

A cerca de dez dias da segunda volta das eleições brasileiras, o arcebispo do Rio de Janeiro, cardeal criado por Bento XVI, Orani Tempesta, recebeu o candidato Jair Messias Bolsonaro.

O cardeal havia de saber que Bolsonaro não era o Messias que surgia para o iluminar, mas o candidato que o procurava para o comprometer. Contrariamente à IURD e a outras Igrejas evangélicas, que declaradamente o apoiavam, o prelado católico tinha a oportunidade de manter a decência. Bastava-lhe anunciar a recusa de receber qualquer dos dois candidatos que disputam a segunda volta, a fim de preservar a neutralidade da Igreja católica de que é um membro proeminente.

Recebeu-o. Foi a sua decisão. Dificilmente convencerá alguém de que o Espírito Santo exista ou, no mínimo, que o tenha ajudado no entendimento.

Sabe-se mais da alegria que percorreu os corredores episcopais, durante o encontro, do que da conversa entre o cardeal Tempesta e o capitão Bolsonaro, mas não há dúvidas de que, em alguns pontos, são gémeas as almas dos dois, e não se conhece um único ponto de discordância.

Da visita resultou um “compromisso formal”, assinado por ambos, contra “o aborto, a educação sexual e a legalização das drogas e em defesa da família e da liberdade religiosa”.

Quem, após o histórico compromisso, na sequência da fotografia que os perpetuará na História, fez a síntese do documento assinado, talvez benzido, foi Bolsonaro:

“É o compromisso que está no coração de todo o brasileiro de bem.”

A partir do próximo domingo, Jair Bolsonaro, Edir Macedo e Orani Tempesta serão ungidos pelo voto como «brasileiros de bem».

Deus, na sua inexistência, há muito que mostra a falta de jeito para milagres e o silêncio perante a pulhice eclesiástica.