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Categoria: Fátima

25 de Setembro, 2009 Carlos Esperança

A visita do Papa a Fátima em 2010

A visita de Bento XVI a Fátima, no próximo mês de Maio, devia ser assunto relativo à Igreja católica e não matéria do Estado português. Num Estado laico o Papa é apenas o chefe de Estado do Vaticano, a única teocracia europeia, criada por Benito Moussolini com os célebres acordos de Latrão.

Que o católico Cavaco Silva, na ânsia das fotos com ex-Prefeito do ex-Santo Ofício, se regozije, é o direito que a liberdade religiosa lhe garante. Que o chefe de Estado de um País laico exulte com a visita do chefe do único Estado não democrático da Europa, já é motivo de azedume para muitos portugueses.

A própria Conferência Episcopal não gostou do anúncio da visita durante a campanha eleitoral face aos resultados que se prevêem e ao desgaste que o PR sofreu com a sua desastrada participação.

O Papa vem a Fátima, à semelhança dos antecessores, porque é um dos santuários mais rentáveis da Igreja católica mas é lamentável que – como diz o bispo Carlos Azeredo – se trate «de uma visita de profundo significado, também por ser o centenário da implantação da República».

Todos sabemos que Fátima foi o instrumento da propaganda contra a República e contra o comunismo e que os milagres tentados noutros locais do país, acabaram adjudicados numa região onde a religiosidade e o analfabetismo os facilitava.

As cambalhotas do Sol, as deambulações da Virgem pelas azinheiras e a aterragem do anjo no anjódromo da Cova da Iria são milagres para quem tem o dom da fé mas não passam de embustes para quem não aceita afirmações sem provas.

Associar a visita do Papa ao Centenário da República é um insulto às instituições e uma intromissão clerical provocatória numa data relevante da História. O clero nunca deixou de conspirar contra a República até à ditadura com a qual se mancomunou. O Presidente da República precisa de um assessor cultural para evitar que a ofensiva clerical regresse.

28 de Maio, 2009 Carlos Esperança

Milagre que eu conheci

Não cometo a ofensa de pensar que os leitores do Diário Ateísta acreditem em milagres nem a injúria de acusar de semelhante ingenuidade o Papa e os bispos.

Sabe-se que a criação de beatos e santos é um negócio idêntico ao dos aviários e que os milagres estão para a indústria da santidade como as rações para a criação de frangos. É por isso que estão encomendados milagres para João Paulo II, o papa de que há fortes suspeitas de ter acreditado em deus, e para a Lúcia e outros bem-aventurados destinados a tornarem-se patronos de outras tantas caixas de esmolas.

O que aborrece, neste negócio, é o embrutecimento a que condena as pessoas simples, o cinismo com que as quer fazer passar por tolas, o impudor com que a ICAR tenta impor paradigmas medievais e sobrepor a irracionalidade da fé à virtude da razão.

A beatificação dos pastorinhos de Fátima – Francisco e Jacinta – criaram mais dúvidas aos crentes e ridicularizaram mais a sua Igreja do que os escândalos sexuais que minam os estabelecimentos de ensino que lhe estão confiados.

A cura da D. Emília dos Santos que, de vez em quando, ficava paralítica e cujo processo clínico parece ter desaparecido do serviço de psiquiatria dos Hospitais da Universidade de Coimbra, é um embuste tão primário que até os padres envergonha.

A D. Emília de Jesus tinha no Hospital de Leiria, no serviço de Medicina, uma mesinha de cabeceira cheia de santinhos e vasta quinquilharia religiosa que impressionavam o director. Quando, uma vez mais, voltou a andar e foi preciso rubricar um milagre, para a beatificação dos pastorinhos, logo foi confirmada a intercessão conjunta no prodígio.

O Vaticano apressou-se a dizer que o milagre foi certificado por três médicos diferentes, embora espante a convicção de que foram os pastorinhos os autores do milagre obrado. E a D. Emília, que morreu curada, nunca andou bem das pernas e da cabeça.

Aqui ficam os nomes dos médicos, diferentes, que confirmara o milagre: Felizardo Prezado dos Santos, director do serviço de Medicina, no hospital de Leiria, Maria Fernanda Brum, médica do mesmo serviço e esposa do primeiro e uma psiquiatra que, por insondável coincidência, é filha de ambos. Última indiscrição: todos os três médicos diferentes eram servitas em Fátima.

Diz a ICAR que os ateus ridicularizam os milagres. Não se vê que é ela que escarnece a inteligência e envergonha os crentes com os seus reiterados embustes?

13 de Maio, 2009 Carlos Esperança

Fátima – 13 de Maio

Nascida para lutar contra a República e transformada em arma de arremesso contra o comunismo, Fátima mantém-se como símbolo da crendice popular e caixa de esmolas que sustenta a máquina eclesiástica.

Os ateus são sensíveis ao sofrimento humano, às manifestações de aflição, ao desespero e aos dramas individuais que exoneram a razão dos comportamentos. Já não podem ter a mesma benevolência para quem convence os crentes do gozo divino com as chagas nos joelhos e as maratonas pedestres ou com a oferta de objectos de ouro que atravessaram gerações na mesma família para acabarem no cofre forte da agiotagem mística.

Os alegados milagres das cambalhotas solares, das deambulações campestres da virgem e da aterragem de um anjo não foram originais nem exclusivas da Cova da Iria. Foram tentados em outras latitudes e repetidos em versões diferentes até atingirem a velocidade de cruzeiro da devoção popular e o pico da fama que tornou rentável a exploração.

Há um ano o cardeal Saraiva Martins, um clérigo atrofiado por longos anos de Vaticano, dedicado à investigação de milagres e à pesquisa da santidade, presidiu à peregrinação… contra o ateísmo. Podia ser a favor da fé, mas o gosto do conflito levou a Igreja a deixar cair a máscara da paz e a seguir o carácter belicista que carrega no código genético.

Há militares que regressaram há mais de quarenta anos da guerra colonial e que, ainda hoje, vão a Fátima agradecer o milagre do retorno, milagre que muitos milhares não tiveram, vítimas da civilização cristã e ocidental para cuja defesa o cardeal Cerejeira os conclamava.

Perdido o Império, desmoronado o comunismo, o negócio mudou de rumo e de ramo. É o emprego que se mendiga a troco de cordões de oiro, a saúde que se implora de vela na mão, a cura suplicada com cheiro a incenso e borrifos de  água benta. Enquanto houver sofrimento o negócio floresce. Dos bolsos saem os euros dos peregrinos  e os olhos dos crentes enchem-se de lágrimas perante a imagem de barro que a coreografia pia carrega de emoção.

Para o ano, no mesmo dia, repete-se a encenação e os corações dos devotos rejubilam com fé na virgem igual à que os índios devotam às fogueiras para atraírem chuva. Com os joelhos esfolados, os pés doridos e o coração a sangrar.

9 de Maio, 2009 Carlos Esperança

Maratonas pias

Por

José Moreira

Confesso que não sou consumidor de “As Tardes da Júlia”. Mas hoje, talvez porque fosse a menos chata das opções televisivas, deixei-me ficar por ali. A minha mulher diz que eu tive preguiça de me levantar para mudar de canal e, se calhar, tem razão.

Bom. A Júlia defrontava um podologista a propósito das caminhadas que os peregrinos fazem até Fátima, pista de aterragem de arcanjos e virgens. Os peregrinos, dizia-se, forçam os pés, não habituados a andanças daquele tamanho e, naturalmente, sofrem. E o podologista ia dando conselhos para as pessoas tirarem melhor partido dos pés.

Errado, quanto a mim. O cumprimento de uma promessa deste tipo implica, necessariamente, sacrifícios. O peregrino tem de sofrer, para que a paga da promessa tenha valor. Deus e a virgem gostam de sacrifícios, e não foi por acaso que colocaram o joelhódromo ali à volta da capela das alegadas aparições. Não tarda nada, e as pessoas, em vez de irem a Fátima a pé vão a Fátima de pé, no autocarro. Como se não bastasse colocarem almofadas nos joelhos, para não doerem durante o circuito. Se não doer não há sacrifício, se não houver sacrifício a promessa não se considera cumprida. É a mesma coisa que pagar uma dívida com dinheiro falso. Esta é a minha opinião, e acho que a Madre Teresa de Calcutá não diria melhor.

Se não querem sacrifícios, façam como as “tias”: vão de carro, levem um bruto farnel, e façam um piquenique.

8 de Maio, 2009 Carlos Esperança

A senhora de Fátima salvou-lhe a vida

Peregrino de Amarante repete peregrinação ao Santuário há 40 anos

Vicente Esteves viaja a pé, há 40 anos consecutivos, de Amarante até ao Santuário de Fátima, por devoção à Virgem Maria, que diz já lhe ter salvo a vida duas vezes

Comentário: Há nove mil mortos da guerra colonial e cerca de 14 mil deficientes que a senhora de Fátima ignorou, sendo indiferente às centenas de milhares de vítimas do outro lado da barricada.

O meu regresso não se deve à senhora de Fátima, com quem nunca mantive relações, mas também não lhe atribuo a maldade de ter matado o Moura e o Dias que magoadamente recordo.

Em 13 anos, foi enorme o sofrimento de Portugal e o dos países onde 800 mil jovens fizeram parte do exército de ocupação. Se a senhora de Fátima esteve metida na guerra, são mais as razões para a levar a julgamento do que para a louvar.

8 de Maio, 2009 Carlos Esperança

Deus é cego…

… mas os automobilistas não.

Campanha «Torne-se Visível» visa sensibilizar peregrinos

A Estradas de Portugal (EP) está a promover a campanha «Torne-se Visível», dirigida aos peregrinos que se deslocarão a Fátima no âmbito da Grande Peregrinação de Maio.

A campanha visa reduzir o número de mortes acidentais de peregrinos relacionadas com os perigos da estrada, reforçando, para tal, a importância de estar eficazmente «visível» quando se circula na rodovia a pé.

7 de Fevereiro, 2009 Ricardo Alves

A evolução de Fátima

Foi colocado no arquivo da Associação República e Laicidade um ensaio sobre Fátima publicado, em Dezembro, pela revista L´Idée Libre: «Fátima e a transformação do catolicismo português». O artigo descreve a evolução de Fátima, da manifestação anti-republicana de 1917 ao actual «centro comercial da fé», passando pelo santuário anticomunista do Estado Novo.

Resumo: «As «aparições» de Fátima, entre 13 de maio e 13 de outubro de 1917, nasceram em reacção ao laicismo da República e nas circunstâncias da 1ª guerra mundial, mas o culto e o santuário ali instalados adaptaram-se facilmente ao regime reacionário de Salazar, designadamente ao seu anticomunismo, e constituem hoje o coração do catolicismo português, que seria inimaginável sem Fátima e o seu capital simbólico e financeiro».

Conclusão: «O catolicismo português, religião oficial do Estado até 1910, substituiu o apoio estatal pelo apoio na crença na visita a Portugal de uma figura celestial».

Da bibliografia consultada, foi-me particularmente útil «As “aparições de Fátima” – Imagens e Representações», de Luís Filipe Torgal (editado pela primeira vez pela Temas e Debates em 2002), na minha opinião o estudo histórico mais sério e sistemático, actualmente existente, sobre a maior aldrabice do século 20 português.

Guardado também no meu arquivo pessoal.

[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]