Loading

Categoria: Política

18 de Julho, 2009 Carlos Esperança

Testamento vital

O Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV) aprovou, na reunião do passado dia 16, o parecer sobre os «Direitos dos doentes à informação e ao consentimento informado», que inclui o testamento vital.

Não sei se o beato juízo do Presidente da República, depois de decidir intrometer-se na vida partidária, condicionando o Governo e a AR, desejará evitar a discussão pública sobre o testamento vital. Não compete ao PR decidir o que os portugueses devem pensar nem à sacristia o que as pessoas podem decidir.

Perante as encarniçadas maratonas médicas para prolongarem por algumas horas ou dias a vida de pacientes, sem esperança de sobrevivência e com sofrimentos escusados, cabe a cada um decidir como quer ser tratado ou deixar de sê-lo.

O CNECV que é integrado por um colaborador do Ponte Europa, André Pereira, tem a função de dar pareceres informados mas é aos cidadãos que cabe decidir o que querem e à AR legislar no sentido de respeitar a vontade de cidadãos que não obriga nem lesa a vontade oposta de outros cidadãos.

Há algo de totalitário na vontade de impor aos outros os nossos valores e preconceitos. O testamento vital há muito que devia estar a ser discutido pelos portugueses e a ser-lhes explicado que, tal como nos casamentos homossexuais, no divórcio e no aborto, por exemplo, a lei não impõe, limita-se a conceder direitos a quem os pretende exercer.

15 de Julho, 2009 Carlos Esperança

A ICAR e o fascismo

O pedido de desculpa dos bispos bascos, mais de sessenta anos depois, pelo silêncio da Igreja sobre a morte de 14 sacerdotes, no tempo de Franco, é, apesar de tudo, um acto de coragem e dignidade de bispos de hoje a contrastar com a cobardia e conivência dos bispos franquistas.

A delirante febre do Vaticano em canonizar as vítimas do lado franquista fica em xeque. Confirma a deriva fascista do Vaticano que beatificou e canonizou centenas de vítimas do lado sedicioso e desprezou e ocultou os clérigos que apoiaram o governo legal.

A execução de 14 padres durante a Guerra Civil Espanhola ((1939-45) pelas forças do general Francisco Franco foi um acto rotineiro de quem assassinou centenas de milhares de espanhóis como retaliação pelo apoio ou simples suspeita de simpatia pelo Governo republicano, democraticamente eleito.

Quem conhece um pouco da guerra civil espanhola e da violência que emergiu dos dois lados da barricada sabe que não houve anjos em qualquer dos lados. A crueldade foi o traço comum a republicanos e franquistas. Também por isso, o Vaticano escusava de ter retomado, pela via das canonizações, a manifestação de apoio que as ditaduras fascistas sempre lhe mereceram.

Monsenhor Esvrivà foi em vida um fervoroso apoiante de Franco, o que não o impediu de ser canonizado com três excelentes milagres que obrou cadáver. Estes 14 sacerdotes morreram do lado errado e nunca farão milagres. Não podem aspirar à santidade e hão-de contentar-se com a inútil missa que o remorso dos bispos lhes consagrou, enquanto o Papa os ignora e procura o piedoso entendimento com os sequazes do bispo Lefebvre.

É nestas alturas que nos recordamos do bairro de 44 hectares, obra de Mussolini, criado pelos acordos de Latrão. O actual Papa está à altura da tradição.

14 de Julho, 2009 Carlos Esperança

Tomada da Bastilha

01_bastilha

Viva a França e a laicidade – 14 de Julho

14 de Julho, 2009 Carlos Esperança

Momento zen de segunda 13_07_09

João César das Neves (JCN), o almocreve das sacristias, é o mais divertido e menos lúcido dos panegiristas da Igreja católica. Este prosélito de serviço é mais papista do que o papa, sendo este papa o que é.

Na homilia de ontem, JCN à semelhança de Santa Teresa de Ávila, deu conta das suas visões mas, enquanto as da santa são explicáveis, à luz de Freud, as de JCN são difíceis de explicar, embora facilitem a beatificação a que um papa vindouro o há-de propor.

JCN, em sintonia com a Divina Providência ou, pelo menos, com o director espiritual, insurge-se contra «A moção aprovada no XVI Congresso Nacional do PS de 1 de Março que propõe “a remoção, na próxima legislatura, das barreiras jurídicas à realização do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.” (III 4 F).

Pela fúria, até parece que o casamento entre homossexuais se tornará obrigatório e não, como é o caso, facultativo, para quem tem uma orientação sexual diferente da de alguns padres, bispos e papas e, eventualmente, de JCN.

Enquanto certamente se persigna, conclui: «O que não há dúvida é que, depois de toda a campanha do aborto, das várias leis antifamília e múltiplas beliscadelas administrativas, se pode dizer que a Igreja Católica, pela primeira vez desde o 25 de Abril, enfrenta uma oposição séria e profunda do poder político», para concluir que «começa a existir uma questão religiosa em Portugal».

Depois, o ex-assessor do igualmente pio ex-primeiro-ministro Cavaco Silva, tira a conclusão lógica: «Depois do Verão a implicação será para os eleitores católicos na decisão do voto. Os bispos portugueses formularam já, em Nota Pastoral de 23 de Abril, os princípios a seguir».

Estava mesmo a ver-se aonde o levava  a nova questão religiosa. Os católicos já sabem em que partido não devem votar. Segundo JCN.

Pensou em PS e benzeu-se de novo.

9 de Julho, 2009 Carlos Esperança

Burka, véu e democracia

burca1João César das Neves (JCN) excede-se no zelo com que divulga o pensamento oficial da Igreja católica. Na habitual homilia de segunda-feira, no DN, referiu-se ao discurso que o presidente francês, Nicolas Sarkozy, pronunciou em 22 de Junho no Parlamento, facto inédito, em França, desde 1875.

JCN vituperou este excerto do discurso: “A burka não é um símbolo religioso, é um símbolo de servidão, é um símbolo de abaixamento. Quero dizer solenemente, ela não será bem-vinda no território da República.” O forte aplauso dos deputados franceses foi, segundo JCN, «da mais tacanha intolerância e incompreensão».

Convém esquecer a propensão beata de JCN e analisar o problema da burka ou, melhor ainda, a exibição ostensiva e provocatória de símbolos religiosos nos espaços públicos, sobretudo quando denunciam a submissão da mulher.

O Estado tem o direito de proibir em nome da liberdade e a obrigação de libertar através de uma proibição?

O problema divide as diversas famílias políticas, embora em França, apesar das graves cedências às religiões, feitas por Sarkozy, ao arrepio da Constituição, gere consenso a proibição da burka  e do véu com que os mulás incitam as jovens a provocar a laicidade do Estado, nas escolas públicas, e a dar notório testemunho da submissão ao homem.

Os aplausos dos deputados sublinharam as afirmações de Sarkozy quando declarou que «…a tolerância tem limites e há muita coisa que não devemos permitir: crime, abuso, injustiça. A discriminação das mulheres e, pior ainda, a sua servidão e abaixamento são evidentemente intoleráveis».

É a supremacia da cidadania sobre o comunitarismo, a exigência da igualdade de género contra a tradição religiosa, a primazia das leis da República sobre os versículos do Corão.

JCN avalia a dignidade da mulher e a decência feminina pela porção de corpo oculto. É o direito de homem pio, que vê a mulher pelos olhos misóginos de Paulo de Tarso, mas as sociedades democráticas devem defender a igualdade de género e abolir o estigma do pecado original.

A sanha contra a laicidade dos sectores mais extremistas da Igreja católica fê-los aliados do islamismo cuja demência mística e vocação para o martírio admiram. O proselitismo está na matriz das religiões e serve de detonador das guerras que fomentam. Unem-se contra a laicidade e aguardam para se digladiarem, depois.

Há quem não perceba que a teocracia é o antónimo da democracia. É pena e é perigoso. Se o respeito pelas tradições fosse a bitola civilizacional teríamos ainda as monarquias absolutas, o esclavagismo, a tortura e, quiçá, a antropofagia, além de outras numerosas iniquidades. A civilização a que chegámos retrocederia para uma qualquer forma de tribalismo. Regressaria a barbárie. E o clero encarregar-se-ia de submeter as nossas vidas à vontade divina.

30 de Junho, 2009 Carlos Esperança

Eurodeputado com oito guarda-costas

Há notícias que valem por si e outras pelo contexto. No segundo caso está a conversão de um cidadão, Magdi Alan, um italiano de origem egípcia que trocou o islamismo pelo catolicismo, um direito que qualquer democracia reconhece e que as religiões fomentam ou combatem conforme o sentido da mudança.

O referido cidadão nasceu numa sociedade que o fez muçulmano como outras o teriam feito católico, budista, adventista do sétimo dia, católico ortodoxo ou evangelista. Todos têm o direito de abandonar a religião que lhes impuseram, aderir a outra ou não querer nenhuma. E qualquer estado democrático é obrigado a defender, em nome da liberdade religiosa, a opção de cada um, sem quebra da neutralidade a que está obrigado.

O caso referido começou com uma cerimónia de apostasia, com pompa e circunstância, num legítimo espectáculo de marketing, baptizado por Bento XVI. O que é um direito elementar numa democracia é um pecado grave para uma religião. O neófito, graças à conversão, ganhou um lugar de eurodeputado por um partido democrata-cristão. Não estranhando os negócios da fé, repudio a ameaça islâmica que paira sobre este italiano cuja protecção pessoal exige oito seguranças.

Ninguém mata em nome da descrença e todos os dias morrem pessoas assassinadas por quem tem demasiada fé. Se uma religião estimula ou prevê a erradicação dos infiéis não é um sistema religioso é uma associação de malfeitores. Se o seu livro sagrado conduz à demência fascista é preciso mudar de livro e submeter ao código penal os que cometem crimes em obediência aos seus ensinamentos.

A laicidade é o vector de integração de todos os cidadãos numa sociedade plural. Assim, adquiriu na Constituição Francesa de 1946  um valor constitucional preciso: «A França é uma República indivisível, laica, democrática e social. Assegura a igualdade perante a lei de todos os cidadãos, sem distinção de origem, de raça ou de religião. Respeita todas as crenças». Ao contrário do proselitismo religioso.

Só um quadro laico tem a capacidade e os meios para que todos os homens e mulheres de convicções diferentes possam viver em paz e sem guarda-costas. É por isso que as referências confessionais nas constituições são um instrumento de ódio e de confronto.

Defender a laicidade é promover a paz, a tolerância e a democracia.

26 de Junho, 2009 Carlos Esperança

Pelo fim da pena de morte

Cada vez que um país renuncia à pena de morte a humanidade apaga uma nódoa na sua marcha para a civilização.

Da visita do presidente espanhol, Luís Zapatero, ao Togo, ficou na memória a nuvem de mosquitos que obrigou à aterragem de emergência e ao adiamento da partida.

Infelizmente parece ter sido esquecido o discurso na Assembleia Nacional do Togo em que aboliu a pena de morte. A lei vai ter o seu nome, o nome de quem há muito se proclamou um defensor activo da abolição da pena de morte batendo-se pelos princípios humanistas de cidadão laico e socialista. Foi o próprio ministro da Justiça do Togo que o confirmou enquanto recordava a guerra civil e o horror que se seguiu, horror que justificou a militância espanhola contra a pena capital.

O alcance da lei, que enobrece o seu mentor e, sobretudo, o País que a consagra, ressalta dos números fornecidos pela Amnistia Internacional, relativos ao ano passado: 8864 penas de morte e 2390 execuções.

O exemplo do pequeno País, dos mais pobres do mundo, pode, e deve, transformar-se num exemplo pedagógico para os que, dizendo-se civilizados, mantêm a barbárie no Código Penal e a prática no quotidiano dos seus países.

Para já, o Togo e o presidente de um país amigo, Zapatero, deram uma lição ao mundo e mais um passo na abolição de uma prática legal cuja utilidade nunca foi provada, com erros frequentes e que subverte os princípios éticos e civilizacionais.

Fonte: el Periódico.com