11 de Setembro, 2009 Ricardo Alves
Deixem-me adivinhar a data
O Ratzinger vem a Portugal em 2010. Deixem-me adivinhar a data. 5 de Outubro seria óbvio demais. Hm. Aposto em 13 de Outubro.
O Ratzinger vem a Portugal em 2010. Deixem-me adivinhar a data. 5 de Outubro seria óbvio demais. Hm. Aposto em 13 de Outubro.
A república, cedo percebeu que sem um eficaz sistema de ensino público gratuito, jamais se poderiam eliminar os obstáculos para regenerar uma vida colectiva que garantisse os valores de liberdade e igualdade num contexto de neutralidade frente a todo o proselitismo religioso. O primeiro requisito da liberdade é a “liberdade da mente”, que só um ensino laico e igual para todos os cidadãos sem discriminações de classe ou credo pode oferecer.
Num país refém durante tantos séculos da hegemonia dos dogmas e doutrinas da Igreja Católica, a sociedade livre e democrática precisa de um sistema neutral de ensino público financiado pelo estado, inspirado nos princípios de igualdade de oportunidades, da liberdade de consciência que animam a Constituição, mas realizado por um corpo docente competente que não esteja ao serviço de nenhum credo religioso.
A Catequese – verdadeiro nome das chamadas aulas de Religião e Moral – de qualquer confissão religiosa mas particularmente entre nós, da religião católica, deve ser “custeada integralmente” pela respectiva igreja, financiada exclusivamente pelos seus próprios meios, dos fundos entregues pelos seus fiéis, sem ajuda ou subsídio de dinheiros públicos. A família que decide uma educação religiosa para os seus filhos deve custeá-la do seu bolso, pois o estado oferece uma educação laica gratuita que, como tal, não impede a sua complementação religiosa confessional através da catequese na paróquia ou em casa.
Deve garantir-se a estas Igrejas ou comunidades religiosas, a liberdade de ensinar ou doutrinar nas suas próprias escolas e centros privados, com a salvaguarda do controlo da competência técnica pelos poderes públicos, quando os seus diplomas aspirem a uma homologação formal.
Nenhuma confissão religiosa pode legitimamente considerar estas exigências um “atentado contra a liberdade de ensino” porque não o é, apesar de toda a atmosfera de intoxicação que a Igreja Católica infiltrou nas mentes dos milhares de portugueses. A Igreja insurge-se contra esta tese, que se impõe pela própria lógica, porque ela afectaria gravemente o factor da “reprodução social automática” da sua posição de hegemonia.
O argumento de que os pais têm “direito a eleger” a forma de educar os seus filhos, não afecta os princípios que enunciei. O suposto atentado ao direito dos pais, é uma estratégia que até agora tem sido muito “rentável” à Igreja Católica Apostólica Romana.
Aqui é essencial realçar que de uma posição sinceramente humanista, por cima do direito dos pais a doutrinarem os seus filhos num credo religioso e numa educação que costuma marcar as suas vidas de modo irreversível, está o “direito” dos filhos”, potencialmente desde a infância, “a poderem optar” na sua adolescência ou idade adulta, quando já possuam os instrumentos intelectuais e morais indispensáveis para uma decisão madura e livre sobre as propostas ideológicas – religiosas ou não-religiosas – que se lhes apresentem.
Que o Papa Bento XVI tenha reagido mal a uma carta subscrita por 41 párocos italianos, a apoiar o direito dos doentes terminais a recusarem o tratamento, é a prepotência que se compreende no líder vitalício e autoritário de uma teocracia. Não lhe falta a experiência iniciada nas juventudes nazis e consolidada à frente da Congregação para a Doutrina da Fé (ex-Santo Ofício), nem a firmeza, para impor a verdade única e o castigo adequado à heterodoxia dos referidos sacerdotes.
Já se compreende mal que o Presidente da República de Portugal, que nunca pertenceu à Legião Portuguesa, à PIDE ou à União Nacional, advirta o poder legislativo contra uma lei que peca por tardia e a que sobra humanidade.
O direito de decisão dos doentes não é um favor do Estado nem uma decisão que o PR ou o Papa devam impedir, é um sinal de respeito pelos cidadãos que cabe ao Parlamento expressar pela via legislativa.
Há na cultura judaico-cristã uma tradição que obriga ao sofrimento com base na alegada vontade divina, interpretada por gerações de clérigos e assimilada por beatos capazes de negar o direito à autodeterminação individual, mas os avanços da medicina possibilitam hoje evitar o tormento e desespero dos últimos momentos de vida.
O testamento vital não é uma obrigação mas, tão somente, uma decisão do foro íntimo que cabe ao Estado respeitar. É tão anacrónico impedir o exercício deste direito como seria intolerável impô-lo.
Os cidadãos não podem estar sujeitos às idiossincrasias de líderes que prezam mais as indicações do chefe da sua religião do que a vontade individual dos seus compatriotas. Ninguém tem o direito de se servir do aparelho de Estado para exercer o proselitismo a que se julga obrigado. Os titulares dos órgãos da soberania não têm de ser ateus, crentes ou agnósticos, devem ser neutros, em matéria religiosa, no exercício das suas funções.
O lei do testamento vital que o PS adiou para a próxima legislatura depois da manifesta ameaça do PR é uma exigência ética que não pode estar dependente das concepções beatas de um PR mais interessado na remissão dos pecados e na salvação da alma do que na defesa dos direitos individuais dos portugueses.
É urgente que a próxima Assembleia da República legisle sobre este assunto ainda que os bispos se enraiveçam e o Prof. Cavaco termine o mandato a rezar ave-marias.
Há tempos, durante uma entrevista, um jornalista perguntou-me por que razão, face ao alegado respeito pela diversidade cultural, mantinha a oposição à poligamia e defendia a sua criminalização.
Objectei que admitiria a legalidade da poligamia se a lei consagrasse igualmente a da poliandria. O que está em causa não é uma questão cultural, com a qual me conformaria, mas uma desigualdade no tratamento de géneros que é uma questão civilizacional.
Este é um dos fundamentos para defender que não há guerra de civilizações mas apenas o combate, descurado, aliás, entre civilização e barbárie.
Quando a palavra da mulher vale menos do que a de um homem, quando a liberdade se restringe a um dos sexos ou o acesso ao emprego, à cultura e aos meios de subsistência privilegia um sexo, não se trata de manter a tradição mas de defender a barbárie.
A tortura, o esclavagismo e a pena de morte, para citar apenas algumas iniquidades, são uma tradição que remonta aos primórdios da humanidade, mas não adianta reivindicar a tradição quando colide com os direitos humanos porque, neste caso, deve ser erradicada.
As religiões abraâmicas, judaísmo, cristianismo e islamismo, são altamente misóginas e não é preciso ser particularmente erudito para descobrir a sua origem tribal e patriarcal.
Se a emancipação da mulher se tornou possível e numerosos Estados subscreveram a Declaração Universal dos Direitos do Homem, tal não se deve à bondade de Deus mas à dos homens. Não foram os clérigos que denunciaram as injustiças que pregavam, foram os homens e mulheres que, combatendo o poder eclesiástico, impuseram a separação da Igreja e do Estado. A democracia não nasceu em Jerusalém, Roma ou Meca, é herdeira da separação dos poderes de origem anglo-saxónica e do Iluminismo que conduziu à Revolução Francesa.
O Irão, a Arábia Saudita e o Iémen mantêm a tradição de açoitar e lapidar mulheres em público, mas não é uma tradição que deva ser integrada no âmbito multicultural ou que possa respeitar-se sem vergonha de tamanha tolerância. Imaginamos o que é ser mulher nos países onde vigora a sharia, uma boa razão para não deixarmos que a barbárie entre na Europa sob a capa do multiculturalismo.
As guerras religiosas custaram milhões de vidas aos europeus mas foi possível acabar com a Inquisição, com as monarquias absolutas e com o poder temporal dos papas. Não há xenofobia na proibição da Burka [símbolo da humilhação feminina] com a qual a mulher perde completamente o sentido de orientação.
Uma sociedade democrática não pode permitir que existam no seu seio, a pretexto da fé ou da tradição, ou de ambas, mulheres sujeitas de forma permanente e definitiva à tutela de um homem, que lhes seja interdita a condução de um automóvel ou o direito de se autodeterminarem. Não vamos criar lugares para homens e mulheres nos transportes públicos nem permitir que as sevícias que extasiam o Profeta e os mullahs islâmicos se exerçam no espaço onde há muito se respeitam os direitos humanos.
Não se trata de xenofobia mas, tão-somente, de tratar o Islão da mesma forma com que é preciso responder ao Vaticano, um bairro de 44 hectares que, graças a Mussolini, goza do estatuto de Estado e obedece a um autocrata celibatário com tiques medievais.
A laicidade é uma exigência ética e necessidade sine qua non para a sobrevivência da civilização. Não pode ser sujeita ao escrutínio eclesiástico.
Vítimas iam para passeio a Fátima, organizado pela Câmara de Baião, quando o carro, com dois passageiros a mais, foi abalroado pelo comboio que seguia da Régua para o Porto. Descuido do condutor estará na origem do desastre em passagem de nível sem guarda.
O veto do PR à lei das uniões de facto é o voto pio de quem foi presidente da comissão de honra para a canonização de Nuno Álvares Pereira, de quem acredita que um herói se transforma em colírio para curar o olho esquerdo de D. Guilhermina de Jesus, queimado com óleo de fritar peixe, por intercessão de um guerreiro medieval.
Há argumentos contra a lei das uniões de facto – e referiu-os –, mas não é aceitável a desculpa da oportunidade – e usou-a –, como se coubesse ao PR alterar o período em que se pode legislar.
Se Guterres, com outra dimensão cívica, não foi capaz de resistir aos amigos do peito e da hóstia, na questão do aborto, por que motivo seria capaz este PR, ressentido com a dispensa do pio Conselheiro João Lobo Antunes de uma escusada comissão Ética, de desistir do veto a uma lei que os padres condenam e a Esquerda defende?
A lei vetada, aprovada em Julho com votos contra do PSD, CDS e de três ornamentos pios com que a bancada do PS se matiza, reforçava a protecção jurídica em caso de morte de uma pessoa em situação de união de facto e criava maior protecção do domicílio da família, além do direito à pensão de sobrevivência. Isto é uma abominação para um crente calejado em jejuns e orações.
Aparentemente, Cavaco transformou o PSD e o CDS em instrumentos de uma qualquer ambição política que não augura nada de bom para o País. No PSD tem uma pessoa de confiança sem ideias e, no CDS, um líder com ideias a mais e sem escrúpulos.
O silêncio perante a torpe insinuação do PSD sobre alegadas escutas aos seus assessores contribuiu para o clima de intriga e desconfiança que mina as instituições democráticas, em nítido benefício do partido de que foi líder.
Ao recusar esclarecer o mecanismo e as circunstâncias da compra e venda das acções do BPN, de que beneficiou ele próprio e a filha, Cavaco destruiu a alegada superioridade moral do cavaquismo.
Restava-lhe a isenção e o sentido de Estado. Prefere cuidar da alma e das indulgências. Interpretou bem o desejo dos bispos. É uma opção mas, se continuar a ser oposição à maioria dos eleitores, em sintonia com a direita mais obsoleta, abdica do respeito a que tem direito e da consideração inerente ao exercício do cargo.
Por
José Moreira
Leio, nos jornais, que os bispos portugueses se congratularam pelo facto de o presidente da República ter vetado a lei que iria dar mais direitos aos que optassem pela união de facto em detrimento do casamento.
Desde logo, parece-me que os bispos estão a fazer confusões terríveis.
Em primeiro lugar, não acho que os bispos, seja de que religião forem, tenham que meter o bedelho nas leis da sociedade secular; da mesma forma que a sociedade secular não mete o bedelho nas encíclicas. Questão de decência, apenas. E de respeito – embora eu duvide de que os bispos saibam o que é isso.
Depois, parece que ainda se julgam num estado teocrático, como nos tempos salazarentos. Na verdade, casamento não tem nada a ver com a Igreja. Há muito tempo, para que saibam. As pessoas podem, agora, casar sem terem de levar com água benta nas trombas. Pelo civil, não sei se estão a ver.
Que os bispos se alegrem por o presidente da República não consentir uniões de facto religiosas, eu aplaudo. Era muito chato a gente assistir a cerimónias em que o padre dissesse eu vos declaro unidos de facto em vez do sacramental eu vos declaro marido e mulher. Mas não é disso que se trata. O casamento arcaico e troglodita está em vias de extinção, e os bispos ainda não viram isso. Ou viram e estão a lutar para que assim não seja.
Depois, apresentam o argumento bafiento da família como pilar da sociedade… E quem garante – para além dos pios senhores – que para haver família tem de haver casamento? Se o meu pai não for casado com a minha mãe, os outros filhos deixam de ser meus irmãos? Deixam de ser da família? Não há família?
Para quando a limpeza às religiosas teias de aranha?
O Estatuto Jurídico da Igreja Católica, em tramitação no Congresso Nacional, é um “retrocesso” no que se refere à separação entre Estado e religião, de acordo com o presidente da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (Atea), Daniel Sottomaior. O estatuto é um acordo diplomático assinado entre a Santa Sé e o governo brasileiro no final do ano passado, regulamentando as atividades da Igreja Católica no país. O documento tem 20 artigos e trata de pontos como os bens da Igreja e o ensino religioso em escolas públicas.
A presença de símbolos religiosos em prédios públicos não ofende os princípios constitucionais da laicidade do estado nem de liberdade religiosa. Com esse entendimento, a Justiça Federal em São Paulo rejeitou pedido do Ministério Público Federal (MPF) para a retirada dos símbolos dos prédios públicos.
O Diário de uns ateus é o blogue de uma comunidade de ateus e ateias portugueses fundadores da Associação Ateísta Portuguesa. O primeiro domínio foi o ateismo.net, que deu origem ao Diário Ateísta, um dos primeiros blogues portugueses. Hoje, este é um espaço de divulgação de opinião e comentário pessoal daqueles que aqui colaboram. Todos os textos publicados neste espaço são da exclusiva responsabilidade dos autores e não representam necessariamente as posições da Associação Ateísta Portuguesa.