Categoria: Política

21 de Janeiro, 2015 Carlos Esperança

A adoção de crianças por casais do mesmo sexo

No chumbo da votação, a que a AR vai proceder, não está em causa uma questão moral, está em causa um preconceito e, quase sempre, por razões meramente confessionais ou de oportunismo político.

Escrevi ‘quase’ porque há deputados cuja formação religiosa os impede de votar uma lei que, na sua fé, e, com seriedade igual à minha, consideram inadequada. No meu ponto de vista, cujas dúvidas são habitualmente tão fortes quanto as certezas deles, não vejo razões morais para votar contra a lei que permite a adoção por casais do mesmo sexo.

Neste momento, há crianças filhas de um dos membros do casal que vive legalmente em regime de comunhão de adquiridos. Se lhes faltar o vínculo familiar ao outros membro, em caso de morte do cônjuge de quem era filho, perde o direito à responsabilidade e aos bens do cônjuge sobrevivo. É, pois, uma questão de proteção das crianças o que está em discussão. Deve punir-se uma criança e arredá-la do direito sucessório pelo facto de ser criada por um casal do mesmo sexo?

Valia a pena estudar “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado”, de Friedrich Engels, baseado nos estudos de um dos fundadores da antropologia moderna, L. H. Morgan.

O voto contra não passa de uma punição a crianças que não têm culpa de viver no seio de um casal que alguns consideram viver em pecado. É mera vingança contra pessoas erradas e indefesas.

18 de Janeiro, 2015 Carlos Esperança

O respeitinho é muito bonito

Ao correr da tecla – o respeitinho é muito bonito

“Temos a obrigação de falar abertamente, de ter esta liberdade, mas sem ofender. É verdade que não se pode reagir violentamente, mas se Gasbarri, grande amigo, diz uma palavra feia sobre minha mãe, pode esperar um murro. É normal!” (Papa Francisco)

Quando um ignaro ministro da economia é capaz de redigir um caderno de encargos de uma privatização em que atropela a lei e se vinga dos trabalhadores que não concordam com ele, tenho obrigação de o ofender, de lhe insultar a mãe (em pensamento, que é o meu registo) e de percorrer Gil Vicente para o adjetivar.

Se Paulo Portas diz que o CDS salvou o País, com uma dívida maior do que a herdada, a balança de transações correntes mais desequilibrada e o desemprego acrescido, tenho de lamentar que o aborto não possa ser retroativo.

Quando um líder religioso exige respeito por uma religião, só posso exigir-lhe respeito por quem a despreza. Se uma quiromante, um bruxo, um cartomante ou um profissional de um ofício correlativo exigem respeito pela sua profissão, só posso pedir-lhes que me convençam da sua verdade, utilidade ou interesse. E não deixarei de me rir!

Quando a religião manda matar infiéis, apedrejar mulheres ou decapitar apóstatas, deixa de ser uma associação respeitável e passa a ser um bando de criminosos. Quando apenas pretende persuadir as pessoas da bondade do incenso, da eficácia da água benta ou de que o batismo é um detergente para os pecados, apenas provoca o riso de quem não crê.

Quando um padre diz que um tsunami é castigo de Deus pelos pecados dos homens não é um ministro do culto, é um terrorista da palavra, um explorador do medo, um aldrabão que merece o nariz do tamanho da mentira e as orelhas na razão inversa da honestidade.

O respeito é uma forma subtil de censura. Porque há de um crente respeitar o ateísmo? Só não tem o direito de esmurrar os ateus. De resto, pode ofendê-los pela estupidez que lhes atribui, a insensibilidade que lhes imputa ou a maldade de que os julga capazes.

Ai de nós se esperarmos que nas madraças, sacristias, mesquitas e sinagogas vai nascer o respeito pela liberdade e imaginar que o cristianismo e o Islão desistem de converter os outros à fé que lhes ensinaram desde pequenos. A indulgência não é uma virtude evangélica, é uma conquista civilizacional adquirida com a laicidade e o secularismo.

Riam-se de mim que eu também me rio deles.

17 de Janeiro, 2015 Carlos Esperança

Francisco deixou cair a tiara

Por mais que se encoste à férula, não retomará o equilíbrio que parecia distingui-lo dos dois últimos antecessores. A nódoa das declarações sobre a liberdade são o corolário da tradição romana, a síntese entre a Inquisição e a liberdade religiosa, o Index Librorum Prohibitorum e a liberdade de expressão, o concílio de Trento e o Vaticano II.

O Papa saiu da Argentina do ditador Videla mas essa Argentina não saiu de dentro de si. Francisco tem o direito de pensar o que pensa, mas os livres-pensadores têm o direito de pensar de forma diferente. Ai de nós, se tivéssemos de nos comportar de acordo com o regedor de um bairro de 44 hectares, sem maternidade, constituição ou democracia. O líder da única teocracia europeia, nascida dos acordos de Latrão, entre Mussolini e o Papa de turno, não faz a lei dos países democráticos.

O Papa tem o direito de pensar que «Não podemos provocar, não podemos insultar a fé dos outros, não podemos ridicularizá-la» (…) e que «É legítimo usar esta liberdade, mas sem ofender». Eu é que reclamo, dentro das leis do meu país, o direito de rir das roupas femininas com que se veste, de gozar com o fenómeno alquímico dos sinais cabalísticos que transformam a água da rede em benta e a rodela de pão ázimo em carne e sangue de um profeta com dois milénios de defunção.

O passado das Igrejas só não é motivo de riso porque o horror e as lágrimas o impedem. Pensar que o Sol parou em Fátima e que durante séculos fez o movimento de translação à volta da Terra é tão cómico como a cura do olho esquerdo de D. Guilhermina de Jesus por D. Nuno Álvares Pereira, quando a cozinheira de Ourém o queimou com salpicos de óleo fervente de fritar peixe porque tinha uma pagela do herói medieval que logo beijou.

Haverá ato de humor mais apropriado do que desenhar um preservativo no nariz de um Papa cuja teologia do látex se tornou responsável pela infeção de centenas de milhares de pessoas a quem dissuadiu do seu uso?

O Aiatolá Khomeini, na sua piedosa loucura, emitiu uma fatwa contra Salman Rushdie e o Papa, o arcebispo de Cantuária e o grande rabino de Jerusalém foram unânimes no silêncio cúmplice. Deviam ser respeitados? O falecido bispo de Coimbra, João Alves, escreveu no Diário de Coimbra que compreendia a fatwa contra o escritor porque este tinha ofendido o profeta que, para os muçulmanos, era sagrado.

Sagrada é a liberdade de rir e criticar. O que os papas disseram dos ateus era um direito, não o que lhes fizeram.

16 de Janeiro, 2015 Carlos Esperança

Contra a violência islâmica

Petição da Amnistia Internacional aqui:

“Arábia Saudita: Libertem o blogger Raif Badawi!”

15 de Janeiro, 2015 Carlos Esperança

O homem era um santo (crónica)

A mulher, que chegava do trabalho antes dele, chegou ao ponto de lhe dizer que não era sua criada, que um dia acabava o hábito de ser ela a única a cozinhar, a lavar e a passar a ferro a roupa, a fazer a cama e a limpar a casa.

O homem, um santo, aguentava a desfaçatez, suportava a sopa, a que faltava ou sobrava sal, sem um queixume, a salada que estava mal temperada, o peixe mal grelhado e ainda a ouvia resmungar enquanto lia o jornal e ela arrumava a mesa e lavava a louça.

Casados há mais de vinte anos, a mulher queria agora gozar dos mesmos direitos, exigir iguais deveres para ambos, depois de ter criado dois filhos sem que o marido soubesse o que era mudar uma fralda ou onde era a creche ou a escola.

Suportou ao longo dos anos que a mulher tivesse um vencimento maior que o seu, sem mostrar a irritação que isso lhe causava, ouvia-a cantar quando queria silêncio e sentia-a emudecida na altura em que queria conversar. Começou a arremessar para a roupa suja as camisas onde via uma ruga, o homem era um santo mas não podia aguentar mais.

Um dia, estava ela na lide da casa, depois de um dia de trabalho de que viera exausta, o homem não podia adivinhar, fez-lhe uma pergunta e não obteve resposta. Nesse dia, depois de anos a aguentar aquela mulher, agarrou na faca da cozinha e deixou-a a esvair em sangue, enquanto se foi entregar à polícia.

No tribunal, presidiu ao coletivo de juízes uma mulher, sem capacidade de compreensão para a bondade do homem que, naquele dia, se excedeu. As testemunhas eram unânimes a denunciar os maus tratos de que o santo homem fora vítima, mas poderia uma mulher compreender o tormento de um homem!? Na sua beca, imaculadamente passada a ferro, a juíza acusou-o de crueldade, violência gratuita e amoralidade, enfim, um exagero que as mulheres cometem, sem se esquecer de o acusar de ter repetido as facadas 12 vezes.

Quando a morta devia ter sido condenada foi o pobre do viúvo que ouviu um longo e penoso acórdão que o condenou a 18 anos de prisão. Já não há justiça. Essa defunta foi uma das 40 de que os companheiros, fartos de tanto sofrimento, acabaram por matar no ano que há pouco findou.

Não sei porquê, lembrei-me da perseguição dos polícias franceses aos que piedosamente executaram os desenhadores do Cahrlie Hebdo. Mataram os santos homens que rezavam cinco orações diárias e só queriam uma assoalhada no Paraíso recheada de 72 virgens.

Já não há justiça!

13 de Janeiro, 2015 Carlos Esperança

A FRASE e a PULSÃO CENSÓRIA

A frase:

«Se no passado os valentes cartoonistas mortos em França puseram Hollande com o seu ‘coiso’ de fora, o presidente português também podia ser desenhado de calças na mão e com as letras BPN tatuadas na nádega direita».
(Rui Cardoso Martins, in Pública – Revista 2)

A pulsão censória:

Existem nas sociedades europeias e noutras sociedades do mundo conquistas que são irrecusáveis e que têm que ver com os direitos humanos, onde está o direito à vida, à liberdade e à responsabilidade de expressão e o direito a ser considerado naquilo que são as convicções e na expressão das ideias».
( Manuel Clemente, Patriarca de Lisboa)

Fonte: DN, 12-01-2015, pág. 14.

22 de Dezembro, 2014 Carlos Esperança

Antes mal acompanhado do que Sony

Quando o frio e alienado assassino, aiatola Khomeini, emitiu uma fatwa contra Salman Rushdie e a horda de intoxicados pelo Corão perseguiu e matou editores e livreiros que ousaram publicar e vender o livro «Versículos Satânicos», perduraram na história como devotos criminosos, os primeiros, e os últimos, como mártires da liberdade.

Quando as caricaturas de Maomé, o profeta muito amado e pouco recomendável, foram divulgadas, os dementes do costume quiseram assassinar o autor e assaltaram os jornais que, em nome da liberdade, não se deixaram chantagear.

Quando se cancela a exibição de uma comédia satírica sobre um complô para assassinar o líder norte-coreano, a figura grotesca cujo penteado é suficiente para levar um cidadão incauto do riso à incontinência urinária; quando basta um grupo de hackers e a ameaça de provocar um novo 11 de setembro em cada sala de cinema que exiba o filme, para que a Sony Pictures se acobarde, assiste-se a uma vergonhosa humilhação perante Kim Jong-il. Ceder à chantagem de Pyongyang ou de quaisquer crápulas, é a liberdade de expressão que se cancela.

A exibição do filme suspenso, «The Interview», ‘Uma entrevista de Loucos’ sobre dois jornalistas (Rogen e James Franco) contratados pela CIA para matar o líder norte-coreano, é uma exigência de quem se bate contra os totalitarismos e não abdica de uma das mais duras conquistas civilizacionais, o direito à livre expressão.

Se insistirmos em defender o respeito por idiossincrasias e preconceitos, preterindo o direito à liberdade, deixamos de ser dignos da civilização e dos direitos conquistados.

É preferível morrer pela liberdade do que morrer de medo… e de vergonha.

5 de Dezembro, 2014 Carlos Esperança

A questão dos feriados é complexa

Por

E – Pá

Por um lado, trata-se de uma ‘imposição’ da troika, alegremente aceite por este Governo, em nome da produtividade (ou da competitividade?) que ninguém no País parece estar em condições de avaliar quanto aos resultados práticos.

Fica a dúvida se foi um imposição ou uma punição. Mas essa dúvida é endémica e transversal a todo o PAEF.

O sinal de derrogação da nossa soberania é difícil de apagar qualquer que seja a ‘ginástica’ de Portas ou o ‘assobiar para o lado’ do Governo.

Os portugueses terão sempre presente que, para este Governo, quer a Restauração da Independência, quer a Implantação da República, são factos históricos e identitários que foram submersos por gratuitas especulações económico-financeiras. E tal facto não os impede (ao actual Governo) de continuar a tentar empunhar a bandeira de um ‘patriotismo’ (manifestamente interesseiro).

Por outro lado, e por outras razões, muitos portugueses não sentirão motivação para exigir a reposição integral do ‘pacote dos feriados’, já que os feriados religiosos não têm (ou não deveriam ter) implicações públicas (para a República). Um deles o ‘corpo de Deus’ é um feriado móvel que tem (para os crentes) a ver com o calendário litúrgico sem qualquer obrigação oficial. Aliás, e difícil perceber como num Estado laico (e apesar da Concordata) não estão previstos feriados do Yon Kippur e/ou do Ramadão só para falar das religiões abraâmicas.

Outro, o extinto feriado de 1 de Novembro bem podia ser restabelecido (pelo menos em Lisboa) para relembrar o trágico episódio do terramoto de 1755 que relançou a ideia da reconstrução nacional sob o modelo pombalino. Seria a comemoração da entrada solene e prática do ‘Iluminismo’ na política da nossa terra (num terreno muito actual – as ‘obras públicas’).

Depois de tantos desaires históricos é caso para plagiar Henrique IV (de França) e argumentar que: “Lisbonne vaut bien une messe”… (passe a contradição).

19 de Novembro, 2014 Carlos Esperança

A ICAR e os privilégios

Parlamento não mexe em isenções fiscais religiosas

por Miguel MarujoOntem

Proposta levaria a rever ou suspender Concordata
Proposta levaria a rever ou suspender Concordata

Só BE acompanha Associação República e Laicidade na exigência de revogar isenção nas tributações no património e no IVA das comunidades religiosas.

O Parlamento não vai mexer nas atuais isenções fiscais das comunidades religiosas, apesar de todas as bancadas terem sido desafiadas a fazê-lo no âmbito da discussão do Orçamento do Estado para 2015. Apenas o Bloco de Esquerda respondeu positivamente ao pedido da Associação República e Laicidade (ARL) – que defende a secularidade do Estado e quer que as várias religiões deixem de ter isenções de impostos patrimoniais e que seja revogada a devolução do IVA a estas comunidades religiosas.

10 de Novembro, 2014 Carlos Esperança

Abdul Aziz Khoja

Por

E – Pá

G.W. Bush e Abdullah (de mãos dadas)
O ministro da Informação e da cultura saudita Abdul Aziz Khoja foi demitido pelo rei Abdullah link.

Este é mais um episódio da luta política interna que envolve facções religiosas muçulmanas e, neste caso, relativa à suspensão do canal de televisão Wesal que goza de enorme audiência no mundo árabe.

Khoja foi um dos rostos identificados como um sinal de mudança do reino saudita anunciada com a chegada ao trono de Abdullah em 2005 link , sendo referido como possuidor de uma discreta ‘aura liberal’.

Na realidade, o relativo ‘apagamento’ da Al-Qaeda e a notória ‘ascensão’ do Daesh (Estado Islâmico) continuam a perturbar os equilíbrios político-religiosos em Riad, onde Abdullah é tido como um sunita convicto e radical (wahhabita) que, de acordo com ventos que sopram, tenta difundir – para o exterior – um (controverso) clima de tolerância.