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29 de Agosto, 2017 Carlos Esperança

Religiões, política e terrorismo

Dos danos das religiões causados aos Estados há fartos exemplos e repetidas denúncias, mas fala-se pouco da nocividade da política sobre as religiões e do aproveitamento que os Estados fazem delas, num caso e noutro com sacrifício da laicidade que a democracia exige.

Quando a URSS invadiu o Afeganistão, mandou a geopolítica que os EUA treinassem e armassem os talibãs para fragilizar o império soviético. Então, os talibãs serravam vivos os soldados russos, perante o silêncio da comunicação social. Eram comunistas!

Os EUA substituíram a URSS, e os talibãs, que tinham treinado e armado, esqueceram os aliados anteriores e serraram, também vivos, soldados americanos. A comunicação social ignorou-os de igual modo. Eram imperialistas americanos!

Os kamikazes japoneses, movidos pela fé, eram talibãs indiferentes ao Paraíso. Eram os soldados de um deus vivo, daquele enigmático Imperador cuja descendência permanece no poder com a tradição a impor-se à racionalidade, à decência e à modernidade.

Os kamikazes extinguiram-se, não por falta de fé, mas por falta de financiamentos e de apoio social. É esse motivo que dá esperança ao fim do recente terrorismo vaabita, à semelhança do que já aconteceu com o IRA ou os ingleses do Ulster, com o Grupo Baader-Meinhof alemão ou os neofascistas italianos, uma tradição recente de terrorismo europeu e caucasiano, com apoios e financiamentos políticos.

Esta fase horrenda do terrorismo islâmico, de que as principais vítimas são os islamitas, deve-se tanto à influência política dos Estados párias, como a Arábia Saudita ou o Catar, como à cumplicidade de países ocidentais com obscuras ditaduras teocráticas do Médio Oriente ou com a deriva totalitária turca de Erdogan.

O entusiasmo com que os novos Cruzados pretenderam levar a democracia ao Iraque e à Líbia, por exemplo, é o mesmo com que amparam as mais obscuras e sinistras ditaduras islâmicas onde a sharia comanda a vida.

Um módico de decência e de coerência nas relações internacionais e o simples respeito pela soberania de outros países é o mínimo exigível às grandes potências a favor da paz.

E quando se abdica da laicidade surge a promiscuidade entre a política e a religião.

27 de Agosto, 2017 Carlos Esperança

Os êxtases místicos de santa Teresa de Ávila

A

Piazza Navona e Bernini

Palácios com aquele ar que em Roma
descasca de velhice o mais moderno prédio.
E a fonte de Bernini. Essa água toda
de que ele tinha em Roma o monopólio.
Mas noutra parte a colunata ascende.
E Santa Teresa, ante a seta do anjo,
vem-se de penetrada em voo de pintelhos
que o hábito lhe roçam esvoaçante
num pélvico bater que a estoura de infinito.

(Jorge de Sena)

Chambéry, 27/7/1971

26 de Agosto, 2017 Carlos Esperança

114 papas e 228 testículos depois

A cerimónia de verificação da masculinidade papal, numa Igreja tão misógina como a dos outros dois monoteísmos, terminou há séculos.

O lugar de ‘apalpador’ dos testículos do candidato, antes de ser declarado Papa, foi eliminado, mas a história regista a cerimónia pia.

Vale a pena ler este artigo do blogue do jornal espanhol «País».

25 de Agosto, 2017 Carlos Esperança

Cristo e Maomé

Naquele tempo o anjo Gabriel era o alcoviteiro de serviço. Foi ele que disse a Maria que estava grávida o que outra mulher teria percebido. Foi também ele que, seis séculos depois, se encontrou com Maomé para lhe dizer qual era a sua – dele, Maomé -, missão.

Os anjos viviam muito tempo, embora poucos conhecessem notoriedade, levando existência discreta e anódina. Gabriel distinguiu-se. Fora criado por judeus, que criavam anjos como o Papa JP2 criava santos, que criam em milagres com a mesma fé com que alguns padres rurais acreditaram na existência de Deus.

Maomé nasceu em Meca durante o ano de 571 e viria a morrer em Medina em 632. O Corão e as agências de turismo fizeram santas as duas cidades e há períodos do ano em que uma chusma de fanáticos aí acorre, apesar dos perigos que os espreitam.

Muito parecidas com as largadas de touros, um espetáculo ainda em uso no concelho do Sabugal e noutras localidades portuguesas, as peregrinações têm perigos idênticos. O apedrejamento ao Diabo, um ódio transmitido de geração em geração, salda-se sempre por várias mortes enquanto o Diabo fica incólume, à espera do próximo apedrejamento.

Maomé teve uma vida pouco recomendável, um casamento com uma menina de seis anos, coisa que a Igreja católica também não via com maus olhos, e um casamento com a rica viúva Cadija cuja fortuna lhe permitiu dedicar-se à guerra, à religião e ao plágio do cristianismo.

Depois aconteceu-lhe o mesmo que a Cristo. Começou a ser adorado, correu o boato de que tinha nascido circuncidado, de que tinha ouvido Deus, de que foi para o Paraíso em corpo e alma, enfim, aquele conjunto de coisas idiotas que se dizem dos profetas.

Hoje já ninguém pergunta se tomavam banho, se sofreram prisão de ventre ou foram vítimas das salmonelas, se urinavam virados para Meca ou para o Vaticano, que hábitos sexuais ou manifestações de lascívia tinham.

Cristo e Maomé tornaram-se cadáveres adorados e os incréus cadáveres apetecidos pelos beatos.

23 de Agosto, 2017 Carlos Esperança

Questão de reciprocidade

Leio que Putin, perante o desejo do rei da Arábia Saudita de comprar um grande terreno em Moscovo, para erigir uma grande mesquita a expensas sauditas, lhe terá dito que não havia qualquer problema, só carecia de permissão para edificar, na Arábia Saudita, uma grande igreja ortodoxa.

É irrelevante que a isso se tenha oposto o rei desse Estado Islâmico cujo financiamento do terrorismo é esquecido pelos beneficiários ocidentais da sua riqueza de combustíveis fósseis, ao ponto de lhe conferirem alvará de “amigo do Ocidente”. Argumentar que não seria possível pelo facto de a religião dele ser verdadeira contrariamente ao cristianismo ortodoxo, ou o facto de Putin lhe ter afirmado pensar exatamente o contrário, é irrisório face ao que está em causa.

Neste caso nem a veracidade da notícia é importante, o que está em causa é a cobardia dos governantes dos países democráticos em exigirem a reciprocidade que se impõe na relação entre Estados.

Para quem defende a superioridade moral das democracias e dos Estados laicos perante os totalitarismos religiosos ou políticos, considero um pressuposto ético a exigência da reciprocidade que Putin alegadamente exigiu ao monarca medieval de um país pária que suborna os líderes pusilânimes de países civilizados.