27 de Janeiro, 2004 Mariana de Oliveira
Citação de boas noites
Se se mata um homem é-se um assassino. Se se matam todos os homens é-se Deus.
Jean Rostand
Se se mata um homem é-se um assassino. Se se matam todos os homens é-se Deus.
Jean Rostand
O Direito Penal não é, nem deve ser, um direito penal de prevenção de riscos especiais e longínquos e de promoção de finalidades específicas da política estadual. Ele é, isso sim, um direito de tutela de bens jurídicos, ou seja, de preservação das condições indispensáveis da livre realização, dentro do possível, da personalidade de cada indivíduo no seio da comunidade.
Tudo isto conduz à questão da legitimação do poder punitivo do Estado. Tal poder tem fonte na exigência de que o Estado só deve retirar a cada pessoa o mínimo dos seus direitos, liberdades e garantias indispensáveis ao bom funcionamento da comunidade. A isto conduz igualmente o carácter pluralista e laico do Estado de Direito, que o vincule a que só recorra aos seus meios punitivos próprios para tutela de bens de relevante importância da pessoa e da sociedade e jamais para instauração e reforço de ordens axiológicas transcendentes de carácter religioso, político, moral ou cultural.
Relativamente à descriminalização do aborto e ao fundamento de que a Constituição defende a vida e que este conceito deve abarcar igualmente a vida intra-uterina, há que notar o seguinde: o legislador constitucional não apontou expressamente a necessidade de intervenção penal neste assunto específico. Neste sentido, onde não existam tais injunções expressas, não é legítimo deduzir sem mais a exigência de criminalização dos comportamentos violadores de tal direito fundamental. E isto porque não deve ser ultrapassado o princípio da necessidade.
É com estas directrizes que a questão jurídica do aborto, porque não passa disso mesmo, deve ser avaliada. Devemos perguntar se não será melhor atingida a tutela do valor “vida” através da restrição do âmbito da criminalização acompanhada por meios não penais de política social.
Deixemos a questão do aborto para quem deve decidir: a mulher e, se existir, o pai. O Estado não tem legitimidade para obrigar uma mulher a dar à luz contra a sua vontade, independentemente das circunstâncias em que houve concepção e de todas as excepções consagradas no Código Penal.
A tutela penal é sempre “ultima ratio”, não a banalizemos com questões mais ou menos religiosas, morais ou culturais que estão longe de ser universais.
De acordo com informações das agências espaciais europeias e americanas, parece que há água em Marte. E onde há água, existe uma possibilidade razoável que também haja vida.
Isto deixa-me intrigada em relação a uma coisa: o cristianismo não fala de extraterrestres (conceito que abrange não só homenzinhos verdes, homenzinhos pensantes, cinzentos com grandes olhos pretos, mas também micro-organismos). Como é que as igrejas, nomeadamente a Católica Apostólica Romana, explicariam isto? A Bíblia estaria incompleta ao mencionar apenas a criação de Adão e Eva ou, através da interpretação extensiva (recurso muito popular entre os intérpretes daquele texto), os alienígenas também deveriam estar englobados?
João César das Neves (JCN) no Diário de Notícias de hoje revela, em relação ao aborto, a mesma compreensão que um talibã reserva para a carne de porco.
Qualifica-o de «infâmia suprema», maior (porque é suprema) do que os churrascos da Inquisição, assustado com a luta pela despenalização que sabe imparável.
A serem verdadeiros os fins de que é acusada a “clínica” de Aveiro implicada no julgamento que tanto incomoda JCN presta um serviço público que a falta de enquadramento legal remeteu para a clandestinidade, a fuga ao fisco e a especulação. Não se discute a acção policial mas a iniquidade da lei que criminaliza o aborto e que é urgente revogar.
A despenalização do aborto (1984) nas situações que a lei já consagra não provoca hoje, em Portugal, um simples vagido de piedosa intolerância quando, na primeira discussão e votação no Parlamento, a direita queria obrigar mulheres violadas a conceber, os fetos com graves deficiências a completar a gravidez e nem o perigo de vida da mãe lhes arrefecia os ímpetos persecutórios. Se pudessem substituir o direito civil pelo direito canónico tê-lo-iam feito com o argumento de que a alma está primeiro.
Proibir aos crentes a prática do aborto é um legítimo direito da ICAR, direito de que carece para impor uma lei que persegue as mulheres que, quantas vezes em situações dramáticas, a ele recorrem. O Estado é laico, ainda que alguns governantes o ignorem. Tão iníqua como a lei que criminaliza só outra que obrigue à sua prática, como acontece na China e aconteceu na Índia.
É urgente alterar a lei para que um problema de saúde pública não seja transferido para a esfera dos tribunais através da repressão policial. Para que no combate à ilegalidade se não torne ainda mais dramática uma gravidez indesejada. Para que não volte a ser notícia um parto escondido na casa de banho.
Enquanto a igreja católica vir na sexualidade apenas vergonha e pecado, os crimes sexuais cometidos pelo seu clero atingem uma violência insuportável.
A castidade é uma regra à espera de ser violada, entre duas orações ou após uma ladainha, lamentavelmente da forma mais torpe.
Quem leu a “A vida sexual do clero” de Pepe Rodriguez – Publicações Don Quixote. Ed 1996 não se surpreende com a onda de devassidão que grassa entre o clero. Em Portugal, onde os silêncios são mais pesados que os escândalos, ninguém se atreve a espreitar os piedosos lençóis onde se lê o breviário e se faz o sinal da cruz.
Mas, de vez em quando, chegam ecos de manhãs submersas no silêncio e na impunidade dos seminários. Hoje mesmo Licínio Lima, no Diário de Notícias (site indisponível) transcreve palavras do antigo director do semanário Expresso das Nove, nos Açores: «Eu próprio testemunhei os mais diversos abusos sexuais durante os nove anos em que estudei no seminário do Santo Cristo, em Ponta Delgada, e no seminário episcopal de Angra do Heroísmo». E prossegue: «Tantos colegas – queridos colegas – que vi transformados em tenros objectos eróticos nas mãos de padres – amigos homens solitários, desprovidos de afecto, tal como as crianças que os rodeavam, sedentas de atenção e carinho, a quem eles padres correspondiam com gestos voluptuosos à noite, nas camaratas – cheias de queridos colegas – quando as luzes se apagavam e eles vinham como “grandes mães” vestidas de negro abeirar-se das camas dos seminaristas para os consolarem com as suas carícias, sob os pijamas, sob os lençóis!…».
Não admira, pois, que o padre Arrupa – continuo a citar Licínio Lima – tenha sido enviado para o Canadá depois de ter referido como homossexuais «bispos e padres, acólitos e catequistas, leitores e ministros da eucaristia» para vir assumir a sua própria homossexualidade «…nasci assim e assim tenho de me amar para poder, também, amar os outros».
A catadupa de milagres deste pontificado – manifestação da doença senil do catolicismo romano – é uma forma de distrair as atenções.
A nossa operação foi descoberta pela Voz do Deserto, blog cristão de poucas linhas mantido por um amante de Kurma de Borrego e leitor das orações de teor universalista da irmã L.
Fiz hoje a minha primeira incursão no blog religioso Palavras que voam … e deparei-me com um post intitulado Ser usado por Deus…, que fazia a apologia deste uso só que, para isso, teríamos de estar na sua (de Deus, acho) dependência.
Lembrei-me de várias coisas. Uma que me fazia lembrar de rapazinhos ajoelhados em escuras e húmidas sacristias a aprenderem o significado da citação “vinde a mim as criancinhas”.
Outra, mais profunda, sobre o livre-arbítrio. Se se é usado por alguém (ou deus) esta característca essencial ao Homem esfuma-se, ser instrumento de qualquer vontade, divina ou não, tira a dignidade a qualquer pessoa. Marionetas, se Deus existisse, seríamos marionetas nas mãos de um velhote aborrecido com tendências masoquistas.
Enquanto ateia, a minha autonomia é tudo. Não ser usada por ninguém, a não ser pelos meus ideais, pela minha vontade, é o que me individualiza. Claro que isto acarreta a auto-responsabilidade pelos nossos actos. Quando acreditamos em algo superior, podemos sempre descartar essa responsabilidade para alguém.
Lembrei-me de uma frase muito gira de Montesquieu:
“Se os triângulos fizessem Deus, faziam-no com três lados.”
Em Coimbra toda a gente sabe onde está reclusa a Ir. Maria Lúcia de Jesus do Sagrado Coração, aquela a quem a Senhora de Fátima ensinou o truque para combater o comunismo – rezar o terço – mas poucos sabem que há uma sapataria que faz concertos.
Por isso divulgo esta fotografia, tirada na Praça Machado de Assis, do prédio de gaveto das Ruas Machado de Castro e Virgílio Correia e convido os leitores a entrarem no ambiente calmo da Sapataria Norbal, disponível às horas de expediente, sem grandes aglomerados, numa zona central e aprazível. Uma pérola em dó sustenido, metáfora da cidade dos doutores.
Numa localidade de província as sapatarias dedicam-se apenas a fazer consertos, isto é, a deitar meias solas, engraxar, pregar um salto, vender um par de palmilhas, entregar uns atacadores, coser uma fivela e o mais que é mister.
Em Coimbra – cidade da Ir. Lúcia e com uma estátua de JP2 – tudo é diferente. Mas o melhor é entrarem por alguns instantes na sapataria e, enquanto esperam que a cola reponha o salto do sapato, que não resistiu aos buracos do largo em frente ou à pastilha elástica que o prendeu ao passeio, sempre se deliciam com “concertos rápidos” que não deixarão de aliviar a alma.
Siga o link e descubra a que tipo de inimigo da fé pertence.
Eu sou uma filósofa/cientista (bela combinação!) e, numa palavra, sou uma ameaça para o cristianismo! MWAHAHAHAHAHAHAHA!!!! :o)
Que tipo de inimigo da fé é você?
O Diário de uns ateus é o blogue de uma comunidade de ateus e ateias portugueses fundadores da Associação Ateísta Portuguesa. O primeiro domínio foi o ateismo.net, que deu origem ao Diário Ateísta, um dos primeiros blogues portugueses. Hoje, este é um espaço de divulgação de opinião e comentário pessoal daqueles que aqui colaboram. Todos os textos publicados neste espaço são da exclusiva responsabilidade dos autores e não representam necessariamente as posições da Associação Ateísta Portuguesa.