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26 de Maio, 2004 André Esteves

Existe cura para o fanatismo?

Sim… Fica-se curado quando temos um canal de TV e desejamos respeitabilidade…

Devem faltar os temas no horário da IURD no canal Record… É o que dá quando as reuniões só servem para planear os objectivos de doações e dízimos. Depois faz-se tudo em cima do joelho…

O Diário de uns Ateus agradece.

25 de Maio, 2004 Carlos Esperança

Emigrantes bem sucedidos – 2.º Conto Piedoso

Delfina de Jesus e Simão Borrego casaram muito novos, no início da década de sessenta. Tinha ela acabado de fazer 18 anos e ele 19. E não foi por haver mouro na costa que é, como quem diz, ir ela já prenhe, infâmia de solteira que na aldeia o matrimónio lava ou as facadas de pai ou irmão reparam. Nada disso.

Não mereceria o ramo de laranjeira com que se apresentou na Igreja, descaramento murmurado por mulheres vigilantes e amigos do noivo que várias vezes viram desaparecer o casal por trás dumas fragas, enquanto eles se entregavam à prática do pecado solitário, ignorando os riscos da cegueira e da tuberculose com que o Sr. Padre repetidamente os prevenia na confissão e nas homilias.

Nunca se atreveram a aproximar-se pois sabiam da perícia com que Simão punha uma pedra no sítio que pretendia, corno de cabra rebelde incluído, perícia de pastor que os mantinha em respeito.

Limitavam-se a imaginar primícias saboreadas, corpos que se fundiam em êxtase, prazeres fantasiados, gozos por fruir.

As moçoilas da idade de Delfina compartilharam com ela muitas conversas sobre o namoro que os pais de ambos toleraram. Deviam saber coisas que as raparigas guardavam e de que os rapazes se gabavam ou ansiavam por conhecer. Talvez por isso a invejavam tanto sem a imitarem.

Temiam o pecado que lhes perderia a alma, receavam a prenhez que lhes complicaria a vida, adivinhavam a desgraça que lhes enlamearia a honra, imaginavam a pancada com que o pai ou um irmão lhes partiria os ossos. E assim iam resistindo aos olhares incandescentes, às palavras sussurradas, aos convites suspeitos, aos apelos alheios ou ânsias próprias. Até ao dia em que a natureza e as circunstâncias falassem mais alto. Até um dia.

Poucos meses depois do casamento começou Simão a cismar na guerra de África para onde, segundo o Sr. Padre, os nossos jovens iam defender a Pátria e a civilização cristã, combater o comunismo e o terrorismo, coisas de que ele pouco sabia e que o privariam da mulher com quem tanto folgava e a quem tanto se afeiçoara.

Em letras pequenas vira no jornal, entre vários, o nome dum amigo mais velho com quem fora tantas vezes aos peixes, com quem armara costilhos aos pássaros, com quem fora tomar banho ao rio da sua aldeia em véspera de ir às inspecções. Por cima do nome estava o título do costume – ?Ao serviço da Pátria? e depreendia-se que morrera por obrigação e que tivera sorte em poder imolar-se por tão nobre causa.

E foi assim que, alguns dias depois do desaparecimento de Simão, sem angústia dos pais ou mágoa visível da mulher, apareceram na aldeia dois senhores a fazer perguntas aos vizinhos, a ameaçar a família e os amigos e a obter declarações em longos interrogatórios no posto da G.N.R..

Constou-se que estava em França. Em breve chegaram notícias que o confirmara em carta, pois ele sabia ler, escrever e contar, finalidade da escola primária cuja instrução levara até ao fim. E só não foi mais longe nos estudos por não terem os pais achado necessário nem útil a quem tinha uma boa casa de lavoura, com uma horta ao pé da casa, campos de cereal, vastos terrenos de pastagens e uma boa quantidade de animais para cuidar.

Os pais nunca frequentaram a escola e, tirando o período da guerra e do racionamento que se lhe seguiu, nunca passaram fome. Para quê ter um filho doutor?

Esteve quase um ano Delfina, privada do homem e de alegria até que conseguiu ir ter com ele.

A aldeia foi esquecendo o casal. Os próprios pais, resignados à separação, pareciam tê-los esquecido também. Poucas foram as notícias que chegaram durante uma longa dúzia de anos.

Entretanto acontecera o 25 de Abril, a guerra de África tinha terminado, aos refractários era consentido o regresso. O País era outro.

Simão e Delfina regressaram à terra num automóvel de luxo numa noite de Agosto. Vinham passar férias. Depois da euforia do reencontro, das saudades matadas, das saudações que o prior lhes fizera na missa, em que publicamente agradeceu o donativo para as festas da Padroeira, donativo que o número de zeros tornava obsceno, depois de almoços e jantares para que convidaram toda a aldeia, o casal justou uma casa com piscina, comprou todas as propriedades disponíveis quase sem discutir preço, pagou o fogo de artifício para a festa da Senhora das Candeias, teve lugar de destaque na procissão e deu-se a todos os prazeres que o dinheiro pode comprar.

O casal foi muito acarinhado. Ambos demostraram saber ainda o nome das pessoas, não ter esquecido amizades e interessar-se pelos problemas da aldeia. Dispostos a acudir a dificuldades, interessados em dotar a terra com uma creche prometida pelos vários partidos em véspera de eleições e ainda não concretizada, logo fizeram o respectivo donativo em francos franceses que entregaram à Junta de Freguesia e que amplamente correspondiam às despesas necessárias.

Delfina era verdadeiramente a primeira dama da aldeia. Elegante no vestir, conservava os traços de beleza da juventude. Luziam-lhe ainda os dentes todos. Não se deixara engordar. Pela anatomia que um vestido de bom corte e discreta transparência deixava adivinhar, via-se que o tempo a poupara mais que o habitual. Parecia dez anos mais nova que as raparigas do seu tempo.

Simão mostrava uma ligeira curva na gravata que passara a usar, adereço que lhe destacava o bom gosto e acentuava o toque de prosperidade que o bafejara. Nem por isso usava qualquer distanciamento para com os seus velhos companheiros de infância. Pelo contrário, o tempo parecia ter robustecido os laços de amizade, a ausência cimentado o afecto, a distância aumentado a simpatia.

Foi numa dessas tardes de verão, na adega do Ezequiel, até então o mais rico da aldeia, colega de escola que ambos lograram concluir em quatro anos, amigo do peito desde sempre, que, depois de alguns copos e confidências várias, Simão revelou a chave do sucesso.

Depois de Ezequiel ter afirmado, por mera intuição, que em França se ganhava muito dinheiro, que a vida devia ter corrido muito bem a Simão, que devia ser possuidor de assinalável fortuna, ao que este anuiu, disparou-lhe:

– Mas em que é que tu ganhaste tanto dinheiro?

Prontamente o amigo o informou, em vernáculo, claro, de que era proprietário de um prostíbulo de homens e doutro de mulheres, estabelecimentos que criara e vinha desenvolvendo há longo tempo, depois de uma breve passagem pela construção civil, a dar serventia de pedreiro, nos arredores de Paris.

Surpreendido e elucidado mostrou Ezequiel compreender a razão de tão sólida fortuna. E exclamou:

– Então tu, Simão, nunca tiveste dificuldades em França!

– A princípio tive!…, rematou nostálgico, com ar de quem subiu a vida a pulso, lembrado dos tempos em que era só ele e a mulher.

25 de Maio, 2004 Ricardo Alves

Sim à Laicidade, não à Concordata (2)

Existem alguns aspectos da nova Concordata que são particularmente gravosos e que merecem portanto ser discutidos em detalhe.

1) Os artigos 1, 8, 9, 10 e 11 garantem o reconhecimento pelo Estado das instituições católicas, reconhecimento esse que será automático após uma notificação unilateral efectuada pelas autoridades eclesiásticas. Quaisquer outras associações formadas livremente pelos cidadãos estão obrigadas a seguir os trâmites da lei geral do associativismo, ou seja, a efectuarem uma escritura em cartório notarial, pagando os respectivos custos, bem como a publicação em Diário da República. A Concordata confirma assim dois regimes associativos distintos, um para as associações católicas, outro para as associações laicas.

2) As instituições católicas beneficiam de uma vasta lista de inaceitáveis isenções fiscais (ao contrário de um mito muito popular, apenas uma pequena parte destas instituições se dedica à assistência social, conforme será explicado num próximo texto). Embora haja algum recuo relativamente às isenções fiscais da Concordata anterior (nomeadamente, a isenção de IRS para os padres) não é claro se a nova Concordata não permitirá que continue o regabofe que tem mantido as livrarias católicas e os hotéis de Fátima isentos de impostos…

3) Uma vez que a Lei de Exclusão Religiosa abrira a possibilidade de algumas igrejas (que a ICAR decida reconhecer através da Comissão de Liberdade Religiosa, estatal mas por ela dominada) poderem realizar casamentos com efeitos civis, a nova Concordata mantém a outra distinção entre a ICAR e as igrejas “minoritárias”: a possibilidade de a ICAR efectuar divórcios com efeitos civis (artigo 16). Evidentemente, a anulação “canónica” do casamento é quase impossível, mas a nova Concordata recomenda paternalmente aos cidadãos casados catolicamente o “grave dever” de não se divorciarem (artigo 15)!

4) O artigo 19 garante o ensino da religião católica nas escolas públicas, com professores nomeados pela ICAR e pagos pelo contribuinte. Ou seja, a transmissão da crença, num espaço público e pago com dinheiro público, fica garantida por mais uma geração. Ora, a escola deveria servir para transmitir conhecimentos e não para propagar a crença. Se possível, deveria ajudar a formar o espírito crítico e científico dos futuros cidadãos…

A nova Concordata continua assim os piores aspectos da anterior. Estabelece a confusão entre o que é do domínio privado e da livre associação de cidadãos (a crença e as associações de crentes) e o que é do domínio público e estatal, como as prerrogativas estatais de criar instituições, de realizar contratos como o casamento, ou de decidir o que é ensinado nas escolas de todos.

Os aspectos enunciados neste texto e no anterior são mais do que suficientes para defendermos a não ratificação deste acordo concordatário. No próximo texto abordarei alguns mitos comuns que são usados pela propaganda católica nas discussões sobre a Concordata.

25 de Maio, 2004 André Esteves

E pimba!

Vinha eu a passear pelos canais da televisão, quando tropeço na 2:, numa entrevista com Maria João Avillez.

A anunciar o seu último livro de entrevistas com Álvaro Cunhal (feiras do livro, sabem?).

Fiquei estranho. Alguma coisa estava errada.

Muito errada. Extremamente errada.

Transplantaram-lhe a cabeça para outro corpo???

AAAAHHHHHHHHHH!! HOORRROORRR!!!!

Afinal não. (UFA…!)

Habituado a vê-la encostar Cavaco Silva à parede, por usar o nome de deus em vão, ou a adormecer as minhas cadelas com os temas abordados, tinha aceite o seu tailheur conservador como uma segunda pele.

Maria João, mantenha a sarja! Tira-lhe anos! Linda!! (Pelo menos até começarmos a ouvi-la falar.)

24 de Maio, 2004 André Esteves

Sinfest, a festa dos pecados.



Legendas:

1ºQuadrado: À volta do século 19, o ateísmo espalhou-se, como os Backstreet Boys.

2ºQuadrado: Filósofos anunciaram a morte de deus. Psicólogos sonhavam teorias sem necessitarem dele

3ºQuadrado: A igrejas esvaziaram-se. A fé entrou em declínio. As pessoas sentiam-se desiludidas com deus.

4ºQuadrado: Não é de admirar, que ele esteja tão desesperado.

Muito raramente, encontramos a excelência. Sinfest é a excelência. Esta banda desenhada ateia consegue quebrar com todos os preconceitos que possamos ter sobre o tema colocado nos quadradinhos. As histórias andam à volta de um conjunto de personagens que personificam a condição humana moderna. Slick e Monique são o foco central do trama. Ele um epicuriano perverso que procura a realização material sem nenhum esforço. Ela uma vamp que procura esconder a mulher sensível que é, encontrando sempre mais fundo, a vamp que realmente é.

Por sua vez, deus e o diabo, bem como o dragão oriental colocam o pano de fundo filosófico nesta autêntica festa dos pecados. (deus está sempre a lembrar ao diabo que ele não passa de uma marioneta da sua vontade, e procura ignorar a existência do sarcástico e independente dragão oriental, personificando os problemas filosóficos do mal, do livre arbítrio e do choque alienígena das culturas orientais na visão, até à pouco tempo exclusiva, da religião judaico-cristã.)

As paródias politicamente incorrectas misturam-se com caligrafia japonesa e comentários profundos revestidos de uma simplicidade e subtilezas desarmantes.

Tatsuya Ishida, o autor, gosta de se apresentar como um rebelde. E é-o pela excelência. O traço clássico em tinta de Nanquim, quase no plágio de «Calvin e Hobbes» (em que Slick é a homenagem final) é desmontado com regularidade e cuidado sistemático revelando um artista com um controle magistral da sua técnica.

Consumir com meditação e uma boa gargalhada epifânica.

A não perder!

Sinfest – A banda desenhada

24 de Maio, 2004 Carlos Esperança

O culto que a igreja quis silenciar

«Muitos dos habitantes de Asseiceira, Rio Maior, continuam a crer que Nossa Senhora apareceu ali várias vezes a um menino chamado Carlos Alberto. Cinquenta anos depois da primeira aparição, o culto mantém-se apesar da rejeição da Igreja Católica. No local pedem-se graças, pagam-se promessas e movimenta-se dinheiro» – lê-se em «O MIRANTE», semanário regional, de 20 do corrente.

O admirável acontecimento ocorreu pela primeira vez em 16 de Maio de 1954 quando o Carlos Alberto, então aluno da 4.ª classe da escola primária de Asseiceira, se encontrava a rezar. Apresentou-se-lhe como «Mãe do Redentor», junto a um loureiro que ainda lá está de pé. A partir daí, até Janeiro de 1955, a Mãe do Redentor apareceu todos os dias 16 ao garoto, altura em que compromissos de agenda a levaram para outras paragens.

São muitas as pessoas que dizem ter presenciado acontecimentos sobrenaturais e assistido a milagres. No entanto o milagre mais difícil foi o do cego Silvério da Costa que de repente começou a ver.

Não obstante a cura de cegos ser uma especialidade bem difícil, onde JC firmou créditos, nem assim a ICAR procura ir além do que afirmou numa nota patriarcal de 7 de Agosto de 1954 «nada existir que confirme ou pareça confirmar a veracidade de tais aparições», recusando-se a conceder o alvará para exploração do milagre.

Todavia se a tendência religiosa de limitar os milagres por hectare, vier a desaparecer, a Mãe do Redentor de Asseiceira tem condições para se tornar numa das maiores vedetas do culto mariano em Portugal.

24 de Maio, 2004 Ricardo Alves

Sim à Laicidade, não à Concordata (1)

Existem boas razões de princípio para se ser contra qualquer Concordata que comprometa a República de que somos cidadãos.

1) Os direitos necessários ao exercício da liberdade religiosa já são garantidos pela Constituição da República Portuguesa, nomeadamente a liberdade de consciência, a liberdade de culto, a liberdade de expressão e a liberdade de associação (ver os artigos 37, 41, 45 e 46). Os católicos exercem estes direitos diariamente e é legítimo que o continuem a fazer. A Concordata não é, portanto, necessária do ponto de vista da garantia das liberdades fundamentais dos cidadãos portugueses.

Só se compreende a sua existência como forma de impôr privilégios para a comunidade católica portuguesa, ou seja, para criar desigualdades entre os cidadãos. (Este aspecto será desenvolvido num texto futuro.)

2) Qualquer Concordata implica o reconhecimento por Portugal do estatuto estatal do Vaticano. Ora, a Santa Sé não governa um Estado, mas sim uma igreja. Não existe um povo do Vaticano, mas sim cerca de 400 pessoas que acumulam o passaporte da Santa Sé com a nacionalidade de outros Estados, e geralmente também com o estatuto eclesiástico. Além disso, o território administrado é o mais exíguo do mundo, e a Santa Sé não ratificou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, não sendo por essa razão um membro efectivo da ONU. Apenas um acordo de 1929, assinado por Mussolini, impede que a República italiana reclame a soberania total sobre os 0.44 km2 vaticânicos. Este pseudo-Estado, a última ditadura da Europa, tem usado o seu estatuto de “observador” na ONU para impôr concepções dogmáticas em matérias de planeamento familiar (e outras).

A República não deve reconhecer igrejas, mas sim cidadãos livres e iguais. Reconhecer uma igreja como se fosse um Estado é portanto um insulto à laicidade.

24 de Maio, 2004 André Esteves

Pequenos absurdos históricos incómodos

O imperador romano Constantino, o homem que se «converteu» ao cristianismo e o tornou religião do império, morreu há 1667 anos. (e um dia…)

Embora bem morto, o seu corpo embalsamado continuou a actuar como chefe de estado, recebendo as figuras do estado e relatórios diários dos seus ministros, como se nada se tivesse passado.

Esta situação continuou até ao inverno.

Muito cristão… Seria?

Quando li este pequeno pedaço de história (e são tantas histórias) que coloca a nossa visão do passado de sobreolho, lembrei-me de uma pequena piada soviética:

Estaline morreu. Puseram-no em câmara ardente. O «paizinho dos povos» foi visitado por todo o povo de Moscovo. Na noite antes do enterro, reuniram-se os seus comparsas à volta do caixão.

No meio da escuridão, olhavam uns para os outros, desesperados. Enquanto se entreolhavam, sussurravam com horror nos olhos.

– Estaline morreu… Estaline morreu…

E assim continuaram durante horas. Até que Béria finalmente ganhou coragem e disse a meia voz:

– Estaline morreu!

Todos gelaram de terror. Béria perguntou, aterrado:

– E quem é que lhe vai dizer?

23 de Maio, 2004 André Esteves

A Moral encontra-se na religião?

«O cristão em mim diz-me que é errado, mas o guarda prisional em mim diz

‘adoro fazer um homem crescido mijar-se’»

Joseph Darby guarda prisional na prisão de Abu Ghraib, Iraque.

No Público

Onde estava Joseph Darby?

Aos domingos na igreja… Todos os outros dias no «trabalho» e na vida real…

E onde é que se vive a moral?

A moral está no dia a dia.

Não é antinatura, então, que um religioso peça uma teocracia?

Não será natural, para todos os que vivem uma vida natural, pedir uma democracia sem referências religiosas?

No púlpito a moral só está lá, porque a roubaram de todos nós.