7 de Junho, 2004 André Esteves
Sobre cães abandonados, o Euro 2004 e um aviso…
Tenho um grande amor pelos animais. Neles encontro, na sua inteligência e linguagem, um mundo que a maior parte dos humanos, persiste em querer ignorar pelo medo de perder os seus deuses. Desde há cinco anos que eu e a minha esposa ajudamos cães de rua. Alimentamo-os, desparasitamo-os, tentamos arranjar-lhes lares decentes e humanos.
Acredito que temos uma responsabilidade racial para com os cães. No nosso passado genético, os cães permitiram ao homem de Cro Magnon ganhar a supremacia com os Neandertais. Deram-nos o volume frontal do nosso cérebro, ao caçar connosco, permitiram-nos diminuir a área olfactiva abaixo do cérebro (bem como outros co-efeitos mútuos), e por sua vez, nós seleccionamos os cães. Um cão bebé consegue reconhecer expressões faciais num humano, à semelhança dos bebés humanos. Na nossa mútua influência, geramos estruturas cerebrais semelhantes. Em contraste, um lobo, de bebé a adulto, mesmo domesticado, nunca aprende a distinguir expressões faciais humanas.
Como podem imaginar, há mais cães abandonados do que lares decentes e humanos.
Neste espaço de tempo, eu e a minha mulher já encontramos de tudo. Animais estropiados a pedirem-me que lhes tirasse a dor (sim). Cadelas com crias, devoradas por parasitas. Cães com esgana, parvo-virose, raiva, rebentados por sevícias sexuais, esfomeados deliberadamente até ao limite, o que imaginarem.
Mas o pior, não são os sofrimentos e os horrores. Já tive que abater 5 cães, pelos quais os quais o meu tempo e dinheiro nada podiam fazer. Acompanhei-os até ao último instante. E chorei pela generosidade de me terem ensinado algo sobre a morte.
Mas o pior, o pior são os humanos.
São eles a causa de tanto sofrimento. Nestes cinco anos, aprendi a distinguir com quem é que podia contar e de quem desconfiar.
O mesmo humano que fala da vida, como valor supremo, que se insurge contra o aborto e a pílula, é o mesmo que abandona os seus cães na berma da estrada, eliminando os afectos e a responsabilidade. Ao afastá-los da sua vista e mantendo a ilusão de que irão «continuar vivos» pois não os matou, enganou-se a si próprio, religiosamente, de que nada de mal fez. Afinal, poupou-lhes a vida!
No outro extremo, temos pessoas que alimentam e protegem os animais, mas não os tiram da rua. Não esterilizam fêmeas ou machos e contribuem para o aumento do sofrimento por todo o país, ao, irracionalmente, servirem de factor de pressão nas Câmaras Municipais, para não se adoptarem medidas de eutanásia humanizadas e indolores, reclamando-se da protecção da «vida».
São as mesmas pessoas que encontro com o rosário pendurado no carro. São as mesmas pessoas que tiram férias no 13 de Maio. São as mesmas pessoas que não pensam, nem sequer acreditam pois só sentem.
Apoiadas numa ideia neolítica, católica e rural de «vida» contribuem para aumentar o número de cães abandonados, maltratados e abusados, por todo o país.
Hoje, através da minha rede de informações, chegou-me a notícia que na zona de Aveiro, um canil Municipal foi assaltado. Foram levados mais de 30 cães. Durante a manhã, chegaram-me também notícias de vários raptos de cães na zona de Estarreja, tanto abandonados, como de moradias. Os cães que foram roubados são os utilizados para treinamento de Pit Bulls e Rottweillers em combates até à morte.
O boato que corre, é que alguém recebeu encomendas de combates pelas claques que vêm ao Euro 2004. As mesmas claques de onde surgiram partidos como o PNR,o BNP britânico ou a Frente Nacional Francesa, pela «vida» e contra o aborto.
Peço-lhe: Cuide e proteja o seu cão, durante o Euro 2004.
É um elemento da sua família expandida.
E não só durante o Euro 2004, porque vivemos num país de monstros.