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4 de Julho, 2004 Mariana de Oliveira

Casamento: Evolução do direito português V

A Lei da Liberdade Religiosa (Lei n.º 16/2001, de 22 de Junho) ressalva expressamente a Concordata com a Santa Sé de 1940, o Protocolo Adicional de 1975 e a legislação aplicável à ICAR, à qual não são aplicadas as disposições desta lei relativas às igrejas e comunidades religiosas inscritas ou radicadas no país (art. 58º). Desta fora, mesmo depois da regulamentação da Lei da Liberdade Religiosa e da sua aplicação prática, o sistema matrimonial português continuará a ser o de casamento civil facultativo na segunda modalidade, em que o casamento católico não é apenas outra forma de celebração do casamento, mas um instituto distinto, regulado, em certos casos, por normas distintas das que regem o casamento civil.

No entanto, passarão a existir casamentos civis celebrados por forma religiosa, perante ministro do culto de igreja ou comunidade religiosa radicada no país (art. 19º), os quais constituirão apenas outra forma de celebração do casamento, que ficará sujeito, no que toca a questões de forma, às mesmas disposições por que se regem os casamentos civis celebrados perante o conservador do registo civil.

4 de Julho, 2004 Carlos Esperança

Euro 2004. Portugal/Grécia

Quero expressar aqui o meu desejo para que, logo, quem gosta de futebol, possa assistir a um belo jogo entre duas excelentes selecções.

Não escondo que ficaria satisfeito com a vitória da selecção portuguesa, mas desejo que ganhe quem jogar melhor.

O que me entristece é o espectáculo deprimente de superstição e histerismo que percorre o país, desde imagens da senhora de Fátima, encavalitada em veículos vários, até à gravata da sorte a rodear o pescoço do futuro presidente da Comissão Europeia.

As promessas de peregrinação, as orações beatas e as persignações aflitas são a imagem de um povo perdido na modernidade, com os tiques herdados pelo secular obscurantismo a que a influência religiosa condenou Portugal.

Que ao fumo das velas piedosas se sobreponha a inteligência e a arte dos jogadores.

3 de Julho, 2004 Mariana de Oliveira

Santa Sé reforça o seu papel nas Nações Unidas

A Santa Sé tornou-se Observador Permanente nas Nações Unidas em Abril de 1964 e desde então tem sido parte activa em todas as reuniões da Assembleia.

Foi aprovada unanimemente, no dia 1, na Assembleia Geral das Nações Unidas uma resolução que expande o papel da Santa Sé naquela organização internacional. A Assembleia geral, ao adoptar a resolução, diz que está desejosa em contribuir para a participação adequada da Santa Sé no trabalho da Assembleia Geral no contexto da revitalização desse trabalho.

Um anexo à resolução estabelece novos privilégios permanentes àquela organização, incluindo o direito de resposta (que permite aos delegados responderem a discursos feitos durante os debates) e o direito de participar no debate geral da Assembleia, que anualmente reúne os líderes mundiais. Sem prejuízo da prioridade dos Estados-membros, a Santa Sé terá direito de inscrição na lista de oradores sobre temas agendados em qualquer reunião plenária da Assembleia Geral depois do último Estado inscrito na lista, diz a resolução.

A Santa Sé, que anteriormente revelava as suas posições através de comunicados de imprensa, terá agora o direito a que suas comunicações relativas às sessões e trabalhos de todas as conferências internacionais convocadas sob os auspícios da Assembleia Geral sejam emitidas e divulgadas directamente, sem qualquer intermediário, como documentos oficiais dessas conferências.

Outras mudanças de ordem técnica incluem o direito de levantar o ponto de ordem – procedimento técnico usado durante reuniões do comité e o direito de co-patrocinar projectos de resoluções e decisões que façam referência à Santa Sé.

Com a adopção desta resolução, a Santa Sé ficará sentada nas salas de conferências depois dos Estados-membros e antes dos restantes observadores.

Segundo a diplomacia do Vaticano, esta mudança permitirá à Santa Sé desempenhar uma melhor acção em favor da paz e dos direitos humanos.

Esta resolução representa um retrocesso na ordem internacional no sentido de não favorecer qualquer confissão religiosa. Sim, porque o binómio Santa Sé/Cidade do Vaticano não pode ser considerado um Estado.

2 de Julho, 2004 Carlos Esperança

A herança do cristianismo

Não é a primeira vez que estou de acordo com o papa – não se pode esquecer a herança cristã na Europa. Seria preciso ignorar completamente a história. As guerras religiosas, a inquisição, as cruzadas, o ódio visceral à república e à democracia, a rejeição do humanismo e o combate à emancipação da mulher são património cristão assumido com júbilo por um guardião intolerante – o papa de Roma.

Recordar a herança cristã é também ter presente o ataque persistente à investigação científica e as alianças com os fascismos do séc. XX.

Não se pode, de facto, esquecer tal herança sob pena de não compreender a escravatura, o feudalismo e a perpetuação no poder de numerosos tiranos ungidos e apoiados pela ICAR.

A herança cristã está ainda presente na eliminação dos índios e no colonialismo. A evangelização foi um alfobre de santos e assassinos cujo proselitismo faz as delícias de JP2, ditador de serviço, instalado no Vaticano há um quarto de século.

O perigo é ver num déspota decrépito uma imagem de bondade e abnegação. É esquecer o ódio com que perseguiu teólogos progressistas, a ferocidade com que se opõe à igualdade entre os sexos, a obstinação com que recusa as experiências para descobrir novos medicamentos a partir de células embrionárias, a paranóia em relação à contracepção, a demência com que embirrou com o preservativo.

O cristianismo é insensível à bomba demográfica que diariamente ameaça o planeta, compromete a paz e é fonte de inenarráveis sofrimentos. O papa comporta-se como dono de uma arrecadação onde armazena grande quantidade de almas, com necessidade de nascimentos para promover o escoamento, insensível à fome, às doenças e à miséria.

Se o ayatollah do crucifixo pensasse um só momento na responsabilidade que lhe cabe na tragédia do desmembramento da ex-Jugoslávia morreria de vergonha ou de remorso. Mas a sua obsessão pela Croácia católica foi mais forte.

Pior do que a tirania do sagrado é a sagração de um tirano. A JP2 outro se seguirá.

Os crentes merecem respeito e os clérigos condescendência, mas as crenças exigem um combate persistente e sem tréguas.

Apostila – Conheço pessoas excelentes, cristãs, mas não compreendo como podem aceitar a autoridade de um papa medieval e caucionarem o embuste permanente dos milagres que adjudica para rubricar os alvarás dos santos que fabrica em doses industriais. Isto não é má fé, burla e obscurantismo?

2 de Julho, 2004 Ricardo Alves

Atrás do véu

Existem duas linhas de argumentação entre aqueles que se opõem à proibição de símbolos religiosos (como o véu islâmico) nas escolas públicas.

(1) Proibir símbolos religiosos pessoais é limitar a liberdade de expressão.

(2) Deve respeitar-se a «identidade cultural» muçulmana ou outra, custe o que custar.

A postura (1) funda-se num valor que muito prezo (a liberdade de expressão) e que só aceito que seja sacrificado neste caso porque estão em risco outros valores igualmente fundamentais: a neutralidade confessional da escola pública e a igualdade entre os sexos. Deve acrescentar-se que proibir símbolos religiosos pessoais não é uma medida indispensável à laicidade escolar; é uma medida de emergência. Efectivamente, o véu islâmico aparece nas escolas francesas devido à pressão exterior de grupos extremistas, e faz-se acompanhar de um crescendo de reivindicações identitárias: rejeição do estudo do genocídio de judeus, recusa de assistir a aulas de educação sexual e até de participar na ginástica e na natação. A mensagem que assim chega à escola, enviada pelo clero mais fanático, é clara:

(i) as meninas não brincam com os meninos;

(ii) o respeito pela «cultura islâmica» necessita da segregação.

A situação agrava-se tanto mais quanto se verifica que, em muitos subúrbios franceses, as raparigas que não usam o véu são vítimas de violência, o que indica que o uso do véu, longe de ser uma escolha livre e pessoal, é uma imposição da família ou dos jovens machistas de bairro. A face e o cabelo desvelados das raparigas de «cultura muçulmana», nas escolas públicas, poderão ser muito educativos para esses jovens aprendizes de mulás extremistas. O direito a uma escola pública livre de pressões clericais deve portanto prevalecer.

Finalmente, a atitude (2) é a de certos «culturalistas» que defendem que as jovens de origem magrebina não fazem outra coisa senão exercer o seu sagrado «direito à diferença», e que não se apercebem de que neste caso se chegou ao «dever de diferença». Não é por acaso que cada vez mais jovens de «cultura muçulmana» se organizam e reivindicam o direito (veja-se lá o atrevimento!), de abandonarem a sua (presumida) «cultura de origem» seguindo o Corão apenas nos preceitos que quiserem, ou até não o seguindo de todo. É esse o caso do «Mouvement des Maghrébins Laïques de France» ou de «Ni putes, ni soumises» (uma associação de mulheres dos subúrbios contra a violência).

Os nossos «culturalistas» argumentam ainda que os valores cívicos e políticos são de origem «cultural» e que portanto não devem ser impostos a outras «culturas», mesmo que esse valores sejam, neste caso, a liberdade individual, a igualdade dos sexos e a laicidade. Mesmo os «culturalistas» da esquerda mais «radical» caem neste erro… É que quem define a «identidade cultural» são sempre os sectores mais tradicionalistas e integristas, ou melhor, não tenhamos medo da palavra: reacionários.

2 de Julho, 2004 Carlos Esperança

Notas piedosas

Selecção Nacional – O efeito conjugado de Nossa Senhora de Caravaggio (um heterónimo brasileiro da Virgem Maria), em sinergia com a Senhora de Fátima, levaram Portugal à final do Euro 2004. No próximo domingo decide-se qual é a religião verdadeira – a ICAR ou a Igreja Ortodoxa grega.

Euro 2004 – «Iremos ganhar, graças a Deus», declarou Durão Barroso. Também disse, no início do seu Governo, «vamos crescer mais do que a média europeia, se Deus quiser» e a opção revelou-se indisponível.

USA – A uma criança de menos de dois dias, infectada à nascença por septicemia puerperal, foi-lhe negada a administração de antibióticos. A decisão dos pais, baseou-se na crença de que as orações poderiam salvá-la. Sob o lema «confiar em Deus para curar as doenças», os 150 membros da Igreja, que recusam medicamentos, atiraram-se à oração. A criança morreu.

Conclusão – a oração tem um efeito semelhante ao do placebo. Alivia mas não cura.

2 de Julho, 2004 jvasco

Cristianismo e Homofobia

O artigo anterior foca um assunto bem pertinente: a homofobia cristã.

Tal homofobia não é simplesmente fruto de uma tradição folclórica ultrapassada ou de um clero dessincronizado com a actualidade. Não: tal homofobia está defendida na Bíblia, várias vezes e de várias formas.

A Bíblia anotada do céptico tem uma lista de 23 citações que o mostram claramente. Cá estão as traduções de alguns exemplos:

“Os actos homossexuais são uma abominação aos olhos do Senhor” Leviticus 18:22

“Os homossexuais devem ser executados” Leviticus 20:13

“As mulheres não devem usar roupa masculina – é uma abominação aos olhos do Senhor.” Deutronimo 22:5

1 de Julho, 2004 Mariana de Oliveira

A aberração das uniões

O ministro da Justiça, Juan Fernando López Aguilar, anunciou recentemente que em Setembro entrará em vigor a uma lei que permitirá aos casais homossexuais casar-se legalmente a partir do início de 2005.

A esta decisão reagiu a hierarquia da Igreja Católica espanhola. O Bispo de Mondoñedo-Ferrol, D. José Gea Escolano, afirmou ver «como uma aberração» que o Governo espanhol pretenda legitimar no próximo ano as uniões de casais homossexuais, lê-se na Agência Ecclesia. Por seu turno, D. Gea Escolano disse que tal iniciativa suporia praticamente a destruição da família e do matrimónio tal e como se entende. Claro que o matrimónio tal como se entende tem sofrido modificações ao longo das últimas décadas resultantes de um princípio da igualdade democrática entre ambos os sexos e independentemente deles. Os senhores bispos, ao que parece, continuam enredados numa concepção de união troglodita que vê apenas como participantes o homem (em primeiro lugar, obviamente), a mulher e Deus numa alegre ménage à trois.

O ministro da Justiça, muito eloquentemente, respondeu às provocações ICARianas dizendo que o Governo expressou à Igreja e ao Papa o seu respeito pelos fiéis, mas também o compromisso do Executivo com uma sociedade plural, «onde existem diferentes atitudes que merecem uma consideração igualitária».

1 de Julho, 2004 Ricardo Alves

Uma vitória para a laicidade

O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos deliberou anteontem que a proibição do uso do véu islâmico não viola nem a liberdade religiosa nem a liberdade de expressão tal como são definidas na Convenção Europeia dos Direitos do Homem. O Tribunal rejeitou assim o recurso de uma estudante turca que fora excluída da Universidade de Istambul por se recusar a tirar o véu islâmico durante aulas e exames.

No comunicado do Tribunal, pode ler-se que «a liberdade de manifestar a religião pode ser restringida a fim de preservar os valores democráticos e os princípios invioláveis da liberdade de religião e da igualdade dos cidadãos perante a lei», que «as escolas podem tomar medidas para prevenir que certos movimentos religiosos fundamentalistas pressionem os estudantes que não praticam a fé da mesma forma e os que não têm a mesma fé», e ainda que «o Tribunal não perdeu de vista que existem movimentos políticos extremistas, na Turquia, que procuram impor a toda a sociedade os seus símbolos religiosos e a sua concepção de sociedade baseada em princípios religiosos». O Tribunal considerou, portanto, que a laicidade e a igualdade entre os sexos são valores que prevalecem sobre a liberdade de expressão e de religião, particularmente quando estão em causa as pressões de grupos extremistas.