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14 de Maio, 2005 jvasco

Judeus ateus

Foi com alguma surpresa que li na wikipedia que, de acordo com vários movimentos judeus modernos, é possível um indivíduo praticar o judaísmo enquanto fé e tradição, sendo no entanto ateu ou agnóstico.

De acordo com a wkipedia, o Reconstrucionismo é um significativo movimento judaico caracterizado por:

-crença que a autonomia pessoal deve ser mais importante que a tradição e leis Judaicas, mas que qualquer acção deve tomar em consideração o consenso geral

-uma atitude positiva face à cultura moderna

-a crença que as formas de estudo tradicionais dos rabis, tal como os métodos académicos modernos e o estudo crítico dos textos, são ambas maneiras válidas de se aprender sobre e através dos textos religiosos judeus.

-um método não-fundamentalista de se ensinar os princípios de fé judaicos, tal como a crença de que os judeus não têm de aceitar todos ou qualquer destes princípios

-a rejeição da crença que os judeus são o povo escolhido, tal como a rejeição dos milagres e do teísmo

No fundo é um movimento baseado na cultura e tradição judaicas, um movimento judeu. Mas não deixa de ser também um movimento ateu.

13 de Maio, 2005 Carlos Esperança

O hipermercado da fé

Há sessenta anos a Virgem viageira poisava nas azinheiras e mandava rezar o terço às criancinhas. Em campanha eleitoral, contra o comunismo e a República, agendou umas sessões de esclarecimento para a Cova da Iria onde reuniu três inocentes pastorinhos.

Disse-lhes que «Nosso Senhor» andava muito zangado e que era preciso rezar muito. Quanto ao mau feitio do referido indivíduo percebe-se hoje melhor o mau humor e apenas se desconhece se continua de trombas ou se já se dá por satisfeito com milhões de terços rezados e com o fim do comunismo.

A Lúcia era a única que via e ouvia a tal Virgem que lhes disse: «eu sou a Nossa Senhora» e, por especial deferência, teve direito a ver o Inferno onde se encontrava o Administrador do Concelho de Ourém que, em vida, não ia à missa. Teve ainda direito a outros mimos como foi o caso da visita de Jesus Cristo que foi a Tuy, de propósito, para a visitar na cela, em rigorosa clandestinidade.

Mas, para que não se pensasse que as crianças eram parvas e se punham a inventar coisas, a Senhora de Fátima, como depois havia de ficar conhecida, mandou o Sol fazer piruetas perante numerosos fregueses atraídos pelas aparições e maravilhados com o espectáculo.

E foi assim, faz hoje 60 anos, que um lugar rústico do concelho de vila Nova de Ourém se tornou no promissor sector terciário, graças ao terço e às peregrinações.

O Papa que mais protegeu o negócio foi o defunto JP2 que hoje, contra as tradições da ICAR, viu o Papa Ratzinger anunciar o requerimento para a promoção a beato. Antes de JP2 só depois de cinco anos decorridos é que se podia meter os papéis.

O negócio está próspero e os milagres vão aumentar. Há grandes investimentos para a promoção do sobrenatural até porque a concorrência de outras seitas mais pequenas e ágeis se adiantaram no ramo. Assim, dentro e breve João Paulo II será vendido como santo, em madeira, bronze, cristal e porcelana, fabricado nas Caldas da Rainha, na Vista Alegre e em numerosas fábricas que vão requerer o alvará de fabrico.

Sexta-feira, 13, é o dia da sorte para os negócios da fé. A RTP, canal de serviço público, desde ontem que tem o tempo de antena adjudicado à ICAR.

13 de Maio, 2005 Palmira Silva

Panteão Católico alargado

O panteão católico terá muito em breve mais um beato, certamente a elevar a santo tão rápido quanto possível. De facto, o Vaticano divulgou hoje que o processo de beatificação de João Paulo II já se iniciou!

13 de Maio, 2005 Ricardo Alves

Debate amanhã, em Évora

Em representação da Associação República e Laicidade, estarei presente amanhã, às 17h30m, num debate, em Évora, sobre o Tratado constitucional da União Europeia. O debate está integrado no Fórum Social Português e intitula-se «Pela Constituição europeia, pelo sim, pelo não».
12 de Maio, 2005 Carlos Esperança

Saudades para Vanessa

Leio e não acredito. Volto a ler. Julgo ter percebido mal e releio. Ainda penso que há gralha, que o jornalista cometeu um lapso e disse o contrário do que queria. Leio uma última vez.

Sinto comoção e raiva. Já vivi muito e sei das baixezas de que os homens são capazes. Estive 26 meses na guerra colonial. Mas, talvez, a estupidez não seja o pior dos males. Pior só a estupidez e a fé reunidas.

Paulo, drogado, saído da prisão de Custóias há quatro meses, desempregado, faz filhos em várias mães no Bairro do Aleixo, bairro de problemas e miséria da cidade do Porto. Uma das filhas chamava-se Vanessa. Tinha cinco anos e a vida para viver. Paulo tê-la-á matado à pancada.

A mãe de Vanessa mandou rezar-lhe missa do 7.º dia na igreja de Lordelo do Ouro, no Porto. Foi o mimo que lhe faltou em vida.

Vou copiar devagar o que li e reli na pg. 90 da «Visão», de hoje. Domingos Oliveira, o padre que celebrou a missa do 7.º dia, por Vanessa, criança de cinco anos, morta à pancada pelo pai, disse na homilia: «matar uma criança no seio materno ainda é mais violento do que matar uma menina de 5 anos» e invectivou a sociedade «que favorece o uso de preservativos».

Há na demência mística do padre Domingos Oliveira uma tal insensibilidade, um tão grave insulto à memória de uma criança mártir, um desrespeito tão grande pela mãe que encomendou a missa e um tamanho ultraje à vida, que estupefaz e arrepia.

Este almocreve de Deus, apóstolo da fé, santa besta fiel ao Papa, padre católico, acha preferível matar uma criança de cinco anos à pancada do que interromper a gravidez de um embrião de cinco semanas.

Maldito seja Deus.

12 de Maio, 2005 Palmira Silva

Defesa Intransigente da Vida

Excertos do Memorando confidencial enviado pelo então cardeal Ratzinger a Theodore McCarrick, arcebispo de Washington, tornado pública em Julho de 2004. Relembrando que nessa época se disputava a Presidência dos Estados Unidos entre Bush, um evangélico anti-aborto e Kerry, um católico pessoalmente contra o aborto mas respeitando a consciência de quem o escolhia e como tal pró escolha, e que, supostamente, o Papa era veementemente contra a guerra no Iraque.

« 2. A Igreja ensina que o aborto e a eutanásia são um pecado grave. A carta evangélica Evangelium vitae, com referência a decisões judiciais ou leis civis que autorizem ou promovam o aborto ou eutanásia, estipula que «existe uma grave e clara obrigação para a sua oposição por objecção de consciência. […] No caso de uma lei intrinsecamente injusta, como uma lei que permita o aborto ou a eutanásia, nunca é lícito, por conseguinte, obedecer a essa lei ou fazer propaganda em favor dessa lei ou votar a seu favor’» (no. 73). Os cristãos têm uma «grave obrigação de consciência de não colaborarem em práticas, mesmo que permitidas pela legislação civil, que são contrárias à lei de Deus. […] Esta colaboração nunca pode ser justificada por invocação do respeito à liberdade de outros ou apelando ao facto que a lei civil o permite ou requer»(no. 74).

3. Nem todas as questões morais têm o mesmo peso que o aborto ou a eutanásia. Por exemplo, se um católico tiver opinião contrária da do Papa na aplicação da pena capital ou na decisão de iniciar uma guerra, ele não deve ser considerado por essa razão indigno de se apresentar para receber a sagrada comunhão. Pode existir uma legítima diversidade de opiniões entre católicos sobre uma guerra e a aplicação da pena de morte mas não em relação ao aborto e eutanásia.»

Ou seja, para Ratzinger os cristãos devem ser contra decisões judiciais e leis que autorizem o aborto e a eutanásia, considerados pecados graves. Aliás é seu dever ser completamente intolerantes com quem não se reger pelo dogma da sacralidade do embrião e com quem reclama o direito a morrer com dignidade.

Nas recomendações de como devem os católicos votar, explica assim que um católico será considerado culpado por cooperar com o mal, e não poderá receber a comunhão, se votar num candidato político que seja a favor da eutanásia e/ou do aborto. Em contrapartida um candidato político que seja (fervorosamente) a favor da pena de morte (afinal inscrita e abundamente prescrita na palavra de Deus revelada, i.e. na Bíblia) ou que decida por uma guerra injusta com centenas de milhares de vidas inocentes como «danos colaterais» deve ser aceitável para qualquer cristão.

Fico sempre muito baralhada com a defesa intransigente da vida advogada pela Igreja Católica…

11 de Maio, 2005 Carlos Esperança

13 de Maio – feira anual

É preciso muita insensibilidade para não sentir dó dos numerosos peregrinos que vão a pé a Fátima. Seguem em bandos pela orla do caminho, atravessam estradas, distraídos, pés inchados, rostos suados, corpos sofridos, em busca do alívio de uma promessa cumprida por um favor implorado ou uma graça recebida.

Acreditam que alguém, algures noutro astro, se importa com vidas tristes e cinzentas. Imploram a protecção da virgem viageira que poisa em azinheiras, fala com pastorinhos e põe o Sol a fazer piruetas. Crêem no Pai, no Filho e no Espírito Santo, confiam em anjos e demónios, em bruxas e maus olhados, na confissão como detergente, nas propriedades nutritivas da eucaristia e na água benta como desinfectante.

Muitos rezam ainda pela conversão da Rússia e pelo fim do comunismo. Pedem a Deus que ilumine os governantes e lhes dê longa vida enquanto outros, mais esclarecidos, os advertem, a estes não, e voltam às contas do rosário a desfiar ave-marias e padre-nossos numa interminável cantilena com que esperam indulgências que os conduzam à vida eterna.

São longos os caminhos e demorada a viagem. Rezam pelo Santo Padre, sem se darem conta de que ele precisaria de muitas orações se acaso estas resultassem ou ele lograsse tornar-se melhor. E voltam ao rosário, às jaculatórias, aos mistérios gozosos, dolorosos ou gloriosos, consoante o dia da semana, e à alienação dos padre-nossos e ave-marias.

São devotos que se revêem no Francisquinho, mais dado à contemplação mística do que à frequência escolar, que rezam à Jacintinha com enorme devoção, que anseiam pela canonização da Lúcia. São crentes, portadores de uma fé cada vez mais anacrónica, que exultam com a procissão das velas e se comovem com a bênção apostólica, que mantêm abertas as igrejas e a próspero o Vaticano.

São estes peregrinos que vão em busca de Deus e se satisfazem com um cardeal, alguns bispos e numerosos padres, julgando-se perto do Céu. São como crianças que vão ao Jardim zoológico e crêem viajar pela selva e embrenhar-se em florestas tropicais.

A fé não move montanhas mas cria montanhas de ilusões.

11 de Maio, 2005 pfontela

Cinema Europeu

A cadeia televisiva RAI (televisão estatal italiana), vai transmitir amanhã o controverso filme de Theo van Gogh intitulado «Submissão». Como o nome indica o filme é altamente crítico do tratamento das mulheres dentro do islão, dado que inclui mulheres semi-nuas com versos do Corão no corpo. Também parece conter uma entrevista com uma mulher islâmica que conta a forma brutal como foi espancada por ter tentado fugir de casa (a razão para a fuga foi a violação de que foi vitima por parte do seu tio).

Theo van Gogh pagou com a vida por ter feito este filme (foi vítima de fanáticos islâmicos), existindo outras personagens holandesas que vivem verdadeiramente como prisioneiras por terem tido a coragem de apontar os abusos do islão. Na sociedade Holandesa considera-se seriamente pela primeira vez a introdução de medidas contra a emigração e a limitação da liberdade religiosa.

Os imãs do conselho islâmico de Turim escreveram a todos os indivíduos de influência em Itália e no Vaticano para tentar proibir a exibição deste filme dando como razão que: «o filme retrata de forma negativa costumes e tradições islâmicas». E acrescentaram, em tom de ameaça, que se o filme fosse exibido «poderia causar fortes tensões que poderiam incitar os mais fanáticos a actos que põem em risco a segurança pública».

Entretanto já houve várias ameaças contra executivos e directores da RAI. Mas nem a RAI nem os políticos italianos parecem querer ceder sendo que todos os partidos apoiam a exibição da obra de van Gogh. Para quem tiver oportunidade: o filme vai para o ar amanhã às 23:00 (hora local).

11 de Maio, 2005 Carlos Esperança

Fátima: Mortos – 1; Milagres – 0

Um homem de 56 anos, oriundo de Vila Nova de Gaia, foi ontem colhido mortalmente próximo de Antanhol, nos arredores de Coimbra, quando se dirigia para a peregrinação anual a Fátima.

A fatídica Estrada Nacional n.º 1, onde ocorreu o infausto acidente, é anualmente palco de mortes e feridos que se deslocam de suas casas atraídos pela propaganda do santuário de Fátima.

Fátima é a miragem da fé, a EN-1 é o cemitério dos crentes.

Os peregrinos saem de diversos locais, todos à mesma distância de Deus, em busca de um destino em que apenas se colocam mais perto dos padres.

Deus não merece o sacrifício de uma vida. Não há milagres que compensem a dor e o luto das famílias que choram os entes queridos, perdidos inutilmente numa curva de um caminho que não conduz a lado algum.

Fonte: «Público Centro», pg. 52, de hoje.