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11 de Fevereiro, 2006 Palmira Silva

A génese e expansão das guerras da religião modernas

Há mais de um ano escrevi que um dos principais sinais históricos que encontramos invariavelmente em épocas de crise é a adesão de pessoas a vertentes (religiosas ou políticas) que se caracterizam por um radicalismo extremo e uma inflacção do sentimento de pertença a um grupo que assuma o papel de protector e detentor da VERDADE ou MORAL absolutas. Um maniqueísmo exacerbado dos nós (os bons) e dos outros (os maus), do Bem contra o Mal.

Hoje os cartagineses são sortidos mas, tal como no século II a.C., há muitos emuladores de Marco Pórcio Catão, censores moralistas que zelam pela moral e bons costumes respectivos e pela punição dos que consideram ideólogos do mal. Tal como Catão, o objectivo dos pregadores é exponenciar o ódio das populações contra esses supostos ideólogos do mal, transformando-o num sentimento nacionalista/de grupo que deixe em segundo plano os problemas sociais, políticos e outros que assolam as respectivas sociedades, prometendo muitas vezes que a eliminação desses ideólogos do mal será simultaneamente a resolução desses problemas.

Não subscrevo a tese do choque civilizacional de Samuel Huntington (que previa há uma década que este seria inevitável no pós guerra fria), mas acho que de facto o maniqueísmo ou lógica bipolar existente antes da queda do muro era um elemento aglutinador que prevenia a eclosão dos conflitos regionais a que agora assistimos e o ressurgimento dos fundamentalismos religiosos, a praga anacrónica do século XXI. Com a população mundial desiludida da política, nos locais onde a tensão social é mais aguda assistimos à substituição dos memes ideológicos pelo memeplexo da religião. Assim, temos assistido nos últimos tempos à eclosão de conflitos religiosos um pouco por todo o Globo, sem nada a ver com o suposto conflito de civilizações, mas em que os intervenientes recorrem ao termo teológico cunhado por Agostinho, o de guerra justa, isto é, aquela que obedece a um desígnio divino ou vinga injúrias (à religião, claro).

O século XXI tem sido assim o século das «guerras justas» religiosas que varrem toda a Terra, algumas das quais para que já alertámos no Diário Ateísta, por exemplo na Tailândia, mais concretamente no sul da Tailândia, Nigéria, Indonésia, na Rússia entre várias religiões, na Tchetchénia e no Afeganistão. E não esqueçamos ainda que também G. W. Bush afirmou estar a cumprir uma missão «divina» quando decidiu invadir o Afeganistão e o Iraque. Assim como foi o reacender dos conflitos religiosos nos Balcãs entre bósnios muçulmanos, sérvios ortodoxos e croatas católicos o rastilho da sangrenta guerra que resultou no desmembrar da Jugoslávia.

Mais recentemente, nas Filipinas, um país em que a esmagadora maioria da população é católica, um massacre de cristãos por um grupo de fundamentalistas muçulmanos foi considerado «um duro golpe para a esperança de paz», especialmente na zona de actuação da Moro Islamic Liberation Front, já que agora «qualquer incidente pode despoletar uma guerra de religiões».

Há menos de uma semana terroristas que se pensa pertencerem ao grupo extremista Abu Sayyaf (Portadores da Espada) assaltaram uma quinta em Patikul, assassinando seis cristãos, incluindo uma bébé de 9 meses. De acordo com um dos sobreviventes os assassinos perguntaram às vítimas qual era a sua religião antes de abrir fogo sobre eles.

Também em Caxemira, alvo de acesas disputas entre a Índia e o Paquistão, o conflito de poder se está a transformar num conflito de religiões. Uma manifestação de muçulmanos enfurecidos pelo que afirmaram ser uma profanação do Corão pelos budistas locais resultou em dez feridos, incluindo cinco polícias, e danos materiais. Os manifestantes, que incendiaram várias casas e carros, exprimiam a sua revolta pelo aparecimento nas ruas de Leh, na região de Ladakh de maioria budista, de várias páginas rasgadas do Corão.

Muitos dos nossos leitores crentes afirmam que as religiões não são culpadas do aproveitamento que delas se faz para justificar a «justeza» de violência sortida. Para mim isso só seria verdade se os responsáveis religiosos deixassem claro aos seus seguidores que a religião é algo do domínio privado que não deve ser misturado com a res (coisa) pública. Se advogassem a estrita separação do Estado/política e da religião. Infelizmente não é isso que acontece em alguma das religiões dominantes, aliás verifica-se exactamente o oposto. Todas elas identificam a laicidade e/ou o «relativismo» concumitante com a ideologia do mal, responsáveis pelos problemas do mundo ou das respectivas sociedades e advogam que estes só podem ser resolvidos com uma estrita adesão aos respectivos ditames. Com os resultados que conhecemos…

10 de Fevereiro, 2006 Ricardo Alves

Por um punhado de cartunes: aproveitamentos e hipocrisias

É óbvio que a crise dos cartunes tem sido aproveitada por partes interessadas. No entanto, não se tem frisado suficientemente que a crise convém a dois lados, só conjunturalmente opostos: aos xenófobos da Dinamarca e de alhures na Europa (a «nossa» extrema-direita) e aos fascistas islâmicos do Médio Oriente e vizinhanças (a extrema-direita «deles»). A primeira gostaria que os imigrantes (principalmente muçulmanos na Dinamarca, na França ou no Reino Unido) partissem, e deleita-se com a imagem de intolerância e violência que alguns muçulmanos estão (voluntariamente) a dar de si próprios; a segunda sonha com o califado mundial após a queda dos regimes não islamistas e «pró-americanos» da região, e deleita-se por apresentar os europeus como tolerantes com a blasfémia (o que é verdade) e xenófobos (o que depende dos casos).

Permanecem como alguns dos sinais mais visíveis da instrumentalização desta crise os ataques a embaixadas na Síria e no Líbano (em ambos os casos, aparentemente orquestrados por alguém em Damasco) e em Teerão. Outro sinal serão os célebres três cartunes que não fizeram parte dos doze publicados pelo Jylllands-Posten, cuja origem permanece incerta (eu apostaria na extrema-direita europeia…) e que foram divulgados por imãs apostados na exacerbação da polémica. A crise serve também aos promotores da teoria e prática da «guerra de civilizações» enquanto polarização entre cristãos e muçulmanos, entre os quais se contam Bin Laden e Samuel Huntington. (Como já escrevi, a polarização real é entre laicidade e clericalismo, liberdade de expressão e delito de blasfémia.)

Neste cenário, há hipocrisia a rodos dos dois lados. À esquerda, há quem tenha satirizado o cristianismo no passado e tenha agora descoberto pruridos em ridicularizar o Islão; e à direita, há quem seja incapaz de criticar o catolicismo e tenha descoberto subitamente o totalitarismo da religião… islâmica. Evidentemente, existe também quem critique essas duas religiões e as mais que nos aborrecerem, e é do lado desses que eu estou.

A situação tem o aspecto irritante (que para mim é habitual…) de nos quererem enfiar numa dicotomia em que não encaixamos. Mas, como ateus e anticlericais, há que repetir que as multidões de muçulmanos em fúria instigadas por imãs são a imagem perfeita do rebanho acrítico e obediente que tanta religião produz e que tanto temos denunciado. E que a ideia de que as nossas comunidades políticas devem ser «clubes cristãos» é um objectivo (que não pode avançar um milímetro) do clericalismo índigena.

Aos muçulmanos, este é o momento de lhes recomendar calma, sentido de humor e, sobretudo, capacidade de encaixe. E já agora, seria conveniente que se distanciassem dos extremistas que se apoiam no Islão (se não for demasiadamente incómodo…). Aos que subitamente se interessaram pela liberdade de expressão, gostaria de perguntar, ingenuamente, se alinhariam na eliminação da alínea b do artigo 252 do Código Penal? (Só para saber quão longe vai o apego ao direito à blasfémia…)
9 de Fevereiro, 2006 Palmira Silva

Guerra dos cartoons explicada

Desde que se acendeu a guerra dos cartoons que achei curioso o facto de os cartoons da discórdia terem sido publicados no Jyllands-Posten em Setembro, republicados pelo jornal egípcio Al Fager em Outubro, sem grandes manifestações de ofensa até há poucos dias. Esta guerra «atrasada», tal como há uns dias o editor-chefe do referido jornal, Adel Hammouda, referia, surpreendeu-me. E tal como ele achei que subjacente a esta guerra pseudo-religiosa estavam motivos políticos e que a pretensa ofensa que constituiam as inócuas caricaturas era apenas um pretexto que escondia uma motivação sem nada de religioso na origem.

Hoje, o New York Times confirma as minhas suspeitas, descrevendo a génese da indignação «espontânea» que tem varrido violentamente o globo.

A guerra das caricaturas foi orquestrada em Dezembro último quando os líderes das 57 nações muçulmanas, incluindo o presidente do Irão, Mahmoud Ahmadinejad, se reuniram em Meca. De facto, a Organização da Conferência Islâmica (OIC) ou mais concretamente os governos que dela fazem parte viram no irrelevante incidente uma forma de «abafar» os protestos políticos dentro dos próprios países, que não são exactamente modelos de democracia e respeito dos direitos humanos, vindos não só de alas mais liberais das respectivas sociedades como de movimentos islâmicos. Assim, a questão dos cartoons foi acesa por estes governos, especialmente os governos do Irão e da Síria, com uma bombardeamento massivo das populações pelos media locais (estritamente controlados pelo estado) que culminaram nas demonstrações «espontãneas» de «indignação» (e em embaixadas em chamas e igrejas atacadas). Suponho aliás ser a primeira vez em muitos anos que os sírios são permitidos manifestar-se por algo…

Como afirmou Muhammad el-Sayed Said, o director do Centro Ahram de Estudos Políticos e Estratégicos no Cairo «Era algo menor até à conferência islâmica e a OIC ter tomado posição contra».

Sari Hanafi, professor associado na Universidade Americana de Beirute, considera que foi uma oportunidade usada pelos governos árabes para eliminar o atractivo que o conceito de democracia constitui para as respectivas populações, um papão que agitaram avisando que a democracia e as liberdades do Ocidente correspondem a desrespeito ao Islão.

Claro que foi igualmente importante o papel de desinformação, ou antes, de mentira deliberada de Ahmed Akkari, o libanês naturalizado dinamarquês que «produziu» 3 cartoons «extra», estes sim francamente ofensivos, e que convenceu alguns jornalistas egpícios que uma proposta de um partido de extrema direita para banir o Corão devido às suas passagens incitando à violência era mais que um delírio de um partido assumidamente anti-imigração e anti União Europeia (o Dansk Folkeparti ou Danish People’s Party obteve 13% dos votos nas eleições de 2005, uma votação não despicienda mas obviamente não representando a maioria dos dinamarqueses, que pretende que a Dinamarca saia da União Europeia).

Mas o pretexto oferecido pelo empenhado muçulmano «caiu do céu» para os governantes reunidos em Meca conseguirem travar os impulsos democráticos inspirados no Ocidente que ameaçavam os respectivos regimes (muitos dos quais ditaduras). Certamente que se não tivessem sido publicadas as ditas caricaturas veríamos, o mundo árabe certamente, mas eventualmente todo o mundo muçulmano inflamado contra uma qualquer liberdade «licenciosa» ocidental…

9 de Fevereiro, 2006 Ricardo Alves

Por um punhado de cartunes: laicidade e clericalismo

Aconteceu-me um dia, já não sei a propósito de quê, falar do meu ateísmo a um muçulmano com quem estava sentado à mesa. O meu comensal rapidamente me informou, com veemência, de que eu não podia dizer o que pensava. Ainda me recordo de como fiquei atónito.

Serve isto, hoje, para sublinhar que ceder na expressão do que pensamos pode começar na censura de caricaturas de Maomé, mas no limite leva a que eu não possa dizer que sou ateu. Como é evidente, não me podem impedir de pensá-lo no mais inalienável dos meus espaços de liberdade: os 1100 ou 1200 centímetros cúbicos da minha caixa craniana. Mas qualquer ateu que não esconda o que pensa é uma ofensa ambulante para os islamistas.

A polémica actual foi originada por caricaturas que poderiam ser mais pertinentes (é pena que se limitem à violência terrorista de indubitável inspiração maometana, e não foquem as mutilações sexuais efectuadas a coberto de algumas tradições islâmicas, ou a opressão das mulheres justificada pelo Corão) e que foram publicadas num jornal tão «religiosamente correcto» que nem se atrevera a publicar cartunes anti-cristãos. No entanto, a polémica pôs a nu o fanatismo e o totalitarismo de alguns muçulmanos extremistas que desejam condicionar a liberdade de expressão (e o decorrente direito à blasfémia) de países em que não vivem e que talvez nem saibam situar no mapa. E desencadeou um debate sobre os limites da liberdade de expressão, no qual felizmente quase todos concordamos que o único limite consensual será a difamação, que se determina nos tribunais (embora existam bons argumentos a favor da ilegalização do incitamento à violência). Os que não concordam têm estado silenciosos, mas mais tarde ou mais cedo tentarão aproveitar a cobardia de alguns governos (incluindo o nosso) que não fizeram o que se requeria: afirmar que os cidadãos são livres de dizer disparates e de se insultarem uns aos outros, por muito gratuitas que algumas provocações pareçam, desde que assumam a responsabilidade pelo que fazem.

No Diário Ateísta, já levamos mais de dois anos em que temos blasfemado todas as semanas, senão mesmo todos os dias. Sempre o fizemos conscientes da distinção entre ridicularizar ideias e pessoas. As últimas merecem-nos respeito, entre as primeiras há as erradas (o criacionismo ou a ressurreição) e as liberticidas (a autoridade do clero em matérias políticas ou éticas, por exemplo). As reacções ao que escrevemos, pelo contrário, já passaram por insultos e ameaças, geralmente com aquela «coragem» que o anonimato confere (pela nossa parte, assinamos tudo o que escrevemos).

Acompanhámos cuidadamente, no Diário Ateísta, a lei sobre o «incitamento ao ódio religioso» no Reino Unido (a propósito: foi aprovada, com alterações, a semana passada). Demos conta do caso do livro que conta a vida de «Jesus Cristo» em banda desenhada, que foi proibido na Grécia (o autor chegou a ser condenado a uma pena de prisão). Noticiamos muitos outros casos de blasfémia. No entanto, nunca houve tanta agitação por um caso de blasfémia. Nem quando Hashem Aghajari foi condenado à morte no Irão, nem quando Younus Shaik esteve preso no Paquistão, nem quando um director de uma revista afegã foi preso. A presente crise internacional, que se deve a um punhado de cartunes, só é possível porque muitos muçulmanos ainda não compreenderam que a religião não pode ser critério englobante da vida social, e portanto tentam condicionar até sociedades em que os muçulmanos são uma pequena minoria. Se os muçulmanos se reduzissem a tentar limitar a liberdade de expressão nos países em que se crêem maioritários (como fazem os católicos, quase tão totalitários como os muçulmanos) não haveria escândalo. O total totalitarismo (passe o pleonasmo) e a violência, tornaram o Islão o maior problema internacional da actualidade.
9 de Fevereiro, 2006 Carlos Esperança

Fé e hipocrisia

Caricaturas de Maomé

O Islão não é a apenas a mais estúpida das religiões, consegue ser também a mais hipócrita.

A horda histérica que ulula contra a liberdade, que se prostra de joelhos cinco vezes ao dia e que jejua em público e come em privado, encontra-se possessa de Maomé, dependente da rede beata dos ayatollahs e mullahs e capaz de todas as ignomínias.

Acontece que as «caricaturas da ira» que os beatos cristãos acharam de mau gosto e, na sua vocação censória, entenderam que não deviam ter sido publicadas, já o tinham sido em outubro de 2005 no jornal egípcio Al Fagr, durante o ramadão.

Um blogger egípcio, «Sandmonkey» livre-pensador, lembrou-se do facto e resolveu denunciá-lo, afirmando que os manifestantes « provaram novamente que o mundo árabe é atrasado mental e não merece nada melhor que os líderes que têm».

O Jornal Globo Online, por sua vez acaba de anunciar o facto.

9 de Fevereiro, 2006 Carlos Esperança

Cristo e Maomé

Naquele tempo o anjo Gabriel era o alcoviteiro de serviço. Foi ele que disse a Maria que estava grávida o que qualquer mulher teria percebido. Foi ele também que, seis séculos depois, se encontrou com Maomé para lhe dizer qual era a sua ? dele, Maomé -, missão.

Os anjos viviam muito tempo embora poucos conhecessem notoriedade, levando uma existência discreta e anódina. Gabriel distinguiu-se. Fora criado por judeus, que faziam anjos como o Papa JP2 faria santos, que acreditavam em milagres com a mesma fé com que alguns padres rurais acreditaram na existência de Deus.

Maomé nasceu em Meca durante o ano de 571 e viria a morrer em Medina em 632. O Corão e as agências de turismo fizeram santas as duas cidades e há períodos do ano em que uma chusma de fanáticos aí acorre, apesar dos perigos que os espreitam.

Muito parecidas com as largadas de touros, um espectáculo ainda em uso no concelho do Sabugal e noutras localidades portuguesas, as peregrinações têm perigos idênticos. O apedrejamento ao Diabo, um ódio transmitido de geração em geração, salda-se sempre por várias mortes enquanto o Diabo fica incólume, à espera do próximo apedrejamento.

Maomé teve uma vida pouco recomendável, um casamento com uma menina de nove anos, coisa que a Igreja católica também não via com maus olhos, e um casamento com a rica viúva Cadija cuja fortuna lhe permitiu dedicar-se à guerra, à religião e ao plágio do cristianismo.

Depois aconteceu-lhe o mesmo que a Cristo. Começou a ser adorado, correu o boato de que tinha nascido circuncidado, de que tinha ouvido Deus, de que foi para o Paraíso em corpo e alma, enfim, aquele conjunto de coisas idiotas que se dizem dos profetas.

Hoje já ninguém pergunta se tomavam banho, se sofreram prisão de ventre ou foram vítimas das salmonelas, se urinavam virados para Meca ou para o Vaticano, que hábitos sexuais ou manifestações de lascívia tinham.

Cristo e Maomé tornaram-se cadáveres adorados e os incréus cadáveres desejados.

9 de Fevereiro, 2006 lrodrigues

A Opção

A gerência do «Carrefour» decidiu colocar este aviso no seu hipermercado do Cairo:


«Caros Clientes:
Expressamos a nossa solidariedade com a comunidade egípcia e islâmica.
O Carrefour não vende produtos dinamarqueses».

Como é óbvio, a gerência dos hipermercados Carrefour é perfeitamente livre de fazer as opções e as escolhas que muito bem entender: comerciais e ideológicas.

E eu também:
A partir de hoje nunca mais na minha vida entrarei num hipermercado Carrefour.

(Publicado simultaneamente no «Random Precision»)

9 de Fevereiro, 2006 Palmira Silva

Uma religião de paz?

No que as autoridades paquistanesas pensam ser um ataque perpetrado por um bombista suicida morreram pelo menos 8 crentes shiitas (números não oficiais) que celebravam o festival de Ashura na cidade Hangu no norte do Paquistão. De acordo com algumas testemunhas, a multidão que recordava a morte do neto de Maomé, o imam Hussein, na batalha de Karbala (o evento que vincou a separação entre shiitas e sunitas) foi ainda alvo de atiradores desconhecidos.

De igual forma no Iraque as autoridades seguem medidas estritas de segurança para evitar ataques de sunitas aos shiitas que celebram a Ashura. O ano passado e há dois anos morreram, respectivamente, 55 e 170 shiitas numa série de ataques coordenados. Cerca de 10 000 agentes de segurança concentram-se em Karbala, o local onde Hussein foi morto pelos seguidores de Abu Bakr, o sogro de Maomé via a sua jovem (Maomé casou com esta quando ela tinha 6 anos e o profeta 54) mulher Aisha.

Em relação à «guerra dos cartoons», gostaria de recordar que os shiitas não têm a objecção dos sunitas em relação à retratação da figura humana, sendo abundantes as representações quer de Hussein quer do seu pai Ali, o marido da filha de Maomé, Fátima.

Assim não se percebe muito bem a reacção violenta do Irão em relação às caricaturas ou talvez se perceba se considerarmos que ontem em Teerão a embaixada inglesa foi atacada sob o pretexto das caricaturas, que não foram reproduzidas na imprensa britânica, na realidade pela oposição de Londres ao armamento nuclear por parte do Irão. Como dizia um dos manifestantes iranianos ontem «Estamos aqui para protestar o papel de Inglaterra em nos mandar para o Conselho de Segurança das Nações Unidas. Nós temos de defender o nosso direito a tecnologia nuclear».

Entretanto em Kano, um dos estados da Nigéria que adoptou a Sharia em 2000 e onde se verifica um programa agressivo para forçar a lei islâmica (wahhabita) em todos os habitantes, a maioria dos quais é Sufi Qadiriyyai, as bandeiras dinamarquesa e norueguesa foram queimadas com pompa e circunstância no Parlamento local.

O «moderado» sheikh Yousef Al-Qaradhawi, presidente do Conselho Europeu para a Fatwa e Investigação, presidente ainda da Associação Internacional de Estudos Islâmicos (IAMS), e o guia espiritual de muitas organizações islâmicas (incluindo a Irmandade do Islão) exortou os fiéis a demonstrarem ao mundo a sua raiva pela publicação dos cartoons de Maomé. O sermão foi transmitido pela televisão do Qatar em 3 de Fevereiro, um pouco antes dos ataques às embaixadas dinamarquesa e norueguesa em vários locais do mundo islâmico… (excertos do sermão aqui).

O «moderado» sheikh exige ainda que a ONU passe uma resolução que proteja de qualquer crítica ou menção não só os profetas e lugares sagrados do Islão mas também os «mensageiros de Alá». Dado a profusão de sectos (e as guerras sangrentas entre estes) dentro do Islão, pergunto-me quem decide quem devem ser considerados mensageiros de Alá… Serão todos os que assim se auto-proclamam? Como não assisti a manifestações comparáveis de repúdio por parte dos muçulmanos à associação de violência ao Islão, bem pelo contrário, pelos ataques terroristas perpetrados em «nome de Alá» será que Osama bin Laden e afins devem ser assim considerados? Significa isso que este muçulmano «moderado» pretende dar carta branca a todos os fanáticos em nome de Alá?

8 de Fevereiro, 2006 jvasco

Comunicado da ARL

Recebi (por correio electrónico) o seguinte comunicado de imprensa da direcção da ARL (que responde às declarações do Ministro dos negócios estrangeiros):

1. A Associação República e Laicidade considera que o único dever das autoridades de um Estado laico e democrático na actual «polémica dos cartunes» é reafirmar o direito inalienável dos cidadãos ao exercício da liberdade de expressão, o qual inclui o direito à blasfémia. A Associação República e Laicidade não pode, portanto, deixar de lamentar e repudiar o comunicado do Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros datado de 7 de Fevereiro de 2006.

2. Contrariamente ao que sustenta aquele documento oficial, a presente crispação internacional não evidencia uma «guerra de religiões», mas sim o confronto entre laicidade e clericalismo. A liberdade de expressão, constitucionalmente garantida, é um direito fundamental que tem valor exactamente na medida em que não conhece excepções. Um alegado «dever de respeito» pelos «símbolos e figuras» religiosos não pode ser constituido em limite à liberdade de expressão, sob pena de destruir o debate livre e aberto que caracteriza as sociedades democráticas.

3. A Associação República e Laicidade – embora respeitando a legitimidade das crenças religiosas pessoais – considera também que quem exerce o cargo de Ministro do Governo da República Portuguesa não deve aduzir dogmas de fé (nomeadamente, a existência de um «profeta Abraão») como justificação de tomadas de posição políticas.

A bem da República.

Lisboa, 8 de Fevereiro de 2006

Luís Mateus ( presidente )
Ricardo Alves (secretário)

Novamente, verifico que estou completamente de acordo com a posição tomada pela ARL.