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6 de Fevereiro, 2015 Carlos Esperança

A FRASE

«Exige a punição referida no Alcorão para os opressores corruptos que combatem Alá e o seu profeta: morte, crucificação ou corte de membros».

(Hhmed Al-Tayeb, principal autoridade muçulmana sunita sobre a morte do piloto jordano, in DN, ontem, pág. 8)

5 de Fevereiro, 2015 José Moreira

Da blasfémia

O insuspeito “Jornal de Notícias”publica, hoje, nas suas páginas, um interessante artigo de Francisco Teixeira, professor de filosofia, sob o título “Em Defesa da Blasfémia“. Permito-me transcrevê-lo, com a devida vénia e sem comentários.

 

“A questão da blasfémia é mais central do que pode parecer. Poder blasfemar e isso ser legal é assumir que os limites do real, aquilo que é divino e não pode ser tocado, afinal podem ser empurrados para trás e desse modo permitir ampliar os limites do que é ser humano. Temos, então, se queremos que o humano seja mais que uma cristalização logo no início, que nos define e definiu para todo o sempre, de insultar os deuses, as religiões e a sua pretensão de definição totalitária e absoluta. E sim senhor, a coisa não vai lá com proposições bem-educadas e trocas argumentativas de tipo académico. Sem uma ampla iconoclastia as religiões definem-nos para todo o sempre e não passaremos, para todo o sempre, de anjos de cera, a amarelecer no altar.

Basta uma relativamente simples análise histórica para perceber que a liberdade sempre se fez no confronto com o religioso, o divino e as igrejas. Foi esse confronto, ganho, pelo menos desde 1789, pelos democratas e liberais, que permitiu que as igrejas deixassem de ser a medida das consciências individuais e da própria ideia de religioso. Bem entendido, não há pensamento sem mediação e algum tipo de relação comunitária sempre terá que existir para que se possa pensar. Mas o fim do comunitarismo religioso obrigatório foi, é, uma condição necessária da liberdade. Se eu não puder imaginar outro Mundo, sem constrangimentos dogmáticos, nada é possível a que ainda se possa chamar humano.Se a blasfémia é dolorosa e tensa? Sim, claro que é. Porque a democracia é, por natureza, agónica e, portanto, tensional. Uma democracia de eterna primavera, sempre de céu azul e sem espirros ou constipações não é mais que uma democracia dietética, um fascismo suave, uma república do respeitinho e da higienização.

Precisamos, pois, de produtos com sal a mais, gordura a mais, sabores intensos e poderosos, paixões assolapadas e perdidas, que destranquem o humano e o real das naturalizações divinas e sacramentais.

Que, porém, seja o Papa Francisco a defender a proibição, e até a violência, contra a blasfémia, não nos deve surpreender. Francisco é um dos papas socialmente mais progressistas da ICAR, aprofundando vertiginosamente a doutrina social da Igreja. Mas nem Francisco é capaz de romper com dois mil anos de intolerância e medo da liberdade. Se todos são assim e pensam assim, na ICAR? Claro que não. Por isso mesmo é que a ICAR ainda é uma religião e não apenas uma máquina de obediência.

PROFESSOR DE FILOSOFIA”

29 de Janeiro, 2015 Carlos Esperança

Carta de um leitor

De

Frei Bento

Caríssimo irmão em Cristo e estimado Carlos Esperança. confesso, aliás eu confesso muitas vezes, confesso e confesso-me, neste caso apenas confesso que me sinto algo envergonhado quando lhe solicito a publicação das minhas indigentes epístolas (a humildade é coisa linda, e eu orgulho-me muito de ser humilde). Tanto mais que elas vão, sempre, de encontro às suas profundas convicções. De qualquer modo, estou a adaptar-me ao blogue e, come deverá ter reparado, até já nem escrevo palavrões, que deixo para quando o filho da, quer dizer, o sacristão se engana nos paramentos, nos preliminares da missa. Porque a missa também tem preliminares, não é só… Bom, aduiante.

Deparei, deslumbrado e espavorido, com esta notícia.Deslumbrado,, porque porque esta gajada não pára de descobrir coisas, Deus seja louvado; espavorido, porque  esta gajada cientista são uma cambada de ateus, que o Inferno os leve a todos, estão a dominar tudo, até a Ciência. Repare, querido irmão, que eles tenham visto os planetas, vá que não vá, que a madre superiora diz que, às vezes, até vê as estrelas, mas isso é outra mística… Agora, terem o desplante e a petulância de afirmar que esses planetas gravitam  em volta de uma estrele MAIS ANTIGA QUE O SOL…! Mas esta gente é doida, ou anda a fazer de nós estúpidos? Então, esses filhos da, quer dizer, esses senhores nunca leram a Bíblia? Não sabem que foi TUDO feito no mesmo dia, logo ali no quarto dia? Ou seja, é tudo da mesma idade, dez mil anos, mais centímetro menos tonelada? É quese como dizer que oe gémeos têm idades diferentes. E têm a lata de publicar isso, como se fosse a coisa mais natural do mundo…
Olhe, irmão, veja lá se publica mais este desabafo, sempre quero ver quem vai ser o primeiro a comentar. Eu não o recomendo nas minhas orações, porque não quero correr riscos. Tenho recomendado um comentador, não digo o nome para lhe preservar a privacidade, e o rapaz está cada vez mais besta…
Saúde e merda, que Deus não pode dar tudo.
27 de Janeiro, 2015 Carlos Esperança

Há 70 anos

300px-Auschwitz-Birkenau

Na rede de campos de concentração do sul da Polónia, onde o Terceiro Reich fez da morte uma indústria, do antissemitismo religião, e da crueldade o apogeu da demência, a libertação dos que sobraram, judeus, ciganos, homossexuais e deficientes, aconteceu há 70 anos em Auschwitz-Birkenau, com a chegada do exército soviético.

Esquecer esse dia é ser cúmplice da mais atroz das ideologias, do mais bárbaro racismo e da maior alienação coletiva. Calar aos filhos e netos o horror dos que aí morreram nas câmaras de gás, é colaborar na repetição a que a loucura dos homens pode conduzir.

O clero católico e protestante facilitaram ao Terceiro Reich os arquivos de batismo o que tornou mais fácil a identificação dos judeus. Pio XII tem sido denominado o Papa de Hitler. Vai ser canonizado.

27 de Janeiro, 2015 Carlos Esperança

O antissemitismo cristão

Surpreende o vigor com que o cristianismo e, em particular, o catolicismo nega quase vinte séculos de antissemitismo militante, hoje menos virulento do que o islâmico.

Martinho Lutero que conhecia a Bíblia tão profundamente quanto a corrupção papal, dizia dos judeus: «são para nós um pesado fardo, a calamidade do nosso ser; são uma praga no meio das nossas terras». (1543)

Quanto à ICAR não é preciso recordar o tribunal do Santo Ofício, basta relembrar as declarações papais ou citar as abundantes e descabeladas manifestações de ódio que o Novo Testamento destila.

Eloquente, chocante e demente foi a atitude do cardeal da Alemanha, Bertram, ao saber da morte do seu idolatrado führer Adolfo Hitler. Já nos primeiros dias de maio de 1945, com a derrota consumada (a rendição foi no dia 8), ordenou que em todas as igrejas da sua arquidiocese fosse rezado um requiem especial, nomeadamente «uma missa solene de requiem, em lembrança do Führer». Entretanto o católico Salazar decretou três dias de luto pelo facínora.

Para alguns católicos e, sobretudo, para ateus, agnósticos e fregueses de outras religiões, é preciso dizer-lhes que, de acordo com a liturgia do requiem, uma missa solene de requiem se destina a que os devotos possam suplicar a Deus, Todo-Poderoso, a admissão no Paraíso do bem-aventurado em lembrança de quem a missa é celebrada.

Os quatro Evangelhos (Marcos, Lucas, Mateus e João) e os Atos dos Apóstolos são uma fonte de ódio antijudaico cristão, tal como o Corão para os muçulmanos. Felizmente, os cristãos, sobretudo os católicos, leem pouco a Bíblia e creem vagamente no conteúdo.

Em períodos de crise, há o risco de se agarrarem ao livro sagrado como os alcoólicos à bebida e, tal como estes, sem discernimento ou força anímica para renunciarem à droga, inibem-se pela habituação e dependência que os escraviza.

O livre-pensamento é uma tentativa séria para promover uma cura de desintoxicação, absolutamente necessária nesta Europa onde o antissemitismo desponta em numerosas manifestações de matriz nazi.

25 de Janeiro, 2015 Carlos Esperança

A laicidade traída e o parasitismo pio

Luxemburgo vai reduzir apoio às confissões religiosas

O Primeiro Ministro do Luxemburgo, Xavier Bettel, assinou um novo acordo financeiro com os representantes das confissões religiosas no país.

Segundo informações difundidas no passado dia 20 pelo jornal on line “Contacto”, o Governo do Luxemburgo anunciou que vai cortar de dois terços o financiamento às confissões religiosas reconhecidas pelo Grão-Ducado.

Em 2014, o Estado deu 24.660 milhões de euros às religiões. Com os cortes agora anunciados, a verba deverá ser reduzida em dois terços, ou seja, 8.375 milhões de euros anuais.

19 de Janeiro, 2015 Carlos Esperança

A FRASE

«Acho que numa sociedade livre existe o direito de ser ofensivo com a religião dos outros».

(David Cameron, PM do Reino Unido, a manifestar discordância com o Papa)
Fonte: DN, hoje, pág. 8)

16 de Janeiro, 2015 Carlos Esperança

Sim, mas… ou a cobardia e a dissimulação

Perdoo menos aos que me são próximos do que aos de que me distancio. Compreendo as reservas do patriarca de Lisboa, do Papa ou mesmo do intelectual Boaventura Sousa Santos. Aceito a convicção do primeiro a defender o direito à vida, mas… a considerar irrecusável «a liberdade e a responsabilidade de expressão e o direito a ser considerado naquilo que são as convicções e na expressão das ideias», numa forma dissimulada de limitar a liberdade de expressão, quando ninguém o obriga a ler um jornal satírico ou a assistir a um filme iconoclasta. Lembro-lhe que Pio IX excomungou comunistas, ateus, livres-pensadores, democratas e liberais. Pensará a ICAR levantar-lhes a excomunhão?

A liberdade não nasceu nas sacristias mas contra elas. O direito à blasfémia custou vidas e provocou tormentos inauditos. O medo do Inferno embruteceu gerações e as religiões, incluindo o cristianismo, crucificaram a liberdade. Em democracia não se provocam os crentes nos seus espaços, mas nenhuma religião tem o direito de banir a negação, crítica ou sátira do seu deus, através da imagem ou da palavra, fora do adro dos seus templos.

O papa, que hesita entre a modernidade que os dois antecessores recusaram e a tradição que mantém o negócio, acaba por dar razão aos terroristas, talvez lembrado da tradição da sua Igreja, ao afirmar que «Não se pode insultar a fé dos outros». E o ateísmo, pode?

Em Boaventura Sousa Santos, com a inteligência que se lhe reconhece, é bem patente aquela esquerda que saiu das madraças católicas onde se ensinava a catequese da nossa infância, minha e dele. Tem uma visão social progressista e uma leitura inquisitorial do livre-pensamento.

A quem não perdoo é à eurodeputada do PS, Ana Gomes, cuja estima, ganha em Timor, se esvaziou na náusea, pela pusilanimidade das suas posições em relação à liberdade de expressão. A cobardia atinge o asco quando pergunta: «Porquê insistir na representação do profeta, que se sabe ofender os muçulmanos? Não estou de acordo». Prefere que os sevandijas matem mais cartunistas?

É desta cobardia, denominada bom senso, que se fazem as vitórias dos que nos querem de joelhos, mãos postas e prostrados perante um ser imaginário. E sempre, e só, o deles.

Ontem todos eram Charlie, hoje são mais as deserções do que as adesões sem «mas».

ICAR = Igreja Católica Apostólica Romana.

15 de Janeiro, 2015 David Ferreira

O fanático multicultural

 in jornal Público

” Como sempre acontece com atentados terroristas, é só esperar que os corpos arrefeçam para os comentários idiotas e autoculpabilizantes começarem a aparecer. A estrutura repete-se: há uma primeira frase pesarosa, a dizer que aquilo não se faz, e logo de seguida vem um “mas”, um “contudo”, um “no entanto”. Foi assim no 11 de Setembro; não poderia deixar de ser assim com o massacre do Charlie Hebdo.

Com esta diferença: em 2001 o Twitter ainda não tinha sido inventado, e em 2015 ele é terreno fértil para espantosas concentrações de idiotice em 140 caracteres. Ana Gomes tem-se destacado nesse campo. Começou logo a 7 de Janeiro, com uma ligação entre o terrorismo e a austeridade, e continuou com a nova capa do Charlie Hebdo: “Porquê insistir na representação do profeta, que se sabe ofender os muçulmanos? Não estou de acordo. Não em meu nome.” É certo que poderíamos fazer um desenho a explicar o porquê de “insistir na representação do profeta”, mas não vale a pena. Até porque Ana Gomes é o mais próximo que temos de um Charlie Hebdo português: o que lhe sai da boca é exagerado e muitas vezes não faz qualquer sentido, mas é corajosa e dá cor e diversidade à nossa democracia. Há que valorizar isso.

De um campeonato muito diferente são os textos de Boaventura Sousa Santos, o Noam Chomsky do Mondego. Alegadamente, ele pensa, produz obra e tem uma vasta corte de seguidores. Ontem, decidiu dar à estampa um texto no PÚBLICO intitulado Charlie Hebdo: uma reflexão difícil – e ponham difícil nisso. Para Boaventura, o mundo ocidental é uma acumulação de miseráveis defeitos, a sua decadência passeia-se pelas ruas e a Terceira Guerra Mundial está à porta, por sua inteira culpa. Fixe, fixe, é viver na Venezuela e na Bolívia.

Mas o pior não é isso: é a sua argumentação vir acompanhada de uma dose de demagogia e de sonsice capaz de dar cabo dos melhores estômagos. Um professor doutor perguntar porque é que 37 jovens mortos no Iémen não causam “a mesma repulsa” que o ataque ao Charlie Hebdo só pode ser piada. Ao fim de décadas de pesquisa sociológica, Boaventura ainda não descobriu que ele pode chorar mais pela morte do seu cão do que pela morte de mil chineses, sem que isso signifique que o seu cão valha mais do que mil chineses. E também não percebeu que a repulsa se deve tanto à morte dos caricaturistas como ao atentado à liberdade de expressão – e por isso a tragédia no supermercado judeu não nos marcou da mesma forma.

Ou será que Boaventura sabe isto? Eu acho que sabe. Simplesmente, é mais prático enviesar argumentos para poderem encaixar no seu “no entanto”. Até porque é um “no entanto” e peras. Pergunta ele: “A defesa da laicidade sem limites numa Europa intercultural, onde muitas populações não se reconhecem em tal valor, será afinal uma forma de extremismo?” Que caraças, andou a esquerda tão cara a Boaventura a morrer durante séculos pelo direito a gozar com a religião, para agora ele achar que atribuir uma cara ao profeta em 2015 é uma actividade radical. Mas ele está certo quando escreve: “Estamos perante um choque de fanatismos.” Só é pena Boaventura não vislumbrar o seu – um fanatismo multicultural onde a expressão “valores ocidentais” é posta entre aspas e toda a culpa pelas dificuldades de integração e pelo crescimento do jihadismo é atribuída às políticas do Ocidente. O problema é que são estes fanáticos multiculturais que acabam por empurrar muita gente moderada para os braços da extrema-direita. Boaventura e Marine são duas faces da mesma moeda.”

 

Um texto que subscrevo na íntegra.