5 de Maio, 2024 Onofre Varela
Ser religioso e ser crente não é a mesma coisa
No jornalismo – mais concretamente no Jornal de Notícias (JN), já que, desde 1969 até ao ano 2000, passei pelas Redacções de todos os jornais diários editados no Porto – tive um chefe de Redacção que era sacerdote católico. Refiro-me a Rui Osório e ao JN. O nosso relacionamento sempre foi cordial e tínhamos conversas versando a fé, sabendo ele que eu era ateu. Lembro de, numa das várias conversas que mantivemos sobre Religião, ele ter comentado: “Não conheço ninguém que seja mais religioso do que tu”.
Só tive que lhe dar razão porque, realmente, ser “religioso” não é sinónimo de se ser “crente”, atendendo à acepção da palavra “Religião”, cuja raiz latina vem de “Religio” e “Religare”, no sentido da procura de visões do mundo enquadradas numa espiritualidade enquanto valor moral e social. Neste aspecto, também a Ciência é uma Religião.
Já não lhe dei razão no significado que aponta para a adoração de uma entidade abstracta criada com a finalidade de darmos um sentido filosófico à vida, na convicção de que ela nos foi dada por um deus criador. Este “deus criador” faz parte da “crença” e não é mais do que um produto da nossa imaginação… essa, sim… criadora.
O verdadeiro criador é o Homem. A necessidade que o “Homo sapiens sapiens” sentiu de criar Deus (deuses) remete-nos para o sentido da religiosidade deísta que alimenta as várias igrejas estabelecidas em todas as sociedades e que os crentes sentem como bálsamo, ou aspirina do espírito, para atalhar as maleitas que sempre nos afligem a vida. Os credos religiosos caracterizam-se por uma união de sentimentos, de emoções místicas e de modos de ver o mundo… consequentemente, reflectem uma cultura.
Quando várias pessoas se juntam a pretexto de um qualquer tema que apreciam, estão a afirmar a sua cultura e a sublinhar o seu respeito e admiração por aqueles que partilham as mesmas ideias. Esta união de sentimentos leva-nos a reunir no mesmo clube, no mesmo partido, no mesmo movimento cívico e na mesma igreja. Sendo certo que no seio de cada um destes grupos é suposto existir respeito entre os elementos que lhe dão corpo, também é certo que não sentem o mesmo afecto pelos frequentadores, ou aderentes, de outros clubes, partidos, movimentos ou igrejas.
Estas diferenças que nos aproximam dos outros (mas que também nos separam), no fundo, só afirmam o facto de todos nós sermos iguais em sentimentos. Guerreámo-nos e suportámo-nos. É a característica do animal predador que somos. Não há “grupos de humanos bons” e “grupos de humanos maus”.
A situação só é verdadeiramente grave e alarmante quando o verbo “guerrear” conduz a atitudes políticas e religiosas extremistas que fazem sofrer o semelhante. E por aí todos nós reconhecemos os exemplos de políticas e de religiões extremistas, que são desrespeitadoras do outro e que preenchem os telejornais com “noticiário apocalíptico” que sublinha o pior do nosso comportamento… quando somos, mesmo, criminosos!…
(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)