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Categoria: Livros

25 de Outubro, 2024 Eva Monteiro

Um Gesto de Altruísmo do Prof. Ricardo Oliveira da Silva

A AAP – Associação Ateísta Portuguesa teve recentemente o prazer de se fazer representar numa conversa online sobre o Ateísmo em Portugal e no Brasil. Esta conversa decorreu no dia 9 de Outubro no Canal de Youtube Ativistas Ateus do Brasil, com o objetivo de iniciar uma ponte entre as comunidades ateístas dos dois países.

Prof. Ricardo Oliveira da Silva

Desta conversa decorreu o contacto com o Professor Ricardo Oliveira da Silva que possui uma Graduação em História pela Universidade Federal de Santa Maria (2005) e Mestrado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2008). É Doutorado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2013). Tem experiência na área de História, com ênfase em Historia das Ideias, Historiografia e teoria da História, História do Brasil republicano e História do Ateísmo. Atualmente é líder do Grupo de Pesquisa Ateísmos, Descrenças Religiosas e Secularismo: história, tendências e comportamentos, e faz parte do Grupo de Pesquisa História Intelectual, Produção de Presença e Construção de Sentido e do grupo História Intelectual e História dos Conceitos: conexões teórico-metodológicas. Esses grupos estão registrados no CNPq. É também membro do fórum acadêmico International Society for Historians of Atheism, Secularism, and Humanism (fonte).

Como autor prolífico na área do Ateismo, o Professor Ricardo Oliveira da Silva prontificou-se a disponibilizar aos nossos leitores algum do seu material sobre o tema, que aqui se reproduz.

A AAP agradece este gesto de incrível altruísmo que me muito ajudará a nossa comunidade a melhor compreender o ateísmo, em particular no Brasil.

19 de Agosto, 2024 Onofre Varela

“O Homem Criou Deus”

“O Homem Criou Deus” é o título do livro de que sou autor e foi editado pela Edium Editores em Dezembro de 2011. A obra, que estava esgotada, teve agora uma segunda edição revista e aumentada (muito aumentada!) pela Seda Publicações (herdeira da Edium), em Junho de 2024.

Adão era canhoto”, ilustração do autor para a capa do livro. Grafite e lápis de cor.

São 411 páginas (contra as 239 da primeira edição) onde discorro sobre o tema Religião de acordo com a minha ideia de não crente e como cidadão interessado no fenómeno religioso, assumindo-me crítico, não da fé (que é perfeitamente lícita) mas sim da exploração que dela se faz através de credos religiosos estabelecidos na sociedade, mas também da Política e da Economia, os outros dois poderes sociais que, somados à fé religiosa, constituem “a troica” que nos submete a situações indesejadas, mas que aceitamos docilmente pela “anestesia da fé” (seja em Deus ou nos gurus de seitas e partidos políticos). São situações de “escravatura mental” a que nos submetemos sem disso darmos conta.

Do sumário do livro destaco alguns temas:

A criação do conceito de Deus (criado por sentirmos necessidade dele, pois o Homem só cria o que necessita); Bíblia e História; a poesia contida no Génesis; os feitos de Moisés que a História não regista; fundamentalistas religiosos que atacam o Humor e assassinam Caricaturistas; o Mito e a Razão; o Sudário de Turim; a Arte e o Sagrado; Mulher, a eterna vítima das sociedades patriarcais bíblicas e corânicas; a desumanidade e selvajaria da Pena de Morte; as fantasias da Trindade e do Dogma; Jesus Cristo e o seu tempo, os Evangelhos e o seu valor social, hoje.

Deixo-vos três parágrafos do livro, como aperitivo:

«…Nas democracias é norma afirmar-se o respeito pelo outro e o reconhecimento dos direitos de todos, incluindo as minorias. Mas também é comum vermos esses direitos constantemente atropelados, com incidência no modo como se tratam etnias e as mulheres. Até no mercado de trabalho, nesta nossa sociedade tão ciosamente democrata e temente a Deus, as mulheres desempenham funções iguais às dos homens, com a mesma capacidade e perfeição, mas auferem menor ordenado pelo facto de serem mulheres! Em Janeiro de 2018 circulava nos media a ideia política de se igualar os vencimentos de homens e mulheres, alertando-se a opinião pública para o facto de os homens ganharem mais 17,8%…» (Página 268).

«…Hoje, quando assisto a uma missa, observando com olhos de antropólogo amador o que ali acontece, se diz e se sente, retrocedo para a Idade Média! Constato que a Igreja não ouviu os seus pensadores […] nem nada de mais actual transmitiu à sua clientela consumidora de missas, do que aquilo que vem transmitindo desde o tempo em que a ignorância imperava sobre os povos crentes anteriores ao Iluminismo… e os seus clientes continuam a afluir em rancho!… Isto parece-me negativamente impressionante e alimenta a minha preocupação e desconfiança no futuro próximo, por me aperceber da existência de tantos cérebros tão mal alimentados e desaproveitados! A qualidade do interesse intelectual da maioria de nós… também é mito…» (Página 351).

«…Se Jesus Cristo vivesse hoje não faria carreira no Vaticano, nem a sua doutrina seria aprovada após uma inspecção teológica de Ratzinger, nem como cardeal, nem travestido de Papa Bento 16. Jesus foi um político do seu tempo, protestante da religião judaica a qual pretendeu purificar. Hoje seria um feroz crítico do luxo que a Igreja ostenta desde a Alta Idade Média. Talvez por isso a Igreja dê uma grande importância a Maria, porque a sua imagem (ao contrário da do filho) não está comprometida com a Esquerda! Maria não cria problemas ao nível da política; e Jesus, tendo em conta a sua conduta social, até pode ser sindicalista e comunista!…» (Página 376).

Os interessados no livro podem encontrá-lo no Porto, na UNICEPE. Praça de Carlos Alberto, 128 A. Telefone 22 205 66 60 (na esquina da Praça dos Leões). Quem está longe do Porto pode contactar o editor: www.gugol-livreiros.pt

29 de Julho, 2024 João Monteiro

Livro: “O universo das seitas destrutivas”

Foi recentemente publicado o livro intitulado “O universo das seitas destrutivas: descubra o mundo secreto do engano, da manipulação e do controlo mental”, pela Arena, uma chancela da Penguin Random House. O autor é António Madaleno, que regressa ao tema das seitas depois da publicação, em 2020, do livro “Apóstata! Porque abandonei as testemunhas de Jeová”.

O livro está dividido em 10 capítulos:

Prefácio
Introdução

1- Estou numa religião ou numa seita destrutiva?
2- A psicologia das seitas destrutivas: compreendendo o apelo e as tácticas usadas.
3- A nova personalidade criada à imagem do líder e do grupo.
4- Porque é tão difícil para alguém reconhecer que está numa seita destrutiva?
5- Sinais de alerta: como reconhecer um grupo potencialmente nocivo.
6- Liberte-se! Estratégias para deixar uma seita destrutiva e começar uma nova vida.
7- Supere o trauma! Como curar-se do abuso emocional e psicológico.
8- Como reconstruir um sentido de identidade e comunidade após deixar o grupo.
9- Como ajudar um ente querido que está envolvido com uma seita destrutiva.
10- Prevenção: educar a sociedade sobre os perigos das seitas destrutivas e grupos de alto controlo.

Conclusão
Posfácio
Agradecimentos
Notas finais
Bibliografia
Apêndice (entrevistas e recursos)

António Madaleno tem sido bastante ativo nos últimos anos a sensibilizar o público para o que designa de seitas destrutivas e grupos de alto controlo. Salienta que apesar da maioria das seitas serem de cariz religioso, há outras instituições que têm o mesmo tipo de características e de comportamento, e que se podem encontrar no meio empresarial, profissional, político ou até familiar.

O autor consegue apresentar definições claras dos conceitos que apresenta, e acompanhá-las de exemplos que ilustram a sua ideia. Longe de ser um trabalho teórico, este livro é um manual prático que ajuda qualquer um de nós a identificar uma seita destrutiva ou um grupo de alto controlo, a tentar compreender o que leva uma pessoa a ser aliciada por tal grupo, e apresenta sugestões de como atuar caso um familiar ou amigo tenha passado a integrar um desses grupos.

Nesse livro, o autor demonstra uma enorme empatia, posicionando-se no apoio à vítima e às pessoas que a rodeiam, e nunca fazendo críticas ou juízos de valores. O facto de ter feito parte de uma seita, com o desempenho de funções hierárquicas, e de se ter conseguido libertar dela, decerto que contribuiu para esta sua capacidade de compreender quem está do outro lado.

Este é um livro útil para quem está numa seita, para quem esteve, ou para quem conhece alguém que esteja, de modo a conseguir reconhecer e ajudar a abandonar esses grupos de alto controlo. Aqueles que nunca passaram por nenhuma dessas experiências, também poderão ficar aqui a conhecer alguns sinais e características desses grupos, de modo a reconhecerem a sua presença na eventualidade de se cruzarem com algumas dessas situações no futuro. É também um livro de grande utilidade para psicólogos e terapeutas que já se cruzaram ou venham a cruzar com pacientes que estiveram envolvidos nestes grupos.

Dada a pertinência, este livro deveria ser lido por um número grande de pessoas, e o tema deveria ser alvo de debate público na sociedade. Felizmente, tem tido muito mediatismo (tanto na televisão, como na rádio, ou ainda em podcasts) e tem recebido o apoio de psicólogos, psicólogos sociais, psicólogos clínicos, investigadores na área da psicologoa, psiquiatras e outros profissionais.

Fica a sugestão para mais uma leitura de férias.

24 de Junho, 2024 Onofre Varela

O HOMEM CRIOU DEUS

O Homem Criou Deus, de Onofre Varela. Apresentado no ATENEU COMERCIAL DO PORTO por Renato Soeiro. Este sábado, 29 de Junho, às 16h00.

Obviamente o Homem já existia quando lhe ocorreu a ideia de criar um deus que o criasse. Sem Homem não haveria Deus.

Onofre Varela – O Homem Criou Deus
4 de Março, 2024 Onofre Varela

Opus Dei proíbe 79 livros de autores portugueses

De entre as particularidades radicais da Santa Inquisição contava-se a censura literária. Através do “Index Librorum Prohibitorum”, a Igreja proibiu a leitura de uma lista de livros, e quem os lesse seria perseguido e julgado. O nazismo de Hitler fez o mesmo, queimando livros em fogueiras públicas. Mais recentemente, em 2019, o Conselho Escolar Católico de Providence, no Canadá, repetiu a acção nazi da destruição de livros, queimando Banda Desenhada de Astérix, Tintim, Lucky Luke e Pocahontas, alegando conterem ideologia racista!…

A primeira das “listas negras” de livros, foi publicada em 1559 pelo papa Paulo IV (teria sido uma das suas últimas acções, pois morreu em 18 de Agosto do mesmo ano), e no decorrer de toda a história da Inquisição a lista foi editada 32 vezes, sendo extinta em 1966 por outro Paulo, o papa Paulo VI.

Hoje, neste nosso tempo tão moderno e no nosso país tão democrático e defensor das mais amplas liberdades, continua a haver listas de livros proibidos elaboradas por homens de fé. Recentemente tive conhecimento de uma: o “index” da seita vaticana Opus Dei (OD), contemplando autores como Eça de Queirós, José Saramago e Lídia Jorge, entre muitos outros. Em notícia assinada pelo jornalista Rui Pedro Antunes e publicada na edição do “Diário de Notícias” do dia 28 de Janeiro de 2013, à data, este rol de livros proibidos, contemplava 33.573 títulos (de entre os quais, 79 de autores Portugueses)!…

Esta atitude censória só pode ser tomada por quem não dá conta de que “o fruto proibido é o mais apetecido”… o que impede (ou pode, ou devia, impedir) o êxito da proibição, promovendo a sua crítica como reacção lógica de um espírito livre e decente.

Autores e especialistas portugueses mostraram-se indignados por a OD proibir a leitura de tais obras. Lídia Jorge diz que a Opus Dei deveria ter vergonha de usar tal tipo de listagem que também é arrasada pela Sociedade Portuguesa de Autores (SPA). Pilar del Río, presidente da Fundação Saramago e viúva do escritor, classifica este índice de “grosseiro e repugnante”, deixando várias críticas à OD: “É uma organização a que chamamos seita porque somos educados. Por acaso, eles não são.” Pilar revela ainda que Saramago nunca escreveu sobre a OD por não lhe atribuir qualquer importância e dignidade, e mostra-se ainda chocada pelo facto de haver “quem se submeta à irracionalidade das seitas”.

Lídia Jorge, que tem as suas obras “Costa dos Murmúrios” e “O Dia dos Prodígios”, inscritas na lista, confessou-se “chocada”. Disse que os membros da seita deviam ter “vergonha”, e classificou os autores da listagem de “gente retrógrada e abstrusa”. “São pessoas que desprezo porque se armam em mentores, em guardas morais, quando, no fundo, revelam uma ignorância absoluta sobre o papel da literatura.”

O presidente da SPA, José Jorge Letria, disse ao DN que “repudia a lista porque é atentatória da liberdade de expressão. Somos contra listas negras, sejam religiosas ou políticas”. Porém, Jorge Letria não se sentiu surpreendido com tal lista por saber que “corresponde à pior tradição das práticas da Igreja Católica, que nos faz lembrar a Inquisição”.

Quem está na lista e já não se pode defender, é Eça de Queirós, com os livros “A Relíquia”, “O Crime do Padre Amaro” e “O Primo Basílio”, que tiveram a honra de subir ao mais elevado nível de proibição. O antigo diretor da Biblioteca Nacional e especialista na obra queirosiana, Carlos Reis, assume a defesa do escritor, considerando que “qualquer lista de livros, ou similar, que contribua para limitar o acesso das pessoas à informação e à cultura é, por princípio, inaceitável”. É um procedimento “contrário a princípios fundamentais” e “abre caminho a repressões ou, no mínimo, a uma ‘vigilância’ que nenhuma religião ou ideologia tem o direito de impor”.

Porém, perante a lei, a lista é legal… pois qualquer associação é livre de, internamente, aconselhar a leitura de um livro aos seus associados, ou recomendar a não leitura de qualquer outro. Cabe a cada um dos associados usar o seu critério pessoal em detrimento do critério colectivo imposto pela seita a que se associa… o que, sabe-se, pode ser tarefa impossível… pois quem se habitua à “rédea curta” de uma ideologia ditatorial, ignora a liberdade… começando pelo uso da sua própria liberdade de pensar e de escolher.

(O autor escreve sem obedecer ao último Acordo Ortográfico)

OV

11 de Novembro, 2022 João Monteiro

Ler e interpretar

Texto de Onofre Varela, previamente publicado no jornal Alto Minho

Para que a leitura de um texto seja compreendida, precisa de ser interpretada. Entre a leitura e a interpretação, existe a mesma diferença que há entre os actos de olhar e de ver. Quem olha, pode não ver o que está no objecto olhado se não tiver a consciência de ter visto. A leitura de um texto não pede mais do que juntar sílabas e formar palavras que passam pela nossa mente em imagens transmitidas pelos olhos e descodificadas pelo cérebro. A seguir a este simples e automático acto, há a tarefa de interpretar o texto lido, a qual não pertence aos olhos.

A interpretação de um texto, ou de uma imagem, precisa de ferramentas fundamentais que o leitor, ou observador, terá de possuir previamente à leitura do texto ou da observação da imagem. O agente principal da leitura ou da observação (que é o leitor e o observador), só consegue interpretar o que acabou de ler ou de observar, se tiver a chave que lhe permita descodificar as palavras lidas ou as imagens observadas. 

Como exemplo direi que, em Arte, o valor artístico só existe se o observador da peça estiver preparado para identificar aquilo que vê, como Arte. Se ele não for capaz de fazer essa leitura, para ele a Arte não existe, embora exista o objecto cujo valor artístico ele desconhece… por isso não reconhece nem valoriza aquele objecto que, olhado pelos seus olhos, o cérebro não identifica, tornando o resultado do seu olhar idêntico ao de um palácio olhado por um boi! 

O leitor, por vezes, até precisa de ter a percepção de entender o que não está explicitamente escrito, mas que pode ser lido nas “entrelinhas”, como acontecia no tempo em que a censura cortava textos a jornalistas e escritores, obrigando os autores a uma ginástica gráfica que o leitor avisado acabava por compreender. O termo “leitor avisado” continua hoje, neste tempo em que a censura toma outras realidades diversas dos censores do Estado Novo… neste tempo em que proliferam as fake news, a ser tão (ou mais) importante como era nos tempos da censura Salazarenta.

Lembrei-me desta temática para a crónica de hoje por um dia ter recebido, de um amigo de longa data e profundamente católico, uma crítica negativa à leitura que fez do meu livro “O Homem Criou Deus” (Edium Editores, 2011). Referia-se ele a um dado parágrafo que, garantia, o ofendeu na sua religiosidade. Porque a minha intenção ao escrever o livro não era ofender, tendo tomado todos os cuidados na tentativa de evitar interpretações contrárias à minha intenção (embora não sabendo se o consegui. Aliás… parece que ninguém o consegue!…), usando palavras escolhidas para evitar correr esse risco. 

Combinei um encontro com o meu amigo para melhor nos entendermos numa conversa olhos-nos-olhos, bem mais interessante do que uma troca de palavras por telefone. Em frente de dois cafés, li-lhe o parágrafo da sua indignação. Tanto bastou para que o meu amigo não lhe encontrasse qualquer insulto à sua religiosidade, acabando por dizer: “Ah!… lido assim!…”. 

O problema está no facto de um religioso (ou um ateu), perante uma obra declaradamente ateia (ou religiosa), encarar a leitura predisposto a sentir-se contrariado, em vez de o fazer com espírito aberto para entender o que lá está realmente escrito, e não o que, no seu preconceito ou má fé (de religioso ou de ateu), imagina lá estar ou queria que lá estivesse!

É mais positivo encarar a leitura de um ensaio com a mente livre, do que armá-la de couraça impeditiva de ver o que lá está escrito, mas julgar perceber, exactamente, o seu contrário, por estar mais de acordo com o seu interesse. 

Conclusão: depois de termos tomado o café… mandamos vir duas cervejas. E brindamos!

(O autor escreve sem obedecer ao último Acordo Ortográfico) 

OV

19 de Novembro, 2021 João Monteiro

Livro: “Roma, temos um problema”

A propósito do texto publicado ontem aqui no blogue, e dada a atualidade do tema, parece-nos pertinente sugerir a leitura do livro “Roma, temos um problema”, sobre a história dos abusos sexuais de menores (e não só) no seio da Igreja e como a instituição lidou com esses acontecimentos ao longo do tempo. O livro foi recentemente publicado pela editora Tinta da China.

A SIC Notícias abordou esse tema no seu website, e a reportagem pode ser lida aqui.

17 de Agosto, 2021 João Monteiro

Férias ateístas

Os membros da Associação Ateísta Portuguesa também merecem um descanso. Mas mesmo em férias tentam meter a leitura em dia. E vocês, o que andam a ler?

Boas Férias!

18 de Março, 2021 João Monteiro

A mulher na Igreja

Texto da autoria de Onofre Varela:

A escritora e jornalista espanhola Cristina Fallarás, autora do livro El Evangelio Según Maria Magdalena (O Evangelho Segundo Maria Madalena), entrevistada pelo jornal espanhol El País (27 de Fevereiro último) diz que “não se entende a violência contra as mulheres sem a Igreja Católica”.

O seu livro não é uma biografia da personagem mais importante do Cristianismo depois de Maria, mas sim uma novela. “Quando não existe o relato [histórico] devemos criá-lo”, disse a autora. É nessa sua criação literária que se enquadra a afirmação da violência da Igreja contra as mulheres, num enredo novelístico à volta da figura de Maria Madalena e da misoginia da Igreja Católica, uma Igreja patriarcal onde as mulheres são relegadas para uma posição menor na organização do credo. 

Fallarás não quis escrever uma novela histórica, até porque não há fontes históricas fidedignas para se abordar com seriedade intelectual e científica a figura de Maria Madalena, nem, tão pouco, a de Maria, mãe de Jesus, tão venerada mas de quem, na realidade, nada se sabe! A construção dos Evangelhos não configura uma narrativa histórica, mas sim uma narrativa de fé, construída conforme o interesse do narrador. 

Curiosamente a escritora faz uma analogia interessante entre a Bíblia e os filmes de cow-boys! Diz ela que “quando comecei a lê-la dei conta de que a história, desde o princípio, não é mais do que um xadrez sem peões. À partida, não se entende, o jogo não funciona. Colocar as mulheres no relato, completa-o, dando-lhe um sentido que não tinha sem elas”. É aqui que a autora considera que os relatos bíblicos têm forma de “western”, pois, no princípio, também não considerou a mulher. Aquilo era só para homens selvagens e maus, dormindo na montanha tendo a sela por travesseiro. “No ‘western’ as únicas camas são as da cadeia e do bordel. Como relato é uma idiotice igual ao Evangelho de Paulo de Tarso, que considerava a mulher um erro”. 

A sua curiosidade por Maria Madalena tomou forma quando o papa Francisco decidiu nomeá-la apóstolo! Foi em 2016 que a Igreja resgatou aquela mulher que foi referida, durante séculos, como sendo possuída por sete demónios. A Igreja sempre a apelidou de prostituta, adúltera e pecadora. Desde Junho de 2016 Maria Madalena tem dignidade de Mulher, e o seu dia foi marcado no calendário litúrgico (22 de Julho), por mostrar “um grande amor a Cristo e ter sido tão amada por ele, devendo ser exemplo e modelo para toda a mulher na Igreja”.

Cristina Fallarás foi criada num ambiente ultra-católico, passando 17 anos em colégios religiosos femininos. “Sempre soube que havia algo de errado naquela vivência. Não houve nenhum momento em que me desse conta de que o mundo era injusto connosco […] educam-nos com um medo de que não se fala […] como se fossemos o Capuchinho Vermelho, que não é uma mulher, mas uma menina”. 

Na sua obra Fallarás espelha Maria Madalena como uma mulher culta, bissexual e rica. Com base neste possível entendimento da história de Madalena, a autora ficcionou no sentido de explorar “a origem da violência com que nos tratam”. Na Bíblia há três mulheres sexualizadas: Eva, Maria e Maria Madalena. “A primeira é tratada como sendo a culpada de todos os males da Humanidade. A segunda é virgem, perfeita, impoluta… algo inalcançável e absurdo. E a terceira… é uma puta… sem mais! Alguém a quem se usava. A mulher é um corpo que pode ser usado por todos, dizem os Evangelhos”. E conclui a autora: “tenho a raiva dentro de mim […] e qualquer mulher que não tenha a raiva dentro, não é consciente da violência que sofre em cada dia”.

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)

OV

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25 de Junho, 2014 Raul Pereira

Dois parágrafos que valem bem mais do que 500 paus

É inato ao homem o querer saber: a poucos é dado o saber querer; a menos ainda o saber. Para mim não abriu a fortuna excepção. Desde o começo da minha vida que eu, dado à contemplação da natureza, tudo perscrutava sem descanso. A princípio o meu espírito, ávido de saber, contentava-se com qualquer alimento que se lhe oferecia; a breve trecho, porém, se lhe tornou impossível digerir e começou a vomitar tudo o que ingerira. Tratava eu já então de ver com todo o cuidado o que havia de dar-lhe que ele digerisse e assimilasse bem: nada havia que satisfizesse os meus desejos. Passava em revista as afirmações dos passados, sondava o sentir dos vivos: respondiam o mesmo; nada, porém, que me satisfizesse. Algumas sombras de verdade, confesso, me entremostravam alguns; mas não encontrei um só que com sinceridade e duma maneira absoluta dissesse o que das coisas devíamos julgar. Voltei-me então para mim próprio; e pondo tudo em dúvida como se até então nada se tivesse dito, comecei a examinar as próprias coisas: é esse o verdadeiro meio de saber.

Levava as minhas investigações até aos primeiros princípios. Iniciando aí as minhas reflexões, quando mais penso, mais duvido: nada posso compreender bem. Desespero. No entanto persisto. Mais. Consulto os Doutores buscando neles avidamente a verdade. Que respondem? Foi-se cada um deles construindo a ciência com alheias ou próprias fantasias: destas inferiram outras, e destas outras ainda; e assim, nada ponderando bem e afastando-se da realidade, arranjaram um labirinto de palavras sem algum fundamento de verdade. Aí não obterás a compreensão das coisas naturais, mas aprenderás a textura de novas coisas e ficções, de cuja inteligência nenhum espírito é capaz. Efectivamente, quem será capaz de compreender o que não existe?

Francisco Sanches (1550-1623), Quod Nihil Scitur (Que nada se sabe), trad. Basílio de Vasconcelos, Lisboa, Vega, 1991 (1.ª ed. Lyon, Ant. Gryphium, 1581) .

Francisco Sanches 500 escudos