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Categoria: Arte e cultura

3 de Novembro, 2024 Onofre Varela

Halloween, o dia das Bruxas

As pessoas da minha idade que celebram o dia 1 de Novembro, atribuem à data duas recordações, sendo uma histórica e outra religiosa: a primeira, é o dia do terramoto que destruiu Lisboa no ano de 1755, e a outra é o “dia de todos os santos”, no qual a tradição manda lembrar os mortos da família numa romagem de saudade ao cemitério onde estão sepultados, dando uma ajuda ao negócio das flores que nesse dia triplicam ou quadruplicam o preço, de acordo com a regra económico-capitalista “da oferta e da procura”.

A estes dois eventos soma-se mais um que não era atendido na cultura portuguesa do meu meio social no tempo da minha meninice e primeira juventude, tendo sido importado de países ocidentais anglófonos. Refiro-me ao “Halloween”.

Celebrado na noite de 31 de Outubro para 1 de Novembro, o Halloween é uma festa americana das crianças que escolhem guarda-roupa de fantasia fantasmagórica para, assim trajadas, baterem à porta de vizinhos, amigos e familiares, pedindo guloseimas (gostosuras) e fazendo travessuras se não forem atendidas.

A origem desta tradição, que pede uma decoração das casas usando abóboras-lanterna, o acender de fogueiras e o contar histórias de assombração, pode ser encontrada em rituais celtas ligados ao fim do Verão e às colheitas agrícolas, e remonta ao século XVIII nos territórios pagãos da Irlanda e da Escócia, cujos rituais foram exportados para o território norte-americano pelos colonos imigrantes que se fixaram na terra dos “peles-vermelhas” (que são os históricos, legítimos e verdadeiros donos daquelas paragens geográficas).

Imagem gerada por IA da Stockcake

Mas a história do Halloween tem uma origem mais alongada no tempo se lhe juntarmos as tradições semelhantes dos povos celtas que habitaram a Gália (França) entre os anos 600 aC e 800 dC. A par do folclore, misto de religioso e pagão, há uma história bem mais dramática ligada à data do “Dia das Bruxas”. Isto dito assim até parece comédia ligeira e faz sorrir… mas vivido no seu tempo constituiu intenso drama sentido pelas mulheres perseguidas por superstição, estupidez e vingança torpe.

Numa sociedade dirigida por homens, tradicionalmente as mulheres nunca foram consideradas na exacta medida da igualdade que naturalmente têm perante os homens. Remetidas para uma escala menor, as mulheres ainda hoje (na nossa sociedade ocidental considerada tão “avançada”), auferem vencimento inferior aos homens que executam a mesma tarefa. (“Desigualdade salarial entre homens e mulheres voltou a aumentar”. Notícia de 9 de Julho de 2024, no jornal Público).

Tempos houve em que qualquer mulher que fugisse do padrão comportamental estabelecido pelos machos da sociedade, passava a ser considerada “bruxa” e, como tal, era perseguida, insultada, presa, torturada e morta violentamente, incluindo ser queimada viva.

Para que uma mulher fosse considerada bruxa bastava que ela mostrasse ser mais inteligente do que os homens que lhe eram próximos. Mulheres que exerciam actividades sociais de relevo, como prestar ajuda a parturientes e preparar medicamentos tradicionais, como hoje se encontram nas ervanárias, podiam ser designadas como bruxas por terem conhecimentos importantes para a época… e no extremo seriam perseguidas pelo complexo de inferioridade dos homens que, na convicção de mostrarem a sua “grandeza enquanto machos”, só sublinhavam a sua extrema pequenez perante as mulheres.

A sociedade machista não tinha estereotipado tais características para as mulheres… por isso, qualquer uma que saísse do padrão subserviente e temente ao homem, estava sujeita à perseguição porque, acreditavam eles, ela “teria feito um pacto com o diabo”. A partir daí podia ser humilhada, torturada e morta.

Na verdade o que acontecia tinha uma razão mais evidente e igualmente triste: a sociedade machista via nessas mulheres uma “ameaça à dominação masculina”, cujo sentimento de prepotência remonta à tradição judaico-cristã de o homem dominar a mulher, não permitindo que ela tenha vida própria para além daquilo que ele estipula “ser legal” para ela, tal como ainda hoje se observa na tradição religiosa de países islâmicos extremistas… e também em algumas famílias portuguesas… já agora!

(Por preguiça de aprender novas regras, o autor não obedece ao último Acordo Ortográfico. Basta-lhe o Português que lhe foi ensinado na Escola Primária por professores altamente qualificados)

25 de Outubro, 2024 Eva Monteiro

Um Gesto de Altruísmo do Prof. Ricardo Oliveira da Silva

A AAP – Associação Ateísta Portuguesa teve recentemente o prazer de se fazer representar numa conversa online sobre o Ateísmo em Portugal e no Brasil. Esta conversa decorreu no dia 9 de Outubro no Canal de Youtube Ativistas Ateus do Brasil, com o objetivo de iniciar uma ponte entre as comunidades ateístas dos dois países.

Prof. Ricardo Oliveira da Silva

Desta conversa decorreu o contacto com o Professor Ricardo Oliveira da Silva que possui uma Graduação em História pela Universidade Federal de Santa Maria (2005) e Mestrado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2008). É Doutorado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2013). Tem experiência na área de História, com ênfase em Historia das Ideias, Historiografia e teoria da História, História do Brasil republicano e História do Ateísmo. Atualmente é líder do Grupo de Pesquisa Ateísmos, Descrenças Religiosas e Secularismo: história, tendências e comportamentos, e faz parte do Grupo de Pesquisa História Intelectual, Produção de Presença e Construção de Sentido e do grupo História Intelectual e História dos Conceitos: conexões teórico-metodológicas. Esses grupos estão registrados no CNPq. É também membro do fórum acadêmico International Society for Historians of Atheism, Secularism, and Humanism (fonte).

Como autor prolífico na área do Ateismo, o Professor Ricardo Oliveira da Silva prontificou-se a disponibilizar aos nossos leitores algum do seu material sobre o tema, que aqui se reproduz.

A AAP agradece este gesto de incrível altruísmo que me muito ajudará a nossa comunidade a melhor compreender o ateísmo, em particular no Brasil.

14 de Outubro, 2024 Onofre Varela

Sobre a Espiritualidade

Quando se fala em Espiritualidade é comum ouvirmos referi-la sob o ponto de vista religioso, aliando-a a uma fé, de acordo com a definição de dicionário que aponta, como sinónimo, a palavra “misticismo” (Dicionário da Língua Portuguesa, Porto Editora, 8ª Edição, 1998). No mesmo dicionário, misticismo é “atitude caracterizada pela crença na possibilidade de comunicação directa com o divino ou a divindade”.

Se seguirmos estas definições encontramo-nos no terreno da crença religiosa que é sementeira de ideias transcendentes relacionadas com as figuras deificas inexistentes no mundo físico que nos fez e acolhe, indo para lá de tudo quanto é natural, na procura de uma outra origem que transgride a Natureza, vogando no espaço imaginativo da crença.

O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (Círculo de Leitores, 2003) navega nas mesmas águas definindo a espiritualidade como “característica ou qualidade do que tem ou revela intensa actividade religiosa ou mística”… quer dizer que seguindo por esta via, pretensamente explicativa, não aprendemos nada que seja real e concreto, e nos distancie do termo enquanto “filosofia de fé”.

Foto de Marc-Olivier Jodoin na Unsplash

O mesmo Houaiss, para a palavra “espírito” aponta, no mínimo, dezoito definições… até o bom vinho o possui! Também lá está a palavra “alma” como sinónimo de “espírito”… mas o termo “alma” tem a sorte de ser bafejado por quatro dezenas de definições, começando pelo “princípio da vida no homem ou nos animais”, passando por pensamento, afectividade, sensibilidade e “conjunto das actividades vitais”. Quer dizer: vida.

Alma é vida. É movimento. A “anima” que possui o significado de “fôlego vital”, respiração ou “sopro da vida”, de onde provém, etimologicamente, a palavra “animal” (ser que tem alma, animação) diferenciando-o dos vegetais, os quais, embora tenham vida, não se auto-locomovem (por não terem animação autónoma) como fazem os animais.

Agora podemos ir mais além nos conceitos que as palavras podem representar, e definirmos “espírito” como “modo de ser”. Há quem, pelas suas palavras, aspecto ou presença, transmita “paz de espírito”; e há quem possua um “espírito irrequieto ou belicoso”. Uma pessoa bondosa e pacífica é definida como sendo “uma paz de alma”.

A espiritualidade é, portanto, característica de seres animados e detentores de um cérebro capaz de um entendimento universalista de si, dos outros e do meio em que se movimentam, para se poderem manifestar sensitivamente: portanto, só o Ser Humano a possui.

Embora quase sempre ligada à esfera do “religioso deifico e transcendental”, a espiritualidade existe em todos nós, quer sejamos crentes, descrentes, assim-assim, nem por isso… ou ateus.

André Comte-Sponville, filósofo francês (1952) fala de “uma espiritualidade sem Deus”, no sentido de termos, todos nós, uma abertura (de espírito, de entendimento) para o ilimitado, no conhecimento de sermos seres relativos e abertos para o “absoluto”.

Nesse sentido, a espiritualidade do ateu caminha ao lado da espiritualidade do religioso, mas dispensando a figura do deus que alimenta a espiritualidade do companheiro da caminhada que ambos encetamos pela estrada da vida.

O alimento do ateu (para além do pantagruélico, que é sempre bem-vindo numa mesa rodeada de familiares e amigos) também passa pela sua espiritualidade, pelo seu lado sensível perante a beleza de uma pintura, de uma estátua, de uma paisagem, de um pôr do Sol, ou de um poema (assisti a um cântico gregoriano na catedral de Santiago de Compostela… e adorei! Nunca experimentei maior prazer auditivo).

A espiritualidade é estudada cientificamente pela “Neuroteologia” (também designada por “Bioteologia”), “Neurociência da Religião” e “Neurociência espiritual”, que investigam crenças, experiências e práticas religiosas ou espirituais. Há uma pesquisa na tentativa de se explicar a base neurológica de experiências religiosas, incluindo a dimensão da espiritualidade e as alterações dos estados de consciência.

O sentido religioso não passa de uma actividade do nosso cérebro. Qualquer ligação que queiramos fazer das coisas e de nós, a um deus, não passa de uma manifestação dos nossos sentimentos mais básicos que nos fazem crer num deus real (para além da guarida que os religiosos dão ao conceito dentro das suas cabeças)… mas que, naturalmente, não desagua em bom mar… até porque o leito onde deveria correr o rio da fé onde navegaria Deus… sempre esteve seco!…

(Por preguiça de aprender novas regras, o autor não obedece ao último Acordo Ortográfico. Basta-lhe o Português que lhe foi ensinado na Escola Primária por professores altamente qualificados)

15 de Setembro, 2024 Onofre Varela

Ciência, Religião,Ética e Moral

Hubert Reeves, especialista em astrofísica e autor do livro “Um Pouco Mais de Azul”, distingue o domínio da Ciência de quaisquer outros domínios de entre os que regem as sociedades que os homens já construíram.

A Ciência explica como as coisas são ou funcionam, e não se imiscui nos valores sociais. O domínio desses valores pertence a outros campos, como a Política e a Economia. Depois, há a Filosofia, a Religião, e mais um ramo filosófico denominado Ética (tendo acoplada a Moral), transversal a todos os outros campos, limitando poderes e moralizando atitudes.

Na Economia e na Política… parece que a Ética é uma espécie de “figura de estilo” que se encontra apenas nos discursos dos profissionais desses dois ramos para “parecer bem”, mas não nas suas acções e atitudes… pelo menos que nos apercebamos dela no dia-a-dia!…

A Filosofia é um tratado de manuais de Ética estudando os valores que regem os relacionamentos entre as pessoas, a harmonia do convívio na significação do bom e do mau, do mal e do bem, e a sua própria definição aponta para “aquilo que pertence ao carácter”.

Sobre a Religião talvez possamos dizer que é “o modo popular” que as populações têm de entender a Filosofia e procurar a harmonia social nos seus conceitos.

Filosofias há muitas… tal como chapéus (como disse o nosso actor Vasco Santana)… e carácteres também os temos por aí às mancheias, aos lotes e aos pontapés. Os carácteres são tão velhos quanto o raciocínio. O “Carácter” conta a nossa História feita de guerras, de crenças e de negócios sem pinga de Ética. Nas guerras encontram-se “carácteres” que são rastilhos patrióticos, causas religiosas e políticas apresentadas por quem as faz como “exemplos de positividade”… mas sempre em prejuízo do mesmo alvo sofredor: o Povo.

Vasco Santana – Arquivo da RTP

O Povo é sempre o personagem que se encontra na cena das acções de guerra e morre crente na divindade apregoada pelos seus líderes religiosos que fazem a guerra, mas também crente nas razões políticas dos líderes que armam exércitos e destroem cidades, matam velhos e, principalmente, crianças que ainda não tiveram tempo de experimentar o paladar da vida.

Se a maioria dos líderes religiosos (que tanto apregoam a divindade e matam gritando que “Alá é grande”), dos políticos e dos generais que, por crença na divindade e no patriotismo serôdio, fazem a guerra, tivessem vergonha e raciocínio Humanista… terminariam as guerras, as invasões, as destruições de equipamentos e cidades… e não haveria mais morte violenta.

De entre homens de Religião destaco Baruch Espinoza (1632-1677), filósofo holandês de origem portuguesa, autor do livro “Ética”, e que foi acusado de ser ateu… mesmo tendo definido Deus como “o ente absolutamente infinito, isto é, a substância que consta de infinitos atributos”… o que talvez queira dizer que Ética e Religião podem conflituar (e conflituam!) entre si!

A Ética tem, no Cristianismo, o seu expoente máximo na célebre frase “Amarás o próximo como a ti mesmo” (Mateus 22:39), que é cópia do Velho Testamento (Levítico 19:18). É uma frase que traduz um conceito universalista, ultrapassando a Moral Católica que defende a vida uterina quando ainda não há ser humano formado e por isso condena o aborto; mas também condena o divórcio, a eutanásia e as relações homossexuais, que a Ética Laica defende como liberdades individuais lícitas.

A Ética religiosa difere de religião para religião. No Islamismo extremado, por exemplo, defende-se a condenação à morte da mulher que se apaixona por um homem que professe outra religião que não seja aquela que é seguida pela família dela!…

É comum misturar-se Ética com Moral. Não são a mesma coisa. Se a Ética estuda valores morais que orientam o comportamento humano, a Moral é constituída pelos costumes, pelas regras e pelos tabus das convenções instituídas por cada sociedade.

Logo, a Ética é mais universalista, enquanto que a Moral (os apelidados “bons-costumes”) é uma herança emocional e colectiva transmitida por cada sociedade aos seus membros… (e muitas vezes não é lá grande coisa!…)

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)

23 de Agosto, 2024 Onofre Varela

O Mundo ao Contrário

Dois jornais nacionais noticiaram, em dias seguidos, dois casos que sendo de naturezas diferentes e distanciados geograficamente, lhes encontro razões políticas semelhantes… maleficamente semelhantes… pelo desrespeito que os seus responsáveis nutrem pelos cidadãos dos seus países.

O primeiro caso foi noticiado pelo Diário de Notícias no dia 20 de Agosto último, e dá a saber que no espaço de um ano os Talibãs que tomaram o poder no Afeganistão desde que Biden retirou as suas tropas daquele país em Agosto de 2021, já destruíram mais de 20 mil instrumentos musicais e milhares de filmes considerados “imorais” pelo Ministério para a Promoção da Virtude e Prevenção do Vício (a meu ver, uma instituição imoral) o qual é responsável pela prisão e assassínio de pacíficos cidadãos, à semelhança do que faz o vizinho Irão que possui um corpo de polícia com a mesma designação e que matou a jovem de 22 anos Masha Amini, em 16 de Setembro de 2022, alegadamente por ter o lenço da cabeça mal colocado permitindo ver-se um tufo de cabelo.

A música e os filmes vulgares que passam nas nossas rádios e nos nossos cinemas – e que todos nós consideramos elementos culturais ou de diversão – são considerados, pela lei dos fundamentalistas islâmicos Afegãos, como instrumentos de imoralidade e contra a lei islâmica (a qual configura a sua cultura).

Na mesma operação (alegadamente dos bons costumes) “decapitaram-se” manequins de montra, foram despedidos 25 mil trabalhadores do sector de comunicação, e foram inspeccionados milhares de locais comerciais, como restaurantes, hotéis e salões onde se realizavam bodas de casamento, para que as autoridades assegurassem que não se ouvia música em tais espaços. A música proibida pelos talibãs não é só a gravada… também inclui música ao vivo e tradicional, executada com instrumentos típicos como timbales e guitarras semelhantes a alaúdes, o que é um atentado cultural aos costumes de um povo.

Excerto do Diário de Notícias, disponível aqui.

A liberdade também é anulada nas mulheres, impedindo-as de frequentarem o ensino superior, de terem acesso ao trabalho e a circularem na via pública sem companhia masculina familiar.

Isto passa-se num regime teocrático desrespeitador dos direitos humanos universais, transformando cada cidadão num autómato que só pode funcionar como o ditador religioso decreta, na convicção de estar a cumprir as ordens de um deus!

Do outro lado do mundo vêm notícias igualmente negativas, divulgadas pelo jornal Público no dia seguinte (21 de Agosto). No Ocidente, que se diz socialmente desenvolvido e tão respeitador dos direitos fundamentais, chegam-nos da Venezuela os ecos de um acto eleitoral opaco que deu a vitória ao ditador de serviço há uma dúzia de anos, mas cuja vitória é contestada pela oposição que mostra vídeos feitos em todas as mesas eleitorais onde se diz em voz alta o resultado da votação que dá vitória esmagadora à oposição.

O povo saiu à rua e o ditador mandou a polícia pôr fim à contestação, o que resultou em 27 manifestantes mortos… mas cujas mortes o ditador assaca aos próprios manifestantes e à oposição, e não à violência da polícia do regime que comanda. O responsável máximo pelo Ministério Público da Venezuela quer mandar prender o líder da oposição, atribuindo-lhe a culpa pela morte dos cidadãos contestatários assassinados!

para o Partido Comunista Português (PCP) a razão está com o ditador, cujos resultados eleitorais se apressou a felicitar, antes mesmo de serem confirmados pelas autoridades venezuelanas, e o Supremo Tribunal da Venezuela já proibiu a divulgação das actas eleitorais… pelo que a confirmação não existe e permite-nos ajuizar que é escondida por não ser favorável ao ditador. O curioso desta atitude do PCP é ela ser contra a ideia do próprio partido comunista venezuelano!

(Devo dizer, como declaração de interesse, que militei no PCP desde o fim da década de 1970 até ao dia em que os seus deputados viraram costas a Zelenski no Parlamento, cuja atitude entendi como apoio implícito ao invasor Putin e condenação do povo ucraniano invadido… o que repudio)

Estes actos mostram-me um mundo ao contrário. 

O mal ocupa o lugar do bem e, espantosamente, tem apoiantes!… 

A ditadura religiosa de uns e a ditadura política de outros, são semelhantes na forma, e os resultados são igualmente maus para as respectivas populações que são as eternas vítimas sempre desrespeitadas, insultadas, perseguidas e manietadas. 

O mundo não pode fazer nada em favor dessas populações? 

Parece que não!… 

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)

19 de Agosto, 2024 Onofre Varela

“O Homem Criou Deus”

“O Homem Criou Deus” é o título do livro de que sou autor e foi editado pela Edium Editores em Dezembro de 2011. A obra, que estava esgotada, teve agora uma segunda edição revista e aumentada (muito aumentada!) pela Seda Publicações (herdeira da Edium), em Junho de 2024.

Adão era canhoto”, ilustração do autor para a capa do livro. Grafite e lápis de cor.

São 411 páginas (contra as 239 da primeira edição) onde discorro sobre o tema Religião de acordo com a minha ideia de não crente e como cidadão interessado no fenómeno religioso, assumindo-me crítico, não da fé (que é perfeitamente lícita) mas sim da exploração que dela se faz através de credos religiosos estabelecidos na sociedade, mas também da Política e da Economia, os outros dois poderes sociais que, somados à fé religiosa, constituem “a troica” que nos submete a situações indesejadas, mas que aceitamos docilmente pela “anestesia da fé” (seja em Deus ou nos gurus de seitas e partidos políticos). São situações de “escravatura mental” a que nos submetemos sem disso darmos conta.

Do sumário do livro destaco alguns temas:

A criação do conceito de Deus (criado por sentirmos necessidade dele, pois o Homem só cria o que necessita); Bíblia e História; a poesia contida no Génesis; os feitos de Moisés que a História não regista; fundamentalistas religiosos que atacam o Humor e assassinam Caricaturistas; o Mito e a Razão; o Sudário de Turim; a Arte e o Sagrado; Mulher, a eterna vítima das sociedades patriarcais bíblicas e corânicas; a desumanidade e selvajaria da Pena de Morte; as fantasias da Trindade e do Dogma; Jesus Cristo e o seu tempo, os Evangelhos e o seu valor social, hoje.

Deixo-vos três parágrafos do livro, como aperitivo:

«…Nas democracias é norma afirmar-se o respeito pelo outro e o reconhecimento dos direitos de todos, incluindo as minorias. Mas também é comum vermos esses direitos constantemente atropelados, com incidência no modo como se tratam etnias e as mulheres. Até no mercado de trabalho, nesta nossa sociedade tão ciosamente democrata e temente a Deus, as mulheres desempenham funções iguais às dos homens, com a mesma capacidade e perfeição, mas auferem menor ordenado pelo facto de serem mulheres! Em Janeiro de 2018 circulava nos media a ideia política de se igualar os vencimentos de homens e mulheres, alertando-se a opinião pública para o facto de os homens ganharem mais 17,8%…» (Página 268).

«…Hoje, quando assisto a uma missa, observando com olhos de antropólogo amador o que ali acontece, se diz e se sente, retrocedo para a Idade Média! Constato que a Igreja não ouviu os seus pensadores […] nem nada de mais actual transmitiu à sua clientela consumidora de missas, do que aquilo que vem transmitindo desde o tempo em que a ignorância imperava sobre os povos crentes anteriores ao Iluminismo… e os seus clientes continuam a afluir em rancho!… Isto parece-me negativamente impressionante e alimenta a minha preocupação e desconfiança no futuro próximo, por me aperceber da existência de tantos cérebros tão mal alimentados e desaproveitados! A qualidade do interesse intelectual da maioria de nós… também é mito…» (Página 351).

«…Se Jesus Cristo vivesse hoje não faria carreira no Vaticano, nem a sua doutrina seria aprovada após uma inspecção teológica de Ratzinger, nem como cardeal, nem travestido de Papa Bento 16. Jesus foi um político do seu tempo, protestante da religião judaica a qual pretendeu purificar. Hoje seria um feroz crítico do luxo que a Igreja ostenta desde a Alta Idade Média. Talvez por isso a Igreja dê uma grande importância a Maria, porque a sua imagem (ao contrário da do filho) não está comprometida com a Esquerda! Maria não cria problemas ao nível da política; e Jesus, tendo em conta a sua conduta social, até pode ser sindicalista e comunista!…» (Página 376).

Os interessados no livro podem encontrá-lo no Porto, na UNICEPE. Praça de Carlos Alberto, 128 A. Telefone 22 205 66 60 (na esquina da Praça dos Leões). Quem está longe do Porto pode contactar o editor: www.gugol-livreiros.pt

29 de Julho, 2024 João Monteiro

Livro: “O universo das seitas destrutivas”

Foi recentemente publicado o livro intitulado “O universo das seitas destrutivas: descubra o mundo secreto do engano, da manipulação e do controlo mental”, pela Arena, uma chancela da Penguin Random House. O autor é António Madaleno, que regressa ao tema das seitas depois da publicação, em 2020, do livro “Apóstata! Porque abandonei as testemunhas de Jeová”.

O livro está dividido em 10 capítulos:

Prefácio
Introdução

1- Estou numa religião ou numa seita destrutiva?
2- A psicologia das seitas destrutivas: compreendendo o apelo e as tácticas usadas.
3- A nova personalidade criada à imagem do líder e do grupo.
4- Porque é tão difícil para alguém reconhecer que está numa seita destrutiva?
5- Sinais de alerta: como reconhecer um grupo potencialmente nocivo.
6- Liberte-se! Estratégias para deixar uma seita destrutiva e começar uma nova vida.
7- Supere o trauma! Como curar-se do abuso emocional e psicológico.
8- Como reconstruir um sentido de identidade e comunidade após deixar o grupo.
9- Como ajudar um ente querido que está envolvido com uma seita destrutiva.
10- Prevenção: educar a sociedade sobre os perigos das seitas destrutivas e grupos de alto controlo.

Conclusão
Posfácio
Agradecimentos
Notas finais
Bibliografia
Apêndice (entrevistas e recursos)

António Madaleno tem sido bastante ativo nos últimos anos a sensibilizar o público para o que designa de seitas destrutivas e grupos de alto controlo. Salienta que apesar da maioria das seitas serem de cariz religioso, há outras instituições que têm o mesmo tipo de características e de comportamento, e que se podem encontrar no meio empresarial, profissional, político ou até familiar.

O autor consegue apresentar definições claras dos conceitos que apresenta, e acompanhá-las de exemplos que ilustram a sua ideia. Longe de ser um trabalho teórico, este livro é um manual prático que ajuda qualquer um de nós a identificar uma seita destrutiva ou um grupo de alto controlo, a tentar compreender o que leva uma pessoa a ser aliciada por tal grupo, e apresenta sugestões de como atuar caso um familiar ou amigo tenha passado a integrar um desses grupos.

Nesse livro, o autor demonstra uma enorme empatia, posicionando-se no apoio à vítima e às pessoas que a rodeiam, e nunca fazendo críticas ou juízos de valores. O facto de ter feito parte de uma seita, com o desempenho de funções hierárquicas, e de se ter conseguido libertar dela, decerto que contribuiu para esta sua capacidade de compreender quem está do outro lado.

Este é um livro útil para quem está numa seita, para quem esteve, ou para quem conhece alguém que esteja, de modo a conseguir reconhecer e ajudar a abandonar esses grupos de alto controlo. Aqueles que nunca passaram por nenhuma dessas experiências, também poderão ficar aqui a conhecer alguns sinais e características desses grupos, de modo a reconhecerem a sua presença na eventualidade de se cruzarem com algumas dessas situações no futuro. É também um livro de grande utilidade para psicólogos e terapeutas que já se cruzaram ou venham a cruzar com pacientes que estiveram envolvidos nestes grupos.

Dada a pertinência, este livro deveria ser lido por um número grande de pessoas, e o tema deveria ser alvo de debate público na sociedade. Felizmente, tem tido muito mediatismo (tanto na televisão, como na rádio, ou ainda em podcasts) e tem recebido o apoio de psicólogos, psicólogos sociais, psicólogos clínicos, investigadores na área da psicologoa, psiquiatras e outros profissionais.

Fica a sugestão para mais uma leitura de férias.

24 de Junho, 2024 Onofre Varela

O HOMEM CRIOU DEUS

O Homem Criou Deus, de Onofre Varela. Apresentado no ATENEU COMERCIAL DO PORTO por Renato Soeiro. Este sábado, 29 de Junho, às 16h00.

Obviamente o Homem já existia quando lhe ocorreu a ideia de criar um deus que o criasse. Sem Homem não haveria Deus.

Onofre Varela – O Homem Criou Deus
5 de Março, 2024 Onofre Varela

Fundamentalismos e “Verdades Falsas”

As relações entre os Homens nunca foram fáceis. Jamais o serão. Manifestam-se mais complicadas na Política por ser a “arte de governar povos”… a qual nunca foi pacífica. Cada grupo social ou político (às vezes, até, cada elemento da mesma família na mesma casa) tem a “sua verdade”, apregoada como oposta à “verdade dos outros”. Todos os partidos políticos querem (ou dizem querer) o melhor para o país (às vezes só para um extracto social), estando em total desacordo com as práticas de outros partidos que, mesmo apregoando a defesa dos mesmos interesses, usam modelos não coincidentes. Cada um considera-se detentor da verdade que imagina, e garante, ser única… e sua!

Quando se trata de aferir a verdade sobre qualquer tema, o modo de o conseguir com realidade só se encontra na “explicação científica”. Porém, em Política a “verdade” não é de cariz físico nem químico… é uma “filosofia gestora”, e cada um defende a sua com a mesma legitimidade do outro. A “verdade” apregoada por cada um, será aferida pela prática da filosofia publicitada, o que só acontece depois de sufragada… e muitas vezes revela-se um fracasso para o Povo que votou nela, ao constatar que foi enganado… e aprendeu tarde!

Quanto à “explicação científica”… ela também pode estar submetida a uma certa dúvida e por isso a porta da explicação nunca é fechada definitivamente, já que a todo o momento pode haver uma investigação, um achado ou uma observação, que venha alterar aquilo que, até aí, era “a verdade” sobre aquele assunto.

As religiões também se apresentam como “filosofias da Verdade”. Esta “Verdade” (com inicial maiúscula, porque divina) é das “verdades mais mentirosas” que eu conheço… imensamente mais do que as políticas!

No campo da Religião a verdade nunca é científica. Por exemplo: não é verdade Maria ter engravidado sem relações sexuais, porque a natureza da gravidez só dispensa o acto sexual se for conseguida em laboratório por inseminação artificial (o que não podia ter sido o caso de Maria). Do mesmo modo, Jesus nunca poderia ter ressuscitado se estivesse morto… se “ressuscitou”… estaria no estado de coma?!… Não é verdade a transformação da água em vinho, nem a multiplicação dos pães, nem o caminhar sobre as águas. Trata-se de narrativas fabuladas… e até são bonitas!… Mas não configuram realidades históricas.

Também não é verdade que santinhas e santinhos possam intermediar curas milagrosas levando o pedido a Deus, o qual, com o seu poder sulfamida curativo à distância, resolve o problema do olho da senhora Guilhermina que foi todo queimadinho com azeite a ferver! Se esta intermediação fosse verdadeira, tínhamos “no céu” o mesmo efeito parasitário das “cunhas” que tão bem conhecemos cá na Terra… o que, convenhamos, não é digno de um deus… ou será?!…

E depois há a própria ideia de Deus… que, assim, tal e qual como o inventado deus é pintado pelas religiões que o criaram e adoram, não passa de um aborto mal parido, de existência real impossível de ser concretizada, já que as leis naturais da Física e da Química não só o permitem, como até o contradizem!

Os Fundamentalismos não passam de colecções de “verdades falsas” impossíveis de confirmação, mas, curiosamente, são sempre apregoadas com o estatuto de verdadeiro e acrescentado da qualidade de “única Verdade”, tanto na filosofia religiosa apregoada por credos transformados em igrejas, como na filosofia social apregoada por credos políticos transformados em partidos com laivos de Religião deísta à mistura, quando se consideram uma espécie de “salvadores da Humanidade”.

Mas não se pense que o Ateísmo escapa a esta análise!…

Os ateus também contam com os seu fundamentalistas! Não são só os profundamente crentes que detêm tal estatuto… os profundamente descrentes também podem usá-lo!

Foto de Sara Calado na Unsplash

Assisti a uma manifestação fundamentalista de um companheiro ateu que criticou o modo de trajar de uma muçulmana por quem nos cruzamos na rua. Aquela senhora (com toda a legitimidade) vestia de acordo com a prática típica do grupo social, antropológico e étnico a que pertencia. O meu amigo, ao insurgir-se contra aquele modo de vestir (com a intenção de atingir criticamente uma Religião) esqueceu-se que vociferava contra uma vestimenta regional… que naquele caso era muçulmana, mas pertencia à mesma característica inserida numa etnia, que poderia ser de uma peruana, de uma sevilhana, de uma vianesa, de um campino do Ribatejo, de um sargaceiro da Póvoa ou de um pauliteiro de Miranda!…

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)

4 de Março, 2024 Onofre Varela

Opus Dei proíbe 79 livros de autores portugueses

De entre as particularidades radicais da Santa Inquisição contava-se a censura literária. Através do “Index Librorum Prohibitorum”, a Igreja proibiu a leitura de uma lista de livros, e quem os lesse seria perseguido e julgado. O nazismo de Hitler fez o mesmo, queimando livros em fogueiras públicas. Mais recentemente, em 2019, o Conselho Escolar Católico de Providence, no Canadá, repetiu a acção nazi da destruição de livros, queimando Banda Desenhada de Astérix, Tintim, Lucky Luke e Pocahontas, alegando conterem ideologia racista!…

A primeira das “listas negras” de livros, foi publicada em 1559 pelo papa Paulo IV (teria sido uma das suas últimas acções, pois morreu em 18 de Agosto do mesmo ano), e no decorrer de toda a história da Inquisição a lista foi editada 32 vezes, sendo extinta em 1966 por outro Paulo, o papa Paulo VI.

Hoje, neste nosso tempo tão moderno e no nosso país tão democrático e defensor das mais amplas liberdades, continua a haver listas de livros proibidos elaboradas por homens de fé. Recentemente tive conhecimento de uma: o “index” da seita vaticana Opus Dei (OD), contemplando autores como Eça de Queirós, José Saramago e Lídia Jorge, entre muitos outros. Em notícia assinada pelo jornalista Rui Pedro Antunes e publicada na edição do “Diário de Notícias” do dia 28 de Janeiro de 2013, à data, este rol de livros proibidos, contemplava 33.573 títulos (de entre os quais, 79 de autores Portugueses)!…

Esta atitude censória só pode ser tomada por quem não dá conta de que “o fruto proibido é o mais apetecido”… o que impede (ou pode, ou devia, impedir) o êxito da proibição, promovendo a sua crítica como reacção lógica de um espírito livre e decente.

Autores e especialistas portugueses mostraram-se indignados por a OD proibir a leitura de tais obras. Lídia Jorge diz que a Opus Dei deveria ter vergonha de usar tal tipo de listagem que também é arrasada pela Sociedade Portuguesa de Autores (SPA). Pilar del Río, presidente da Fundação Saramago e viúva do escritor, classifica este índice de “grosseiro e repugnante”, deixando várias críticas à OD: “É uma organização a que chamamos seita porque somos educados. Por acaso, eles não são.” Pilar revela ainda que Saramago nunca escreveu sobre a OD por não lhe atribuir qualquer importância e dignidade, e mostra-se ainda chocada pelo facto de haver “quem se submeta à irracionalidade das seitas”.

Lídia Jorge, que tem as suas obras “Costa dos Murmúrios” e “O Dia dos Prodígios”, inscritas na lista, confessou-se “chocada”. Disse que os membros da seita deviam ter “vergonha”, e classificou os autores da listagem de “gente retrógrada e abstrusa”. “São pessoas que desprezo porque se armam em mentores, em guardas morais, quando, no fundo, revelam uma ignorância absoluta sobre o papel da literatura.”

O presidente da SPA, José Jorge Letria, disse ao DN que “repudia a lista porque é atentatória da liberdade de expressão. Somos contra listas negras, sejam religiosas ou políticas”. Porém, Jorge Letria não se sentiu surpreendido com tal lista por saber que “corresponde à pior tradição das práticas da Igreja Católica, que nos faz lembrar a Inquisição”.

Quem está na lista e já não se pode defender, é Eça de Queirós, com os livros “A Relíquia”, “O Crime do Padre Amaro” e “O Primo Basílio”, que tiveram a honra de subir ao mais elevado nível de proibição. O antigo diretor da Biblioteca Nacional e especialista na obra queirosiana, Carlos Reis, assume a defesa do escritor, considerando que “qualquer lista de livros, ou similar, que contribua para limitar o acesso das pessoas à informação e à cultura é, por princípio, inaceitável”. É um procedimento “contrário a princípios fundamentais” e “abre caminho a repressões ou, no mínimo, a uma ‘vigilância’ que nenhuma religião ou ideologia tem o direito de impor”.

Porém, perante a lei, a lista é legal… pois qualquer associação é livre de, internamente, aconselhar a leitura de um livro aos seus associados, ou recomendar a não leitura de qualquer outro. Cabe a cada um dos associados usar o seu critério pessoal em detrimento do critério colectivo imposto pela seita a que se associa… o que, sabe-se, pode ser tarefa impossível… pois quem se habitua à “rédea curta” de uma ideologia ditatorial, ignora a liberdade… começando pelo uso da sua própria liberdade de pensar e de escolher.

(O autor escreve sem obedecer ao último Acordo Ortográfico)

OV