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Categoria: Ateísmo

15 de Janeiro, 2013 Carlos Esperança

Associação Ateísta Portuguesa (AAP) – Convite da RTP – 1

Para conhecimento dos sócios da AAP, em particular, e dos leitores do Diário de uns Ateus, informo que fui convidado para participar no próximo programa «Portugal no Coração» da próxima 5.ª feira, dia 17.

 

Eis o teor do convite:

Conforme conversa telefónica aqui vai o meu pedido para estar no programa “Portugal no Coração” no dia 17 de Janeiro, quinta-feira, para nos falar sobre o Ateísmo. O tema do programa do “Portugal no Coração” será Portugal: Profano ou Sagrado?

Pedia-lhe que me enviasse uma pequena biografia sua assim como alguns tópicos a abordar no programa, tópicos que considere importantes e relevantes nós destacarmos.

Será contactado amanhã pela produção com o horário da sua participação para quinta- feira sabendo que o programa começa ás 15h ás 18h.

Qualquer dúvida que tenha não hesite em contactar-me.

Melhores Cumprimentos,

Andreia Castro Guimarães

12 de Janeiro, 2013 Carlos Esperança

DE NATURA DEORUM (3 de 3)

Por

João Pedro Moura

O TOTALITARISMO

As religiões monoteístas são altamente totalitárias.

Remontam a uma época em que a unidade do género humano, para tais religionários, estava dividida em duas espécies de gente: os que estão do nosso lado e os que não estão; os que seguem a doutrina oficial e os outros…

Vejamos 3 conceções paradigmáticas, no Novo Testamento, acerca do destino reservado aos outros… 

1- Marcos 16:16:

“Quem crer e for batizado será salvo; mas quem não crer será condenado.“

São as palavras finais do Cristo “ressurreto”, aos seus apóstolos. A mensagem definitiva e escatológica.

Será condenado porquê???!!! Alguém fez um mal, ao não crer na doutrina oficial???!!!

Objetivamente, não há mal nenhum, em não crer, mas, para deus e seu ectoplasma filial, Jesus Cristo, pejado de misericórdia e amor infinitos à humanidade, haverá condenação infernal aos que, simplesmente, não creram na treta divina, porque deus não os predispôs para tal…

2- João 15:5, 6:

“Eu sou a videira e vós os ramos; quem está em mim, e eu nele, esse dá muito fruto; porque, sem mim, nada podeis fazer.

Se alguém não estiver em mim, será lançado fora, como o ramo, e secará; tais ramos são recolhidos, lançados ao fogo, e ardem.”

Ora aqui estão, também, as razões do aparecimento da Inquisição e da sua pena suprema – o braseiro purificador dos malditos…

Novamente, o Cristo, esse paradigma do “amor”, da “bondade” e da “misericórdia”, a afirmar o que acontecerá a quem não estiver “nele”…

… A morte na brasa

3- Mateus 25:31-46

“31- E quando o Filho do homem vier em sua glória, e todos os santos anjos com ele, então se assentará no trono da sua glória;
32- E todas as nações serão reunidas diante dele, e apartará uns dos outros, como o pastor aparta dos bodes as ovelhas;
33- E porá as ovelhas à sua direita, mas os bodes à esquerda.
34- Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo;
(…)

41- “Então dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos;
42- Porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede, e não me destes de beber;
43- Sendo estrangeiro, não me recolhestes; estando nu, não me vestistes; e enfermo, e na prisão, não me visitastes.
(…)

46- E irão estes para o tormento eterno, mas os justos para a vida eterna.”

E, para terminar o desiderato escatológico do amor pela humanidade, temos o “Dia do Juízo Final”, a “Dies Irae”: os “maus”, quero dizer, todos aqueles que não seguiram o Cristo, tais como ateus, indiferentes, religionários de religião errada, etc. seguirão para o “fogo eterno”; os virtuosos da adoração divina seguirão para o jardim da celeste corte…

4- É preciso um alto grau de totalitarismo, um inimaginável ódio pela humanidade, um maníaco pendor discriminatório, para não só não aceitar todos aqueles que não seguiram “o guia”, como também ordenar a sua condenação ao “fogo eterno”!

5- As religiões monoteístas, a judio-cristã e a islâmica, constituem o maior totalitarismo da História!!!

Patenteiam uma tamanha conceção de unicidade individual e social, que as leva a reprimir, brutalmente, qualquer dito ou feito, considerado dissonante com a doutrina.

Não há paralelo, na História da Humanidade, de semelhante totalitarismo!

Uma atrocidade! Uma crueldade! Um enorme ódio pelo outro e pelo diferente!

6- O que vale é que a “Dies Irae” já passou, com toda a sua infalibilidade:

a) Mateus 24:34:

“Em verdade vos digo que não passará esta geração sem que todas estas coisas aconteçam. “

b) Lucas 21:32

“Em verdade vos digo que não passará esta geração até que tudo aconteça.“

CONCLUSÃO

            Deus é uma projeção mental dos explorados, oprimidos, ignorantes, os desejosos de saber depressa a causa das coisas, os medrosos, os inquietos…

            Seria difícil, nos tempos primitivos, ver-se o faiscar dos relâmpagos, o trovão ribombante, as tempestades, os sismos e demais manifestações naturais, sem ficar apreensivo com a causa e sem idealizar uma entidade medonha, que estaria a supervisar a vida…

Depois, veio o clero, erigido em autoridade suprema e indistinguível do poder político, a debitar o preceituário doutrinário da redenção salvífica e a preconizar a mansuetude ovelhum, para manter a paz dos poderosos e o pasto fácil dos mesmos…

Depois, edificou-se a aliança entre o trono e o altar, para melhor garantir as tutelas dum e doutro e continuar a preservar a pacatez asinina do rebanho, em ordem para a melhor condução ao aprisco divino…

… Até um dia…

8 de Janeiro, 2013 Carlos Esperança

DE NATURA DEORUM (2 de 3)

Por

JOÃO PEDRO MOURA

BÍBLIA

            A Bíblia é o livro do cristianismo. Parcialmente, também é o livro do judaísmo. Mas aqui interessa, fundamentalmente, o cristianismo que é o que nos “afeta” a todos, em termos de civilização e matriz cultural…

Continuando com a “Natureza de Deus”, vou, seguidamente, explanar sobre “a criação do mundo”, em 6 dias, na versão bíblica, a origem da humanidade e a genealogia do profeta-mor do reino, Jesus…

… Nada como começar com a origem das coisas…

 

OS 6 DIAS DA CRIAÇÃO

1- Génesis 1:1-19:

“1- No princípio criou Deus os céus e a terra.
2- E a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo; e o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas.
3- E disse Deus: Haja luz; e houve luz.
4- E viu Deus que era boa a luz; e fez Deus separação entre a luz e as trevas.
5- E Deus chamou à luz Dia; e às trevas chamou Noite. E foi a tarde e a manhã, o dia primeiro.
6- E disse Deus: Haja uma expansão no meio das águas, e haja separação entre águas e águas.
7- E fez Deus a expansão, e fez separação entre as águas que estavam debaixo da expansão e as águas que estavam sobre a expansão; e assim foi.
8- E chamou Deus à expansão Céus, e foi a tarde e a manhã, o dia segundo.
9- E disse Deus: Ajuntem-se as águas debaixo dos céus num lugar; e apareça a porção seca; e assim foi.
10- E chamou Deus à porção seca Terra; e ao ajuntamento das águas chamou Mares; e viu Deus que era bom.
11- E disse Deus: Produza a terra erva verde, erva que dê semente, árvore frutífera que dê fruto segundo a sua espécie, cuja semente está nela sobre a terra; e assim foi.
12- E a terra produziu erva, erva dando semente conforme a sua espécie, e a árvore frutífera, cuja semente está nela conforme a sua espécie; e viu Deus que era bom.
13- E foi a tarde e a manhã, o dia terceiro.
14- E disse Deus: Haja luminares na expansão dos céus, para haver separação entre o dia e a noite; e sejam eles para sinais e para tempos determinados e para dias e anos.
15- E sejam para luminares na expansão dos céus, para iluminar a terra; e assim foi.
16- E fez Deus os dois grandes luminares: o luminar maior para governar o dia, e o luminar menor para governar a noite; e fez as estrelas.
17- E Deus os pôs na expansão dos céus para iluminar a terra,
18- E para governar o dia e a noite, e para fazer separação entre a luz e as trevas; e viu Deus que era bom.
19- E foi a tarde e a manhã, o dia quarto.”

Como se pode ler, deus criou a “luz”… no primeiro dia, mas só criou o sol, a lua e as estrelas, no quarto…

Ainda gostava de saber qual foi a extraordinária fonte de luz, que deus criou no primeiro dia, distinguindo o “dia” da “noite”, sem ser o sol, nem a lua nem as estrelas…

… Mas acho que nunca o saberei…

Mais: como é que deus, no seu infinito poder, consegue estabelecer o primeiro dia, um período de 24 horas, em que o sol alterna entre o acima e abaixo da linha do horizonte, sem ter criado o… sol???!!!…

O próprio deus a desafiar as leis da Física, contraditando-as, mas estabelecendo-as, 3 dias depois…

Os poderes de deus, em todo o seu esplendor, “chumbados” logo no primeiro exame sobre astronomia elementar…

Eu explico: é que os néscios que fizeram o Génesis, não sabiam que a luz da aurora era a primeira radiação visível do sol emergente. Pensavam que era uma luz abstrata, independente do sol. Por isso, é que tais néscios puseram o seu deus de fancaria a brincar às luzes…

Das duas, uma: ou deus inspirou os néscios, imperfeitamente, ou foram estes que fizeram a “luz” do Génesis, desinspiradamente…

 

ADÃO, EVA, CAIM, ABEL E…

2- Nos capítulos 2 e 4 do Génesis, o “nosso Senhor” põe-se a criar mais coisas estranhas, tais como o primeiro homem e a primeira mulher, mais 2 filhos de ambos, Caim e Abel, tendo aquele matado este, posteriormente.

Todavia, no versículo 17, do cap. 4, lê-se esta enormidade:

“E conheceu Caim a sua mulher, e ela concebeu, e deu à luz a Enoque; e ele edificou uma cidade, e chamou o nome da cidade conforme o nome de seu filho Enoque;”

Pelo que, o quesito emerge com uma potência esmagadora:

– Donde é que raio surgiu a mulher de Caim???!!!

Tínhamos o casal primevo, os seus filhos, Caim e Abel, e… mais nada!

Agora, aparece uma mulher obscura vinda de nenhuma parte…

Como é que a partir de 2 homens, Caim e Abel, este, entretanto defunto, se poderia originar a humanidade???!!! Pelos vistos, inventou-se uma mulher para dar seguimento…

Só que, como é que a partir dum casal se poderá originar uma humanidade???!!! A partir de relações incestuosas???!!!…

Os mistérios de deus são insondáveis! Tão insondáveis que nem se consegue vislumbrar nem a lógica nem os factos nem o que quer que seja do desatino divino…

3- Mais e pior: a partir do capítulo 5, do Génesis, a descendência de Adão é totalmente diferente do cap. 2 e 4:

Génesis 5:1-5

“Este é o livro das gerações de Adão. No dia em que Deus criou o homem, à semelhança de Deus o fez.
Homem e mulher os criou; e os abençoou e chamou o seu nome Adão, no dia em que foram criados.
E Adão viveu cento e trinta anos, e gerou um filho à sua semelhança, conforme a sua imagem, e pôs-lhe o nome de Sete.
E foram os dias de Adão, depois que gerou a Sete, oitocentos anos, e gerou filhos e filhas.
E foram todos os dias que Adão viveu, novecentos e trinta anos, e morreu.”

Já nem se fala de Eva, mas duma vaga mulher…

Temos, então, um Adão a gerar um filho aos 130 anos (!!!) e a morrer aos 930 anos (!!!)….

Naquele tempo é que as pessoas viviam rijamente!…

 

GENEALOGIA  DE  JESUS

4- Mateus 1:1-16:

“1- Livro da geração de Jesus Cristo, filho de Davi, filho de Abraão.
2- Abraão gerou a Isaque; e Isaque gerou a Jacó; e Jacó gerou a Judá e a seus irmãos;
(…)
15- E Eliúde gerou a Eleázar; e Eleázar gerou a Matã; e Matã gerou a Jacó;
16- E Jacó gerou a José, marido de Maria, da qual nasceu JESUS, que se chama o Cristo.

17- De sorte que todas as gerações, desde Abraão até Davi, são catorze gerações; e desde Davi até a deportação para a babilônia, catorze gerações; e desde a deportação para a babilônia até Cristo, catorze gerações.”

5- Lucas 3:23-38:

“23- E o mesmo Jesus começava a ser de quase trinta anos, sendo (como se cuidava) filho de José, e José de Heli,
24- E Heli de Matã, e Matã de Levi, e Levi de Melqui, e Melqui de Janai, e Janai de José,
(…)
34- E Judá de Jacó, e Jacó de Isaque, e Isaque de Abraão, e Abraão de Terá, e Terá de Nacor,
35- E Nacor de Seruque, e Seruque de Ragaú, e Ragaú de Fáleque, e Fáleque de Éber, e Éber de Salá,
36- E Salá de Cainã, e Cainã de Arfaxade, e Arfaxade de Sem, e Sem de Noé, e Noé de Lameque,
37- E Lameque de Metusalém, e Metusalém de Enoque, e Enoque de Jarete, e Jarete de Maleleel, e Maleleel de Cainã,
38- E Cainã de Enos, e Enos de Sete, e Sete de Adão, e Adão de Deus.”

6- Matã e Heli eis os nomes dos avós paternos de Jesus, segundo os evangelistas, Mateus e Lucas…

… E o resto dos antepassados raramente coincide na genealogia dos 2 evangelistas…

Como é que 2 evangelistas, que, supostamente, inspirados pelo deus infalível, deveriam apresentar a genealogia infalível do profeta/deus, contradizem-se???!!!

Começa logo no avô!

Como sabem, da lógica, duas proposições contraditórias anulam-se mutuamente…

Jesus, essa espécie de ectoplasma filial de deus, “chumba” logo no exame inicial da sua presumida existência…

7- Temos, então, a Bíblia a falhar logo na origem do mundo, da humanidade e do profeta-mor do cristianismo, o fantasmagórico Jesus…

7 de Janeiro, 2013 Carlos Esperança

Citação de José Saramago

«Já não adianta nada dizer que matar em nome de Deus é fazer de Deus um assassino. Para os que matam em nome de Deus, Deus é o Pai poderoso que juntou antes a lenha para o auto de fé e agora prepara e coloca a bomba.»

José Saramago, Visão, 18-08-2005

4 de Janeiro, 2013 Carlos Esperança

DAS CHAGAS E DAS MENTIRAS

Por

David Ferreira

Ao longo da minha vida, sempre que a ocasião o propicia, tenho colocado o dedo na chaga permanentemente aberta e purulenta que debrua a bandeira de quase todas as religiões. É um acto consciente e muitas vezes solitário, que se manifesta inconscientemente, como quem anseia desaguar o excesso de águas inquinadas que a enxurrada sociocultural vai acumulando ao longo dos recantos pantanosos do subconsciente.

Por diversas vezes me questionei acerca do porquê de tal necessidade de alívio mental imediato perante o vislumbre de qualquer centelha mais perniciosa de religiosidade, mas sem necessidade, uma vez que, no fundo, sempre soube a resposta. Mas se o porquê já não me assiste, então para quê?

As religiões não são somente uma proposta ou uma visão filosófica daquilo que apreendemos como realidade, muito menos um simples e cosmológico retransmissor de entidades sobrenaturais indefinidas e indefiníveis que se apresentam, num perverso jogo multidimensional das escondidas, como últimos criadores incriados a necessitarem de constante atenção, como crianças que nunca tiveram pais, em apoplética e eterna carência afetiva.

As religiões são, sobretudo, a materialização e a implementação de uma outra forma de poder, alternativa e concorrente ao poder secular. Se o poder dos homens sobre os homens, assente tanto em pilares de bom senso como, por vezes, na falta dele, serve para regular a manutenção e a subsistência do nosso Eu físico, numa desejada e inevitável harmonia social, já o poder religioso, o de um ou vários deuses sobre os homens, conforme o delírio ou o grau de intoxicação alucinogénia, assenta nos maleáveis pilares evolucionários da moderação comportamental e da sobrevivência, como o medo do desconhecido, o sofrimento, a angústia, a necessidade de explicar fenómenos naturais poderosos para uma adaptação mais sincrética à realidade e, talvez o mais importante de todos, a percepção inequívoca da morte.

É neste limbo de percepções inefáveis e de sentimentos impetuosos, que o espectro da religiosidade estende os seus tentáculos, cheio de espiritualidade mas com muito pouca espirituosidade, com o objectivo de subjugar, regular e comandar o sempre volúvel Eu incorpóreo.

Seja com o Cristo que incessantemente se ressuscita, condenado a salvar os homens por intermédio da exibição morbígena e pornográfica da sua execução, seja com o profeta quezilento e rancoroso que não aceita um gracejo sem suar aziúme por todos os interstícios lendeosos das veneráveis barbas, os arautos do paraíso acotovelam-se diligentemente no resguardo dourado das suas bancas de feira e apregoam aos sete céus a originalidade misericordiosa que aduba os seus terrenos contrafeitos, numa competição desenfreada pela máxima acumulação de almas no mínimo de espaço-tempo possível. Vendem sonhos, compram almas. Contrabandeiam acções virtuosas, lucram indultos ansiados fervorosamente, analgésicos místicos que atenuam a dor auto-infligida que o transtorno dissociativo de personalidade provoca. Publicitam virtudes, mascaram imperfeições. Apelam à doçura, esquecem, ocultam e, por vezes, praticam a tortura. Criticam a idolatria, gerem multinacionais de arte sacra. Perfilham a ciência, praticam exorcismos. Exaltam a criação do Homem e conspurcam-na com pecados originais, vergonhosos e capitais. E tantos malabarismos que tais.

São vendedores de sonhos que reclamam o reino eterno, negociando a eternidade a troco de mentiras que se eternizam. Vendem o desejo de que a certeza, adquirida e multiplicada pelos outros voluntariamente e de uma forma viral, de reza em reza, lhes remova ilusoriamente a agonia da sua própria incerteza e lhes conceda o antídoto perfeito que domestique e tranquilize complacentemente o Mr. Hyde de sono leve que hiberna no seu convulso Dr. Jekyll.

Para quê, então, a necessidade de apalpar periodicamente essa ferida hemofílica que teima a sarar? Para estimular a produção de glóbulos brancos. E para que ela não se esqueça que não é mais que uma ferida que teima em evoluir até à imponência tranquila, natural e adulta de uma cicatriz. E, sobretudo, porque não gosto de mentiras, mesmo que o mitómano que as conceba seja um obsessivo e compulsivo portador de boa vontade.

2 de Janeiro, 2013 Carlos Esperança

DE NATURA DEORUM* (1 de 3)

Por

JOÃO PEDRO MOURA

– A BASE

* “Da Natureza dos Deuses”, é o título duma trilogia que o escritor romano Marcus Tullius Cícero, escreveu em 45, antes da nossa era, explanando sobre a teologia grega e romana, mormente a estoica e epicurista.

Aproveitando o título, explano eu, agora e aqui, 2058 anos depois, sobre a natureza de deus: o conceito, a “obra” escrita e a “obra”… final…

A CAUSA PRIMEIRA

            1-Os crédulos da coisa divina, para convencerem os incréus, ou quem quer que seja, da necessidade de deus, costumam enunciar o seguinte silogismo:

– Tudo tem uma causa

– O Universo teve uma causa

– Logo, a causa é deus

2- Examinemos a validade deste silogismo. “Tudo tem uma causa”? Geralmente é verdade, para aquilo que nós conhecemos, objetos, pessoas, qualquer coisa teve uma causa, mais ou menos conhecida, independentemente da sequência de causas que originam uma sucessão de coisas.

3- “O universo teve uma causa”? Aqui nós não sabemos nada. Apenas saberemos remontar a vida atual e a matéria inanimada a uma sucessão retrógrada, que culmina na teoria do Big-Bang, superexplosão primordial, donde teria decorrido toda a matéria, em processo dinâmico de evolução. Não podemos adiantar mais nada, a não ser registar as fases e os momentos cruciais, plausíveis, da História Natural.

Mas insistem os crédulos que tinha de haver uma causa para o universo, neste caso, para o próprio “Big-Bang”, uma vez que tudo teria uma causa e o universo não poderia aparecer sozinho…

…Mas nós não sabemos se houve uma primeira causa! Para que serve especular?! É aqui que entram as religiões…

Aliás, nós só conhecemos a matéria, e como esta nunca poderia ter aparecido do nada (“ex nihilo, nihil”), deveremos concluir que a matéria é eterna, portanto, nunca foi criada.

4- “Logo, a causa é deus”? Em primeiro lugar, para alguém introduzir “deus” num silogismo, teria que justificar a sua existência, para poder operá-lo num raciocínio silogístico; em segundo lugar, como não conseguem demonstrar a existência de deus, impedindo, assim, a configuração duma hipótese divina, introduzem-no meramente como conceito especulativo… e acham ter resolvido o magno problema da origem primordial das coisas…

5- … Mas realmente não está resolvido…

Até porque, pegando no argumento da “causa divina”, como “causa primeira”, opugnaríamos logo este argumento da “causa primeira”, agora aplicado a deus:

– E quem criou deus???!!!

6 – De novo, os recalcitrantes crédulos tratam logo de arranjar uma réplica argumentativa, arengando com a suposta impossibilidade de haver uma causa para deus…

… E por que é que, então, teria que haver uma “causa primeira” para a matéria???!!!

Então, para o seu deus, não haveria uma causa primeira, mas para a matéria tinha que haver?!…

Isto é uma contradição antitética da credulidade religiosa!

OMNISCIÊNCIA, OMNIPOTÊNCIA E OMNIPRESENÇA

7- Omnisciência, omnipotência, omnipresença: estes são os poderes lógicos e indeclináveis de deus, enquanto conceito.

Mas a sua aplicação prática vai levar a situações tais, que invalidam tais poderes…

Deus sabe tudo, pode tudo e está em toda a parte, desde há biliões de séculos, portanto, no passado, no presente e… no futuro.

Ora, tudo aconteceu, acontece e acontecerá no mundo: desastres naturais, acidentes de todo o tipo, assassinatos de “culpados” e inocentes, atos cruéis e virtuosos, vidas boas e más, sofrimento e ventura, etc.

Pelo que, o quesito emerge com todo o vigor:

– Que fez deus para evitar o mal e promover o bem???!!!

Nada!!! As coisas vão, simplesmente, acontecendo…

8- Dizem os crédulos que deus criou, mas deu liberdade às pessoas, para fazerem o que entendessem, mal ou bem…

Mas este argumento é intrinsecamente falso:

O que distingue um ato criativo divino, e consequente e suposta atribuição de “liberdade” ao objeto criado, duma criação humana, é que esta não domina absolutamente a matéria, e, por isso, as criações humanas têm falibilidade.

Um produtor de computadores e outro de automóveis até os podem criar a funcionar bem, mas não podem garantir uma perpétua funcionalidade, sem problemas.

Os objetos criados pelo ser humano têm, de vez em quando, avarias, falhas, degradações, e a manutenção permanente pode obviar a uma parte desses problemas, mas não sempre, nem todos…

9- Agora, o que é que um colosso absoluto tem a ver com seres humanos???!!!

Como é que tal entidade absoluta poderia criar seres humanos, sem saber o que eles iriam fazer a seguir???!!! Então, deus não é omnisciente???!!! E não é omnipotente???!!!

Quando uma pessoa dá liberdade a outra pessoa, aquela não saberá necessariamente o que esta vai fazer. É o que acontece com os pais relativamente aos filhos: aqueles não sabem o que estes irão exatamente fazer, com a obtenção de liberdade.

Uns filhos poderão “triunfar” na vida; outros enveredarem pela marginalidade; uns seguirão caminhos imprevistos; outros previstos, etc.

Estou certo que, se dependesse dos pais, conseguir o melhor para os filhos, com a liberdade que estes alcançaram, viveríamos num mundo virtuoso e venturoso…

Mas o ser humano não é assim…

Agora, deus, que tudo sabe e tudo pode e em todos os lugares está presente, como é que pode “dar liberdade” a criaturas programadas e determinadas apenas e só para aquilo que deus quis???!!!

Por isso é que os crédulos até têm um bordão, “Se deus quiser”, que contraria, exatamente, a suposta “liberdade” que os humanos teriam recebido de deus…

Dizer que deus criou os humanos e lhes deu liberdade, além de ridículo e absurdo, é o mesmo que dizer que deus não sabe o que cada um vai fazer com essa “liberdade”, tal-qualmente, um pai ou uma mãe ou um produtor de transformadores elétricos ou de galinhas também não sabem exatamente se as suas produções vão funcionar corretamente e sempre sem problemas…

Se um indivíduo se tornou criminoso, outro cirurgião, outro ateu e outro crédulo, então, o “nosso” plenipotenciário deus não só sabe isso tudo, previamente, como programou as pessoas para isso, pois que facilimamente as poderia programar para outras coisas…

… Pois que toda a constituição físico-química dos indivíduos e suas interações e suas qualidades genéticas e sociais, que o propendem para o “mal” ou para o “bem”, foram determinadas por deus.

10- Dar liberdade a alguém é torná-lo capaz de fazer o que entender… sem previsibilidade.

Como é que um deus, que sabe sempre o que cada um vai fazer, poderia “dar liberdade”???!!!

11- Se os crédulos, na sua estupidez infinita e fatal, insistem que o “mal” decorre da dádiva divinal de liberdade aos humanos, e que estes fariam o que entendessem, de bem ou de mal, e que o mal estaria, então, nesse desvio de alguns das virtudes preconizadas por deus, então, por que é que acontecem males naturais, como sismos, furacões, tsunamis, tempestades, secas, inundações, causadores de milhares de mortos?!…

… Será que são consequências de deus ter dado “liberdade” à geomorfologia e aos outros elementos inanimados terrestres???!!!…

… E as crianças que morrem, alguns pouco depois de nascerem, de doenças graves???!!! Também serão consequência de se “desviarem” dos “retos caminhos divinos”???!!!

As perguntas multiplicar-se-iam, mas a resposta é só uma: o deus das religiões, tal como no-las apresentam, não criou nada…

…Os crédulos é que acham que há deus!…

CRIADOR, GOVERNADOR E JUSTICEIRO

12- Deus criador???!!! Mas para que é que um colosso absoluto daqueles criaria???!!!

Alguém consegue imaginar, mesmo que vagamente, um motivo para tal deus criar???!!!

Imaginemos o conceito de deus: é imutável, porque não precisa de tomar decisões, nem de ir para aqui nem para acolá, também não tem qualquer vislumbre de tristeza ou alegria, nem vontade de se satisfazer ou o quer que seja, que nos caracteriza a nós, humanos.

Deus criaria, para quê???!!! Para brincar aos computadores realistas, num jogo chamável de Human Games???!!! Para ver o que acontece???!!! Para se entreter???!!! Para brincar, simplesmente???!!!

A ideia dum deus criador ainda é mais absurda do que a sua mera imaginação!

Além de que um deus criador, de coisas, pessoas, animais, massa, energia, invalida, concomitantemente, a ideia dum ser imutável, pois que decidiu criar, transmutando-se duas vezes: ter a ideia (???!!!…) e praticá-la…

… Pelo que não seria eternamente ativo e necessário, manifestando-se, apenas, a partir dum momento.

Então, que teria feito antes das criações???!!!

13- Deus governador???!!! Isto é, um deus que intervém, respondendo favoravelmente a preces (é para isso que servem as orações, não é, crédulos?!…), praticando milagres, portanto, corrigindo falhas…

… Mas tudo isto contraria a perfeição do criador, pois que um criador, como deus, nunca poderia intervir posteriormente para alterar o curso das coisas, sob pena de invalidar a perfeição da obra que fez…

… Já para não questionar por que é que deus só intervém umas vezes, nesta ou naquela pessoa, neste ou naquele evento, e pretere as(os) demais…

14- Deus justiceiro???!!! Sim, sim! O deus judio-cristão, mais o colega islâmico, tem duas sentenças, no Dia do Juízo Final: a sentença paradisíaca e a pena infernal, ambas perpétuas…

Na primeira, os religionários da igreja vencedora (qual será?) seguem, em excursão recreativo-cultural, a caminho do jardim da celeste corte, para não fazerem mais nada durante a eternidade: nem trabalhar, nem andar, nem comer, nem fornicar, nem beber, nada, porque nada precisam de fazer…

Os malvados, como ateus, indiferentes, religionários doutras casas e demais cambada seguirão, em sofrimento atroz, para o inferno, onde serão assados “ad eternum”, mas sem morrerem, que é para o suplício ser permanente e satisfazer, assim, deus… que os criou com esse defeito…

Engraçado, não é?!

Eu não terei razão, quando digo que a religião é a coisa mais estúpida do mundo e… arredores?!