Loading

Categoria: Ateísmo

19 de Julho, 2014 Carlos Esperança

A discussão do batismo na TVI

O objetivo da entrevista a um padre católico e a um ateu, destinava-se a esclarecer, por um lado, a diminuição drástica do número de batizados e, por outro, a legitimidade do batismo de recém-nascidos ou de crianças de tenra idade.

Os temas foram arredados do debate ou insuficientemente comentados por qualquer dos intervenientes. Nem sequer foi explicado o que é o batismo, um ritual de iniciação em várias religiões. Com o batismo – dizem os católicos –, liberta-se a criança do pecado original, naturalmente transmitido pela impureza feminina, e afasta do neófito o demo.

Assim, a cerimónia litúrgica atua como detergente para os pecados e como demonífugo para o maligno cuja existência ainda é reconhecida pelo papa atual, como se comprovou com o reconhecimento que fez recentemente da Associação Internacional de Exorcistas.

O batismo do adulto, além de perdoar o pecado original, confere as virtudes teologais e isenta de penas os pecados anteriormente cometidos. No fundo, a cerimónia do batismo, católico, luterano, anglicano, metodista ou da Igreja Reformada tem igual significação e procura, desde tenra idade, a integração no seio da Igreja respetiva.

Como ateu entendo que o batismo do lactente, da criança ou do adolescente não se deve praticar por dificultar a autodeterminação religiosa do adulto, mas defendo que cabe aos pais o direito de cujo exercício discordo. Judeus e muçulmanos têm um ritual iniciático mais tardio e cruento, a circuncisão, e todos pensam que a entrada na Religião é vitalícia e irrevogável, levando os islamitas o proselitismo ao ponto de a tornarem efetiva com a separação da cabeça do tronco, no caso de apostasia, um direito inalienável de todos os cidadãos.

Quanto à diminuição drástica do número de batismos em Portugal, considero três razões que enumero por ordem decrescente de importância quantitativa. Em primeiro lugar, a rápida redução da natalidade cujas razões são complexas e irrelevantes para este tema.

Em segundo, a progressiva secularização da sociedade com redução marcada da prática religiosa e dos constrangimentos sociais favorecidos pela concentração da população em meios urbanos.

E, finalmente, o empobrecimento acelerado das pessoas. A falta de recursos financeiros, praticamente desnecessários para o batismo, são essenciais para o batizado. O padre não recusa o batismo à criança de um pobre, mas este deixa de o festejar com a festa que lhe está associada, sem vitualhas necessárias, para que à liturgia pia se associe a festa pagã que, em conjunto, constituem o batizado.

Foi esta reflexão que faltou fazer e cuja opinião do padre católico teria sido interessante.

200px-Batismo_Davi_Bergstedt

29 de Junho, 2014 Carlos Esperança

A santidade da vida

Texto da autoria de George Carlin, enviado por Paulo Franco

O que mais se ouve, no debate sobre o aborto, é uma afirmação chamada “santidade da vida”. Acreditam nisso? Pessoalmente acho que é um monte de tretas.

A vida é sagrada? Quem disse? Deus? Se você olhar para a História, vai ver que Deus é uma das principais causas de morte. Tem sido assim durante milhares de anos. Hindus, Muçulmanos, Judeus, Cristãos matando-se uns aos outros porque Deus lhes disse que era uma boa ideia. “A espada de Deus”, “O sangue do cordeiro”, “A vingança é minha”. Milhões de filhos da p…… mortos. Milhões de filhos da p…… mortos, e tudo porque deram a resposta errada sobre Deus. -“Acredita em Deus? – Não. Pum, morra. Acredita em Deus? – Sim. Acredita no meu Deus? Não. Pum, morra. O meu Deus é melhor do que o teu Deus.

Durante milhares de anos, as maiores e mais ferozes guerras, as mais brutais e sangrentas, foram baseadas na intolerância religiosa, o que é ótimo para mim pois quando os crentes se matam uns aos outros, eu rolo no chão de tanta alegria. Então não me venha para mim com esse papo furado da “Santidade da vida”. Sabem como surgiu essa história da “Santidade da vida”? Nós a inventamos, e sabe porquê? Porque estamos vivos. Interesse próprio, é claro. O Homem cego pelo seu egocentrismo. Os vivos têm muito interesse em promover a ideia de que a vida é sagrada. Não vemos o Mussolini, ou o JFK, nem o Elvis Presley por aí a espalhar essa baboseira de que a vida é sagrada.

Nem uma palavrinha. Isto porque Mussolini, JFK, e o Elvis estão mortos. Isto só interessa aos vivos.

Tudo isto parte de uma perspetiva unilateral. É o que mais nos convém. É uma daquelas coisas que dizemos para nos sentirmos nobres.

“A vida é sagrada” faz-nos sentir nobres. Além disso, tem outro lado curioso. “A Santidade da vida” não se aplica às células cancerígenas, certo? Você nunca vê num para-brisas um adesivo dizendo “Salvem os tumores” ou “Lutemos pelo progresso do melanoma”.

Não, vírus, bolor, mofo, ervas daninhas, fungos, coliformes fecais, chatos e bactérias infeciosas não têm nada de sagrado. Todas estas manifestações de vida não parecem merecer do mesmo padrão de nobreza que os Humanos, no entanto são igualmente formas de vida. “A santidade da vida” apenas se aplica a um universo restrito, e seleto, por sinal.

Podemos decidir quais são as formas de vida que consideramos sagradas e eliminar o resto. Um negócio bem interessante, hein? Está vendo agora? NÓS É QUE INVENTAMOS ISSO TUDO!!!

“Quanto mais estudo as religiões, mais estou convencido que o Homem nunca adorou nada além dele mesmo”. Richard Francis Burton.

“Acreditar é mais fácil do que pensar. Daí existirem muito mais crentes que pensadores.” Bruce Calvert.

28 de Junho, 2014 Carlos Esperança

Resposta a um inquérito académico 5/5

P – Mais algum comentário que gostaria de deixar para informar a minha tese sobre o tema da liberdade religiosa em Portugal?

Resposta – Há aspetos chocantes no que diz respeito ao oportunismo político, na ânsia de ganhar votos. É vulgar as Câmaras Municipais pagarem excursões a Fátima a idosos internados em lares. As Forças Armadas e militarizadas participam em procissões, e o próprio presidente da República prestou-se a presidir à Comissão de Honra da canonização de Nuno Álvares Pereira, canonização que se cobriu de ridículo com a atribuição de um milagre à «cura do olho esquerdo de uma cozinheira de Ourém, Guilhermina de Jesus, queimado com óleo fervente de fritar peixe». A atribuição do milagre ao guerreiro medieval transformou um herói em colírio, para gáudio da população.

A existência das capelanias já referidas, a remuneração dos professores de Educação Moral e Religião Católica, disciplina de oferta obrigatória, com docentes nomeados e exonerados discricionariamente pelos bispos, e com o tempo de serviço contado para efeitos legais, ultrapassando os colegas que ficaram sem colocação em disciplinas para as quais não encontraram vaga, é uma ofensa à laicidade.

O pensamento da Associação Ateísta Portuguesa (AAP) está plasmado nos documentos publicados no sítio próprio, onde se encontram igualmente os seus estatutos, objetivos e nomes que integram os corpos diretivos.

27 de Junho, 2014 Carlos Esperança

Ainda o dia nacional do peregrino

Vivemos num país disfuncional onde o futebol é mais valorizado do que o futuro dos portugueses, onde, no rescaldo da eliminatória da seleção nacional, estropiada pelo calor e esforço, os deputados da direita instituem o «dia nacional do peregrino».

Perdido o orgulho da bola, ganha-se o campeonato da fé. Os cachecóis e outros adereços ficaram obsoletos e, por isso, os deputados agarraram-se ao “dia nacional do peregrino”.

Não se vendem camisolas, chapéus e cachecóis, vendem-se santinhos, pagelas e virgens. O negócio do futebol terminou precocemente? Antecipa-se o centenário das piruetas do Sol, das acrobacias da virgem nas azinheiras e do voo picado do anjo, na Cova da Iria.

A Seleção baldou-se aos golos? Os deputados preparam o concurso das missas. Perde-se o campeonato mundial de futebol mas ganha-se o certame nacional das maratonas pias. Em vez do dia de S. Ronaldo instituiu-se o dia do peregrino, substituíram-se jogadores por pastorinhos, o Brasil por Fátima, a bola pelo hissope e o treinador por um cardeal.

Em vez de fintas há genuflexões, cruzes, terços, caminhadas medievais a um santuário e relança-se a indústria das velas.

O Estado é laico, mas os deputados não. São livres de acreditar que a Lúcia, a quem um devota do norte, viu no cadáver os dois dentes que restavam e logo a intitulou bidente, é a santa que faltava na luta contra a República e no apoio a Salazar. Em Espanha, JP2 e B16 criaram tantos beatos e santos franquistas que se temeu o esgotamento de defuntos normais nas hostes da ditadura.

Em Portugal não há santos salazaristas, é urgente que a Irmã Lúcia seja canonizada, que obre dois milagres comprovados, que cure a sarna de uma freira avessa ao banho ou o Parkinson de outra com uma pagela de João Paulo II sob o hábito.

Que interessam o défice, a pobreza, a dívida, o desemprego e a fome se os bens terrenos podem ser trocados pela fé e o bem estar efémero da vida pela felicidade eterna?

Bem-aventurados deputados, preocupados com a salvação das almas dos eleitores.

27 de Junho, 2014 Carlos Esperança

Pensamento

Se não estivesse convencido de que foram os homens que criaram Deus, aceitava a teoria de José Cardoso Pires, de que Deus criou o cão e, para se ver livre dele, criou o homem.
(In ‘República dos Corvos’)

27 de Junho, 2014 Carlos Esperança

Resposta a um inquérito académico (4)

P – Existe verdadeira liberdade religiosa em Portugal comparativamente à generalidade dos países europeus?

Resposta – Sim, sem hesitação. Existe inclusivamente a liberdade de se ser agnóstico, cético, ateu, em suma, a de se ser livre-pensador. A intolerância dos crentes é idêntica à que pode ser encontrada em ateus. É um defeito herdado da ditadura, a intolerância para com o que é diferente.

Apesar dos privilégios de que goza a Igreja católica, a liberdade de culto, de qualquer culto, é hoje uma realidade que não merece contestação.

26 de Junho, 2014 David Ferreira

Deus e futebol

O jogador está no centro da área. Desmarca-se para receber a bola. Sente uma leve brisa no ombro e atira-se ao chão. O árbitro apita. Grande penalidade. O jogador levanta-se, exultante, ergue os braços ao céu e agradece a Deus. Perante os protestos do jogador adversário que também olha para o céu e abana a cabeça, incrédulo, clamando inocência. Como é possível, meu Deus?!

Neste jogo da vida pode um Deus omnipotente acudir a todos os pedidos e orações dos que nele creem? Não pode. A concessão de um simples pedido, de um desejo ou de um sonho a um indivíduo em particular quebraria a ordem natural, o rumo aparentemente caótico dos acontecimentos, e provocaria demasiadas incoerências e injustiças. Nada mais faria sentido, sendo que o que nos faz sentido varia de acordo com a adaptação constante da autoconsciência ao plano de existência causal em que evoluímos.

É precisamente o resultado do desempenho dessa autoconsciência que permite a recompensa ao farsante e a consequente penalização ao inocente, ao mesmo tempo que converte a culpa em graça por intermédio de uma reconfortante réplica do ego projetada extrinsecamente, a que dá o nome de Deus, um super-eu.

Neste jogo mais arbitrário que de livre-arbítrio, o árbitro, o juiz, o que decide a verdade de um facto ou de uma ocorrência, somos todos nós. Os que experienciamos, os que ajuizamos. Sempre iludidos pelas aparências devido às nossas limitações físicas e sensoriais. E para repor a verdade e a justiça não precisamos de Deus. Apenas de tecnologia.

26 de Junho, 2014 Carlos Esperança

Resposta a um inquérito académico (3)

P –  O que pensa do avanço e aplicação do secularismo em Portugal?

Resposta – O avanço do secularismo (doutrina da filosofia inglesa que reivindicava a administração laica dos bens eclesiásticos e, mais tarde, significou a confiscação de bens eclesiásticos) tem hoje um significado diferente, sendo a doutrina que tende a emancipar as instituições do seu carácter religioso. Neste sentido, e só neste, é defendido pelos ateus da Associação ateísta Portuguesa (AAP) que, para além de não acreditarem em qualquer deus, seja o Deus abraâmico ou outro, se reveem na Declaração Universal dos Direitos Humanos e no respeito pela Constituição da República Portuguesa.

No entanto, dada a conjuntura económica atual, com o empobrecimento da população portuguesa, não estou certo de que o secularismo esteja ainda a avançar. A prática religiosa católica caminhava para valores residuais e nota-se agora uma estabilização, afirmação que faço sem rigor científico, dada a pouca transparência da Igreja católica a revelar o que se passa no seu interior, e um aumento progressivo de práticas religiosas por outras Igrejas cristãs que disputam a fé. Em períodos de crise, as crenças têm tendência a exacerbar-se e constituem uma âncora psicológica e, às vezes, material, com o contributo das Igrejas.

Permito-me recorrer a duas citações que definem o carácter democrático e plural do ateísmo que perfilham os sócios da AAP:
«O Estado também não pode ser ateu, deísta, livre-pensador; e não pode ser, pelo mesmo motivo porque não tem o direito de ser católico, protestante, budista. O Estado tem de ser cético, ou melhor dizendo indiferentista» Sampaio Bruno, in «A Questão religiosa» (1907).

«O Estado nada tem com o que cada um pensa acerca da religião. O Estado não pode ofender a liberdade de cada qual, violentando-o a pensar desta ou daquela maneira em matéria religiosa». Afonso Costa, in «A Igreja e a Questão Social»

25 de Junho, 2014 Carlos Esperança

Resposta a um inquérito académico (2)

P – Num estado constitucionalmente secular e laico o que pensa da Concordata e desta num contexto em que existe a Lei da Liberdade Religiosa?

Resposta – Num Estado secular e laico a Concordata é uma aberração. As religiões deviam estar em igualdade e ao Estado competir apenas a defesa da liberdade de culto, uma vez que a liberdade de associação e reunião estão amplamente asseguradas.
A Lei da Liberdade Religiosa tornou-se uma necessidade, face à Concordata, para dar migalhas que escondessem os privilégios escandalosos da Igreja católica que, um pouco à semelhança dos países muçulmanos, vai aumentando progressivamente a sua influência no ensino, saúde e assistência, transformado direitos constitucionais, numa época de crise, em assistencialismo pio.
Num Estado laico o direito à crença e à descrença deve ter igual valor e não cabe ao poder de turno definir o que é a verdade religiosa ou ser um instrumento de propagação da fé e de sustentação de qualquer culto.

A existência de capelanias hospitalares, militares e prisionais (sempre católicas) são um instrumento de discriminação das outras confissões religiosas.