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Categoria: Ateísmo

15 de Dezembro, 2024 Onofre Varela

O Natal de um ateu

Já me têm perguntado: “como é o Natal de um ateu?”. É uma curiosidade motivada pela ideia generalizada de que a sociedade está dividida em segmentos. Há o segmento religioso, o segmento político e o segmento futebolístico (no mínimo…). E também há quem pense que em cada segmento as pessoas funcionam de modo diverso das outras.

Para satisfazer os curiosos… cá vai:

Não posso falar pelos ateus em geral, porque cada pessoa é ela própria e não o decalque de quaisquer outras (consideração válida para ateus e religiosos); como os meus amigos sabem, religiosamente sou ateu, politicamente sou de Esquerda, e em futebol… sou contra! Não gosto de futebol, nunca joguei a bola nem entrei num estádio e não vejo campeonatos, nem pela televisão. Costumo dizer aos meus amigos que, para mim, o futebol está ao nível de Deus… não existe!

Quanto ao Natal… é uma festa religiosa das sociedades cristãs. Cada um de nós, embora seja dotado de raciocínio próprio, é sempre o resultado do meio em que nasceu – cresceu e foi educado – não lhe podendo fugir. O Natal e a Páscoa são festas religiosas do meio que me fez, mas também são profanas. A Páscoa nunca teve significado no meu meio familiar; é um Domingo como qualquer outro… sempre assim se procedeu em minha casa porque “a ressurreição” (no figurino em que os religiosos cristãos a apresentam) não tem sentido.

Já o Natal é a “Festa da Família”. É um dia em que se reúnem familiares mais chegados, habitualmente separados por factores profissionais ou de residência distante, num jantar comunitário (designado por Consoada, palavra derivada do latim Consolata que quer dizer “refeição partilhada”) onde se sacrifica um bacalhau salgado, já sacrificado no Mar do Norte, regado com azeite de Trás-os-Montes e acompanhado de um bom vinho. Há sobremesas doces e distribuição de prendas, e findo o serão vou dormir sem assistir “à missa do galo”.

Imagem da Unsplash

Portanto, retirando a missa e as orações dos Católicos (que nem todos cumprem), o meu Natal de ateu é igual ao Natal de um religioso!

As datas religiosas da Igreja Católica, como Páscoa e Natal, têm a ver com a vida de Jesus Cristo, enquanto ícone deífico dos cristãos… mas também estão ligadas à Natureza, aos equinócios do Inverno e da Primavera. Toda a vida dos Seres Humanos é baseada, em primeiro lugar, na Natureza, e depois na sociedade e no seu folclore próprio e sazonal, que pode ser laico ou religioso, mas que é, sempre, folclore inerente a cada grupo social, que a Antropologia, a Etnologia e a Sociologia, estudam e explicam.

O Pinheiro e o Presépio

Nos meus tempos de miúdo ia cortar, numa bouça próxima de casa, um pequeno pinheiro recém-nascido, que enfeitava com bugalhos forrados com prata retirada dos maços de cigarros (encontrados no lixo e no chão da rua) rematando a obra com bocadinhos de algodão a fingir de neve (se tivesse vinte e cinco tostões para comprar pequenas bolas de vidro, coloridas e muito frágeis, e dois pacotinhos de minúsculos chocolates amarrados com uma fita de seda, para pendurar na árvore… era uma festa e a obra ficava espectacular!) sem ter consciência de que a tradição da árvore de Natal estaria ligada às crenças dos povos pagãos do norte da Europa, principalmente à celebração do Solstício de Inverno – a noite mais longa do ano – como homenagem à Natureza adormecida.

Já o Presépio encerra uma outra história para além da relação com o Solstício de Inverno. Uma breve consulta ao Novo Testamento mostra-nos que de entre os evangelistas que nos falam da história de Jesus nenhum deles narra a cena que estamos habituados a ver designada por Presépio. Mateus (2:11) diz-nos que os reis magos “entrando na casa acharam o menino com Maria”. Logo, o estábulo da tradição não existe nesta referência, já que o local do nascimento seria “uma casa”.

Marcos e João omitem o nascimento de Jesus, referindo-o já como adulto, quando é baptizado nas águas do rio Jordão por João Baptista.

Lucas (2:7) já nos diz que Maria “deu à luz o seu filho primogénito e envolveu-o em panos, e deitou-o numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na estalagem”.

A necessidade de José e Maria terem um lugar para pernoitar, devia-se ao facto de se terem deslocado de Nazaré, onde viviam, para Belém, na obrigação de se recensearem, no cumprimento de um decreto do imperador César Augusto que obrigava ao recenseamento de todos os cidadãos; e o casal partira para o local quando Maria já estaria num estado avançado de gravidez.

A imagem do Presépio que hoje figura na maioria das casas e nas montras das lojas na época natalícia, teve origem numa ideia de Francisco de Assis que, em 1223, festejou o Natal fora da igreja, montando uma manjedoura na floresta de Greccio, Itália, colocando junto dela um boi e um burro como elementos tradicionais de um estábulo.

O povo não entendeu de imediato o significado daquela encenação, mas durante a Idade Média o costume espalhou-se e, em 1567, a Duquesa de Amalfi mandou montar um grandioso Presépio com 116 figuras representando o nascimento de Jesus Cristo com a adoração dos reis magos, dos pastores e com anjos a cantar.

A partir do século XVIII o costume espalhou-se pelas casas dos crentes, mantendo-se até hoje… e convenhamos que o Presépio, enquanto decoração natalícia, fica muito bem nas montras das lojas e nos centros comerciais, nesta época de chamamento ao consumo desenfreado… conotando uma festa de cariz religioso, com o consumismo.

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)

8 de Dezembro, 2024 Onofre Varela

Crer é um acto intelectual

Muito provavelmente a ideia de Deus (dos deuses) entrou em processo de depuração logo após a termos criado, por sentirmos que o caminho dos deuses, afinal, era uma vereda muito mais estreita do que a estrada que ambicionávamos pisar. Razões diversas estarão na base da motivação que nos levou à criação das divindades – que imaginávamos ter-nos oferecido o mundo, a vida e a felicidade eterna – e à eleição de um deus particular para cada momento dos dias que os deuses nos ofereceram para os cultuarmos. Começamos por criar um panteão onde colocamos os deuses da nossa invenção e, com o evoluir do pensamento,

destruímos o panteão e elegemos um único deus (um deus-single) para nos servir a todo o tempo e em cada situação de vida.

A ideia do divino é comum a todas as sociedades porque o Ser Humano é único e universal. Somos o mesmo ser em todas as latitudes e em todos os tempos, e as motivações que nos levam à adoração do que quer que seja, são universais; apenas modificadas por questões culturais de cada povo e em cada época.

Em todas as sociedades há um fundo comum embelezado com as crenças, às quais não é estranha a humana necessidade da introspecção, a inquietude do acaso, a fuga à solidão e às agruras da Natureza, e o sentimento da insegurança, acrescentando o medo da morte como “medo máximo” que eternamente nos consome.

O vencer do caminho que nos conduziu ao abandono de um panteão, pretensamente (mas também enganadoramente) protector de todos os males, e ao apuro de um único deus, acabará por dispensar, também, o deusJeová (Alá) – criado pelos Hebreus, reciclado por Jesus Cristo e adoptado (e adaptado) por Maomé – que sobrou da purga que o passar do tempo e o evoluir do pensamento promoveu no panteão que gregos e romanos herdaram da civilização mesopotâmica.

Na verdade antropológica, “deus habita em nós”. Isto é: existe no nosso pensamento… mas não passa de uma ideia, não se encontrando em mais lado algum fora da cabeça de quem crê. A crença num deus (ou em deuses e santos) é uma característica da nossa espécie de “Sapiens”, a qual nos diferencia de todos os outros animais nossos companheiros da vida na Terra.

Imagem gerada por IA

Porém devemos ter a consciência de que a crença é um acto intelectual. Aqueles ateus “em princípio de carreira” que vociferam contra tudo quanto “cheira a incenso”, se não tiverem essa consciência também não têm discurso que mereça ser ouvido. Se cremos, é porque sentimos que precisamos de crer; se criamos deus à nossa imagem e semelhança, foi porque sentimos necessidade de o fazer, já que o Homem só cria aquilo de que necessita. (A exploração social e económica que dessa ideia se faz, por uma elite exploradora de tal sentimento… é que já é outra conversa!…)

O sentimento da religiosidade é comum a todos os humanos independentemente das geografias em que se encontrem, e só está vedado aos restantes animais por não terem intelecto. Foi a nossa capacidade de raciocínio, a inteligência, a sensibilidade e o sentido estético, que nos levou à criação da Arte, ao entendimento do belo e à criação de deuses (que depois transformamos no Deus único).

Esta faceta criativa que nos caracteriza, faz de nós uns seres especiais. No entanto, quando em discordância com os nossos semelhantes, somos capazes de adoptar comportamentos iguais aos de um qualquer animal predador porque a nossa origem natural, enquanto animais, é a mesma!… 

Embora raciocinemos, deixamos, imensas vezes, a nossa sensibilidade tormentosa comandar-nos tomando conta da razão… e, por esse caminho, se bem virmos, até ficamos em patamares inferiores relativamente aos irracionais nossos companheiros de reino, porque enquanto que eles só guerreiam por alimento, por fêmea e pelo domínio do grupo, nós fazêmo-lo pelas mesmas três razões dos irracionais que consideramos inferiores… e ainda acrescentamos a lista, deixando-nos tomar por uma irracionalidade e uma cupidez que demonstram o pior da nossa condição animal, incluindo na lista das malfeitorias a crença em Deus quando a usamos como arma discriminatória e até mortífera (embora, ao mesmo tempo, o louvemos e lhe cantemos loas… o que sublinha a nossa imponente estupidez).

Isto parece-me incongruente com a capacidade que temos de raciocinar… mas a verdade é que nós somos assim… somos um produto natural ainda muito mal acabado!… (Espero que a evolução natural “lime as arestas” e nos melhore… mas isto, se calhar, também já é crença!).

Nós só erramos porque somos imensamente ignorantes… alguém disse que  “o erro é uma ignorância que se ignora”. A ignorância também é uma das nossas características. Todos nós somos ignorantes, até mesmo os sábios… que só o são no seu tempo e no seu ramo… e, mesmo assim, com limites.

(Por preguiça de aprender novas regras, o autor não obedece ao último Acordo Ortográfico. Basta-lhe o Português que lhe foi ensinado na Escola Primária por professores altamente qualificados)

29 de Novembro, 2024 Onofre Varela

Levanta-te e pensa

«Pensar é o trabalho mais difícil que existe, o que é provavelmente a razão porque tão poucos se envolvem nele»

(Henry Ford. 1863-1947)

A minha crónica de hoje é a transcrição do texto de abertura da 2ª Edição do meu livro “O Homem Criou Deus”.

O seu título é uma adaptação do que se lê no Novo Testamento, na cura do paralítico de Cafarnaum: “Levanta-te e anda” (Mateus: 5; 6), cujo figurino é usado em comédia no programa televisivo “Levanta-te e ri”.

Tal como o exemplo desta frase que foi adaptada repetidamente e usada em diferentes situações, também a vida de cada um é uma repetição da vida de todos nós, com mais ou menos nuances que emprestam outro colorido à nossa vida, tal como as diferentes fórmulas que glosam a frase bíblica que conduziu ao título desta prosa.

Ninguém inventa a sua vida… todos a temos oferecida pelo nascimento que não pedimos (o filósofo Agostinho da Silva dizia que “nasce a gente de graça, para depois ter de ganhar a vida!)… depois, todos nós a podemos melhorar ou piorar de acordo com as acções usadas no preencher dos dias, ornamentando-a com as melhores cores que conseguimos engendrar, ou pintando-a a preto e branco… embelezando-a ou borrando-a.

A escolha é nossa… mas também pode ser condicionada pela sociedade.

Por muito má que consideremos ser a nossa vida, há sempre um momento para nos determos numa reflexão suficientemente profunda e encontrarmos algum modo de corrigirmos o rumo que, por qualquer razão, intuímos não nos conduzir para o melhor dos destinos que para nós sonhamos.

Esta reflexão filosófica é uma função positiva da Religião… talvez a principal… não será a única porque é acompanhada pelo processo do luto que menoriza o sofrimento.

Porém (há sempre um “porém” que pode fazer a diferença das nossas escolhas) devemos estar atentos à corrente do “rio religioso” que decidimos navegar!… Ela nem sempre nos dirige para a melhor foz, nem nos conduz pelo melhor leito!

A corrente pode transportar-nos para águas mansas e calmas, permitindo-nos a contemplação das margens que as guiam, ou, pelo contrário, podem desaguar em desfiladeiros tormentosos com correntes imparáveis de efeitos desconhecidos quando as margens, ao invés de guiarem a corrente da água… a comprimem e convulsam!

A escolha da rota é sempre do discernimento de quem navega o rio da Religião…

(Por preguiça de aprender novas regras, o autor não obedece ao último Acordo Ortográfico.

Basta-lhe o Português que lhe foi ensinado na Escola Primária por professores altamente qualificados)

OV

21 de Novembro, 2024 Carlos Silva

Mensagem de Natal da IC na RTP

Imagem: RTP

Atribuir à Igreja Católica ou a qualquer outra confissão religiosa tempo de antena em canais de televisão públicos, pagos pelo contribuinte, viola o princípio constitucionalmente definido da Laicidade da República Portuguesa.

Havendo um parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, segundo o qual “toda a publicidade destinada a promover uma confissão religiosa, ou que tenha por objeto ideias religiosas, deverá ser considerada ilícita, incorrendo o infrator em responsabilidade contraordenacional”, não se compreende, porque não foi tomada qualquer ação por quem de direito.

Se ao Provedor (a) do Ouvinte e do Telespectador compete “representar e defender, no contacto com as Empresas de Serviço Público de Rádio e de Televisão, as perspetivas dos Ouvintes e dos Telespectadores diante da oferta radiofónica e televisiva”, o que é que o mesmo fez para evitar tal ilicitude?

Católicos, evangélicos, muçulmanos, hindus, judeus, budistas… qualquer crença têm o direito de transmitir a suas “mensagens”, mas, obviamente, nos locais e canais próprios, para os seus fiéis seguidores, ou para aqueles que veneram amigos imaginários e paguem o dízimo ou esmola… não para a população em geral e muito menos para pessoas minimamente lucidas e racionais, que normalmente estão vacinadas contra os seus dogmas.

Não o podem fazer numa televisão pública paga por todos os contribuintes, sobretudo aqueles que respeitam a separação e laicidade do Estado.

Não é lícito!… muito menos moral, o Estado favorecer, publicitar e patrocinar uma religião específica (IC) a quem atribui inúmeras regalias e sobretudo isenções de impostos.

Já chega de discursos “politiqueiros” … “jornadas religiosas” … “lutas contra o aborto” … “lutas contra a eutanásia” … “lutas contra a homossexualidade” …

(…)

A RTP, enquanto órgão de informação, tem obrigação de oferecer aos seus telespectadores e contribuintes um serviço público livre e independente do poder político, económico e religioso.

AGORA ATEU (II), 2023-12-24

13 de Novembro, 2024 Carlos Silva

Despertar

Imagem gerada por IA de Artguru

A determinada altura da vida atingimos um determinado patamar de consciência que nos confere um nível de perceção exclusivamente racionalista.[1]

A determinada altura da vida deixamos de temer criaturas “infernais” e aspirar a “paraísos” supranaturais.

A determinada altura da vida, somos inevitavelmente arrastados pela corrente de observação objetiva da realidade.

A determinada altura da vida a consciência atinge praticamente o seu auge e assimilamos que só AGORA podemos ser realmente felizes.

A determinada altura da vida deixamos de ter pressa de viver e queremos apenas desfrutar.

A determinada altura da vida queremos simplesmente conhecer e esquecer tudo o que inutilmente nos impuseram.

A determinada altura da vida queremos simplesmente deliciar com esta maravilhosa paisagem com que diariamente nos deslumbramos.

A determinada altura da vida queremos simplesmente estar em paz, connosco e com todos os que nos rodeiam.

A determinada altura da vida queremos simplesmente saborear o mais simples dos milagres…

A VIDA!

Aspiramos então a ser apenas nós…

Livres e satisfeitos!

Aspiramos então a sentir e que nos deixem sentir completamente.

Aspiramos então a pensar e que nos deixem pensar da forma mais racional possível.

Aspiramos então a amar e sobretudo que nos deixem amar quem e o que realmente amamos.

É então que assimilamos que nunca é tarde para Sonhar…

É então que assimilamos que nunca é tarde para Amar…

É então que culminamos que nunca é tarde para Viver…

E nunca é tarde para DESPERTAR!


[1] Numa fase mais precoce, traduzida pela descoberta e deceção que conduz ao desacreditar do “pai natal” e de todas as figuras do universo imaginário.

Numa fase mais matura, alicerçada no crivo do contraditório e na consciência da realidade, traduzida na contínua desconstrução e desmistificação de todos os dogmas previamente incutidos.

É, pois, normalmente neste apogeu de plena capacidade física e intelectual, que é atingido o desacreditar lógico e racional em todas as entidades ditas “divinas; o ponto de perceção do ideal divino como mero conceito individual e abstrato, factualmente inexistente fora do contexto mental humano”.

A óbvia assimilação e conclusão do ato mental, característico da espécie humana, que varia de acordo com contexto sociocultural onde se produz.

AGORA ATEU (I), 2017-03-06

31 de Outubro, 2024 Carlos Silva

“Manual de maus costumes”

Imagem: internet


Saramago apelidou hoje a Bíblia… “Manual de maus costumes”, o que provocaria grande indignação a algumas figuras religiosas… recordo apenas alguns adjetivos…

“vergonhoso”, “ofensivo”, “ignorante” …


Ao assistir aos noticiários, pude efetivamente constatar que as suas palavras tiveram grande impacto social e sobretudo um enorme desconforto na cúpula da Igreja Católica.

Curiosamente os adjetivos que me vieram à mente seriam…

lucidez, racionalidade, inteligência…

Replicou… (J.S.)

Vergonhosos” e “ignorantes” são os ditos “representantes de um dito Deus na Terra” não terem consciência de que “Nada disto existiu, está claro; são mitos inventados pelos homens, tal como Deus é uma criação dos homens”, mesmo até que o homem em si tenha realmente vivido!

Sobre o dito livro, que também já tinha tentado ler, mais do que desilusão mental apenas conseguiria confirmar ainda mais a minha delusão pessoal e um tremendo esforço para não adormecer…

É realmente uma enorme demência nascer e crescer com a Bíblia ao lado e não despertar… ou despertar tão tarde para a liberdade e lucidez da restante literatura.

É realmente uma enorme demência ver como sob a sua prolongada escrita “passaram mais de dois mil anos e dezenas de gerações, sempre sob a “dominante de um Deus cruel, invejoso e insuportável”.

Mais abomináveis ainda, são as inúmeras e trágicas guerras que ao longo da história se travaram em nome da dita religião e realmente, “as religiões nunca serviram para aproximar os seres humanos uns dos outros”. Mesmo sem guerra, o que hoje constatamos, é precisamente o contrário!

Mais irracionais ainda, são as inúmeras formas assumidas pelo dito Ser cuja única aparência realmente só mesmo no domínio das ideias e quase sempre assimilando formas humanas… um ser “do outro mundo”, capaz de “não fazer absolutamente nada, de criar todo um Universo, não se sabe bem porquê, nem para quê, em apenas seis dias, descansando depois ao sétimo… e depois, até hoje, decidiu nada mais fazer!…”

Mais impressionante ainda, é ainda hoje ser “a grande resposta para a salvação de toda a Humanidade”.


AGORA ATEU (I), 2009-10-19

28 de Outubro, 2024 João Nascimento

Apenas Humano

Imagem criada com o DALLE-4

Escrevi este poema há décadas, quando finalmente percebi, com genuína satisfação, que eu era mais um dos que simplesmente não conseguem acreditar. Não só ansiava por viver sem ilusões, como sabia que devia fazê-lo – não podia ser de outra maneira. Nunca olhei para trás.


Sou humano, susceptível a doenças,

a enfermidades,

e ao inevitável fim.

Estou à mercê,

e à clemência,

do que quer que me infeste.

Estou cheio de falhas,

mentiras, e enganos.

Estou preso,

numa luta incessante,

comigo mesmo,

contigo,

e com o mundo à minha volta.

Os meus defeitos e imperfeições

perseguem-me,

e sempre o farão.

Sou a causa,

a raíz de toda a minha miséria.

Sou a razão pela qual podes magoar-me.

Sou o defeito,

o erro,

que vivo dia após dia.

Sou humano,

não devias confiar em mim.

Sou mortal,

não tenhas fé em mim.

Mas, tu também és humano,

com os teus defeitos,

com as tuas imperfeições,

que eventualmente me aceitarão.

Sou humano,

não há nada de extraordinário em mim.

Há 8 mil milhões de outros,

exactamente como eu.

Sou humano,

é o pior,

e o melhor em mim.

Sou culpado,

serei sempre.

Inventei,

desenhei,

e imaginei,

o Deus que me criou.

Sou apenas humano,

mas espero sempre mais de mim.

Tão frágil,

tão delicado,

e vulnerável,

magoado pelo simples existir.

Sou apenas humano,

não é fácil.

Sou humano, 

perdoa-me.

27 de Outubro, 2024 Carlos Silva

Diz-me mulher

Imagem: Internet


Diz-me mulher

Filha
Mãe
Avó
Esposa
Amiga
Companheira

Diz-me mulher

Como podes permitir que
Um homem
Te roube o direito à vida
Te roube o direito à liberdade
Te roube a autonomia de pensar
Te torture e imponha maus tratos
Te viole física e moralmente até ao íntimo do ser
Te imponha o direito de escolher
Te negue o direito à informação e educação
Te impeça de votar e participar neste progresso
Te humilhe simplesmente por seres mulher

Diz-me mulher

Como podes permitir que
Um livro
Exclusivamente escrito por homens e para homens
Exclusivamente baseado no domínio dos homens sobre as mulheres
Absolutamente machista absurdo e obsoleto
Te peça que sejas submissa
Te faça objeto propriedade e mercadoria
Te cubra o corpo e a mente
Te estupre e atire pedras até à morte
Te cegue e crucifique por perderes a virgindade
Te queime pelo adúltero delito de amares alguém
Um livro escrito com sangue suor e lágrimas
Que de ti faz demónio do bem e anjo do mal
Que te rouba a vida e tudo o que é natural

Diz-me mulher

Como te pudeste deixar seduzir
Por tão encantadora serpente
Como pudeste ter ingerido tão pecaminoso fruto
De tal proibida árvore
Como pudeste ter nascido
De tal dita virgem maria
Sem amar verdadeiramente

Diz-me mulher

Tu que dás e concedes esta vida
Tu que dás alento e alimento
Tu que dás este canto e encanto
Tu que dás esta inspiração e admiração
Tu que dás este sentimento e sensualidade
Tu que tudo dás na realidade
Peço que neste preciso momento
Soltes o cabelo ao vento
Soltes a voz com todo o alento
Quero ouvir o teu grito até ao mundo dar volta
Quero ouvir o teu grito de volta e de revolta

BASTA

Não
Não fiques aí parada
Solta e desvenda a verdadeira beleza do teu rosto
Solta e descobre o verdadeiro encanto do teu sorriso
Solta e manifesta todas as razões do teu coração
Tu és legitimamente a única dona do teu corpo
Tu és autenticamente a única dona do teu ser

Desperta mulher

Desperta o corpo da tua admirável mente
E ama verdadeiramente
Ama plenamente a liberdade
Ama perdidamente aquele homem
Que simplesmente te quer

MULHER


AGORA ATEU (I), 2019-05-26

25 de Outubro, 2024 Eva Monteiro

Um Gesto de Altruísmo do Prof. Ricardo Oliveira da Silva

A AAP – Associação Ateísta Portuguesa teve recentemente o prazer de se fazer representar numa conversa online sobre o Ateísmo em Portugal e no Brasil. Esta conversa decorreu no dia 9 de Outubro no Canal de Youtube Ativistas Ateus do Brasil, com o objetivo de iniciar uma ponte entre as comunidades ateístas dos dois países.

Prof. Ricardo Oliveira da Silva

Desta conversa decorreu o contacto com o Professor Ricardo Oliveira da Silva que possui uma Graduação em História pela Universidade Federal de Santa Maria (2005) e Mestrado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2008). É Doutorado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2013). Tem experiência na área de História, com ênfase em Historia das Ideias, Historiografia e teoria da História, História do Brasil republicano e História do Ateísmo. Atualmente é líder do Grupo de Pesquisa Ateísmos, Descrenças Religiosas e Secularismo: história, tendências e comportamentos, e faz parte do Grupo de Pesquisa História Intelectual, Produção de Presença e Construção de Sentido e do grupo História Intelectual e História dos Conceitos: conexões teórico-metodológicas. Esses grupos estão registrados no CNPq. É também membro do fórum acadêmico International Society for Historians of Atheism, Secularism, and Humanism (fonte).

Como autor prolífico na área do Ateismo, o Professor Ricardo Oliveira da Silva prontificou-se a disponibilizar aos nossos leitores algum do seu material sobre o tema, que aqui se reproduz.

A AAP agradece este gesto de incrível altruísmo que me muito ajudará a nossa comunidade a melhor compreender o ateísmo, em particular no Brasil.

14 de Outubro, 2024 Carlos Silva

Apostasia

Imagem: Internet


Batizaram-me quando apenas tinha três meses de vida!

Mergulharam-me em “água benta” com a promessa que tal me purificaria e abriria o caminho para a eternidade.

Mergulharam-me em “água benta” com a convicção que tal me uniria eternamente ao seu deus (“Pai, Filho e Espírito Santo”) que por mim morrera e ressuscitara -tornando-me, assim, para sempre, seu filho e fiel servidor.

Marcaram-me como “cristão” quando ainda nem sequer sabia o que era uma ilusão, como quem marca um cordeiro recém-nascido do seu rebanho.

Marcaram-me num ritual eclesial mascarado de festa de família e amigos onde selaram uma espécie de contrato que, supostamente, manifestaria a vontade dos meus pais em me doutrinar de acordo com os valores e princípios morais da religião católica.

Assinaram uma espécie de contrato que definia o presente e decidia o meu futuro… que me impunha não pensar, não sentir… e sobretudo não questionar ou renegar.

Como é que uma mente minimamente decente pode celebrar ou validar um contrato entre uma suposta divindade e uma inocente criança?

Ninguém pode decidir o futuro de uma inocente criança sem conhecimento de causa… e muito menos com um outorgante fictício!

Diz a Igreja Católica que “Deus dá-nos o Seu Espírito e adota-nos como seus filhos, antes mesmo de O conhecermos” … “Deus ama as crianças ainda antes de estas O conhecerem” … e não é por acaso que o manifesta em Mt19, 14: “deixai vir a Mim as criancinhas e não as impeçam…”

Como é que um ser fictício, fruto da imaginação humana, pode adotar uma criança, ainda antes de esta ter consciência da sua… inexistência?

Mais do que um abuso de confiança, este “contrato divino” a que chamam “Batismo”, é uma ofensa à inteligência de qualquer mente minimamente racional.

Mais um dos muitos dogmas absurdos da Igreja Católica que importa desmistificar… e anular.

Assim, existindo tal contrato que me define como “cristão”, que para efeitos estatísticos do meu país me coloca como membro da Igreja Católica Apostólica Romana…

É de forma consciente e de livre vontade que o venho anular através do ato de Apostasia.


AGORA ATEU (I), 2024-02-10