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Ricardo Alves

21 de Abril, 2006 Ricardo Alves

Os «civilizacionistas»

Existe, visível em artigos de jornais e em alguns recantos da blogo-esfera, uma corrente política que expressa um repúdio veemente pelo clericalismo islâmico e pelos seus crimes, mas que se esquece de condenar os clericalismos católico ou judaico.

Chamemos-lhes «civilizacionistas».

São geralmente os mesmos que defendem que a laicidade evoluiu a partir do cristianismo (um erro clamoroso…) e que jamais poderá florescer em países que tiveram ou têm outras religiões maioritárias. São os mesmos que se entusiasmam com as «guerras de civilizações» e que disfarçam (nem sempre com sucesso…) um ódio surdo aos imigrantes. Que condenam a excisão e a circuncisão quando feitas num contexto islâmico, mas desculpam a circuncisão quando feita entre judeus. No fundo, defendem que libertarmo-nos da cultura de origem é anátema, e que devemos tratar os indivíduos e os países em função da sua religião suposta.

Mas enganam-se. O catolicismo ou o judaísmo estão mais próximos do Islão do que da cultura iluminista. Foi o século das luzes, de Voltaire e Thomas Paine, que lançou as sementes da descrença e da laicidade, que geraram as democracias laicas onde vivemos. Contra as igrejas e contra o cristianismo, e não por influência destes. Convém não esquecê-lo.

20 de Abril, 2006 Ricardo Alves

B16: balanço de um ano na luta católica contra a modernidade

Qual é o balanço de um ano de reinado de Bento 16, Papa dos católicos e monarca absoluto da última ditadura da Europa ocidental?

Para este ateu que acompanha, com justificada atenção, as actividades da maior organização totalitária e obscurantista do mundo, o primeiro ano de B16 evidenciou sobretudo um fechamento da ICAR em posições nitidamente mais clericais e mais obscurantistas do que as do seu antecessor. Se JP2 era um inimigo da liberdade mas apenas um conservador (com uma boa gestão da sua imagem mediática), B16 pretende ser um ideólogo reacionário (mas com uma imagem pública tão caricata que já foi «baptizado» com alcunhas como «Pastor Alemão» ou «Sapatinhos Vermelhos»…).

Politicamente, Ratzinger conseguiu acalmar os católicos de esquerda ao receber Hans Küng, embora simultaneamente desse passos muito mais significativos na direcção que lhe interessa, abrindo a porta aos católicos fascistas da Fraternidade Sacerdotal São Pio X (a franja lunática, lefebvrista, do catolicismo, que é fanaticamente anti-semita, teocrática sem disfarces e abertamente defensora da Inquisição). Curiosamente, Ratzinger fora obrigado a promover a exclusão destes integristas (depreende-se agora que contra a sua própria vontade) quando era líder da Congregação para a Doutrina da Fé.

No geral, B-16 tem-se mostrado um continuador do combate de JP2 contra as liberdades. Beneficia de uma comunicação social condicionada pelo religiosamente correcto católico, de modo particularmente flagrante em Portugal, onde o repúdio claramente expresso de Ratzinger e de Policarpo pela liberdade de expressão não foi apontado por quase ninguém. E no entanto, esse foi um dos momentos em que ficou evidente que, ao contrário de uma ideia falsa que Ratzinger tenta fazer passar, os valores da ICAR de B16 estão mais próximos daqueles do Islão fundamentalista do que dos valores laicos que fundam as democracias europeias…

Na frente do combate contra a ciência, Ratzinger deu uma ajuda preciosa aos cristãos literalistas dos EUA ao aceitar o «Desenho Inteligente». Deve notar-se que, com Wojtyla, a ICAR tinha uma posição (prudente) que consistia ou em aceitar a teoria da selecção para todos os animais à excepção do animal humano, ou em até aceitar a teoria da evolução para a nossa espécie, mas «suplementada» com uma «inoculação da alma» em estágio evolutivo e momento histórico incertos. B16 começou por ser pressionado por um seu amigo (o Cardeal Schonborn) para que promovesse o obscurantismo criacionista. Após ceder a essa pressão, conseguiu ocultar mediaticamente a sua defesa do criacionismo ao permitir a um académico próximo do Vaticano um artigo do Osservatore Romano. Mas quem manda no Vaticano é o Papa, não um académico qualquer…

Em Janeiro, Ratzinger publicou a sua primeira encíclica, essencialmente uma crítica aos «católicos progressistas» que praticam a caridade motivados ideologicamente, mas que contém também uma condenação anacrónica do marxismo e umas banalidades sobre o «amor» (um sentimento que a ICAR começou a destacar apenas no século 20, numa das suas poucas adaptações inteligentes à modernidade).

Há um ano atrás, especulei sobre se alguns católicos sairiam da ICAR. Os exemplos parecem ser poucos, mas Ratzinger pode multiplicá-los. B16 fará com certeza alguns ateus, mas o mais importante é que gera um natural (e saudável) anticlericalismo. Eu, que sou ateu e anticlerical, nada tenho contra a fé quando genuinamente espiritual e portanto civicamente discreta. Mas combato o clericalismo pela ameaça que representa para as nossas liberdades e para o progresso da ciência. Ratzinger é a imagem quase perfeita do avesso da modernidade.

Adenda: o comunicado de imprensa do Vaticano sobre a crise dos cartunes (onde se diz que a publicação das caricaturas e a violência que se lhe seguiu são «igualmente deploráveis») e o discurso de Ratzinger perante os deputados do Partido Popular Europeu (onde B16 dá orientação de voto sobre questões legislativas em discussão na Europa) são dois documentos para ler e guardar.

20 de Abril, 2006 Ricardo Alves

95 anos de Separação da Igreja do Estado

O Governo Provisório da República faz saber que em nome da República se decretou, para valer como lei, o seguinte:

Capítulo I

Da liberdade de consciência e de cultos

Artigo 1º

A República reconhece e garante a plena liberdade de consciência a todos os cidadãos portugueses e ainda aos estrangeiros que habitarem o território português.

Artigo 2º

A partir da publicação do presente decreto, com força de lei, a religião católica apostólica romana deixa de ser a religião do Estado e todas as igrejas ou confissões religiosas são igualmente autorizadas, como legítimas agremiações particulares, desde que não ofendam a moral pública nem os princípios do direito político português.

Artigo 3º

Dentro do território da República ninguém pode ser perseguido por motivos de religião, nem perguntado por autoridade alguma acerca da religião que professa.

Artigo 4º

A República não reconhece, não sustenta, nem subsidia culto algum; e por isso, a partir do dia 1 de Julho próximo futuro, serão suprimidas nos orçamentos do estado, dos corpos administrativos locais e de quaisquer estabelecimentos públicos todas as despesas relativas ao exercício dos cultos.

(…)

(Assinalam-se hoje 95 anos sobre a Lei da Separação da Igreja do Estado; agradeço ao Cozido à Portuguesa ter-mo recordado.)
19 de Abril, 2006 Ricardo Alves

O pogrom de Lisboa segundo Damião de Góis

«…Nos dois derradeiros capítulos desta primeira parte, tratarei de um tumulto e levantamento que, a dezanove de Abril de 1506, Domingo de Pascoela, houve, em Lisboa, contra os Cristãos-novos.

No mosteiro de São Domingos existe uma capela, chamada de Jesus, e nela há um Crucifixo, em que foi então visto um sinal, a que deram foros de milagre, embora os que se encontravam na igreja julgassem o contrário. Destes, um Cristão-novo (julgou ver, somente), uma candeia acesa ao lado da imagem de Jesus. Ouvindo isto, alguns homens de baixa condição arrastaram-no pelos cabelos, para fora da igreja, e mataram-no e queimaram logo o corpo no Rossio.

Ao alvoroço acudiu muito povo a quem um frade dirigiu uma pregação incitando contra os Cristãos-novos, após o que saíram dois frades do mosteiro com um crucifixo nas mãos e gritando: “Heresia! Heresia!” Isto impressionou grande multidão de gente estrangeira, marinheiros de naus vindos da Holanda, Zelândia, Alemanha e outras paragens. Juntos mais de quinhentos, começaram a matar os Cristãos-novos que encontravam pelas ruas, e os corpos, mortos ou meio-vivos, queimavam-nos em fogueiras que acendiam na ribeira (do Tejo) e no Rossio. Na tarefa ajudavam-nos escravos e moços portugueses que, com grande diligência, acarretavam lenha e outros materiais para acender o fogo. E, nesse Domingo de Pascoela, mataram mais de quinhentas pessoas.

A esta turba de maus homens e de frades que, sem temor de Deus, andavam pelas ruas concitando o povo a tamanha crueldade, juntaram-se mais de mil homens (de Lisboa) da qualidade (social) dos (marinheiros estrangeiros), os quais, na Segunda-feira, continuaram esta maldade com maior crueza. E, por já nas ruas não acharem Cristãos-novos, foram assaltar as casas onde viviam e arrastavam-nos para as ruas, com os filhos, mulheres e filhas, e lançavam-nos de mistura, vivos e mortos, nas fogueiras, sem piedade. E era tamanha a crueldade que até executavam os meninos e (as próprias) crianças de berço, fendendo-os em pedaços ou esborrachando-os de arremesso contra as paredes. E não esqueciam de lhes saquear as casas e de roubar todo o ouro, prata e enxovais que achavam. E chegou-se a tal dissolução que (até) das (próprias) igrejas arrancavam homens, mulheres, moços e moças inocentes, despegando-os dos Sacrários, e das imagens de Nosso Senhor, de Nossa Senhora e de outros santos, a que o medo da morte os havia abraçado, e dali os arrancavam, matando-os e queimando-os fanaticamente sem temor de Deus.

Nesta (Segunda-feira), pereceram mais de mil almas, sem que, na cidade, alguém ousasse resistir, pois havia nela pouca gente visto que por causa da peste, estavam fora os mais honrados. E se os alcaides e outras justiças queriam acudir a tamanho mal, achavam tanta resistência que eram forçados a recolher-se para lhes não acontecer o mesmo que aos Cristãos-novos.

Havia, entre os portugueses encarniçados neste tão feio e inumano negócio, alguns que, pelo ódio e malquerença a Cristãos, para se vingarem deles, davam a entender aos estrangeiros que eram Cristãos-novos, e nas ruas ou em suas (próprias) casas os iam assaltar e os maltratavam, sem que se pudesse pôr cobro a semelhante desventura.

Na Terça-feira, estes danados homens prosseguiram em sua maldade, mas não tanto como nos dias anteriores; já não achavam quem matar, pois todos os Cristãos-novos, escapados desta fúria, foram postos a salvo por pessoas honradas e piedosas, (contudo) sem poderem evitar que perecessem mais de mil e novecentas criaturas.

Na tarde daquele dia, acudiram à cidade o Regedor Aires da Silva e o Governador Dom Álvaro de Castro, com a gente que puderam juntar, mas (tudo) já estava quase acabado. Deram a notícia a el-Rei, na vila de Avis, (o qual) logo enviou o Prior do Crato e Dom Diogo Lopo, Barão de Alvito, com poderes especiais para castigarem os culpados. Muitos deles foram presos e enforcados por justiça, principalmente os portugueses, porque os estrangeiros, com os roubos e despojo, acolheram-se às suas naus e seguiram nelas cada qual o seu destino. (Quanto) aos dois frades, que andaram com o Crucifixo pela cidade, tiraram-lhes as ordens e, por sentença, foram queimados

Damião de Góis, na «Crónica de D.Manuel I», capítulo CII da Parte I.

11 de Abril, 2006 Ricardo Alves

Civilizacionistas pseudo-laicos contra clericais

A emissão de ontem do programa popularmente conhecido como «Prós e Prós» foi menos desequilibrada do que eu esperava. Fátima Bonifácio e António Barreto (duas escolhas surpreendentes para representar a perspectiva laica…) estiveram razoavelmente bem, embora Bonifácio seja mais conservadora do que a generalidade dos laicistas quanto ao casamento entre homossexuais, e Barreto tenha evitado deliberadamente discutir a interrupção voluntária de gravidez. Quanto ao público, é francamente escandaloso que tenha sido escolhida «uma chusma de “Morangos com Açúcar”, a tresandar a colégio com nome de santo» para servir de claque ao Talibã das Neves, e que não tenham sido convidados ateus e agnósticos para o público, ao contrário do que acontecera em ocasiões anteriores.

Nestas condições, o cardeal Saraiva conseguiu difundir a mentira habitual segundo a qual o tratado constitucional europeu «ofendeu» de alguma forma os católicos por o Preâmbulo não conter uma referência ao cristianismo, sem que nenhum dos «laicos» lhe recordasse que a ICAR, ao garantir um direito de consulta institucional através do artigo I-52º, conseguiu uma vitória tal que em França os bispos até apelaram ao «sim» no referendo, e que em Portugal Policarpo se preparava para fazer o mesmo.

Saraiva foi também espalhando números fantasiosos sobre os muçulmanos residentes na Europa (os 35 milhões que referiu são um exagero enorme, mesmo contando com os habitantes de Istambul) e apelando implicitamente a uma «Cruzada» contra o Islão, a única religião que segundo os participantes do programa de ontem tem «fundamentalistas». Aliás, Bonifácio convergiu com Saraiva na preocupação quanto à destruição da «identidade cultural» europeia, o que é paradoxal quando se considera que Fátima Bonifácio foi impecável na defesa da liberdade individual como fundamento da nossa polis (e assim encostou César das Neves à parede de forma exemplar), liberdade individual essa que, cara senhora, acarreta o direito de abandonar a «identidade cultural» e de não ser oprimido por esta. Implica o direito de ter filhos quando se quer ou mesmo de não os ter, mas também pode resultar numa Europa que não seja branca nem cristã, o que não compreendo que a incomode se defende efectivamente a herança iluminista.

César das Neves atreveu-se a dizer que os conflitos religiosos em Portugal foram curtos, sem que ninguém lhe tivesse recordado que cristãos e muçulmanos estiveram em guerra no nosso território de 711 a 1249; que em 1496 os judeus foram convertidos à força e em 1506 massacrados no pogrom de Lisboa; que a Inquisição se estabeleceu em 1536 e durou até 1821; que em 1846 ainda se perseguiram protestantes na Madeira; e que as minorias religiosas só começaram a sair da clandestinidade em 1911, com a República.

Rendo no entanto a minha homenagem a César das Neves, que tentou explicar que a verdadeira clivagem se nota nas questões de família, e é entre laicistas e clericais (sendo estes muçulmanos ou católicos), ao contrário do que pensam Bonifácio e Barreto, que me pareceram excessivamente obcecados com a sua «guerra civilizacional». E quero destacar a intervenção de um jovem católico que se mostrou pronto para ser terrorista (e consequentemente matar milhares de pessoas) se o proibissem de usar um penduricalho que trazia ao peito. Esse jovem mostrou a quem quiser ver qual é raiz de acontecimentos como o 11 de Setembro: a imunidade ética que a religião confere aos crentes.
10 de Abril, 2006 Ricardo Alves

Eu concordo com o arcebispo

Lawrence Saldanha, arcebispo católico de Lahore, lidera a campanha pela abolição do delito de blasfémia no Paquistão. O arcebispo, que preside também à Conferência Episcopal católica do Paquistão, defende a revogação dos preceitos B e C do artigo 295º do Código Penal paquistanês, que criminalizam a crítica do Corão e de Maomé, respectivamente.

Em 2005, registaram-se 54 condenações por delito de blasfémia no Paquistão, uma acusação que, de tão vulgarizada mas simultaneamente tão eficaz, é frequentemente usada para ajustes de contas pessoais que podem nada ter que ver com religião.

O arcebispo católico afirma que a existência legal do delito de blasfémia é uma causa directa de violência inter-religiosa e um pretexto para a perseguição de minorias religiosas. Eu concordo com ele, e lamento que o português José Policarpo não aprenda com exemplos destes que apenas a liberdade de expressão garante a liberdade religiosa de todos, no Paquistão ou em Portugal, quer os católicos sejam minoritários ou quer sejam maioritários.
5 de Abril, 2006 Ricardo Alves

Catolicismo mais minoritário em Espanha

Pela primeira vez na história, nem sequer 50% dos jovens espanhóis se consideram católicos. A conclusão é de um estudo da «Fundação Santa Maria», noticiado na agência católica Zenit, que assinala que 77% dos jovens espanhóis se declaravam católicos há apenas dez anos atrás. Como reconhece o estudo, o apoio dos jovens à secularização das práticas sociais e à laicização das instituições políticas é portanto crescente.

O mesmo processo social já se iniciou em Portugal, na minha opinião. O conservadorismo das elites políticas portuguesas é que tem permitido contê-lo.
4 de Abril, 2006 Ricardo Alves

O Opus Dei como organização totalitária

Imagina, caro leitor, que pertences a uma organização que te proíbe teres relações sexuais e te obriga a contar qualquer fantasia sexual que tenhas; que controla os teus contactos com a tua família e abre a tua correspondência; que escolhe os livros que lês e os filmes que não podes ver; que te dá um programa diário intensivo de rituais religiosos, mas deixa-te sair para trabalhar e recrutar novos membros; que te retira o teu salário e o administra por ti; que te encoraja a agredires-te com um chicote e a usar um cinto com picos de ferro; que te faz viver numa casa onde apenas estão permanentemente outros como tu, do mesmo sexo que tu, e que só é visitada por outros que aspiram, dizem-te, a ser como tu. Imagina que te convencem de que unicamente através desta organização alcançarás a maior das honras possíveis (que é «ser santo», dizem eles), e que sabes que se saíres todos cortarão relações contigo, e te deixarão de falar se te cruzares com eles na rua. É esta, muito resumidamente, a vida de um membro numerário do Opus Dei, uma organização autoritária e totalitária que tem apoiado ditaduras de extrema direita na América Latina, que se prepara para lançar um candidato à Presidência do Brasil, e que cada vez tem mais influência dentro da ICAR, em parte devido ao seu poder na alta finança.

Os pais de família, principalmente os católicos, têm o direito de saber o que espera os seus filhos se estes se deixarem seduzir pelos «cursos» e «retiros» organizados pela Obra. Como diz um ex-numerário: «tiram tudo da gente: o salário, a família, a alma (…) no final você é um nada, fica destruído». É portanto imprescindível ler os depoimentos daqueles que abandonaram a organização (que já foi considerada uma seita pelo parlamento belga), e hoje têm a coragem de falar da organização perversa e totalitária que deixaram para trás. Recomendo os testemunhos seguintes: Opus Livre, Opus Libros e Opus Dei Awareness Network.

Se algum dia esta organização dominar totalmente a nossa sociedade, não teremos outra liberdade senão a de ir em rebanho à missa e ajoelhar abjectamente.
3 de Abril, 2006 Ricardo Alves

O país onde faltar às orações é crime

Na Malásia, o cidadão Mohamad Taib foi condenado em tribunal por ter faltado às orações na mesquita local durante três sexta-feiras consecutivas. Mohamad Taib escolheu pagar uma multa (de cerca de 82 dólares), de preferência a passar um mês na prisão. No Estado malaio de Kelantan é crime um muçulmano faltar às orações, sendo tal acto punível com até seis meses de prisão ou com uma multa de cerca de 273 dólares.

Em tribunal, Mohamad Taib confessou-se culpado e alegou que sofre de asma. O juiz sugeriu que a doença é uma prova de que Mohamad Taib está a ser castigado por «Deus» pela sua fraca prática religiosa.

29 de Março, 2006 Ricardo Alves

Laicização do protocolo de Estado

O deputado Fernando Rosas entregou na Assembleia da República um requerimento que questiona o Ministério dos Negócios Estrangeiros sobre a existência, no protocolo de Estado, de um lugar para o Cardeal Patriarca de Lisboa da Igreja Católica.

A questão foi originalmente levantada pela Associação República e Laicidade (ARL), aquando da tomada de posse do Presidente da República. Nessa ocasião, o Cardeal Patriarca de Lisboa não apenas teve um lugar na tribuna de honra junto dos anteriores presidentes da República, como fez parte do ordenamento da apresentação de cumprimentos ao recém-empossado Presidente, imediatamente após os Chefes de Estado e Primeiros-Ministros presentes e antes dos Vice-Presidentes da Assembleia da República. A ARL recordou que a Lei da Liberdade Religiosa (Lei nº16/2001) preconiza que «o Estado não adopta qualquer religião» e que «nos actos oficiais e no protocolo de Estado será respeitado o princípio da não confessionalidade» (pontos 1 e 2 do Artº 4º – Princípio da não confessionalidade do Estado). Deve notar-se que a mesma Lei estipula que «o Estado não discriminará nenhuma igreja ou comunidade religiosa relativamente às outras» (ponto 2 do Artº 2º).

O constitucionalista Vital Moreira afirma, sobre este assunto, que «nem era preciso estar na lei, bastando o princípio constitucional da separação entre o Estado e a religião». O requerimento do deputado Fernando Rosas conclui perguntando «o que tenciona o Ministério fazer para que o Protocolo de Estado cumpra as leis da República e Lei n.º 16/2001, de 22 de Junho em particular»?