11 de Abril, 2008 Ricardo Alves
Monumento ao catolicismo?
O memorial do pogrom de 1506 é apresentado na Agência Ecclesia como um monumento ao catolicismo. Na próxima semana veremos o que a Câmara Municipal de Lisboa permitiu que se fizesse.
O memorial do pogrom de 1506 é apresentado na Agência Ecclesia como um monumento ao catolicismo. Na próxima semana veremos o que a Câmara Municipal de Lisboa permitiu que se fizesse.
Uma reportagem sobre a táctica cientologista de captação de celebridades (Tom Cruise, John Travolta, Kirstie Alley…): descobrir segredos embaraçosos (através do equivalente cientologista da «confissão») e… chantageá-las?
Maryam Namazie é uma ateísta iraniana, e uma activista laicista. Este discurso foi pronunciado no lançamento do Comité de Ex-Muçulmanos do Reino Unido.
Não há como exagerar a importância da chamada de atenção que Rui Pena Pires faz no (felizmente regressado) Canhoto: no mundo muçulmano, a alfabetização de mulheres e homens progride, a endogamia diminui, e a fecundidade está em queda (ver o impressionante quadro da evolução do número de filhos no Líbano).
A alfabetização e a urbanização são componentes inevitáveis da modernidade, mesmo para ditaduras religiosas que não apreciam os efeitos secundários desses processos. As indicações de que os xiítas do Líbano passaram de sete para dois filhos por mulher, no espaço de trinta anos, é um sinal de que se passa algo na privacidade das casas muçulmanas de que raramente se fala na Europa: informação e contracepção, presumivelmente sem consulta aos mulás. O que também ajuda a relativizar o «alarme demográfico» que a extrema-direita faz soar com frequência na Europa.
As palavras de Jorge Ortiga, já referidas pela Mariana, merecem mais um pequeno comentário.
Quando o líder da CEP afirma que «o Estado democrático não pode ser militantemente ateu», eu concordo. Simplesmente, um Estado militantemente ateu mandaria fechar as igrejas, eventualmente poderia prender sacerdotes apenas por o serem, e promoveria o ateísmo através do sistema de ensino, com aulas refutando explicitamente o teísmo. Foi o que aconteceu na Europa de Leste em maior ou menor grau, com variações de espaço e tempo consideráveis, mas todos os laicistas portugueses condenam hoje esse género de práticas políticas. Ninguém em Portugal, que eu saiba, defende o ateísmo de Estado. Ortiga gosta de confundir laicidade de Estado com ateísmo de Estado, naquilo que é a típica táctica de agitar um espantalho.
Em segundo lugar, quando Ortiga pede que «[o Estado procure] satisfazer a opção dos cidadãos a quem proporciona as condições necessárias para viver a sua religião», pede no fundo que a religião seja apoiada activamente pelo Estado. Acontece que a religião, ao contrário da saúde e da educação, não é um direito social. É um direito político e cívico. As confissões religiosas só podem pedir ao Estado que garanta a liberdade individual de professar ou mudar de religião, a liberdade de associação, e a liberdade de manifestar a sua crença ou mantê-la privada. Tudo o mais (subsídios ao culto, isenções fiscais, aulas de religião na escola pública, capelães hospitalares pagos pelo Estado), é um abuso que terá um dia de terminar. Esperemos que amanhã seja a véspera desse dia.
Há muitas pessoas que se preocupam, com alguma razão, com a possibilidade de a chária (lei islâmica) vir algum dia a ser aplicada em países europeus. Todos estamos recordados das recentes declarações do arcebispo de Cantuária (Reino Unido), sugerindo que alguns aspectos da chária fossem implementados para a população muçulmana da Inglaterra em assuntos de finanças ou família.
Acontece que a chária já é aplicada, legalmente, num Estado da União Europeia. Concretamente, na Grécia.
Dizer que a Grécia tem o regime mais retrógrado e clerical da União Europeia é dizer pouco. Para além de ter uma Igreja de Estado, protegida constitucionalmente, com poder de veto sobre a construção de locais de culto não-ortodoxos, a Grécia tem ainda esse duvidoso privilégio de conter dois territórios que só fazem parte da UE no papel: o monte Athos (governado por monges) e a Trácia oriental, o único território da União Europeia onde a chária é aplicada.
A UE, que se dedica a harmonizar tanta coisa e a interferir em tantas áreas da vida das pessoas, poderia bem «harmonizar» os direitos das mulheres na UE, pondo fim à vergonhosa aplicação da chária no território europeu de um dos seus estados-membros, com o seu cortejo de casamentos forçados, casamentos (perfeitamente legais, note-se) de raparigas de 12 anos, divórcios que são um direito do marido mas não da mulher, e poligamia, tudo gerido por tribunais islâmicos com muftis nomeados pelo Estado que decidem em assuntos de casamento, divórcio e tutela de crianças de acordo com a lei islâmica. Na Trácia Oriental, sujeitos a estas regras medievais, vivem 100 000 cidadãos (e cidadãs) da União Europeia. As vizinhas turcas destas «cidadãs» gregas muçulmanas gozam de direitos de cidadania mais igualitários.
O filme de Geert Wilders já está no YouTube.
A primeira parte é uma digressão pelos momentos de choque e pavor que o islamismo trouxe ao mundo nos últimos anos (11 de Setembro, 11 de Março, 7 de Julho, Somália), entrecortados por imagens de sermões (e manifestações) particularmente extremistas onde se faz claramente a apologia da violência em nome do Islão. Inclui também alguns versículos do Corão que podem ser utilizados para justificar a violência.
É na segunda parte que o filme do senhor Wilders se torna mais abertamente xenófobo, com números do crescimento de muçulmanos na Holanda (944 mil, 6% da população total) e na Europa. São mostradas imagens de execuções de homossexuais (Irão) e de mulheres (Afeganistão), e sugere-se que acontecerá o mesmo na Holanda de amanhã, o que já é entrar no puro disparate: que eu saiba, o regime talibã já caiu, o do Irão está internacionalmente isolado, e apenas o da Arábia Saudita goza de boas relações com a Europa e os EUA. Mais: nos anos mais recentes, o islamismo só subiu ao poder na Faixa de Gaza, que tem peculiaridades ausentes alhures. E mesmo que a população muçulmana fosse alguma vez maioritária na Holanda (o que, à taxa actual, demoraria mais de cinquenta anos) duvido que essa maioria quisesse impôr a chária. Porque nem todos os muçulmanos, felizmente, são islamofascistas, do mesmo modo que nem todos os católicos se chamam Carlos Azevedo ou César das Neves.
Mas se é evidente que o islamofascismo deve ser combatido, para que a relação dos muçulmanos com o Islão mude, esse combate só pode ser feito em nome da laicidade. A ICAR também só mudou (Concílio Vaticano 2) graças a Afonso Costa e à lei francesa de 1905 (entre outros), e não graças aos fascistas europeus que tão bem se entenderam com ela. Portanto, a bem da coerência e da eficácia, não pode haver complacência com os clericalismos concorrentes (cristão evangélico, católico ou judaico), que o católico Wilders, reveladoramente, nunca tem tempo para criticar.
Resumindo: deixem o senhor Wilders falar. Percebe-se que o problema dele não é tanto o Islão, mas mais os muçulmanos. E que as suas soluções andarão mais próximas de cortar os subsídios de desemprego a muçulmanos do que os subsídios a escolas religiosas (muçulmanas ou, valha-lhe «Deus», cristãs). No limite, este senhor proibiria o Corão (já o defendeu, sem explicar onde ficaria a liberdade de expressão) e expulsaria os muçulmanos. O objectivo dele não é acabar com a discriminação de ateus e outras minorias religiosas, é riscar da constituição holandesa a obrigação de não discriminar.
O perigo para a Europa não é uma «islamização», que não seria exequível demográfica ou (contenham o riso) militarmente. O perigo é a convergência de esforços entre clericalismos, como o rei da Arábia Saudita já compreendeu muito bem. O senhor Wilders é uma distracção e uma perda de tempo.
Segundo uma sondagem recente, 71% dos franceses querem manter a lei de separação entre a República e as igrejas (de 1905), tal como está. E 77% dizem que «as autoridades religiosas não devem tomar posição publicamente sobre as questões de sociedade». O que prova que a laicidade não é um regime imposto por uma minoria a uma sociedade renitente. Antes pelo contrário.
O mito central do cristianismo é a «ressurreição». Cristãos a sério como os do leste da Europa têm na «Páscoa» a festa central do seu calendário. Os católicos, com a sua pitoresca mistura de paganismo, cristianismo e consumismo, criaram uma religião pseudo-cristã que tem no «Natal» a sua festa mais importante.
É a suposta violação de uma das mais fundamentais leis do universo que os cristãos celebram nesta altura do ano. Se não fosse uma violação de uma lei evidente até mesmo para os pastores semitas de há dois mil anos, não valeria a pena celebrá-la. Não se funda uma religião autoritária a partir de factos evidentes como a queda de uma pedra abandonada no ar, a água correr para a foz, ou ser impossível restaurar um copo partido em mil pedaços. Os chamados «milagres» são quase todos violações grosseiras do funcionamento conhecido da natureza, e é por isso que têm valor e que acreditar neles dá estatuto dentro de uma comunidade religiosa.
Que tratemos com respeito comunidades que exaltam a crença em perfeitos disparates não abona a favor da nossa sociedade.
E como se não bastasse celebrarem uma completa impossibilidade, os nossos vizinhos católicos ainda por cima acrescentaram-lhe uns detalhes grotescos com sangue, cruzes, espinhos e dor, muita dor. Sinceramente, não entendo como se pode celebrar a chegada da Primavera com cerimónias que recordam a dor, ostentam a dor, homenageiam a dor, se deleitam com a dor. Celebrar a Primavera deveria convidar aos primeiros passeios pelo campo ou pela praia, em boa companhia e depois de bem servido de mesa.
No fundo, as nozes com chocolate são uma escolha mais racional do que a crucificação. E não enganam ninguém.
O Diário de uns ateus é o blogue de uma comunidade de ateus e ateias portugueses fundadores da Associação Ateísta Portuguesa. O primeiro domínio foi o ateismo.net, que deu origem ao Diário Ateísta, um dos primeiros blogues portugueses. Hoje, este é um espaço de divulgação de opinião e comentário pessoal daqueles que aqui colaboram. Todos os textos publicados neste espaço são da exclusiva responsabilidade dos autores e não representam necessariamente as posições da Associação Ateísta Portuguesa.