13 de Junho, 2006 Palmira Silva
Mundial proibido em Mogadishu
A guerra civil na Somália, embora intermitente, tem sido uma constante desde 1977. Guerra civil que escalou a partir de 1991 quando foi derrubado o ditador Mohamed Siad Barre, por senhores da guerra tribais que, desde então, têm semeado o terror e a insegurança na Somália na sua luta pelo poder.
As Nações Unidas ajudaram ao estabelecimento de um governo interino há dois anos, mas esse governo situado em Baidoa, a 250 km de Mogadiscío, não conseguiu entrar na capital, devastada por guerras entre senhores da guerra.
Segunda-feira, a União dos Tribunais Islâmicos, UTI, assumiu o controle da capital, expulsando os ditos senhores da guerra que a controlaram nos últimos 15 anos. Os habitantes da capital somali afirmaram-se inicialmente aliviados pela vitória da UTI, que pôs termo a décadas de insegurança e violência.
Mas agora os habitantes de Mogadiscío têm protestado energicamente as decisões dos fundamentalistas islâmicos que, não obstante os insinceros protestos em contrário, pretendem impôr o seu modelo aberrante de sociedade, nomeadamente a Sharia, a todos.
De facto, a milícia islâmica que controla a cidade proibiu a transmissão da Copa do Mundo de futebol, uma imoralidade ocidental. Todas as muitas exibições públicas improvisadas dos jogos de futebol do Mundial (não existe o equivalente à TvCabo na Somália) foram interrompidas à força pelos fanáticos islâmicos, desencandeando uma onda de protestos dos milhares de somalis que pretendem ver os jogos.
«Não permitiremos a exibição do Campeonato do Mundo porque isso corrompe as nossas crianças a quem nos esforçamos por ensinar a via islâmica da vida», declarou Abdul Kadir Ali Omar, vice-presidente da UTI, um grupo suspeito de ligações à Al-Qaeda.
A rota para a talibanização da Somália, análoga à do Afeganistão, parecia-me imparável mas aparentemente o futebol é o único catalizador capaz de despertar os somalis da complacência em relação ao fundamentalismo islâmico!
De facto, em todas as zonas da capital ainda sob o controle dos senhores da guerra os residentes mobilizaram-se para assistir à transmissão dos jogos e fora de Mogadiscío, nomeadamente em Jowhar, o reduto dos senhores da guerra 90 km a norte da capital, a população juntou-se em cinemas públicos para assistir ao Mundial.
«Nós não aceitamos que a milícia islâmica nos impeça de assistir à Copa do Mundo» afirma um residente de Mogadiscío, Ahmed Yusuf, «Continuaremos a manifestar-nos até eles cederem».
«Quando os islamistas assumiram a segurança da nossa cidade pensámos que teríamos liberdade» disse por sua vez Adam Hashi-Ali, um adolescente fã de futebol, «Mas agora eles têm impedido que nós assistamos ao Mundial».