3 de Julho, 2006 Palmira Silva
Igreja Católica quer excomungar cientistas
Estátua de Giordano Bruno no Campo dei Fiori (Roma) erigida no local onde este foi queimado vivo pela Igreja Católica em 17 de Fevereiro de 1600. A partir de 1603, todo o trabalho de Bruno desapareceu sob ameaça da Igreja, que proibiu que as teorias avançadas pelo herético ateísta Bruno fossem sequer mencionadas. O trabalho de Bruno apenas voltou a ser citado um século depois por outro «herege», Newton. A ICAR ainda hoje recusa o trabalho de Bruno, por cujo assassinato nunca pediu desculpas, e o seu carrasco, o cardeal Bellarmino, foi canonizado em 29 de Junho de 1930.
A Igreja Católica, que nunca excomungou Hitler, que morreu católico, cujos representantes afirmam sem pudor que um aborto é equivalente aos ataques por bombistas suicidas, e assim excomunga liberalmente mulheres, quaisquer que sejam os motivos para o aborto, mesmo salvar a vida da gestante e mesmo que essa gestante tenha 8 anos (neste caso são os pais os excomungados), quer agora que sejam excomungados os cientistas que trabalham com células estaminais!
De facto, o cardeal Alfonso Lopez Trujillo, responsável pelo Conselho Pontifical da Família, o tal que diz que o HIV é suficientemente pequeno para passar através dos preservativos, afirmou a uma revista oficial do Vaticano, a Famiglia Cristiana, numa entrevista publicada na quinta-feira, que os cientistas que trabalham com células estaminais devem ser excomungados, da mesma forma que as mulheres que abortam e os médicos que as auxiliam.
O cardeal Trujillo pretende ainda que a excomunhão latae senentiae, isto é automática, seja estendida aos políticos que aprovem leis permitindo a investigação em células estaminais.
Numa altura em que a revista Nature torna acessível a todos o Stem Cell Insight para que os interessados neste campo fascinante de investigação possam apreciar os progressos nesta área emergente e as possibilidades que oferecem no tratamento de diabetes juvenil e deficiências imunológicas congénitas, desordens neuronais, cancro ou mesmo o envelhecimento, para além de permitirem a regeneração de tecidos para condições como ferimentos na coluna dorsal, etc., o Vaticano volta a demonstrar que a condenação de Galileu, Giordano Bruno e muitos mais cientistas não foi em «erro», é a imagem de marca de uma Igreja obscurantista e prepotente, completamente desligada da modernidade, a que se opõe ferozmente.
Não ficou claro se esta deve ser considerada a posição oficial da Igreja mas, conhecendo o pensamento sobre o tema de um papa que já criticou os «ateus» cientistas, que enquanto Ratzinger considerou pecaminosa qualquer manipulação genética, incluindo a clonagem terapêutica (quer usando células estaminais embrionárias quer adultas) e sabendo ainda que Bento XVI já tinha declarado que uma das prioridades do seu papado seria exactamente este tema, não é difícil prever que o será dentro em breve!
Há mais de um ano escrevi «este novo Papa considera que se uma célula adulta é alterada para se tornar totipotente (ou estaminal) então deve ser considerada um embrião. Ou seja, é expectável que brevemente pretenda proibir, na boa tradição inquisitorial a que já nos habituou, a investigação em células estaminais, embrionárias ou adultas, e todas as terapias envolvendo estas células, que serão certamente consideradas um pecado mortal».
Infelizmente mais uma vez parece que não me enganei na minha análise deste papa!