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Palmira Silva

23 de Julho, 2006 Palmira Silva

A imbecilidade criacionista

Kent Hovind, o fundamentalista cristão dono do Dinosaur Adventure Land – um parque biblíco perto de Pensacola, Flórida, em que são apresentadas como verdades absolutas fantasias de que a Terra tem apenas seis mil anos, que o Grand Canyon foi formado num dia como consequência do grande dilúvio biblíco e que os homens coexistiram com os dinossauros – é um expoente da paranóia e demais idiossincrasias dos fundamentalistas cristãos.

Como um dos nossos leitores do Comunhão e Libertação que afirmava, com a arrogância insultuosa que é característica deste movimento, ser a teoria da evolução algo sem pés nem cabeça congeminado com o único propósito de «provocar» os cristãos, Hovind afirma que a «abominação» evolucionista é um conspiração satânica com o propósito de estabelecer uma «Nova Ordem Mundial» anti-cristã, com Belzebu nas rédeas. Conspiração que pretende introduzir outras abominações como o aborto, justiça social, ambientalismo e eliminação da pena de morte.

Parte desta suposta conspiração evolucionista foi «revelada» quando as autoridades da Flórida ordenaram o encerramento dos edíficios integrantes do parque, porque Hovind nunca obteve uma licença de construção para os mesmos, licenças que supostamente violavam os sentimentos religiosos profundos dos seguidores da seita de Hovind.

Hovind, que dirige o oxímero [Evangelismo da] Ciência da Criação é literalmente um fundamentalista cristão, isto é, advoga a inenarrância e literalidade da Bíblia, e concumitantemente, é um criacionista puro e duro, daqueles que afirmam que a Terra tem 6 000 anos. Também concumitante com o seu fundamentalismo cristão Hovind é visceralmente anti-semita e vende livros como «Fourth Reich of the Rich» para além de recomendar a leitura da invenção imbecil «The Protocols of the Elders of Zion», um livro que viu a luz do prelo em 1905 como apêndice ao livro «The Great and the Small» do escritor russo Sergei Nilus, pretendendo ser as minutas de um grande encontro de líderes judeus. Os Protocolos de Sião, uma justificação do anti-semitismo, descrevem os meios tortuosos pelos quais, supostamente, os judeus pretendiam causar um colapso político e económico global de forma a facilitar o seu domínio do mundo.

Hovind, que considera ser a segurança social um dos grandes problemas dos Estados Unidos (em conjunto com o ambientalismo e o sistema de impostos), advoga a lapidação das mulheres «promíscuas», é um grande defensor da pena de morte e propõe que a execução de criminosos seja pública – e por lapidação – afirma que a «democracia é um mal e contrária à lei de Deus».

A «satânica» democracia americana prendeu na quinta-feira o devoto cristão com base em 58 acusações federais, proeminente a recusa em pagar impostos, incluindo segurança social para os seus funcionários – que Hovind pretende serem missionários – e ameaças a investigadores do IRS.

Kent Hovind declarou-se inocente de todas as acusações. Aliás afirma nem sequer perceber porque é acusado já que não reconhece direito ao governo federal em o julgar por fraude e evasão fiscal.

De facto, o criacionista afirma que tudo o que o possui não é dele mas sim de Deus e como tal o governo não tem jurisdição sobre os seus bens. Nas suas alegações de inocência Hovind conta com o conselho e ajuda do seu associado Glen Stoll, bem conhecido devido aos seus esquemas fraudulentos pelo IRS americano…

20 de Julho, 2006 Palmira Silva

Células estaminais: o primeiro veto

G. W. Bush usou pela primeira vez o veto presidencial para rejeitar legislação aprovada no Congresso norte-americano. A legislação em causa pretendia expandir as restritas leis que governam o financiamento da investigação em células estaminais embrionárias, restrições impostas pelo próprio Bush em 2001 e que limitam a investigação nesta área a 71 linhas de células.

Para a esmagadora maioria dos americanos, entre 70% e 75% de acordo com as últimas sondagens apoiam a investigação em células estaminais embrionárias, este é um assunto incontroverso, claramente do domínio científico e não político, especialmente considerando os promissores resultados na cura de doenças e situações actualmente incuráveis.

No entanto para Bush, considerado o pior presidente da História dos Estados Unidos, este assunto é uma forma de manter o apoio daqueles que constituem a sua base irredutível de sustentação: os fundamentalistas cristãos. Assim, a decisão presidencial foi a conclusão de uma crónica de um veto anunciado, especialmente agora que Bento XVI fez saber, pela voz do cardeal Alfonso Lopez Trujillo, que os cientistas que trabalhem em células estaminais, assim como os políticos que aprovem leis permitindo a investigação em células estaminais, poderão ser automaticamente excomungados, vincando sem margens para dúvidas a posição do Vaticano numa área que não lhe diz minimamente respeito, aliás que está nos antípodas da sua competência – a ciência.

Bush defende que a utilização de alguns dos embriões excedentários da reprodução medicamente assistida em investigação é imoral. Na voz do seu porta-voz Tony Snow que, adoptando o mantra ilógico e irracional dos activistas anti- aborto, referiu-se à prática como assassínio (de meia dúzia de células indiferenciadas). Mais concretamente, o porta-voz de um presidente que acredita na legitimidade de uma guerra «preventiva» que já matou centenas de milhares de pessoas, que enquanto governador do Texas assinou um número recorde de execuções, declarou que a oposição de Bush à lei se deve ao facto de que «ele pensa que o assassínio é errado».

As declarações de Tony Snow fizeram-me recordar o terrorista verbal James C. Dobson, fundador e presidente da maior organização teocrata americana e uma das mais radicais, que comparou a investigação em células estaminais embrionárias com as experiências nazis conduzidas com pacientes vivos, durante e antes do Holocausto.

A posição de Bush é claramente (excepto para os fanáticos cristãos) uma piada hipócrita: dezenas de milhares de embriões excedentários são destruídos anualmente em clínicas de fertilidade sem qualquer prurido e sem qualquer propósito.

Se de facto Bush considera que esta destruição é um assassínio não deveria perder o seu tempo com minudências como o financiamento de ciência: deveria fechar imediatamente todas as clínicas de fertilidade no país, prender os «assassinos» que lá trabalham e acusar todos os casais que recorrem a fertilização in vitro como assassinos em massa!

De facto, e não contabilizando os embriões imediatamente destruídos após uma fertilização in vitro com sucesso, existem mais de 400 000 embriões excedentários congelados e, não obstante o financiamento federal para casais que resolvam «adoptar» esses embriões, apenas 182 destes foram alguma vez «adoptados». Não é muito complicado concluir qual será o fim último desses embriões: a destruição.

Assim, como apontou o senador democrata do Iowa, Tom Harkin, que classificou o veto presidencial como «uma vergonhosa exibição de crueldade, hipocrisia e ignorância»:

«Se [destruir um embrião] é assassínio, porque razão o presidente permite que a prática continue? Onde está a indignação?»

Claro que uma posição destas ditaria o fim político de Bush (e possivelmente arruinaria as hipóteses de os republicanos ganharem as próximas eleições) pelo que o cristão renascido, com grandes fanfarras de defensor intransigente da vida(?), e na boa tradição hipócrita do cristianismo de apenas manter as aparências, limita-se a interferir em algo que nunca percebeu o que é, a ciência, e uma ciência que poderia salvar a vida ou melhorar as condições de vida de muitos milhões de pessoas.

18 de Julho, 2006 Palmira Silva

Choque e espanto

Algo que nunca deixará de me espantar e irritar profundamente é a forma como os prosélitos em nome de Deus mentem descaradamente, especialmente para impor as suas anacrónicas «morais» sexuais.

De facto, ao longo de toda a História do cristianismo a única moral «absoluta» cristã que nunca se alterou é a que estabelece que os fins justificam os meios, e um dos meios banalizados pelo cristianismo é a mentira. O pejorativo maquiavélico – que tal como o pejorativo epicurista reflecte o ataque da Igreja em relação a filosofias «blasfemas», no caso de Maquiavel a sua contestação da autoridade «divina» dos governantes e a sua sugestão inédita da separação entre Estado e Igreja – para ser realista deveria assim ser «católico» ou «cristão»!

Um dos exemplos mais flagrantes é a grosseira mentira propalada pelo cardeal Alfonso Lopez Trujillo, responsável pelo Conselho Pontifical da Família, que afirmou no documentário «Panorama – Sex and the Holy City», verberando que se apoiava em estudos «científicos», que o HIV é suficientemente pequeno para passar através de um preservativo. Se pensarmos que um vulgar balão é cheio com hidrogénio, H2, ou hélio, He, simplesmente as espécies químicas de menores dimensões existentes – ou azoto, oxigénio e dióxido de carbono se for cheio com ar, moléculas igualmente muito pequenas – e que o HIV é muitos milhões de vezes maior, é chocante pensar como a Igreja propala uma mentira tão descarada!

Mentira exponenciada pelas afirmações do prelado de que «os preservativos podem mesmo ser uma das principais razões para a disseminação do HIV/SIDA», ecoando o que a conferência dos bispos da África do Sul, um dos países mais flagelados pela doença, tinha afirmado uns anos antes. Não é assim de estranhar que tenham propalado o boato que os preservativos estão contaminados com o HIV!

Numa religião cuja imagem de marca é a pregação ululante de que as profundas dos Infernos é o castigo inevitável para os homens e mulheres livres que não se submetem aos seus ditames, o medo, instalado pela mentira e pela força, das armas ou das câmaras de tortura e fogueiras, sempre foi a arma favorita dos cristãos para propagar e manter a fé.

Dos Estados Unidos de Bush chega-nos a informação que as tácticas cristãs de intimidação continuam em toda a sua «glória e esplendor».

Mais uma vez, as mentiras descaradas têm a ver com sexo, a obcessão de todos os fanáticos cristãos, que acreditam piamente ser a gravidez a punição divina para esta prática «infame» e pecado a fuga a essa punição. A ciência que tanto execram permite que as mulheres escapem a este castigo divino, pelo que os prosélitos de Deus envidam todos os esforços para combater programas de educação sexual e de informação sobre contraceptivos e simultaneamente ululam que um embrião ou feto sem consciência de si nem do meio ambiente, sem sistema nervoso para sentir dor, é um ser humano de plenos direitos, animado pelo «sopro» divino na união dos gâmetas, pelo que o seu abortamento é um assassínio!

Como a esmagadora maioria das pessoas que dão uso aos neurónios tem dificuldade em ver um ser humano num amontoado de células – que não incluem os ditos, ou conexões entre eles no caso dos fetos – estes prosélitos envidam todos os esforços em transpor para a letra da lei como crime o que consideram «pecado» e quando tal não é possível, mentem para tentar aterrorizar, especialmente adolescentes, a não abortar.

Assim, supostos conselheiros em centros de informação sobre a gravidez, financiados com o dinheiro dos impostos de todos os americanos, mentem às adolescentes a braços com uma gravidez indesejada que os procuram, informando-as falsamente que o aborto aumenta o risco de cancro de mama – um dos centros contactados chega ao cúmulo de dizer que o risco aumenta 80% – infertilidade e doenças mentais.

Como afirmou Henry Waxman, eleito pela Califórnia para a Câmara dos Representantes, que integra a comissão democrata que investigou como são gastos os muitos milhões de dólares de dinheiro federal entregues pelo Compassion Capital Fund a estes centros:

«Centros de aconselhamento à gravidez são quase todos organizações pró-vida cujo objectivo é persuadir [pela mentira] adolescentes e mulheres com gravidezes não desejadas a escolher a maternidade ou a adopção».

Até agora não foi possível contactar a porta-voz do Departmento de Saúde e Serviços Humanos, que financia os centros.

16 de Julho, 2006 Palmira Silva

Tu stultus es

Tu stultus es (tu és estúpido) é o motto do meu jornal satírico favorito «The Onion», publicado em suporte celulósico desde 1988, inicialmente por estudantes da Universidade de Wisconsin, na rede desde 1996 e hoje em dia sedeado em New York.

A minha Cebola favorita tem-me fornecido não só artigos satíricos de um humor inigualável como confirmações hilariantes da máxima do jornal, normalmente proporcionadas por devotos cristãos que acreditam ser verdade as fabulosas caricaturas que os fundamentalistas cristãos e as suas ululantes «causas» permitem.

Estou a lembrar-me da patetada cristã em torno dos livros Harry Potter, em que uma mentecapta, a fazedora de opinião cristã Helen Makkai, acreditou sem pestanejar na notícia obviamente falsa da Cebola que reportava uma atracção pelo satanismo nos seus pequenos leitores e deu origem ao movimento que vilifica os livros de J. K. Rowling, nos quais se inclui Bento XVI.

Uma das minhas favoritas aconteceu durante a minha estadia nos Estados Unidos e um dos meus colegas de laboratório, igualmente devoto da Cebola, fez questão que eu comprovasse no jornal da sua cidade natal, algures no Mississipi, a profunda verdade do motto. Esta foi despoletada por um artigo simplesmente fabuloso sobre os protestos de fundamentalistas cristãos em relação à inclusão da 2ª lei da Termodinâmica nos curricula escolares. A segunda lei da termodinâmica diz que num processo espontâneo a entropia do Universo aumenta e, tal como no artigo do Onion, uns devotos locais protestavam «um princípio científico profundamente perturbador que ameaça a compreensão do Universo de Deus pelas nossas crianças».

A semana passada a blogosfera americana teve um momento alto de hilariedade quando o escriba do blog anti-aborto e fundamentalista cristão «March Together for Life» [nota: o artigo foi alterado com imagens chocantes e falsas depois de ter sido transformado num fenómeno da internet pelo que não indico a respectiva hiperligação] tropeçou num artigo velho de sete anos «I’m Totally Psyched About This Abortion!». O devoto cristão, com longa prática de considerar serem verdades literais as barbaridades da Bíblia, acreditou piamente no que leu e atacou visceralmente o artigo num post que rapidamente catapultou o obscuro blog para uma notoriedade nunca antes imaginada.

Um artigo «histórico» da Cebola, «Christ Kills Two, Injures Seven In Abortion-Clinic Attack» caricaturava magistralmente as inconsistências cristãs em relação à «defesa intransigente» da vida mas suponho que também neste caso o sarcasmo passe ao lado da maioria dos fundamentalistas cristãos. Quiçá por alguma lesão cerebral pré-frontal que impede aos que a apresentam perceberem mais que o significado literal das palavras…

16 de Julho, 2006 Palmira Silva

O poder da sátira

Um dos meus filósofos favoritos contemporâneos é Sam Harris não só pelas razões óbvias, isto é, o facto de compartilharmos a certeza que a atitude complacente em relação às religiões é uma ameaça latente para o modelo de sociedade que queremos construir – uma sociedade justa, de paz e tolerante – mas também porque a uma licenciatura em Filosofia soma o seu trabalho de doutoramento numa das áreas que considero mais fascinantes, as neurociências, e num tema ainda mais fascinante, a neuroteologia que basicamente estuda as bases biológicas da crença.

Sam Harris é o autor de um Manifesto Ateísta, já referido pela Mariana, um texto absolutamente indispensável em que «Harris, filósofo graduado em Stanford, que estudou religiões ocidentais e orientais, ganhou o prémio PEN de 2004 [e o de 2005] com o livro ‘The End of Faith‘, que examina e explora de forma explosiva os absurdos da religião organizada. ‘Truthdig’ pediu a Harris que escrevesse uma resenha da sua tese que defende que a crença em Deus e o apaziguamento dos extremistas religiosos pelos moderados de todas as crenças foi e continua a ser a maior ameaça para a paz mundial e um assalto continuado à razão».

Numa entrevista mais recente Harris afirma algo que é também a minha convicção profunda «Mas os moderados religiosos dão cobertura aos fundamentalistas devido ao respeito em relação a qualquer debate baseado na fé que os moderados exigem. Como consequência, isso sustenta o fundamentalismo e os fundamentalistas fazem um uso muito cínico e artístico do politicamente correcto nos nossos discursos».

Este politicamente correcto, imposto pelos moderados de todas as religiões, que impede o apontar das irracionalidades e da obscenidade imoral de inúmeras passagens dos seus textos «sagrados», é o principal obstáculo a ser vencido na construção de uma sociedade que se coadune com o século XXI e com o respeito pelos direitos humanos.

O combate ao fundamentalismo religioso passa por combater este politicamente correcto complacente e expor como absurdas, anacrónicas e irracionais as «verdades absolutas» dos Livros que os seus devotos querem impor a todos. Mas os argumentos lógicos e racionais, embora necessários, não são suficientes.

Como Sam Harris indica, esta é uma guerra de ideias, a ser travada em várias frentes, na qual não se deve subestimar o poder do ridículo. O filósofo/neurocientista aponta como exemplo a forma como o Ku Klux Klan perdeu a força e prestígio e passou em 60 anos de dezenas de milhões de aderentes para uns meros cerca de 5 000 actualmente. Simplesmente porque um homem, Stetson Kennedy, aderiu ao KKK nos anos 40 e passou o mambo jambo cretino desta organização às pessoas que escreviam os episódios radiofónicos de «As Aventuras do Superhomem». Ouvir semana após semana as palermices do Klan expostas na rádio contribuiu mais para a queda do Klan que argumentos racionais e éticos.

Ou seja, o embaraço público de subscrever opiniões cada vez mais ridicularizadas devido à sua denúncia satírica ditou o fim do Klan.

Aliás, não é por acaso serem as sátiras, por exemplo, os cartoons de Maomé, o cartoon do António, a peça «Me cago en Dios», que levam os crentes aos arrobos mais paradoxais de indignação.

Também por isso o alvo dos ataques mais virulentos dos crentes que comentam nestas páginas é o Carlos Esperança. Quantas mais pessoas como o Carlos afrontarem o tabu de criticar as religiões e o fizerem da forma satírica magistral que é a imagem de marca do Carlos, mais fácil será acabar com a praga anacrónica das guerras «santas» e da subordinação das sociedades, nomeadamente do Direito, aos muitos disparates absurdos das religiões .

Neste dia em que o Diário Ateísta está prestes a completar meio milhão de visitantes aproveito o ensejo para parabenizar o Carlos que consegue mostrar… divinalmente… o rídiculo da fé e incomodar os mais fanáticos com as suas caricaturas dos fundamentos das crenças.

Todos têm o direito em acreditar no que quiserem, em astrologia, em quiromancia, em psicografia, em Xenu, que o Elvis está vivo mas foi raptado por extraterrestres, em Thor, Baco, Deus e restantes mitologias sortidas; ninguém tem o direito a exigir que esses disparates sejam «respeitados» pelos restantes. É tão impossível «provar» a inexistência de Deus como «provar» que o Elvis não está a ser objecto de estudo de uns quaisquer homenzinhos verdes. Para um ateu tão rídicula é essa tese como a que sustem que a Bíblia é a «palavra revelada» de um Deus da Idade do Ferro, sublimação da ignorância dessa era.

15 de Julho, 2006 Palmira Silva

South Park strikes back

Em Março deste ano, quando o episódio «Trapped in the Closet» foi banido após Tom Cruise ter ameaçado processar a Paramount se o episódio fosse emitido outra vez, os criadores de South Park Trey Parker e Matt Stone afirmaram à Variety «Então, Cientologia, podem ter ganho ESTA batalha, mas a guerra de 1 milhão de anos pela Terra apenas começou».

E de facto a guerra do «Trapped in the Closet» foi perdida aos pontos pela Cientologia! Não só o episódio é um dos nomeados para o prémio Emmy para a melhor animação como voltará ao ar já na próxima quarta-feira no Comedy Central.

South Park versus Cientologia, uma nota da MSNBC.
15 de Julho, 2006 Palmira Silva

Milingo volta a chocar o Vaticano

Ainda há uns dias, a propósito da ligeireza com que a Igreja Católica encara a dissolução de alguns casamentos, dizia o Carlos que «Quando o arcebispo Emmanuel Milingo se casou, sob os auspícios do reverendo Moon, o Vaticano envidou esforços para que o prelado zambiano rompesse o matrimónio com a esposa, María Sung, e regressasse ao múnus e à obediência a Roma. E conseguiu»

Na realidade, parece que o Vaticano não conseguiu! Depois de ter desaparecido do convento onde vivia em reclusão (forçada?) nos últimos anos, facto que preocupou o Vaticano, o arcebispo da Zâmbia de 76 anos reapareceu em Washington e voltou a chocar os dignitários de Roma com as suas declarações públicas.

Numa conferência de imprensa em Washington, o idoso arcebispo, que aparentemente se reuniu com a sua esposa, de quem se tinha separado pelos bons ofícios do cardeal Tarcisio Bertone, agora o número 2 do Vaticano – e pela ameaça rápida de excomunhão – disse que o seu objectivo agora era acabar com o celibato obrigatório na Igreja Católica.

«Penso que é tempo de a Igreja se reconciliar com padres casados» disse Millingo. O arcebispo disse ainda que os padres que se apaixonam «têm sido levados [pela Igreja] a serem quase casos mentais» e apelou para que os padres punidos pelo seu casamento «saiam das prisões católicas e sejam reconduzidos».

O Vaticano já se declarou chocado pelas revelações do arcebispo rebelde e informou estar a considerar medidas punitivas contra o prelado.

12 de Julho, 2006 Palmira Silva

Ataque terrorista na Índia

Mais de 180 pessoas foram mortas e cerca de 700 ficaram feridas na sequência de um ataque terrorista coordenado a comboios suburbanos que transportavam trabalhadores para a cidade de Bombaim.

A polícia indiana investiga o bárbaro atentado, que ainda não foi reinvidicado. As primeiras suspeitas cairam sobre grupos separatistas (da Caxemira indiana) ligados ao Paquistão Lashkar-e Toiba (LeT) e Jaish-e-Mohammad (JeM), cujos líderes negam qualquer envolvimento com o caso.

O grau de sofisticação do atentado e as semelhança com os que se verificaram em Madrid e Londres proporcionam algumas especulações sobre o envolvimento da Al-Qaeda nos mesmos.

12 de Julho, 2006 Palmira Silva

O verdadeiro ecumenismo: actualização

A tolerância ecuménica atingiu o seu zénite com a distribuição de panfletos nos bairros ortodoxos de Israel em que são prometidos 20 mil shekels novos (3.700 euros) a quem matar homossexuais e lésbicas que participem na Parada Internacional do Orgulho Gay.

Os métodos recomendados são os preconizados no livro «sagrado», o apedrejamento, ou em alternativa, uma concessão aos tempos modernos, cocktails molotov que o panfleto ensina a fazer em casa.

Os protestos inconvincentes à polícia dos líderes ortodoxos sobre a sua inocência na autoria do panfleto, que atribuem … à comunidade gay (?!), são negados pelo aviso dos rabis ultra-ortodoxos de Jerusalém sobre o banho de sangue que a realização do evento significaria. Uma declaração oficial contra o evento, assinado por estes dignitários exorta «Todos os com capacidade para tal, têm o dever de fazer tudo ao seu alcance para esmagar as mandíbulas do mal de qualquer forma que consigam».

De igual forma, o sheik Ibrahim Sarsur, deputado do Knesset, avisou o mundo que «se os gays se atreverem a aproximar o monte do Templo durante a parada fá-lo-ão por cima dos nossos cadáveres».

Já o arcebispo Antonio Franco, o embaixador do Vaticano em Israel, foi mais moderado nos termos em que condenou o evento, que para o dignitário católico, que não faz a mínima ideia do que significa pluralismo, democracia e tolerância -palavras ausente do léxico das religiões do livro- corresponde à «imposição da vontade de alguns sobre a maioria».

Considerando o que se passou na Polónia em que os homofóbicos (e anti-semitas) membros do partido ultra-nacionalista – muito apoiados pela Igreja católica – ameaçaram esperar os gays participantes na parada local com clavas, e o que se passou recentemente em Moscovo na mesma iniciativa, não é extemporâneo pensar que alguns fundamentalistas cristãos se juntariam aos seus análogos das outras religiões do livro para punir «adequadamente» os «pecadores».

12 de Julho, 2006 Palmira Silva

O verdadeiro ecumenismo

O grande Rabi de Israel, Shlomo Amar (sefardita), enviou uma carta a Bento XVI pedindo a condenação da Parada Internacional do Orgulho Gay, programada para 10 de Agosto, em Jerusalém. Segundo diversas fontes, na carta Amar pede ao Papa que «condene de forma inequívoca e enérgica este terrível fenómeno, com a esperança de despertar um protesto geral por parte de diferentes dignitários religiosos». O Rabi pede ainda a Bento XVI: «Ajude-nos a impedir a Parada Mundial Gay, programada para o mês de Agosto, em Jerusalém, pois ela ‘viola e humilha’ a Cidade Santa».

Na realidade os dignitários de todas as religiões do livro e suas variantes são uníssonos na condenação do evento, como seria apenas expectável. Os muçulmanos de Israel esqueceram o conflito israelo-árabe e juntaram as suas às vozes judaicas e cristãs de diferentes denominações -incluindo a Igreja Ortodoxa – que exigem do Parlamento a proibição do desfile.

O núncio apostólico em Jerusalém, monsenhor Pietro Sambi, advertiu que a Parada Gay «não seria apenas uma ofensa, mas uma provocação para os judeus, cristãos e muçulmanos de Jerusalém e do mundo inteiro».

Já o sheik Abed Al Salam Menasra, adjunto do mufti de Jerusalém, pediu para que não provoquem «a cólera com uma celebração ímpia e profanadora», que pode levar «à perda da cidade santa».

A «imundície», nas palavras de Nissim Zeev, deputado do Partido ultra-ortodoxo Shas, conseguiu algo inaudito na história do Knesset: representantes muçulmanos e das alas judaicas mais à direita (isto é, religiosas) uniram-se em torno de uma causa comum: a imposição a todos dos preconceitos neolíticos sobre sexualidade do «livro».

Até de Moscovo vieram vozes de protesto: Yona Metzger, o Rabi-chefe aschenazi, que participa do encontro inter-religioso promovido pelo Patriarcado Ortodoxo, pede que se «cancele a parada gay na Cidade Santa de Jerusalém» justificando:

«Como todos sabem Jerusalém é o berço no qual nasceram as três religiões monoteístas. Devemos estar unidos para preservar sua histórica santidade, e os valores de pureza e moralidade que a caracterizam».

No encontro, que inclui representantes de 40 países, incluindo a Síria, Irão e Arábia Saudita, Metzger afirmou que se deviam esquecer as disputas políticas e que «todos os países dever-se-iam unir em torno da sua crença num Deus único».

Ou seja, para o rabi os fundamentalistas das respectivas religiões dever-se-iam unir contra não só os que não acreditam em resquícios neolíticos da evolução humana, mantidos anacronicamente pela imiscuição religião-estado que obriga ou permite a doutrinação religiosa desde o berço, como contra os que não seguem os ditames, muito semelhantes, das religiões do Livro. De facto, todas elas são contra a abominação que constituem os direitos do homem, principalmente a liberdade de opinião e expressão, e especialmente são contra a abominação mor que é a igualdade de direitos para as mulheres. Todas elas reclamam que o Direito dos países respectivos deve ser regido por esses ditames!

As últimas notícias indicam que esta união inédita de políticos e dignitários de todas as religiões do livro já deu resultados: é quase certo que a Parada Mundial Gay se realizará não em Jerusalém mas sim em Tel Aviv, por razões de segurança.

De facto, considerando que os fundamentalistas das religiões do livro não são exactamente conhecidos pela tolerância mas mais pela violência «veemência» com que protestam os insultos à sua fé – dos quais o insulto máximo é o facto de o Direito não obrigar todos a seguirem os seus ditames anacrónicos – a Polícia de Jerusalém, que tem de lidar com a possibilidade de atentados bombistas suicidas numa base diária, considera difícil garantir a segurança dos participantes no evento!

Acho deveras significativo que todos estes piedosos dignitários religiosos, que rapidamente se uniram nesta «causa» comum – como se uniram no passado para condenar o reconhecimento dos direitos da mulher – sejam incapazes de se unir numa causa essa sim meritória: um apelo à paz, emitido com a mesma veemência com que debitaram este, apelo à paz que na nossa época é equivalente a um apelo ao fim da violência em nome de Deus!