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Palmira Silva

14 de Agosto, 2006 Palmira Silva

50 anos sem Bertolt Brecht

No dia 14 de Agosto de 1956 falecia Eugen Bertholt Friedrich Brecht, vítima de um ataque cardíaco. Mas a sua obra mostra quão vivo está o criador do teatro didáctico, ateu assumido.

Recordo, por exemplo, «A Boa Alma de Setsuan». Esta parábola de Brecht data de 1941 e foi escrita na época em que o dramaturgo vivia no exílio da Alemanha nazi e em que Brecht afirmava que a bondade era o estado natural do homem.

Brecht foi desde o início um opositor do regime nazi e viveu no exílio desde a subida ao poder de Hitler. «A Resistível Ascensão de Arturo Ui» é uma paródia sobre Hitler escrita em 1941, na Finlândia. Usando como pano de fundo Al Capone e as guerras entre gangsters, transpostas para a Alemanha nazi, Brecht reproduz a tomada de poder e a anexação da Áustria.

O seu desprezo pela religião pode ser apreciado, por exemplo, na maravilhosa peça de teatro de Bertold Brecht, Santa Joana dos Matadouros (1932).

Se por acaso alguém vier dizer baixinho,
Que existe um Deus, invisível é verdade,
Do qual, portanto podeis esperar por socorro,
Batei-lhe o crânio na pedra,
Até que ele rebente.

ou no seu poema, «Se os tubarões fossem homens»

(…)
O mais importante seria, naturalmente, a formação moral dos peixinhos.

Eles seriam informados de que nada existe de mais belo e mais sublime
do que um peixinho que se sacrifica contente,
e que todos deveriam crer nos tubarões, sobretudo
quando dissessem que cuidam da sua felicidade futura.

Os peixinhos saberiam que este futuro só estaria assegurado
se aprendessem a obediência.
(…)
Também não faltaria uma religião, se os tubarões fossem homens.
Ela ensinaria que a verdadeira vida dos peixinhos começa no paraíso,
ou seja, na barriga dos tubarões.

14 de Agosto, 2006 Palmira Silva

Momento Zen de segunda

Não sei se é a «silly season» ou se de facto o cavaleiro da pérola redonda, J.C. das Neves, ensandeceu de vez, mas a homília de segunda debitada hoje no Diário de Notícias, é francamente mais imbecil que o habitual.

Subjacente à opinação, com o interessante título «Uma decisiva questão de omeletas», está o tema querido ao spin doctor de segunda: a imposição a todos do modelo de família e de sexualidade segundo o evangelho de J.C. das Neves.

Para o devoto católico, no mundo actual subsiste apenas um problema importante, uma clivagem histórica: a não submissão de todos aos ditames do Vaticano no que respeita à sexualidade, traduzida «na facilitação do divórcio e do aborto, na equiparação de outras formas de vida [leia-se não discriminação e estigmatização de homossexuais e mães solteiras]» que segundo o fundamentalista opinador constituem um «ataque à família».

Como o Pedro apontou há uns tempos, e como é óbvio para todos, não há qualquer ataque à família, o que acontece, para grande incómodo da hierarquia católica e de todos os fundamentalistas, é que não há ataques às famílias monoparentais e homossexuais. Cada vez mais, com excepção de uns redutos católicos mais fanáticos, a sociedade ocidental se revela mais tolerante em relação às opções pessoais dos seus membros, está mais aberta à diversidade e ri das definições anacrónicas, neolíticas da ICAR sobre afectos e a sua concretização.

Concordo plenamente com o Pedro quando este diz que «A ICAR ambiciona um monopólio das definições, da definição de fé, da definição de amor, da definição de afectos, etc, porque percebe que nas definições está a chave para o controlo da legislação (é uma questão de lógica bastante simples, se eu controlo as premissas praticamente estou a ditar a conclusão)». E aquilo que os spin doctors católicos de segunda tentam, felizmente desta forma no mínimo rídicula, é manipular a sociedade de forma a impor as definições católicas. Manipulações absolutamente evidentes não só no caso da homossexualidade como no caso do aborto, em que os fundamentalistas católicos querem redefinir o significado de pessoa de forma a abranger meia dúzia de células indiferenciadas.

Acho no mínimo interessante que o fazedor de opinião de segunda, que tanto vocifera contra a ciência, que diz a alto e bom som que a ciência é a «religião» dos ateus, venha agora usar falaciosamente a ciência como muleta para as suas ridículas omoletes. Claro que no mesmo texto em que deturpa a ciência para a conformar aos seus propósitos, demoniza a mesma ciência quando esta se traduz naquilo a que chama «desrespeito pelas regras naturais», isto é, desrespeito pelas regras jurássicas da ICAR que o bom católico quer impôr como «regras naturais».

J.C. das Neves, que não se pronuncia sobre ser igualmente contra natura tudo aquilo que damos como adquirido na sociedade moderna, desde a utilização de qualquer electrodoméstico, até do acender de uma lâmpada, passando pelos hospitais e pelos medicamentos até à roupa que vestimos, assesta baterias apenas nas actividades humanas permitidas pelo nosso desenvolvimento tecnológico que vão contra os ditames do Vaticano: «a procriação artificial, aborto, eutanásia e aberrações sexuais,» que considera «formas de impor a soberania artificial sobre a natureza». Esquecendo que, por exemplo, é a imposição da «soberania artificial» sobre a natureza de muitas doenças que subjaz ao debate da eutanásia, isto é, muitos doentes terminais são mantidos vivos, ou sem dor, artificialmente e a eutanásia em muitos casos reduz-se à remoção desses meios artificiais de manutenção da vida. Como no mui mediático caso de Terry Schiavo.

Entretanto o wannabe fazedor de opinião, que inicia a sua prosa de segunda relegando todos os problemas que assolam o mundo, desde o terrorismo, o aquecimento global ao subdesenvolvimento, como problemas menores em que «domina um consenso ou, quando muito, há escaramuças», termina igualando a tolerância em relação às opções sexuais alheias, isto é, a não submissão de todos à ditadura do Vaticano, ao nazismo e ao comunismo.

Enfim, as habituais falácias católicas e os papões que agitam para tentarem controlar toda a sociedade e no processo assegurarem o poder político do Vaticano que por sua vez é a garantia do poder económico do mesmo, indispensável para manter o fausto a que as cúpulas do Vaticano se habituaram.

A confiança que J.C das Neves demonstra no poder branqueador dos revisionistas históricos ao serviço da ICAR, que pretendem apagar o papel que esta teve no apoio ao regime nazista e conotá-lo com o ateísmo, pode no entanto revelar-se um verdadeiro tiro no pé. Nem todos engolem as histórias da carochinha que estes revisionistas históricos querem vender!

13 de Agosto, 2006 Palmira Silva

Heresia ao longo da História

A Igreja Católica que hoje conhecemos surgiu pela mão de Constantino numa tentativa de unir pela religião um Império Romano em decadência. Em que todos os créus, pela autoridade divina do braço religioso do Império, a Igreja de Roma, seriam compelidos a lutar pelo Império e espalhar a fé.

Era necessária uma religião suficientemente forte para se impor aos povos dominados por Roma; para consolidar na crendice indissociável dos povos da época o poder conquistado pela força. Uma religião autoritária, rígida, inflexível, estabelecida mediante poderes, leis e morais terrenas. Assim começou o Catolicismo: um expediente político para tornar a Religião Imperial Católica Apostólica Romana a Toda Poderosa, nominalmente predicando o perdão mas de facto imposta e sustentada pela força da espada.

Constantino precisava criar a religião adequada aos seus propósitos hegemónicos e o catolicismo existente no início do século IV não tinha a autoridade suficiente para tal. Era necessário acabar com as grandes controvérsias doutrinais da igreja e estabelecer claramente não só a autoridade em questões de fé de Roma como um conjunto de dogmas em torno do qual se desenvolvesse a teologia necessária a Constantino para cumprir as suas ambições hegemónicas. Assim, Constantino convoca o concílio de Niceia (hoje Iznik, na Anatólia, Turquia), em 325.

O concílio de Arles, em 314, já tinha condenado uma «heresia» desastrosa para a Igreja, a dos Donatistas, que ameaçava alastrar perigosamente e «contaminar» a fé. Os «hereges» Donatos (dois bispos com o mesmo nome: Donato de Casa Nigra, bispo da Numídia; e Donato, o Grande, bispo de Cartago) ensinavam que a Igreja deveria compor-se só de justos, reconhecidos pela sua vida pia e frugal; no momento em que fossem tolerados pecadores no seu seio deixaria de ser a Igreja de Cristo. Pior, diziam que o baptismo administrado por um sacerdote em estado de pecado, é inválido e que um bispo, se com um pecado manchando a respectiva alma, não pode crismar nem ordenar sacerdotes. Esta «heresia», somada à heresia máxima da pregada separação entre Igreja e Estado, era uma ameaça para a ambiciosa, pecadora e faustosa hierarquia cristã de forma que a sua supressão marcou o mote para os restantes concílios, a maioria deles destinados a erradicar pensamentos perigosos para a Igreja, pensamentos identificados como «hereges».

Assim, os pontos a ser discutidos no sínodo de Niceia foram:

  • A questão Ariana,
  • A celebração da Páscoa
  • O cisma de Milécio
  • O baptismo de heréticos
  • O estatuto dos prisioneiros na perseguição de Licínio.

O primeiro ponto era igualmente o mais importante a ser clarificado. De facto, a controvérsia que urgia ser esclarecida tinha a ver com algo que incomodava a cristandade: era o seu mito divino e se sim como conciliar a divindade do Cristo com o dogma de fé num único Deus?

Especialmente porque Ário defendia que o mítico fundador da seita, Jesus, é apenas uma «criatura do Pai», não sendo, portanto, nem eterno nem divino. Insistindo em dizer que «houve um tempo em que o Filho não existia». O arianismo, a que aderiram muitos ilustres prelados, entre eles o bispo Eusébio de Cesareia, conhecido escritor da Igreja, ameaçava atingir proporções inadmissíveis, tão mais inadmissíveis porque sem a natureza divina do Cristo o cristianismo não era mais do que uma divisão do judaísmo.

Aliás, o anti-judaísmo, ou o anti-semitismo cristão, firmou-se com a tomada do controle do Império Romano, sendo o concílio de Niceia um marco neste sentido. Os posteriores Concílios da Igreja manteriam esta linha. O concílio seguinte, o de Antioquia (341) proibiu aos Cristãos a celebração da Páscoa com os Judeus. O estabelecimento da Páscoa foi o 2º ponto decidido em Niceia, em que foi acordado que a Páscoa se celebraria sempre no primeiro domingo a seguir ao 14º dia da primeira lua da Primavera, o 14º Nisan, e não no 14º Nisan, como os judeus e algumas igrejas cristãs o faziam.

O concílio de Niceia ilustra ainda o que acontece quando os teólogos tentam racionalizar o rídiculo. Assim como ilustra algo indissociável da teologia, uma crescente complexidade linguistica que pretende consolidar a autoridade e o poder da Igreja baralhando os mais incautos com uma linguagem hermética e assim pomposamente disfarçar a vacuidade das pretensões em que assenta a religião.

Mais concretamente, foi necessário recorrer a obscura e rebuscada linguagem para estabelecer a divindade de Jesus, conseguida através do recurso à pagã Trindade, ou deus(a) triuno. Faltava resolver como exprimir simultaneamente a unidade e distinção dentro da Trindade, o que foi feito através de uma manipulação judiciosa dos termos ousia (essência) e hypostasis (pessoa). Assim, a Trindade corresponderia a uma única ousia mas as distinções entre Pai, Filho e Espírito Santo eram estabelecidas por três hypostasis. Não era (nem é) claro como estes termos se aplicam na cristologia. Isto é, não só o Cristo para além da baralhação triuna tinha duas essências como falar na ousia divina unida com a ousia humana do mítico Cristo implica que toda a trindade encarnou…

Antes do concílio de Niceia physis e hypostasis eram habitualmente utilizadas para realidades concretas enquanto ousia detinha um significado mais geral e abstracto, sendo as três palavras usadas como sinónimos em muitos casos.

(continua)
12 de Agosto, 2006 Palmira Silva

Heresia e totalitarismo

Heresia: do grego hairesis significa escolha, preferência, gosto particular, escolha filosófica, inclinação ou preferência filosófica ou por uma escola de pensamento.

O aggiornamento que o Concílio Vaticano II se propunha a fazer pretendia não integrar a Igreja no projecto civilizacional moderno, contra o qual esta tinha lutado de unhas e dentes, mas sim «lavar» a imagem de uma Igreja totalitária demasiado comprometida com a II (e I) Guerra Mundial, com a Inquisição, etc.. Para sobreviver a Igreja necessitava parecer reconciliar-se com o mundo moderno, com os seus valores – tais como os direitos do homem, a igualdade, a liberdade, a fraternidade e a democracia – contra os quais tanto combateu, recorrendo a meios que o homem pós II Guerra Mundial reconhecia como abominações morais e éticas.

E posteriormente apropriar-se destes valores como se fossem seus, fazendo passar a mensagem de que, nas palavras, por exemplo, do «modernista» cardeal Kasper, «a modernidade foi construída fora da Igreja, em grande medida contra a Igreja, mas fundada em valores evangélicos».

Assim, a inquisição, os anátemas e a apologética do século XIX eram estigmas de uma postura que precisava ser superada, e foi desenvolvida uma teologia dos «sinais dos tempos», na qual se inclui a teologia da libertação, que substituiu a teologia apologética que pareceu durante o final do século XIX e início do século XX a única racionalidade teológica possível para fazer frente ao modernismo anatematizado e demonizado por Pio X.

Esta teologia nunca foi aceite de facto pela Igreja, não apenas pelas facções mais conservadoras que a consideram abertamente uma «heresia» modernista, devidamente condenada por Pio X no Decreto Lamentabili Sane e na encíclica Pascendi Dominici Gregis. Heresia modernista que Bento XVI, um seguidor confesso da patrística, se devotou erradicar, chamando-lhe relativismo, agora que o objectivo do Concílio foi atingido, isto é, a imagem da Igreja foi convenientemente lavada.

Torna-se assim interessante analisar as evoluções heréticas ao longo da história do cristianismo, recordando que um elemento fundamental na acusação de «heresia» é o «pecado» do orgulho. Orgulho que consiste em não aceitar os ditames da «autoridade» com base em lucubrações próprias.

De facto, as religiões organizadas não são mais que formas de controle social disfarçadas de religião e/ou ética. E para manter o controle é necessário arranjar um rótulo que identifique quem não aceita a autoridade da Igreja como pertencente aos «maus», aos «outros». Vemos essa necessidade em qualquer sistema totalitário, seja ele político, religioso ou uma amálgama de ambos.

Assim, as religiões procuram explicar os comportamentos humanos com mitos destinados a manipular e controlar, simultaneamente impedindo alterações do status quo. Estas explicações simples, maniqueístas, destinadas a gente simples – que precisa de alguém para odiar e desprezar, alguém sobre o qual sente uma «legítima» superioridade «moral» e contra o qual tudo é justificado – dividem o mundo em «bons» e «maus», «nós» e os «outros», eleitos e excluídos, consoante a sua obediência ou não à autoridade.

É necessário inventar palavras anatematizantes que descrevam inequivocamente os adversários, recorrendo aos mitos que forem necessários para desacreditar e demonizar o «inimigo», simplesmente aquele que não aceita a autoridade. Assim surgiram palavras como epicurista, donatista, arianista, maquiavélico, relativista, etc.. que em conjunto identificam o «herege», aquele que se atreve a pensar pela sua cabeça, o homem livre, o grande inimigo de qualquer forma de autoritarismo.

11 de Agosto, 2006 Palmira Silva

Deus é o meu arquitecto

O pastor Jeff Carroll da Cedar Grove Methodist Church, no Alabama, parece pensar que o governo não deveria ter direito de se imiscuir em assuntos da Igreja (embora o contrário não seja verdade) mesmo em «pequenos» detalhes como licenças de construção. Por isso, não se deu ao trabalho de obter uma quando «ajudou» a sua congregação a construir a sua nova igreja. Para que é necessária a permissão de um qualquer inspector quando à partida se tem a permissão mais «sagrada» que existe?

Mas aparentemente o divino arquitecto tem um sentido de humor algo bizarro e resolveu destruir todo o trabalho da congregação no momento em que este foi completado: o telhado da novissima igreja ruiu numa quinta-feira à noite. Claro que o pastor se apressou a agradecer ao «divino» brincalhão ter resolvido fazê-lo quando ninguém se encontrava lá dentro:

«Graças a Deus ninguém ficou ferido. Ele escolheu deixar o telhado cair numa quinta-feira à noite quando ninguém estava lá».

Na atribuição das culpas do sucedido Carrol, claro, procura causas mais mundanas. Que segundo ele nada teriam a ver com o facto de que «as plantas para a igreja foram feitos por um dos membros da Igreja e pela sua filha depois de olharem para figuras na internet» mas com traves «defeituosas».

Carroll, ele próprio um construtor civil e que acha ser a ignorância uma desculpa para pôr em risco a vida de 500 pessoas, afirmou não saber serem necessários quaisquer requisitos legais para a dita construção e diz que permanece céptico sobre a legitimidade de um orgão governamental ter algo a dizer acerca de como uma igreja deve ser construída:

«Se a Igreja e o estado estão separados não percebo porque eles pensam que têm jurisdição».

Carroll esperava que o seguro da nova igreja cobrisse o colapso do telhado mas a companhia de seguros em questão não aceitou o pedido de indemnização.

11 de Agosto, 2006 Palmira Silva

Pedofilia e assassínio

Em Fevereiro último, referi dois casos de assassinato por um padre católico, Ryan Erickson, que assassinou Daniel O’Connell e James Ellison.

Erickson, um padre ultra conservador, que se seguia por canônes pré-Vaticano II, um moralista que estava encarregue da educação sexual dos jovens da St. Patrick’s School, estava particularmente interessado em suprimir comportamentos sexuais «pecaminosos», especialmente a masturbação.

A obsessão de Erickson pela masturbação, o pecado máximo, pode ser apreciada neste «pensamento do dia» enviado por e-mail aos seus seguidores: «Nem a missa de domingo está a salvo dos trajes imodestos de alguns demónios. Elas aparecem para ler, distribuir a santa comunhão,etc…. parecendo um anúncio. Os seus trajes imodestos dizem a todos os presentes: Eu sou fácil! Vão para casa e masturbem-se pensando no meu corpo fantástico. O que é triste é que alguns fazem-no».

O misógino padre assassinou O’Connel em Fevereiro de 2002 quando este o confrontou com acusações de pedofilia. Ellison era apenas uma testemunha incómoda que foi por isso eliminado.

Ninguém o ligou aos assassinatos, excepto o padre que o perdoou pelo seu «pecado», até meados de 2004. Em Dezembro de 2004, o padre Erickson suicidou-se na igreja para onde fora transferido, St. Mary’s of the Seven Dolors, em Hurley, Wisconsin. Um dia depois de os polícias que investigavam o caso terem revistado a sua casa em busca de evidências que o ligassem aos assassinatos. Descobriram pornografia infantil no seu computador…

Erickson coleccionava armas e pornografia, consumia regularmente bebidas alcoólicas com os adolescentes a seu cargo e fora confrontado com acusações de abuso sexual anteriormente. E a hierarquia católica … recomendou aconselhamento psicológico como resposta! Três vezes! E transferiu-o do local do crime para bem longe…

Agora a família de um dos homens mortos, Daniel O’Connell, fartos do que consideram conivência da Igreja católica com os seus padres pedófilos interpuseram uma acção contra a conferência episcopal americana, em que nomeiam 200 bispos, na qual pedem os nomes e localização dos 5 000 padres acusados de abusar sexualmente de crianças, apenas nos Estados Unidos, claro.

Considerando que há menos de 30 000 padres em exercício nos Estados Unidos, este número dá uma ideia da dimensão do escândalo de pedofilia que tem abalado a ICAR americana. Mais de 17% dos padres acusados de pedofilia, um número significativamente superior aos 4% indicados como minorante do valor real no relatório de 2002. Claro que este relatório cobria um período de 52 anos, ou seja, os valores elevados dos últimos anos eram diluídos por décadas sem qualquer queixa…

11 de Agosto, 2006 Palmira Silva

Turquia e Estados Unidos iguais em fundamentalismo

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A revista Science (hiperligação para o material suplementar do artigo) publicou hoje os resultados da análise de sondagens internacionais conduzidas entre 1985 e 2005 que pode explicar porque aberrações como as descritas no post anterior acontecem nos Estados Unidos. De facto, dos países constantes, 32 países europeus, os Estados Unidos e o Japão, apenas na Turquia a percentagem de pessoas que não acreditam na evolução é superior à encontrada nos Estados Unidos.

Como um dos autores do artigo, Jon Miller da Michigan State University, indica «O protestantismo americano é mais fundamentalista que todos excepto talvez o fundamentalismo islâmico, e por isso nós estamos tão próximos da Turquia».

Recomendo as análises do artigo no Pharyngula e no Panda’s Thumb.

11 de Agosto, 2006 Palmira Silva

Criacionistas vs Universidade da Califórnia

Há um ano escrevi sobre uma acção interposta contra a Universidade da Califórnia, UC, uma rede pública compreendida por 10 universidades que incluem a Universidade pública mais bem classificada no ranking das Universidades americanas, UCBerkeley, a UCLA (Universidade da Califórnia, Los Angeles) e a UCSD (Universidade da Califórnia, San Diego) por uma uma associação de escolas secundárias cristãs e a Escola Cristã do Calvário que acusaram a Universidade da Califórnia de discriminação contra as escolas que ensinam criacionismo, que consideram integrante da liberdade de expressão e religião.

A acção, interposta pela Association of Christian Schools International, (uma organização que à data integrava 800 escolas cristãs e hoje mais de 4000) e a Escola Cristã do Calvário em Murrieta, é defendida por Robert H. Tyler, pertencente a uma organização anti-ACLU, o oxímero Advogados para a Fé e Liberdade, e Wendell R. Bird, um ex-membro de outro oxímero, o Institute for Creation Research.

Os queixosos pretendem acabar com os ateus critérios de admissão da UC, isto é, com a política «ateísta» da Universidade em rejeitar disciplinas de biologia que sejam «inconsistentes com o conhecimento aceite universalmente na comunidade científica». Nomeadamente disciplinas que assentem nos livros de (pseudo)biologia publicados pela Bob Jones University Press e A Beka Books. Segundo a acção, esta política viola os direitos dos queixosos de «liberdade de expressão, liberdade de discriminação com base em opiniões, liberdade de religião e associação, liberdade de discriminação arbitrária, igual protecção das leis e liberdade de hostilidade contra a religião».

Nunca pensei que o caso tivesse pernas para andar mas aparentemente essa não foi a opinião do juíz S. James Otero, que embora descartando parte das alegações permitiu, numa decisão provisória, que a acção prosseguisse com base na liberdade de expressão, associação e religião. De facto, o juíz demonstrou preocupação por apenas uma escola evangélica integrar o processo, enquanto escolas católicas, judaicas e islâmicas não têm problemas com os critérios de admissão da UC.

Esperemos que antes da decisão definitiva o juíz possa apreciar que a razão do que considerou discriminação contra os evangélicos não tem nada a ver com religião mas sim com os curricula anti-científicos das escolas evangélicas. Se não vejamos alguns exemplos:

Logo na introdução de um dos livros em questão os autores avisam que:

«As pessoas que prepararam este livro tentaram consistentemente pôr em primeiro lugar a palavra de Deus e a ciência em segundo»

Continuando desancando os ateus cientistas que ignoram a palavra de deus e se arrogam a

«afirmar que o gafanhoto evoluiu há 300 milhões de anos. E pode-se encontrar a descrição de um qualquer insecto a partir do qual supostamente o gafanhoto evoluiu e uma descrição dos insectos que os cientistas dizem ter evoluído do gafanhoto. Pode mesmo encontrar-se uma explicação ‘científica’ da praga bíblica de gafanhotos no Egipto. Estas afirmações são conclusões baseadas em ‘ciência suposta’. Se as conclusões vão contra a palavra de Deus, então as conclusões estão erradas, não importa quantos factos científicos parecem suportá-las».

A minha favorita continua a ser a definição de falácia encontrada no livro:

«Falácia: tudo o que contradiz a verdade revelada de Deus, não importa quão científico, quão estabelecido ou quão aparentemente consistente e lógico pareça».

10 de Agosto, 2006 Palmira Silva

Amor cristão: ecumenismo

Depois dos protestos encenados pelos crentes que nos lêem acerca do termo que utilizei, vacuidade, para descrever as conclusões de algumas constatações experimentais sobre as pretensões católicas de que a sua é uma religião de tolerância e amor, mais um exemplo recente, para além daqueles que enchem os nossos arquivos, confirmam a pertinência do termo.

Por informação de um dos nossos leitores do outro lado do Atlântico cheguei a esta notícia que dá conta que dois indígenas de uma comunidade do estado de Chiapas, no sudoeste do México, foram detidos por se atreverem ao desplante de professarem uma versão do cristianismo que não a católica.

Os dois evangélicos em causa, Roberto Vicente Pérez e Carlos Jiménez López, encontram-se presos na casa comunitária desde domingo. Os católicos exigem o pagamento de 6 mil pesos (cerca de 500 euros) para soltar os dois homens, apesar de eles «não terem cometido algum delito».

O pastor Alonso González, coordenador de assuntos religiosos de San Cristóbal de las Casas, denunciou ainda que os católicos destruíram na semana passada um templo evangélico em Majomut, em San Juan Chamula.