31 de Agosto, 2006 Palmira Silva
Hitler, Darwin e evolução
O último ataque dos IDiotas à evolução é, para variar, um tiro no pé. Na total falta de argumentos científicos, os fundamentalistas cristãos recorreram à táctica habitual dos apologetas: a mentira pura e dura num revisonismo histórico que seria rísivel não fora essa mentira ser prodigamente transmitida não só nas inúmeras estações de televisão cristãs nos Estados Unidos como nalgumas estações públicas.
De facto, o documentário Darwin’s Deadly Legacy: The Chilling Impact of Darwin’s Theory of Evolution, produzido pelo teocrata James Kennedy, o tele-evangelista do Coral Ridge Ministries, em colaboração com os acéfalos apóstolos do Discovery Institute, nomeadamente o presbiteriano Philip Johnson e o católico Michael Behe, pretende mostrar «porquê a evolução é uma má ideia que devia ser descartada no caixote de lixo da História».
Isto é, não interessa que cientificamente a evolução seja inatacável, de facto seja a pedra basilar de todas as ciências da vida, a evolução deve ser substituida pela IDiotia ou neo-criacionismo porque… Hitler era, supostamente, um evolucionista!!
Para além de ser uma falácia óbvia, uma mistura de Apelo às Consequências (argumentum ad consequentiam) com um argumento ad hominem, o documentário é um tiro no pé porque na realidade Hitler era um criacionista! Ou seja, como Hitler é reconhecidamente um dos maiores monstros psicopatas que a humanidade produziu, os devotos cristãos deturpam a verdade histórica para usar o criacionista católico Hitler para advertir os mais ignorantes do perigo quer do ateísmo quer do evolucionismo, que ululam de dedo em riste terem sido as causas do Holocausto!
Na realidade, como indica Ed Brayton nos Despachos das Guerras Culturais, uma análise, por exemplo do Mein Kampf, mostra claramente que Hitler, como bom católico, não só acreditava ter sido o homem criado à imagem de Deus como negava como absurda a hipótese evolucionista de evolução do homem de um ancestral comum ao macaco.
Um artigo recente na revista Archaeology, que descreve como Heinrich Himmler criou um instituto de investigação chamado Deutsches Ahnenerbe – Studiengesellschaft für Geistesurgeschichte (Ancestralidade Germânica – Sociedade de Investigação e Ensino), destinado a fabricar evidências da superioridade ariana, a tal raça nórdica superior (e mítica) que Hitler achava ser «um pecado contra a vontade do Eterno criador» contaminar por miscigenação com «raças» inferiores. Assim, os arianos deveriam compreender que era uma missão divina «dar ao Todo Poderoso Criador seres como Ele próprio fez à Sua imagem», ou seja, «O Weltanschauung (visão do mundo) que baseia o Estado numa ideia racial deve ter sucesso na promoção de uma era mais nobre, na qual os homens não mais darão atenção exclusiva ao cruzamento e criação de cães e cavalos e gatos com pedigree, mas envidarão os seus esforços para melhorar a raça humana».
De acordo com o artigo, «Himmler também encontrou tempo num encontro para transmitir a Bohmers [um dos arqueólogos do Ahnenerbe] a sua posição pessoal no assunto evolução do homem. Deve ter sido uma conversa instrutiva. Como Bohmers depois indicaria, Himmler descartou imediatamente a hipótese de que a raça humana estava próxima dos primatas. Estava igualmente indignado com uma ideia avançada por outro investigador alemão que propunha ser o Cro Magnon descendente do Neandertal. Para Himmler, ambas as hipóteses [a evolução e a relação entre Cro Mgnon e Neanderthal] eram ‘cientificamente completamente falsas’. Eram igualmente ‘muito insultuosas para os humanos’».
Como termina Ed Brayton, os fundamentalistas cristãos distorcem as evidências históricas da mesma forma que distorcem as evidências científicas e tentam, em completa oposição e negação de todos os factos históricos e científicos, distorcer a realidade para impor a sua mundivisão patética, assente não na realidade mas em mitos. Fabricando o mito de um Hitler ateu e darwinista para suportar o seu mito de um Criador/Designer inteligente!
Infelizmente, as televisões públicas americanas que em tempos transmitiam programas como o Cosmos de Carl Sagan agora devotam-se a propagar mentiras e a envenenar a opinião pública, à boa maneira nazi, com lixo como o é este «documentário» cristão!