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Mariana de Oliveira

13 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

Publicidade blasfema

Via um comentário do Boss, do Renas e Veados, soubemos que a associação «Croyances et Libertés», no passado dia 25 de Fevereiro, levou a tribunal (leiam-se também as notícias de 10 e 11 de Março da Laic.info) os criadores de moda Marithé e François Girbaud e a agência de publicidade Air Paris, por «injúria visando um grupo de pessoas em razão da sua religião, nomeadamente o catolicismo».

A associação pretende o fim imediato da campanha publicitária tanto nos jornais como nos «outdoors». A publicidade consiste numa interpretação livre de «A Última Ceia», de Leonardo da Vinci, e que, de acordo com o advogado daquela organização, «coloca mulheres em posições lascivas e altamente sugestivas (…), comportamentos eróticos e blasfemos ao olhar do que constitui ou essencial para os cristãos, ainda para mais, estamos em plena Quaresma».

Entretanto, porque o julgamento foi adiado, a estratégia da «Croyances et Libertés» evoluiu, ou seja, em vez de invocar a blasfémia, põe em evidência «a indecência» da utilização «mercantil» de um «elemento fundamental para os católicos».

No dia 10 de Março, o tribunal decidiu a favor da associação alegando que «a escolha de instalar num local de passagem obrigatória do público este cartaz de grandes dimensões constitui um acto de intrusão agressiva e gratuita nas bases das crenças íntimas». A isto os juízes acrescentam: «a ligeireza da cena faz desaparecer todo o carácter trágico inerente ao evento inaugural da Paixão».

À interdição da publicidade acrescenta-se o pagamento de uma multa de 100 000 euros por cada dia de atraso na sua retirada, a sociedade GIP, de quem depende a marca F & M Girbaud, e a Decaux são igualmente condenados no pagamento de 10 000 euros à «Croyances et Libertés».

Esta condenação é apenas uma de uma série de acções com o objectivo de criminalizar a blasfémia. De facto, os estatutos da associação «Croyances et Libertés» propugnam a defesa dos católicos contra «atentados aos seus sentimentos religiosos ou convicções religiosas que possam sofrer por parte da rádio, da imprensa, do cinema, da imagem ou de qualquer outro suporte».

Por toda a Europa, onde despontaram os movimentos a favor da liberdade de expressão e da liberdade de imprensa, somos confrontados com um crescente número de iniciativas cujo objectivo é reintroduzir o crime de blasfémia nas legislações penais (vejam-se os artigos do Diário Ateísta «Censura Cristã», «Lei da blasfémia em debate no Reino Unido», «A outra face», «Blasfémia! Vejo-me grego para entender isto», «A lei da blasfémia – a saga continua», «Imaculada contracepção», «Blasfémia», «Não à chantagem religiosa» e «Submissão») . Nos actuais Estados de Direito Democráticos tal crime é inconcebível, uma limitação inadmissível do direito de exprimir livremente as opiniões e uma cedência obscena a grupos de pressão religiosa.

12 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

52

O New York Press presenteia-nos, esta semana, com as «52 situações mais engraçadas acerca da morte do Papa». Por exemplo:

«48. Todo o mundo espera até ao útltimo momento por uma súbita melhoria do estado de saúde do Papa. Longas filas de raparigas, nas Filipinas, ajoelham-se e rezam. Por toda a parte, católicos, com as orelhas comprimidas contra os rádios, especados. O Papa solta um último gemido, cospe, morre.(…)

45. O Papa deixa a Terra quando o «Hitch» está no topo das vendas de bilheteiras em todo o mundo.(…)

35. O médico sente a pulsação no pescoço do Papa e cai-lhe uma orelha.(…)

23. Os médicos, ao examinarem o corpo, não só descobrem que o Papa era uma mulher mas também Hitler.(…)»

Tem a sua graça portanto, dêem uma vista de olhos.

11 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

Comemorações

Hoje é o dia da disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica e, este ano, é celebrado em todas as escolas desde o 1º ciclo do ensino básico ao secundário.

Numa mensagem enviada aos professores da disciplina, Augusto Cabral, director do Secretariado Nacional da Educação Cristã, referiu que os subsídios distribuídos por aquela organização – ligada à Comissão Episcopal da Educação Cristã, da Conferência Episcopal Portuguesa – aos professores de Educação Moral e Religiosa Católica «são simplesmente uma oportunidade de reflexão e de acção para ir ao encontro das várias dimensões do ser humano e para proporcionar estratégias pedagógicas comuns». Dimensões e estratégias comuns apenas aos católicos que, numa clara subversão de um ensino laico, privilegia uma religião em detrimento de outras ou de nenhuma. É de notar que esse subsídio oferecido pelo Secretariado Nacional da Educação Cristã vem a adicionar-se aos fundos dispendidos pelo Estado Português, provenientes dos nossos impostos, para financiar aquela disciplina religiosa.

Na referida mensagem, Augusto Cabral, afirma que a Educação Moral e Religiosa Católica quer «orientar na reflexão sobre o sentido da vida, promovendo o discernimento para uma lúcida compreensão dos acontecimentos, contribuindo para uma assimilação dos valores e para a aquisição de referências que permitam definir um Rumo para a existência pessoal». Muito bem, os católicos estão no seu direito de quererem «orientar na reflexão sobre o sentido da vida» dos seus fiéis graças à liberdade de culto e de consciência, mas esse direito não deve ser exercido num espaço de ensino público que é destinado a todos os alunos e que se quer neutral.

A existência de uma tal disciplina nos currículos dos alunos é, só por si, algo que arrepia a laicidade do ensino público, mas a comemoração da sua existência tem um pendor proselitista e arrogante inadmissível.

10 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

Infame decreto

O decreto 7/2005, de 1 de Março, da Presidência do Conselho de Ministros representa um dos mais flagrantes atropelos à Constituição da República Portuguesa. Este documento decreta o luto nacional pela morte da senhora Lúcia.

A Lei Fundamental, no seu art. 13º, estabelece um princípio da igualdade, ou seja, «todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei» (número 1)e «ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social» (número dois). Mais à frente, no art. 41º, estipula-se o seguinte: «a liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável».

Ora bem, o mencionado decreto afirma que «a Irmã Lúcia foi um dos testemunhos vivos de um acontecimento decisivo na História do Portugal contemporâneo – a sequência das aparições de Fátima -, tendo consagrado toda a sua existência a um culto e a uma reflexão que não deixaram indiferentes largas camadas da população portuguesa, incluindo os não-crentes». É inegável que a existência daquela senhora marcaram os não-crentes, especialmente com mensagens tão democráticas como aquela em que diz que Salazar foi um enviado de Deus.

Mas o pior deste texto é o facto de o Governo da República Portuguesa considerar como verdadeiras as aparições de Fátima, fenómeno contestado mesmo no seio da própria Igreja Católica, com o decreto a insistir: «de facto, as aparições de Fátima, de que a Irmã Lúcia foi directa interveniente (…)».

É inadmissível que, trinta anos após o fim do fascismo, tenhamos tido um executivo que vergasse a República de uma forma tão indecente à religião. É nestas alturas que desejo ter nascido por alturas da Primeira República.

10 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

Aquele dia

Comemorou-se, no passado dia oito, o Dia Internacional da Mulher. Noventa e cinco anos depois de ter sido proposto, por Clara Zetkin, na 2ª Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, continuamos a ter uma data que nos lembra que ainda não atingimos a paridade.

As religiões têm muita responsabilidade nesta discriminação. E não precisamos de ir para um país islâmico ou do chamado terceiro mundo para ver como as mulheres são tratadas. Há uma semana passada, neste nosso país civilizado, vimos um padre a disparar contra quem usa métodos contraceptivos; às portas de Lisboa pratica-se a excisão do clitóris; o aborto continua a ser crime e toda uma estranha moralidade defende o modelo tradicional da família em que a mulher tem de cuidar é dos filhos e do marido.

O ideal seria não ter um dia para comemorar a mulher.

7 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

Momento teatral

O novo livro de João Paulo II, «Memória e Identidade», em que o papa aponta como causa dos males do mundo o movimento iluminista que colocou a razão e a dignidade da pessoa acima da fé e de Deus, afirma que, «se o homem pode decidir por si mesmo, sem Deus, o que é bom e mau, pode também decidir que um grupo de pessoas seja aniquilado, como aconteceu com o nazismo e com o comunismo, e como pode ainda acontecer».

Muito bem, parece que a existência de Deus é uma espécie de filtro que impede más acções e genocídios. O que leva à questão da perseguição e extermínio de nativos americanos pelos europeus colonizadores. A Igreja esquece-se que não censurou aquele genocídio e apoiou o comércio de escravos e, assim, esquece-se que é tão fácil matar em nome de Deus como em nome de qualquer outro valor.

A esta conclusão chega o escritor francês Jean-Claude Carrière, na sua peça de teatro intitulada «A controvérsia de Valladolid», em que se encena o debate, em 1550, sobre se os povos indígenas da América podiam ser considerados ou não humanos. Bartolomé de Las Casas traz testemunhos de massacres, violações e assassínio de crianças enquanto defende que os «índios» deviam ser considerados «irmãos em Cristo». Do contra encontramos Sepulveda, que cita as Escrituras e Aristóteles para provar que «Deus criou-os para nós. Ele esperou até que a nossa vitória sobre os Mouros fosse completa antes de nos guiar para estas novas costas. E Ele quis que eles se submetessem a nós».

Infelizmente para nós, não temos possibilidade de viajar até ao outro lado do Atlântico e a peça de teatro está em cena em Nova Iorque.

6 de Março, 2005 Mariana de Oliveira

Santa ignorância

Dos Estados Unidos, o mais brilhante farol da Democracia e Liberdade ocidentais, chega-nos esta interessante carta de uma leitora do jornal «The Sun Times».
A senhora começa por dizer que «os ateus continuam a rastejar debaixo dos seus troncos podres» e que a Bíblia diz que são propositadamente ignorantes, ou seja, o que faz com que eles «ouçam exactamente o contrário do que está a ser dito». Há muito que não encontrava uma definição de ateísmo tão retrógrada e absurda como esta. Bem vistas as coisas, a autora da missiva talvez tenha razão: os ateus, em determinado ponto das suas vidas, analisaram de forma consciente a sua posição individual perante a divindade e escolheram o caminho da descrença.

De acordo com a senhora, o ateísmo acusa a cultura cristã de uma longa história de violência. E erradamente pois os feitos do ateísmo são muito piores: «o nazismo, o socialismo e o comunismo, que são praticamente o mesmo. A todos eles falta integridade intelectual e moral». Quanto ao nazismo, este Diário já se pronunciou sobre a relação deste movimento com a religião, relação essa de grande proximidade e apoio. Leia-se, por exemplo, dois artigos da Palmira intitulados «A religião e o holocausto», parte I e II.

Relativamente ao comunismo e ao socialismo, esses males vermelhos que foram tão diabolizados pelo imaginário norte-americano, essa ideia de estas ideologias políticas serem consequência lógica do ateísmo não pode ser mais falaciosa. Este é um fenómeno de culpa por associação, ou seja, se uma parte dos comunistas são ateus, dizem os teístas, que há uma ligação entre aqueles dois conceitos. Nada de mais errado. Os ateus, tal como os crentes, divergem na sua ideologia política: há ateus (e crentes) de todos os quadrantes políticos.

Os disparates não acabam aqui. Na carta pode também ler-se que o comunismo e o evolucionismo estão intimamente ligados. Porquê? Porque «Carl [ou Karl] Marx pediu a Darwin que escrevesse a introdução do “Das Capitol” [mais conhecido por “Das Kapital“] porque sentia que ele tinha fornecido uma base científica para o comunismo». Assim, «quem empurra a conspiração comunista, também empurra uma perspectiva evolucionista, imperialista e naturalística, que pretende retirar o Criador do Cosmos». Portanto, isto faz tudo parte de uma grande conspiração de «comedores de criancinhas ao pequeno-almoço».

Daqui, parte-se para a constatação de que Stalin assassinou mais pessoas do que Hitler e que Mussolini, «que frequentemente citava Darwin, disse que a guerra era necessária para a sobrevivência do mais forte». Para além disso, o subtítulo da obra paradigmática de Darwin é «Preservação de raças favorecidas na luta pela vida». E a senhora pergunta: «quem é que decide as “raças favorecidas”»? A mim, que sou ateia, parece-me que ninguém tem capacidade de decidir isso, crente ou não crente, e essa ideia de «decisão» é absurda.

A seguir, a senhora adianta que «Cristo odiava assassinos de bébés» e que os descrentes são responsáveis pelo holocausto americano do aborto. Acho que não é preciso ser-se Cristo para não se ter especial carinho por assassinos, de bebes ou não. Os ateus não desprezam mais a vida do que o comum crente. Para além disso, quanto ao aborto, os ateus – como, de resto, os crentes – divergem profundamente de opiniões.

Para terminar, «Pol Pot, Osama bin Lauden [sic], Saddam (não cristãos) mataram milhões» e «milhões de cristãos estão a ser mortos no Sudão por ateus». Tanta ignorância junta é desesperante. Esta senhora junta o associa o ateísmo ao comunismo, ao fundamentalismo islâmico (ou seja, religioso) e a um regime ditatorial que a única filosofia que defendia era o poder do seu chefe. É de ficar boquiaberta!

23 de Fevereiro, 2005 Mariana de Oliveira

Falemos, claro

O Diário de Notícias revela-nos um grande defensor da moral e dos bons costumes, o senhor João de Mendia que, a fazer coro com o senhor João César das Neves, torna aquela publicação num órgão propagandístico da ICAR.

O artigo de opinião do senhor Mendia está cheio de bonitas pérolas que merecem ser largamente divulgadas. A primeira é esta: «Dois mil anos antes de Marx, Lenine, Estaline, Mao, Engels, Pol Pot, ou mesmo Robespierre, Descartes ou até do dr. Arnaut, já tinha havido Alguém que veio dar sentido à Humanidade, fazendo dela uma comunidade de homens livres, esses, sim, verdadeiramente livres, onde cada um deles, se quiser, pode ser bom e justo. Suponho que este «Alguém» seja uma personagem que dá pelo nome de Jesus de Nazaré e que, segundo dizem, andou a espalhar uma mensagem de paz e amor universal, percursora do movimento hippie dos anos 60. Se essa era realmente a mensagem daquela personagem, foi completamente adulterada por uma organização que dá pelo nome de Igreja Católica Apostólica Romana e cuja filosofia e valores são bem conhecidos do leitor.

Mas, continuemos. «E a liberdade, a verdadeira liberdade, está exactamente nisto se quiser. É o amor, a fé e uma dimensão sobrenatural acima dos homens que Deus propõe, e nós aceitámos. Não aquela limitação um tanto farisaica a que chamam “direitos do homem” onde este é o princípio e o fim de tudo. E não é». Pois é, os direitos do Homem – que incluem as inalienáveis dignidade da pessoa, liberdade e igualdade -, são considerados limites hipócritas pelo autor do artigo. Isto em nome de uma vã quimera que apenas confere a respeitabilidade do Homem depois da morte e se não for parar ao fogo do Inferno.

No entanto, a opinião do senhor João de Mendia não versa sobre os direitos do Homem e a sua natureza mais ou menos farisaica. Versa, isso sim, sobre um mal muito maior do que a luta pela dignidade da pessoa humana: a Maçonaria. «A propósito da atitude do PR, a meu ver infeliz, grave e insultuosa, e o sequente aproveitamento do GOL aquando da cerimónia maçónica na Basílica da Estrela que precedeu o enterro do dr. Nunes de Almeida». O dr.Nunes de Almeida não era católico, era maçon e, pela sua posição de destaque, como juiz do Tribunal Constitucional, o funeral de Estado obrigou a que as cerimónias fúnebres fossem realizadas naquela igreja.

Continuando, «sua Eminência recordou, de forma acessível e inequívoca, a posição da Igreja face à Maçonaria. Esta posição do sr. D. José Policarpo não pode, nem deve, ser interpretada como reacção, se bem que legítima, da hierarquia da Igreja aos constantes e cada vez mais insistentes ataques que lhe vêm sendo feitos pela Maçonaria, mas tão-só, e a propósito daquele grave insulto, muito grave, para relembrar aos fiéis da sua definitiva e total incompatibilidade com qualquer obediência maçónica». Que ataques têm sido perpetrado pela maçonaria aos desígnios da ICAR não sabemos, mas suponho que seja algo de altamente conspirativo integrado num plano mais lato de dominação global. Quanto à total incompatibilidade com obediências maçónicas, ela só se verifica de um lado: se a ICAR não permite aos seus membros a participação na Maçonaria, o inverso já não é verdadeiro.

O senhor Mendia, muito vexado na sua consciência católica, afirma que o dr. Arnaut, grão mestre do Grande Oriente Lusitano não podia ter menos razão ao ter dito que «determinado bispo de Lisboa teria sido um destacado maçon», especialmente porque «não se sabe por que regras se regem os maçons, dizer que esta ou aquela personalidade é da Maçonaria só passaria a ser crível quando os nomes de todas as outras passarem a ser públicos». De qualquer maneira, para Mendia, o dr. Arnaut só tem razão «para os maçons, mas é disso que quase todos nos andamos a queixar há 200 anos». De facto, há duzentos anos há muita gente a queixar-se da defesa da igualdade, da fraternidade e da liberdade, valores caros não só à Maçonaria mas a qualquer cidadão minimamente consciente.

Após uma onda de verborreia contra o grão-mestre do Grande Oriente Lusitano e da espiritualidade que existe numa cerimónia fúnebre maçónica, encontramos esta pérola «Não se entende, igualmente, onde estará o espiritual numa organização furiosamente ateia e materialista como a Maçonaria». Não sei onde é que se foi buscar o ateísmo. Que eu saiba, não é condição para ingresso na organização em causa a recusa de um ser supremo. Na verdade, a ideia do Grande Arquitecto tem o seu quê de espiritual e de algo de divino.

Finalmente, o senhor Mendia fala no caso do padre Lereno que, indo contra a lei, falou aos fiéis, não só da sua igreja, como afirma o autor do texto, mas também os que o ouviam na rádio, «sobre os perigos reais de se poder estar a votar, nestas eleições de Fevereiro, em partidos que têm nos seus programas propostas contrárias ao preceituado pela Igreja em relação à sua doutrina e fé». Alertou e alertou bem, segundo o senhor João, «para a defesa da vida contra a cultura de morte que alguns partidos querem ver generalizada na vida portuguesa. Não só fez bem como tinha a estrita obrigação de o fazer». Independentemente de ser a favor ou não da despenalização do aborto ou do suicídio assistido, o padre de Lisboa, no exercício das suas funções, induziu os eleitores a não votarem em determinados partidos políticos. A última pérola é de morrer: «O Estado deverá ser neutro, com certeza, mas o Estado tem pessoas lá dentro. E essas pessoas, graças a Deus, em Portugal, há 900 anos que são quase todas católicas». Ora, então, o princípio da laicidade do Estado é completamente ignorado por João de Mendia que, pelos vistos, ainda não se deu conta que vivemos num Estado de Direito Democrático há trinta anos e que a carcaça de Salazar já teve tempo de se transformar em pó.

Deste artigo de opinião podemos retirar algumas conclusões:
1. Que a Igreja Católica está a reabrir as hostilidades contra a Maçonaria, como a Palmira já tinha comentado num texto publicado neste Diário;
2. Que a Igreja Católica continua a arrogar-se como defensora de uma moral suprema;
3. Que a laicidade do Estado é ignorada por muitos católicos com alguma influência no espaço público.

23 de Fevereiro, 2005 Mariana de Oliveira

Não ao monopólio

O Supremo Tribunal de Justiça alemão considerou improcedente o pedido da diocese de Karlsruhe que reclamava a proibição do título da colecção «Pro Fide Catholica», de uma editora bávara que publica livros críticos para a Igreja. Nesta colecção publicaram-se livros como «Karol Woityla als Familienvater» («Karol Woityla como pai de família») e «Falsche und Echte Papstweissagungen» («Predições papais verdadeiras e falsas»).

Aquele tribunal superior decidiu que a Igreja apenas tem o direito de reivindicar o uso da palavra «católico», tanto em alemão como em latim, quando esta é referida à denominação de instituições e a actos eclesiásticos.

Assim, os juízes entenderam que a ICAR não tem o monopólio sobre o termo em questão. Portanto, na Alemanha, poder-se-á recorrer à designação «católico» à vontade sem correr o risco de se ser perseguido judicialmente por «violação da marca registada».

20 de Fevereiro, 2005 Mariana de Oliveira

O verdadeiro problema do Islão

Hugo Macedo deixou-nos uma sugestão de leitura imperdível: a entrevista de Faouzi Skali ao «Público».
«Faouzi Skali», lê-se no artigo, «52 anos, sufi, antropólogo e professor da Universidade de Fez, em Marrocos, é o fundador e director do Festival das Músicas Sacras do Mundo, e foi eleito pela ONU, em 2001, como uma das 12 figuras mundiais que mais contribuíram para o diálogo entre culturas e civilizações. O seu actual projecto é criar em Fez um centro de diplomacia intercultural e inter-religiosa, aberto a todas as culturas do mundo. É autor de diversas obras sobre o sufismo».

Nesta entrevista, Skali explica o que é o sufismo e fala sobre os problemas do Islão, nomeadamente da promiscuidade entre a religião e a política – que, a seu ver, «hoje, o verdadeiro problema no mundo muçulmano é definir a relação entre religião e política» -, do terrorismo islâmico e da relação com o Ocidente.

Pela análise equilibrada, de um ponto de vista de um muçulmano, do que se passa no mundo é um texto que vale a pena ler.