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23 de Janeiro, 2005 lkrippahl

Ecumenismo Ateu.

Ultimamente a questão da tolerância tem levado a uma certa intolerância entre ateus, agnósticos e crentes. Infelizmente, temos mais tendência para ver diferenças que semelhanças, e projectamos nas pessoas as diferenças que vemos entre as suas ideias e as nossas. Acaba-se a atacar gente em vez de discutir assuntos…

E isso é especialmente trágico porque as diferenças acabam por ser pouco importantes. O Ateu e o Crente são opostos, evidentemente; um diz que não há deuses, o outro diz que há. Mas, se virmos bem as coisas, isso é uma questão de pouca importância. A nossa vida é muito mais que a questão da existência de deuses.

Para o ateu (nem todos almejamos a letra maiúscula, felizmente) o importante é que, não havendo deuses, não há dever nenhum de acreditar neles. Quem quer acredita no que quiser, quem não quiser não acredita. A maioria dos ateus não está preocupado com o que os outros acreditam ou deixam de acreditar.

Para o crente (que também tende a ser de letra pequena, pois a grande maioria acaba por ser crente para umas coisas mas descrente para outras, e ainda bem) o importante é a sua atitude pessoal de crença. Poucos são os fanáticos que acham merecedor de sofrimento eterno todo o que acreditar em qualquer coisa que saia da fé «oficial». Para o crente também é importante que cada um seja livre de crer, ou de não o querer.

Preocupa-me que crentes, agnósticos, e ateus se agridam com a questão metafísica e pouco relevante da existência de deuses, quando no fundo quase todos concordam com o que é importante: não se deve impor crenças. Isso é que interessa!

Não interessa se um acredita e outro não. O que interessa é que crianças órfãs não se tenham que sujeitar à religião que a instituição em que calham lhes queira impor; que sacerdotes duma ou outra religião não possam abusar da confiança e poder que a sua posição lhes dá; que as organizações religiosas se sujeitem à lei e respeitem a nossa Constituição e os direitos Humanos. Estas coisas interessam tanto a crentes como a ateus.

É certo que muitos crentes não se importam que a religião seja imposta, desde que seja a deles e não outra. Esse é talvez o maior obstáculo ao «ecumenismo» ateu: persuadir os crentes que todos ganhamos em encarar a crença ou descrença religiosa como um direito individual e não como um dever sagrado. Mas não é a atacar pessoas, a ofender, ou a ameaçar as suas crenças que conseguimos uma sociedade mais tolerante.

18 de Janeiro, 2005 lkrippahl

Os valores de um ateu

O Ateu não crê em deuses, segue apenas a razão, não tem fé no que não vê. Por isto, dizem os crentes, não tem valores nem base para a moral. Mas os crentes que nisto crêem enganam-se. A crença muitas vezes engana, e é talvez a aceitação deste facto que mais distingue o Ateu do Crente.

A razão é uma ferramenta útil para processarmos observações. Tal como qualquer ferramenta, usada por si só, sem mais nada, não leva a lado algum. Disto são exemplos tentativas de crentes, de Tomás de Aquino a Descartes, de provar a existência de deuses com recurso apenas à razão. É martelar sem pregos… um exercício fútil pois a conclusão é função apenas dos axiomas em que decidimos acreditar à partida. Tomás de Aquino assumiu que tudo o que se move tem que ser movido por algo mais; com essa premissa, não é de estranhar que tenha concluído que tem que haver algo mais que aquilo que observamos mover-se.

A atitude de dúvida comum a muitos ateus não resulta em usar apenas a razão. Pelo contrário, leva-nos, ateus, a sujeitar a razão ao que observamos. Não tiramos os nossos axiomas do chapéu, nem assumimos verdades incontestáveis. Usamos a razão como ferramenta para compreender o que observamos.

E essa atitude de dúvida não leva ao vazio moral. É verdade que observamos que os valores são subjectivos. A subjectividade dos valores estéticos todos aceitam (de gustibus non est disputandum), mas a subjectividade dos valores éticos e morais é igualmente óbvia. O Crente vê apenas duas alternativas: ou acreditamos que os valores morais são ditados por Alguém a quem todos temos que obedecer, ou a moralidade passa a ser algo puramente subjectivo sem qualquer fundamento. Mais uma vez, o Crente engana-se: não só estas duas alternativas são a mesma coisa, mas há outra que lhe escapa.

Precisar de Alguém para fundamentar a nossa moral é o mesmo que dizer que a moralidade é subjectiva. É certo que o pecado de comer carne à Sexta-feira parece mais sério se resultar dum juízo divino que se provier dum momento de fraca inspiração dum membro do Clero. Mas nem por isso deixa de ser subjectivo; apenas se substitui um sujeito humano por um alegadamente divino. Se a moral fosse objectiva não precisávamos de um deus para decidir o que é bom e o que é mau, tal como não precisamos de fé para determinar a carga do electrão.

E isto não nos reduz à subjectividade pura. É que esta propriedade dos valores, de serem subjectivos, é uma propriedade objectiva. Independentemente da opinião de cada um, os valores são sempre subjectivos. Com isso podemos contar. E isso pode servir de fundação para a moral; serve para a minha, e acho que estou bem servido. Passo a explicar.

Como os valores são subjectivos, eu não defendo um conjunto de valores como bons rejeitando outros como maus. O que eu defendo são os valores de todos, e todos os valores. Por isso sou a favor da legalização do casamento de homossexuais. Não é uma opção que escolheria para mim, mas se duas pessoas têm valores diferentes dos meus e preferem esta opção, devem ter o direito a ela. Não é simplesmente por eu ou outros discordarmos que se deva priva-los do reconhecimento dos seus valores. Por outro lado sou contra a violação ou a tortura. O violador pode ter valores diferentes dos meus, e achar que está a fazer bem, mas se a vítima discorda os seus valores também contam. Ou seja, quando tomo uma decisão moral, em vez de perguntar o que este ou aquele deus prefeririam, pergunto o que será melhor para os seres envolvidos de acordo com os seus próprios valores. Seja deus ou mortal, valores são sempre subjectivos, por isso mais vale basearmo-nos nos valores dos que sofrem as consequências da decisão a tomar.

Proponho isto apenas como uma de muitas hipóteses para fundamentar uma moral sem recurso ao divino. Não é necessário que todos os ateus concordem com esta abordagem. Aliás, a minha moral está em conflito com a maioria dos ateus em alguns pontos. Um exemplo é o aborto. Se por um lado respeito o juízo de valores da mulher que não quer que aquele feto se transforme num bebé para amamentar, numa criança para educar, num adolescente para aturar e sustentar até finalmente sair de casa dos pais, por outro lado tenho também que considerar que todos esses estágios de desenvolvimento serão de grande valor ao ser que vai ser abortado. No caso da gravidez resultar dum acto sexual voluntário e de não haver riscos de saúde que justifiquem o aborto, sou moralmente contra esta prática. Nisto vejo como erradas as abordagens tanto dos que são contra por considerar a vida humana sagrada como os que são a favor da escolha por considerar que um feto não é uma pessoa: ambos cometem o erro de projectar os seus valores subjectivos nos dois seres mais directamente afectados por esta decisão.

Outro exemplo é a minha objecção moral ao consumo de carne de alguns animais. Acho que as vacas e os porcos, entre outros, sofrem demasiado na criação, transporte, e abate para que o meu gosto por bifes e costeletas justifique a minha participação nesta actividade. Por isso recuso-me a comprar estes produtos.

Em suma, não é verdade que a descrença no divino ou a aceitação da subjectividade dos valores negue a moralidade. Até considero bastante mais moral aquele que age de acordo com os seus princípios que aquele que se sujeita aos princípios de outrem por medo do castigo eterno. E não é verdade que negar a natureza sagrada da espécie humana nos obrigue a um comportamento animalesco e imoral. Pelo contrário, a compreensão que somos todos animais e que todos os organismos são parentes, descendentes de ancestrais comuns, obriga-nos a um respeito muito maior pela natureza da qual fazemos parte.

26 de Dezembro, 2004 lkrippahl

Foi Natal.

Recentemente muitos celebrámos um dia que se associa à mitologia Cristã. É certo que esta celebração é muito mais antiga, originalmente ligada ao solstício de Inverno, mas marca hoje em dia um dos acontecimentos principais para os Cristãos: o nascimento do seu deus. O único que o rivaliza é a Páscoa, também uma celebração muito anterior ao Cristianismo, mas que agora marca a morte do seu deus.

E isto dá que pensar. Parece que os principais marcos do Cristianismo são o nascimento e a morte do seu deus. O próprio credo Católico parece resumir a história de Jesus a isto:

«Creio em Deus Pai todo-poderoso, Criador do Céu e da Terra; e em Jesus Cristo, seu único Filho, Nosso Senhor; que foi concebido pelo poder do Espírito Santo; nasceu da Virgem Maria; padeceu sob Pôncio Pilatos; foi crucificado, morto e sepultado; desceu aos Infernos; ressuscitou ao terceiro dia; subiu aos Céus; está sentado à direita de Deus Pai todo-poderoso, de onde há de vir a julgar os vivos e os mortos. Creio no Espírito Santo; na Santa Igreja Católica; na Comunhão dos Santos; na remissão dos pecados; na ressurreição da carne; na vida eterna. Amén.»

Não terá esta história coisas mais importantes que um nascimento milagroso, uma morte dolorosa, e uma ressurreição?

Há vinte séculos foram escritas muitas histórias acerca de Jesus. A Bíblia Católica contém quatro evangelhos seleccionados especificamente pela forma como se encaixam, para minimizar contradições. Mas mesmo estas, selecção limitada, não foram escritas com intuito de serem crónicas rigorosas da vida deste personagem. Foram escritas como expressões de ideologia, que codificassem os princípios deste movimento religioso.

Mesmo que não possamos dizer se existiu um Jesus de facto, se era um personagem composto de vários episódios que tenham acontecido a várias pessoas, ou se era apenas um personagem metafórico e imaginário, o facto é que houve um grande esforço filosófico e literário por detrás destas obras, quer dos evangelhos quer das várias cartas escritas pelos fundadores do Cristianismo. Vejamos alguns.

«Amarás o teu próximo como a ti mesmo» Gal.5:14. Inovador na altura, e muito actual hoje em dia. Não só amar, mas respeitar os outros como a nós próprios. Igualdade, liberdade, fraternidade. Uma ideia central na nossa sociedade moderna. Infelizmente, não para a Igreja Católica, onde as mulheres são discriminadas e onde uns são mais iguais que os outros.

«Então Jesus entrou no templo, expulsou todos os que ali vendiam e compravam» Mat 21:12. O Jesus desta história era obviamente contra a comercialização da religião. Mais, as suas críticas aos Fariseus, os seus ensinamentos que a oração devia ser privada, a sua rejeição da autoridade religiosa de então, da soberba das vestimentas, do ritual repetitivo e pouco sincero, tudo isto transmitia uma ideia que pode ser facilmente projectada na nossa sociedade moderna: a religião como algo pessoal e privado, e que deve estar separada do poder político e económico. Mais um ensinamento importante que a Igreja Católica esqueceu. A Igreja Católica controla vastos fundos mas não paga impostos. Uma Concordata com o Estado Português confere-lhe poderes à margem da lei do nosso país. O ritual público, a hierarquia da Igreja, a própria forma como os seus líderes se vestem vão contra estes ensinamentos. Se Mateus ressuscitasse hoje, o comércio em Fátima matá-lo-ia de desgosto.

«Aquele dentre vós que nunca pecou atire-lhe a primeira pedra» Jo. 8:7. O perdão. A tolerância. Não julgar os outros só porque os nossos valores são diferentes. Mais um importante exemplo, mais um princípio fundamental na nossa sociedade multi-cultural, que a Igreja Católica prefere ignorar. A homossexualidade, a contracepção, a crítica sã, entre outras, são sistematicamente condenadas pela Igreja Católica. Até o ateísmo, pois mesmo que já não nos queimem em vida (felizmente!) ainda nos condenam ao fogo eterno por rejeitarmos o seu deus.

Como ateu não me fio na alegada origem divina destes ensinamentos. Mas, como ateu, sei que não precisamos de deuses para ter boas ideias, e respeito estas ideias que tiveram os autores do Novo Testamento.

Por isso entristece-me que uma organização como a Igreja Católica, supostamente a guardiã destes valores, prefira focar os aspectos supersticiosos dum nascimento milagreiro, ou o acto eticamente questionável de crucificar um inocente para salvar pecadores, ou exigir aos crentes que afirmem repetidamente que acreditam “na Santa Igreja Católica”.

Aproveitando o espírito natalício Cristão, pedia um favor aos Católicos. Quando disserem o Credo, substituam a afirmação de crença na Igreja pela crença na igualdade, na fraternidade, e no respeito pelos valores e crenças dos outros. Não só ficará o vosso credo mais próximo da ideia original, mas ajudarão o Cristianismo, outrora na vanguarda destes valores, a recuperar um pouco do seu grande atraso em relação à nossa sociedade.

19 de Dezembro, 2004 lkrippahl

Ciência ou Religião?

Têm sido muitos os conflitos entre ciência e religião. Giordano Bruno foi queimado vivo por ter especulado a existência de outros planetas habitados. Galileu teve mais sorte; escapou à sentença ao declarar publicamente que afinal não havia luas a orbitar Júpiter, e pouco mais de trezentos anos depois da sua morte até foi perdoado pela Igreja Católica.

Hoje em dia as coisas estão mais calmas, pelo menos em países como o nosso. Os astrónomos já descobriram centenas de planetas fora do nosso sistema solar, e não têm medo da fogueira por especular. Finalmente percebemos que a Natureza não dá muita importância às nossas convicções pessoais, e que, por isso, ter fé não adianta muito se queremos saber como as coisas são na realidade. A nossa sociedade reconhece que em matéria de facto a ciência é bastante mais fiável e merece autoridade sobre a religião.

Mas há ainda a noção que a religião é a maior autoridade em questões éticas e matérias de valor. Infelizmente, a nossa sociedade dá se mais peso à opinião dos padres que dos cientistas quando questiona o que é ético fazer numa área em que um cientista sabe muito mais que um padre. Não sei porquê. Não vejo porque uma demonstrada capacidade de acreditar no falso confere ao padre maior autoridade na determinação do que é ou não de valor, ou porque uma demonstrada capacidade em determinar o que é verdadeiro tira ao cientista capacidade de decidir o valor das coisas.

E penso que esta abordagem nos traz problemas concretos, como a investigação em células estaminais embrionárias.

A preparação duma linha de células estaminais embrionárias implica a criação dum zigoto, o seu desenvolvimento até a fase de blastocisto, e a destruição do blastocisto pela remoção da massa celular interna. Traduzindo: cria-se um ser humano, que em seguido é morto. Podemos tentar dar a volta ao problema arranjando definições mais ou menos restritas do que é um ser humano, mas eu penso que não é a definir palavras que resolvemos isto. E quero deixar bem claro que eu dou imenso valor a uma vida humana. Se estivéssemos a falar dum embrião saudável firmemente implantado no útero da mãe, eu concordaria que era um problema ético sério matá-lo, pois seria a diferença entre sete ou oito décadas de vida humana par esse ser, ou nada. Oitenta anos de vida é algo muito valioso para se deitar fora sem problemas.

Por isso, eu concordo com a posição da Igreja Católica quando diz, na encíclica _Evangelium_vitae_:

“O ser humano deve ser respeitado e tratado como uma pessoa desde a sua concepção”

Mas um zigoto na lâmina dum microscópio não está na mesma situação que um embrião implantado no útero. Não tem condições para se desenvolver, e está condenado ou a morrer ou a ser congelado. Nunca se desenvolverá o suficiente para dar valor à vida que tem. Retirar a massa celular interna a um zigoto sem condições para se desenvolver para ajudar outra pessoa com uma doença grave é como retirar um rim a um paciente em coma irreversível para salvar a vida a outra pessoa.

Parece que o problema da Igreja Católica é que o zigoto tem alma, e por isso a sua vida é “sagrada”, e não pode ser sacrificada para salvar outros mesmo que não tenha qualquer hipótese de se desenvolver, de ganhar consciência, e de dar valor à sua existência.

Isto de um deus colocar almas em todos os zigotos humanos parece-me problemático. Vejamos o caso dos gémeos verdadeiros, em que o blastocisto se divide acidentalmente e as duas partes se desenvolvem como seres humanos independentes. Será que este deus cria uma alma extra na altura da divisão, dá ao zigoto duas almas de início já a contar com o problema, ou será que um gémeo de cada par é um desalmado?

Sabemos também que cerca de um terço, ou talvez mesmo metade, das concepções não chegam a vingar, ou porque o blastocisto não se consegue implantar ou porque o embrião é abortado espontaneamente. Será que um deus infinitamente sábio e misericordioso coloca almas nestes seres sabendo que não viverão mais que umas semanas e nunca terão hipótese de se desenvolver?

Mais intrigante ainda é a ideia que este deus coloca uma alma num zigoto criado num laboratório para gerar uma linha de células estaminais. Porque faria tal coisa? E como podem os senhores padres saber que o seu deus foi de tal maneira insensato?

Tenho muito respeito pelas pessoas, acreditem no que acreditarem, mas, perdoam a honestidade, acho isto um disparate.

Mas vamos admitir que o zigoto ou blastocisto criado no laboratório e agora congelado a -70ºC tem uma alma. Mesmo assim, não se justifica manter essa alma aprisionada num punhado de células por período indeterminado. Se fosse eu, preferia que acabassem logo com aquilo e dessem algum uso àquelas células do que me deixarem preso num corpo microscópico dentro dum congelador. Ao menos a minha morte servia para ajudar outros, e tinha o céu garantido (podiam baptizar-me primeiro, se achassem necessário).

Em suma, esta abordagem feita de absolutos, da vida ser sagrada, da alma e tais coisas, está a causar um problema ético muito maior do que o que pretende resolver. Juntar um espermatozóide a um óvulo para fazer células capazes de curar leucemia ou regenerar órgãos não é um mal; é um bem. Separados, a vida desse espermatozóide e desse óvulo não era melhor, e tãopouco beneficiaria o zigoto de ser congelado para o resto da sua vazia existência. E é imenso o que se pode ganhar de tão modesto sacrifício.

Mas é uma questão de tempo. Galileu foi perdoado. Giordano Bruno ainda não, mas pelo menos a Igreja Católica já não queima ninguém por estas coisas. E eventualmente irá aceitar também a utilização de células estaminais embrionárias.

Digo isto porque ninguém proíbe a investigação destas técnicas em animais. Não têm alma, por isso não há problema. E quando tivermos curas simples e eficazes para a leucemia, para doenças degenerativas dos órgãos, entre outras, mas as pessoas só as poderem usar nos seus animais de estimação e não para salvar os seus filhos, ninguém vai dar ouvidos aos padres.

15 de Novembro, 2004 lkrippahl

Porque sou ateu

Para muitos na sociedade em que vivemos é uma questão de escolha pessoal se havemos de acreditar neste ou naquele deus, não acreditar em deuses, ou nem sequer decidir sobre o assunto. O ateísmo, o agnosticismo, e a fé são vistos como algo que cada um decide. Em parte isto está correcto, mas também está errado.

Um aspecto deste problema é objectivo: existe ou não existe algum deus? Sendo objectivo, não é uma questão de escolha. Eu não escolho se faz chuva ou sol, ou se a gravidade me puxa para a Terra. As coisas são como são. Parte do meu ateísmo é a conclusão que não há deuses, ou pelo menos que não há Deus como o costumam definir: omnipotente, omnipresente, criador do universo, entre outros atributos.

Esta conclusão deriva apenas da forma como o Universo se apresenta, e não da minha escolha pessoal. Não há fenómeno algum para o qual um deus seja a melhor explicação, e muitas observações contrariam a hipótese. Quantas crianças pisariam minas se houvesse um deus omnipresente e benévolo que lhes pudesse dizer para brincar noutro sitio?

Mas há outro aspecto da crença no divino. Deus também pode ser uma fonte de valores morais, um exemplo a seguir, uma ideia para nos orientar, e isto independentemente da sua existência objectiva. No que toca aos nossos valores, temos que escolher. Mas a minha escolha é que os meus valores são meus, e não são função do que outro ser possa ditar, por muito poderoso que seja.

Se um deus disser que a contracepção é pecado, eu discordo. Se um deus me mandar ir à missa todos os Domingos, eu recuso, porque acho que tenho esse direito. Se um deus ditar que quem não acreditar nisto ou naquilo será condenado ao sofrimento eterno, eu protesto, porque acho que ninguém deve sofrer pelas suas crenças. Não escolho os meus valores pelo que alguém poderoso me diz, mas pelo que dita a minha consciência.

Objectivamente o meu ateísmo não é escolha minha. As coisas são o que são, e tudo indica que não há deuses de verdade. E subjectivamente não escolho os meus valores ao sabor do que me dizem. As coisas que para mim parecem justas ou injustas continuam a parecê-lo mesmo que alguém todo poderoso dite o oposto. Em suma, sou ateu não porque escolhi ser ateu, mas porque escolhi aceitar a realidade como ela é, e assumir eu próprio a responsabilidade pelos meus valores.