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João Monteiro

28 de Outubro, 2022 João Monteiro

“Amai os vossos inimigos”

Texto de Onofre Varela, previamente publicado na imprensa

Enquanto cristãos (nós, Portugueses), por questões culturais, temos mais inclinação para a leitura dos Evangelhos do que para o Velho Testamento, e encontramos neles a exaltação das boas práticas sociais baseadas na fraternidade, com a intenção de se propagar a Paz entre os povos, o que só é possível almejar se cada um de nós entender o outro e respeitar as suas ideias quando são diversas das nossas. 

Não tenho dúvidas de que tais ensinamentos (atribuídos a Jesus) fazem parte da aspiração de todos nós, independentemente do lugar e da etnia a que pertencemos, e nos acompanha através de todos os tempos, no sentido de que seja possível almejar uma sociedade perfeita, sem guerras nem diferenças sociais. Bem sei que estas premissas são consideradas utópicas… mas não são impossíveis. 

Nas palavras de Lucas, no Sermão da Montanha (6; 27-39), estão contidos todos os modos de bem viver em comunidade quando esta é sadia. Vejamos o que nos diz ele (percorrendo o mesmo caminho já percorrido por Mateus [5; 1-12]): “A vós que me escutais digo o seguinte: amai os vossos inimigos e fazei bem aos que vos odeiam; a quem te bater numa face oferece-lhe a outra; a quem te roubar a capa dá-lhe também a túnica; dá a todo aquele que te pede, e quando levarem o que é teu, não reclames; tal como queres que as pessoas procedam contigo, procede com elas da mesma maneira”. 

A estes ensinamentos seguem-se algumas perguntas para aclarar propósitos: “Se amais aqueles que vos amam, que agradecimentos mereceis? Também os pecadores fazem o mesmo. E se emprestais àqueles de quem esperais receber, que agradecimento mereceis? Também os pecadores emprestam aos pecadores a fim de receberem o equivalente. Amai os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai, sem nada esperar em troca. Não julgueis para que não sejais julgados; não condeneis e não sereis condenados; perdoai e sereis perdoados; dai, e ser-vos-á dado”. 

Algum dos meus leitores conhece algum católico (ou crente num qualquer outro formato de fé) que proceda assim, conforme os mandamentos que considera sagrados? Quantos são os que emprestam dinheiro sem cobrar juros? Conheceis um banco, sequer, que tenha uma acção social e fraterna para com os seus clientes trabalhadores por conta de outrem? Algum banco já perdoou a dívida do empréstimo para habitação, em vez de tomar a casa e colocar o cliente na rua? (Mas o Novo Banco já perdoou grande parte da dívida de Luís Filipe Vieira!). 

No ano 2020 Jardim Gonçalves, presidente do Banco Comercial Português e membro destacado da seita vaticana Opus Dei, viu anulado, pelo Tribunal da Relação, o seu complemento de reforma no valor de 175 mil euros mensais (não é gralha: são 175.000 € por mês!) e o profundamente religioso católico e opusdeísta, não gostou de lhe ser permitido receber, “apenas” cerca de 70.000 euros, e recorreu da decisão do tribunal. Esta atitude do banqueiro tem algum resquício de “atitude cristã” ou da “santidade comportamental” propalada pelos membros da seita?… 

Relativamente ao mandamento que fala no dever de “amar os inimigos”, quantos são os profundamente católicos comedores de hóstias, que não amam, sequer, os amigos, quanto mais os inimigos?!… (É uma pergunta… não um julgamento). Quanto a julgar… já todos nós fomos “condenados” pelo julgamento de muitos dos nossos vizinhos e conhecidos, mesmo pelos mais fervorosamente crentes e tementes a Deus Nosso Senhor! Parece que até eu já fui alvo de julgamento por quem não me conhece, nada sabe de mim, nunca comigo falou e nem me viu!… 

As igrejas e as seitas ditas evangélicas são antros de hipocrisia e de interesses materiais camuflados pela espiritualidade religiosa? Quem souber que responda (ressalvando as raríssimas excepções à regra).

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)

OV

Imagem de Gerd Altmann por Pixabay
26 de Outubro, 2022 João Monteiro

Os piores de nós

Texto de Onofre Varela

As organizações que constroem as sociedades, são falíveis. Parece não haver organizações impolutas nem exemplares, e algumas delas são, até, mesmo, tenebrosas, como bem nos mostra a História com o exemplo do Nazismo que, nas suas origens, não revelava a maldade pela qual veio a ser conotado, mostrando o pior que pode habitar nas mentes de alguns de nós (e cuja ideologia ainda hoje tem partidários declarados, ou mais ou menos camuflados, inclusivamente com assento em Parlamentos europeus, considerando o Parlamento da nossa República!).

Todas as organizações políticas, sociais e religiosas, são a essência de nós. Fomos nós que as criamos e alimentamos. Qualquer análise crítica às malfeitorias já protagonizadas por aqueles que detinham o poder – seja político, económico, social ou religioso, e que, à época das suas práticas, eram considerados “os melhores de nós” e por isso lhes demos o poder ou, se não lho demos, consentimos que o tomassem – não deve esquecer a origem social do próprio analista que nunca se encontra fora da espécie que tais actos comete.

É o caso da Igreja Católica, tão rotulada de santidade, tão apregoadora do bem e do amor, e tendo na sua História milenar imensos casos nada dignos da moral que enforma os seus pregões!

De todas as acções menos correctas que ensombram a Igreja Católica, parece não haver dúvida de que as mais graves serão as que contam situações de pederastia, tão desprestigiantes da instituição.

Recentemente a imprensa referiu Joseph Ratzinger (o clérigo que protagonizou o papel de Papa Bento XVI e renunciou ao cargo em Fevereiro de 2013), que antes de ser Papa presidiu ao gabinete do Vaticano identificado como “Congregação para a Doutrina da Fé”, com o cargo de vigiar a pureza na prática da Religião Católica pelo mundo.

Nesse sentido é dele a responsabilidade da destruição daquilo que, nas décadas de 1950 e 1960, era a esperança maior dos povos latino-americanos: a “Teologia da Libertação” defendida por sacerdotes progressistas da América Latina, como o brasileiro Leonardo Boff, entre outros, contra os abusos clericais que protegiam capitalistas exploradores do povo mais desgraçado. Ratzinger colocou-se ao lado dos exploradores, contra os explorados, e destituiu, ou ostracizou, os “padres libertadores”. É um “pecado” que a História não esquece ter sido praticado por Ratzinger.

As notícias mais recentes que aqui trago, lembram que Ratzinger iniciou o seu pontificado com a teoria de que “a roupa suja deve lavar-se em casa”, dando a ideia de estar empenhado em denunciar abusos sexuais no seio da Igreja, aos quais o seu antecessor não tinha dado a devida importância.

Nesse sentido, Bento XVI proclamou o são princípio da “tolerância zero” para os crimes sexuais, no intuito de limpar a Igreja do pior da sua história recente. Fracassou em tal intenção, possivelmente por mais do que uma razão, mas também porque o lugar de Papa, no Vaticano, se encontra “rodeado de lobos”, cuja alcateia dificulta as intenções dos melhores pontífices. Quando se retirou da Santa Sé, renunciando ao cargo de Papa, o clérigo alemão deixou algumas mensagens demolidoras contra os bispos que dificultaram, ou impediram, a concretização das suas melhores intenções na melhoria das práticas da sua Igreja.

A imagem de Joseph Ratzinger estava a ser tão bem gerida pelo próprio e pelos seus mais dilectos colaboradores, quando, há cerca de uma dezena de dias, se veio a saber, pela imprensa internacional, que o Papa emérito Bento XVI, afinal, encobriu casos de crimes sexuais contra crianças na arquidiocese de Munique, quando foi arcebispo entre os anos de 1977 e 1981!

A sua ideia de “a roupa suja deve lavar-se em casa”… afinal, podia referir-se à sua própria roupa… não a querendo ver em lavadouro público que nada prestigiava quem a vestiu!…

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)

OV

Imagem de Clker-Free-Vector-Images por Pixabay
25 de Outubro, 2022 João Monteiro

Honestidade papal

Texto de Onofre Varela

Em Janeiro de 1999 a cadeira de S. Pedro estava ocupada pelo Papa João Paulo II (JP2).

Em alguns dos seus discursos dirigidos ao mundo, eu sentia que o Papa usava de alguma honestidade intelectual.

Particularmente em dois deles, essa honestidade foi tão notória que não me parecia ser o discurso de um Papa tradicional… pelo menos não era habitual ouvir tais palavras saindo da boca de personagens com responsabilidades eclesiásticas.

Nesse dia, JP2, usando de honestidade intelectual, tentou pôr as coisas nos seus devidos lugares colocando a crença numa prateleira própria, mas com vasos comunicantes com a prateleira da Ciência.

Disse ele que o céu não é um lugar paradisíaco situado algures para lá das nuvens, mas que é, isso sim, uma boa relação psicológica com (a ideia de) Deus; e que o inferno é a total ausência dessa relação.

Foi um discurso que por me parecer autêntico eu aplaudi, e que vinha na sequência de um outro onde JP2 afirmara que “Deus não é um velho com barba”, mas sim “uma relação psicológica com a ideia da divindade”. Totalmente certo!

Finalmente eu ouvia um discurso sério saído da boca de um Papa!…

Recordo que fazia uma viagem de automóvel quando ouvi estas afirmações de JP2 num bloco noticioso da rádio e, entusiasmado com a honestidade do Papa, esperei por notícias bombásticas nos jornais do dia seguinte… mas nada aconteceu!

Nesse dia havia um qualquer jogo de futebol entre duas equipas consideradas importantes, num qualquer campeonato também importantíssimo para a tribo do futebol, e a imprensa deu destaque ao jogo da bola em todos os dias da semana, esquecendo o discurso do Papa! É sempre assim… as coisas verdadeiramente importantes para o pensamento, são atropeladas pelas notícias futebolísticas que os responsáveis pela informação jornalística colocam em nível superior, exaltando-as, dando-as a comer aos consumidores ávidos do supérfluo, esquecendo o que realmente é importante (ou devia ser) para o intelecto de qualquer cidadão.

O jornal Público foi o único diário nacional que noticiou o discurso do Papa, mas com pouca visibilidade. Acabei por me informar mais e melhor na imprensa espanhola, pela qual também fiquei a saber que os padres Dominicanos se apressaram a divulgar diversa leitura do discurso papal, reafirmando as tradicionais imagens do céu paradisíaco, do inferno medonho e tenebroso, e da figura de Deus com barba alva, tal e qual como foi pintado pelos artistas da Idade Média e da Renascença.

E quando Ratzinger assumiu o seu papel de Papa no teatro da Santa Sé, tratou de oficializar as tradicionais imagens de fé medievais e despediu o director do Observatório Astronómico do Vaticano, alegadamente por ter apoiado JP2 na recuperação da memória de Galileu Galilei na onda de perdões que varreu a Igreja Católica em 2000, o ano do seu jubileu.

Para Ratzinger, Galileu não é recuperável… e cá para mim, Ratzinger (todos os “Ratzingeres” deste mundo e da Igreja) não têm recuperação possível!

O trono do Vaticano, abandonado por Ratzinger que resignou ao cargo, foi ocupado por Mário Bergoglio (Francisco I) em Março de 2013, que se mostrou um homem mais cordato, mais humano, mais atento às realidades, olhando o mundo tal como ele se apresenta na realidade, sem o enfeitar com as vestes místicas como muitos sacerdotes afirmam ser.

A honestidade intelectual é o que se espera de quem exerce cargos tão importantes para o mundo, como se reconhece serem os políticos com responsabilidades de governação… e o Papa, por ser o monarca de uma igreja com tantos aderentes.

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)

OV

29 de Julho, 2022 João Monteiro

Guerra interna no Vaticano

Texto de Onofre Varela

Aquilo lá pelo Vaticano, sede da empresa religiosa e multinacional Igreja Católica, não anda lá muito católico!… As coisas não correm bem… e o Papa Francisco I, que pretende dar um banho de humanidade, moralidade e modernidade à Santa Sé, encontra-se cercado de inimigos e mergulhado num poço de víboras.

O jornal espanhol El País (edição de 24/12/2021) insere uma notícia com o título “O Papa reclama unidade à sua Cúria em plena batalha com os conservadores”. É uma frase elucidativa das dificuldades que Francisco I (F1) tenta vencer, sabendo-se rodeado de inimigos.

Os bispos e cardeais que por lá gravitam, não são uns “santos” – como os crentes consumidores de missas dominicais imaginam ser os bispos – também comportam um bom naipe de “diabos e mafarricos”.

Diz o jornal que “Francisco I aproveitou o seu tradicional discurso de Natal perante a Cúria para chamar à ordem o seu exército”. Assim se inicia a notícia onde se aborda o discurso interno do Papa, no qual o Sumo Pontífice chama a atenção dos cardeais para a necessidade de se eliminar os males que afligem a hierarquia da Igreja Católica.

No nono ano do seu pontificado, F1 incentivou a unidade e pediu para que se não caia em “divisões, facções e inimigos”, tendo a certeza que tais divisões e facções já existem entre o corpo cardinalício. Na base do seu discurso está a guerra ideológica que atravessa a instituição com distintas correntes, entre as quais sobressai a do sector mais conservador contra F1.

“Se o Evangelho proclama a notícia, nós devemos ser os primeiros a tentar viver com transparência”, disse F1 fazendo juz à honestidade que teimou em levar para o Vaticano e que não é bem vista pelos cardeais conservadores, defensores de uma igreja medieval. Este sector conservador, composto pelo poder económico e político da extrema-Direita da Europa e dos EUA, ataca as suas reformas e a profundidade do seu pensamento teológico, no qual se conta o diálogo que tem mantido com outras confissões religiosas e que não é bem visto pelos conservadores. Estes, afadigam-se a erguer um muro que trave as mudanças que F1 quer implementar numa instituição tão velha e decadente como é a Igreja Católica, e que alberga interesses tão contrários à fé que apregoa.

O Papa aproveitou o seu discurso de Natal para ultrapassar a tradicional lenga-lenga de fé, e dirigir-se à Cúria, denunciando as resistências ao seu esforço para reformar e revitalizar a Igreja, pedindo “aos clérigos de mentalidade tradicional para que deixem de viver no passado”, cujo pensamento ancestral não se adequa ao tempo presente pela “incapacidade de saber discernir a verdade das coisas”.

Falando sobre a tradição que faz a história da Igreja, F1 disse que “recordar não é repetir, mas sim saber acumular as boas qualidades e reavivá-las. Para que recordar não se converta numa prisão do passado, precisamos de outro verbo: gerar”. E terminou o seu discurso dizendo que “o humilde, gera, convida e impele aquilo que não se conhece; o arrogante ufano e orgulhoso, pelo contrário, repete-se, endurece os procedimentos, fecha-se na sua repetição, sente-se seguro naquilo que conhece, e teme o novo porque não o pode controlar a seu contento”.

Esperam-se grandes convulsões internas na multinacional empresa de fé registada com o nome Igreja Católica Apostólica Romana, minada por interesses materiais que nada têm a ver com a moralidade presumivelmente contida no Evangelho que prega, e que o clérigo argentino Jorge Mário Bergoglio, travestido de Papa Francisco I no teatro do Vaticano, pretende levar à cena… mas depara-se com dificuldades nos bastidores, onde os técnicos daquela sala de espectáculos religiosos, se afadigam em sabotar o seu papel de actor principal, na tentativa de transformar em fracasso a peça que idealizou, escreveu e quer pôr em prática.

Cabe-nos perguntar: Se Jesus Cristo cá estivesse hoje… seria católico?

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico) OV

28 de Julho, 2022 João Monteiro

Fé e senso comum

Texto da autoria de Onofre Varela

Se o meu discurso for lido com radicalismo, dir-se-á que sou inimigo da fé e da crença. Não o sou, nem valeria a pena sê-lo… a crença é um acto intelectual, faz parte do cérebro que possuímos e só somos crentes porque pensamos (e também somos ateus por isso mesmo!). Negar a crença seria tão estúpido como negar a importância do oxigénio para a manutenção da vida. 

Eu não tenho nada contra a crença e a fé. O que eu tenho é tudo contra o aproveitamento malicioso da fé (o que é coisa bem diferente) quando os crentes são assim mantidos com propósitos muitas vezes inconfessáveis… e que em alguns casos até pode constituir crime (os vigaristas aproveitam-se da “boa fé” de cada um… a IURD também!…). 

Perante os discursos de fé de qualquer religião ou seita, o bom senso aconselha duas atitudes: ou não lhe damos ouvidos, ou ouvimo-los como narrativas de fé aparentadas às fábulas. As fábulas têm importância e um lugar cativo no plano dos interesses intelectuais e culturais, mas não alcançam o valor que damos à realidade que a História conta e documenta… nem à Ciência, que estuda e comprova mediante experimentação e método. As fábulas são outra coisa! Cada matéria tem a sua prateleira própria e não se mistura com outras que lhe são estranhas. Fé, é apenas fé!… Cada um tem direito e legitimidade de ter fé no que quiser, e de cumprir os rituais que entender serem merecidos aos seus santos ou outras entidades que considere sagradas pela sua fé. 

A minha crítica ultrapassa a fé de cada um, para ir às causas que a constrói, alimenta e conduz à exploração das vítimas das várias formas de fé e de crenças, sempre em benefício de alguém… mas nunca do crente… embora ele creia que sim; por isso é crente!… O crente alimenta-se da fé que lhe dão para consumir, e há agentes da fé que usam uma linguagem beata e infantil como que se quem os ouve não tenha um raciocínio amadurecido e seja incapaz de interpretar o discurso. E também há quem alimente um fanatismo extremado e violento. Nenhum deles merece a minha consideração pela falta de racionalidade, humildade e humanidade que sobressai dos seus discursos e que sublinha as suas atitudes. Salvam-se “os outros”, aqueles que creem (ou não creem) com a racionalidade que a inteligência lhes confere, e interrogam-se. Por isso não se radicalizam. Podem ser crentes mas não engolem, sem mastigar muito bem, tudo quanto o guru lhe quer dar a comer. Muitos dos meus amigos e amigas crentes pertencem a este saudável grupo. 

O nosso Povo é católico e na sua generalidade é bom, hospitaleiro, pacífico e respeitador. Penso que estas características têm muito da educação cristã que recebemos desde o berço. O Cristianismo, na sua essência – expurgado do mito que lhe dá forma enquanto Religião teísta – tem positividade porque é universalista no respeito devido ao outro. E esta característica aproxima-o do Ateísmo… mesmo que católicos, e outros cristãos, se sintam escandalizados com tal aproximação. Retirando-lhe o nascimento divino, os milagres e a ressurreição, tudo quanto sobra é Ateísmo puro… e talvez, até, Comunismo!… 

A diversidade de sensibilidades faz com que haja quem repudie tudo quanto tresande a Igreja, e quem fuja de tudo quanto cheire a Ateísmo! Parece não haver meio termo… e todos nós sabemos, pelos adágios sapientais dos nossos ancestrais avós, que… “no meio é que está a virtude”. Virtude que é, tão só, a capacidade de criar diálogo, impedindo imposições, extremismos, zangas e ódios!… 

Porém não se deve pintar o discurso da virtude com um cinzentismo inócuo! Afinal, a virtude é o senso-comum… sendo que este nem sempre é verdadeiro, e nem tudo quanto o contradiz será falso! Não se pode confundir senso-comum com Razão: há verdades certíssimas e comprováveis (como o movimento da Terra à volta do Sol) em contra-ponto com preconceitos de fé que nem por estarem muito espalhados e façam parte do senso-comum de uma época ou elite, deixarão de ser erróneos (como acontecia com a defesa que a Igreja fazia da ideia de o Sol rodar à volta da Terra). Estes exemplos também querem dizer que o senso-comum é adquirido e cada tempo e sociedade tem o seu. E quando se trata do estudo científico, aquilo que faz o senso-comum pode, até, ser um empecilho ao estudo quando não se considera que a verdade procurada possa estar para lá do que o senso-comum delimita. Perguntem a Galileu!… 

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico) 

OV

23 de Junho, 2022 João Monteiro

Debate: Religião no Século XXI

João Monteiro, presidente da Associação Ateísta Portuguesa, participou num debate com Luísa Jacinto, que representou o Movimento Católico de Estudantes. A moderação esteve a cargo de João Mendes, da Escola Superior de Comunicação Social, onde teve lugar o debate. A conversa pode ser ouvida aqui.

25 de Março, 2022 João Monteiro

Sobre a consagração da Rússia e da Ucrânia

Hoje teve lugar a Consagração da Rússia e da Ucrânia ao Sagrado Coração de Maria, numa cerimónia que teve lugar em simultâneo no Vaticano e no Santuário de Fátima. O Papa pediu a todos os bispos que estivessem presentes.

O padre Carlos Cabecinhas, reitor do Santuário de Fátima, explica do que trata esta iniciativa: “Um Ato de Consagração significa pedir a paz como dom de Deus, mas pedir também a Deus que toque o coração dos decisores políticos, para que encontrem caminhos justos para a solução dos problemas, que nunca podem ser a guerra. A guerra nunca é solução”.

Enquanto o papa presidia à consagração no Vaticano, o cardeal polaco Konrad Krajewski presidiu a cerimónia em Fátima. No seu discurso, o cardeal afirmou que a motivação desta iniciativa é “expulsar o demónio da guerra” e que os católicos têm “uma arma sofisticada: a oração, o jejum e a esmola” (…) “Convido-vos a usar esta arma e vereis que teremos um milagre”.

O Secretariado Geral da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) fez ainda um apelo: “Pede-se que todas as paróquias, comunidades, institutos de vida consagrada e outras instituições eclesiais assumam esta intenção de consagração nas celebrações desse dia”. E agora faço uma pergunta: Qual foi a personalidade pública e política que respondeu a este apelo? Provavelmente adivinharam: o senhor Presidente da República, considerando que o evento é um apelo à paz universal. O mesmo não foi sozinho, tendo o corpo diplomático também sido convidado.

Enquanto o Presidente estava num ato que só pode ser entendido como simbólico, porque na realidade é ineficaz se atendermos a uma relação de causa-efeito, os Chefes de Estado e de governo dos países-membros da NATO estiveram reunidos para discutir a invasão do governo russo à Ucrânia.

21 de Março, 2022 João Monteiro

O que é rezar?

Ainda sobre o potencial da oração na resolução de conflitos.

18 de Março, 2022 João Monteiro

“Nossa Senhora de Fátima” já está na Ucrânia

No dia 12 de Março deste ano, os jornais informavam que o Santuário de Fátima iria enviar uma estátua da Virgem Peregrina para a Ucrânia. A motivação terá estado num pedido do arcebispo local Ihor Vozniak, com o intuito de alcançar a paz pela oração.

Está então encontrada a resolução para o conflito: qual resistência do povo ucraniano contra os invasores, quais negociações, quais intervenções políticas – afinal bastava parar e rezar.

Os crentes poderão argumentar que não devemos escarnecer desta estátua com supostos poderes milagrosos, pois a mesma será a personificação da “verdadeira Nossa Senhora”. E, de facto, esta estátua que foi para a Ucrânia não é uma estátua qualquer: é a réplica nº13 (a original continua em Portugal).

A mesma chegou ontem à Ucrânia (17 de Março) e aí ficará durante um mês. Se a paz for alcançada, e nós queremos que seja, a Igreja irá fazer dessa situação um aproveitamento atribuindo a responsabilidade à presença da estátua, mesmo que a causa verdadeira tenha sido a intervenção política ucraniana e internacional.

Acho incrível a capacidade de acreditar que um pedaço de madeira/barro/plástico que constitui a estátua possa parar uma guerra. Mais incrível quando se sabe que se trata de uma réplica e não da estátua original!

Além disso, porquê desejar uma estátua portuguesa e não utilizar uma estátua de uma santa ou santo local? Para quê levar uma estátua a viajar entre países, quando a própria Virgem poderia aparecer diretamente ao vivo no local? (a resposta a esta é fácil, porque a dita Virgem não existe e por isso nunca apareceu presencialmente).

A crença, frequentemente, é irracional. Mas para continuar a acreditar é necessário atribuir uma virtude que compense essa irracionalidade: a fé é essa virtude. É elogiado o que tem fé e criticado publicamente quem não a tem. Aí está o reforço psicológico para continuar a acreditar.

É claro que compreendo que a nível emocional, e ainda para mais num contexto desesperante como este, de uma guerra, as pessoas precisem de algo que lhes dê animo – e portanto, diriam alguns, está aí a função da religião. Porém, condeno o recurso à crença e à superstição para dar esse ânimo, porque é uma falsa esperança, um apoio frágil e enganador, enfim, é uma atitude paternalista. O ânimo deve ser dado por aquilo que realmente existe: as pessoas e a capacidade de mudança por intervenção do coletivo.

17 de Março, 2022 João Monteiro

Vereador de Lisboa: estando em funções, vai em procissões

Ângelo Pereira, vereador da Câmara Municipal de Lisboa, abandonou o seu exercício de funções para acompanhar a Procissão do Senhor dos Passos da Graça. O próprio fez questão de o mencionar com alarde no twitter (ver fotos abaixo). Estes tweets merecem duas críticas: uma de carácter institucional e outra de carácter religioso.

A nível institucional, e tendo nós um Estado Laico, há que relembrar o dever de separação da crença individual do exercício de funções públicas, o que exige uma neutralidade confessional. Assim, Ângelo Pereira poderia estar na procissão na qualidade de cidadão enquadrado na sua crença, mas não se poderia identificar como Vereador em exercício de funções públicas como fez no tweet. Além do mais, o carácter político na procissão fica reforçado se atendermos que o mesmo contou com a presença da Embaixadora da Ucrânia e – surpresa, surpresa – do nosso Presidente da República.

A nível religioso há a apontar a oração pela paz e fim da guerra. Qual o resultado prático desta oração? Nenhum. Não são as orações que terminam as guerras – aliás, não fazem nada. O que termina as guerras são as conversações, as negociações e as intervenções políticas. Mas, uma vez mais, orações religiosas e intervenções políticas deveriam ser como água e azeite: não se misturam.

Sejamos construtivos: então qual o procedimento correto que o vereador deveria ter tido?

a) presença na procissão a título pessoal, enquanto cidadão, ou não ir de todo;

b) no final do ato religioso, convidaria a Embaixadora e o Presidente da República para um encontro de carácter político em ambiente profano.

É simples. Fica a dica para próximas ações.