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Carlos Esperança

18 de Julho, 2019 Carlos Esperança

O comprimento da saia

É possível que nas próximas duas décadas não seja bom ser mulher! …

Isso é assustador para as gerações futuras…

Dê uma boa olhadela neste cartaz belga, banido na França, que lhe pede para escolher entre a liberdade e o Islão.

O poster da Associação Flemish “mulheres contra a islamização”, afixado desde janeiro 2019 em Antuérpia, mostras as pernas de uma mulher nova que levanta sua saia.

As características indicam qual a altura da saia que é ou não aceitável pelo Islão.

Apostila – Porque é proibido, aproveito para lhe dar publicidade.

17 de Julho, 2019 Carlos Esperança

Recordando Jaime Gralheiro – escritor, jornalista, advogado e membro ativo da Associação Ateísta Portuguesa a cujos almoços nunca faltou enquanto viveu

PORQUE SOU ATEU?

Essa é uma boa pergunta para uma resposta complexa. É que ninguém se torna ateu de um momento para o outro, por obra e graça de um “milagre” do Mafarrico.


Só há dois caminhos para se chegar ao ateísmo: ou se é educado, desde criança, num clima de agnosticismo religioso ou da pura ausência da ideia de Deus (o que será muito difícil num mundo onde a larga maioria se diz crente), ou se atinge o ateísmo através de um longo processo de confronto e negação. Foi esse o meu caso.

Como quase todas as crianças portuguesas nascidas na primeira metade do século XX no Portugal rural de então (o das “aparições” de Fátima) eu fui educado por meus pais dentro da máxima popular religiosa “graças a Deus muitas; graças com Deus poucas”.

De qualquer maneira nunca fui à catequese da Igreja. Na minha aldeia (de Macieira) não havia igreja nem escola. Por isso, meus pais, mediante a paga de um alqueire de milho e de pouco mais, entregaram o cultivo da minha ignorância religiosa ao cuidado de um homenzito (meio anão), conhecido pelo Pedro, que não sei onde se tinha especializado nas questões do “creio em deus padre todo-poderoso…”, nos atos de contrição e de atrição, na salvé-rainha e nos mandamentos (de Deus e da Igreja) e em todos os outros atos de fé, que o “padre-nosso” e “avé-maria” eram coisas corriqueiras que a gente ia aprendendo em casa com a reza do terço e as “ações de graças”.

Quando saí lá da serra e debaixo das saias de minha mãe, fui para dois colégios de padres. Aí o Deus do Pedro de Macieira foi-se interiorizando em mim, tornando-se caminho e guia que eu levava muito a sério com muitas medalhas penduradas do pescoço, muitas missas e comunhões, persignações antes de todas as refeições, da deita e da levanta, tudo misturado com muitas orações e rezas. Para cada ato da vida eu tinha uma oraçãozinha adrede.

Nesta situação de Deus como caminho e guia me mantive até aos meus 26 anos, altura em que iniciei a minha vida profissional, tomando então contacto com a vida dura dos camponeses e dos outros “servos da gleba”. Esse contacto, acompanhado com o “abre-olhos” dos meus dois patronos profissionais, que eram dois democratas agnósticos de férrea tempera, fez-me ver que o tal Deus que eu tinha arvorado como “caminho e guia” não passava do grande aliado do Salazarismo, oprimindo o Povo português. Mais: que as próprias aparições de Fátima se encaixavam na grande encenação político-religiosa do Regime (“Fátima Desmascarada”, como mais tarde vim a verificar).

Esta constatação fez-me olhar com mais cuidado para a História em geral e para a História da Igreja Católica, em particular, onde o retrato do tal Deus não aparecia nada favorecido. Ele tinha sido o mentor e responsável pelas Cruzadas, pela “santa” Inquisição, pela morte de Savonarola e pela perseguição de Galileu, para não falar em todas as guerras de muitos trinta anos…

Esse Deus cuja Igreja pregava o Amor era, historicamente, o Deus da violência, do terror e da morte. Era o Deus de Constantino que, desde o Concílio de Niceia (325), o pôs ao seu serviço. Serviço esse que manteve e reforçou com o Concílio de Trento (1546).

No fim da década de 50 e início da de 60 do século passado a Igreja Católica tornara-se para mim na grande aliada e defensora dos valores salazaristas, posição esta que ficou demonstrada com a expulsão do bispo do Porto, D. António Ferreira Gomes, que se atreveu a dizer não à omnisciência e omnipotência de Salazar (1958).
A convocação do Concílio Vaticano II pelo papa João XXIII, em 1962, com o objetivo de a Igreja fazer o seu aggiornamento democrático, foi para mim uma fonte de esperança. Comigo estavam todos os chamados “Católicos Progressistas”.

Nesta esperança passei a militar ativamente na Oposição Democrática, desde o início dos anos 60.

Procurando dar uma base teórica à minha praxis política eu lia tudo, desde Emmanuel Mounier, às encíclicas Mater et Magistra e Pacem in Terris, os documentos conciliares, as intervenções de D. Hélder da Câmara e dos bispos de Medelim, do padre e guerrilheiro colombiano Camilo Torres e de Che Guevara. Lia tudo, desde as revistas O Tempo e o Modo, Seara Nova e Vértice até aos Cuadernos para el Dialogo e ao Novell Observateur, desde o teólogo Bernard Haring aos teólogos protestantes, para não falar nos padres portugueses Felicidade Alves e Mário da Lixa. Tudo devorava de uma literatura mais ou menos clandestina que me chegava à socapa da PIDE: ele eram os escritos políticos da Oposição Democrática, a que se juntavam os textos clandestinos dos socialistas e marxistas europeus, complementados pelas leituras de Jorge Amado (Os Capitães da Areia, Jubiabá, Capitão da Esperança e Os Subterrâneos da Liberdade); ele eram os escritores russos do fim do século XIX e princípio do século XX; ele era Antero de Quental das Conferência do Casino; ele era Soeiro Pereira Gomes, Alves Redol e Álvaro Cunhal; ele era José Cardoso Pires, Luís Stau Monteiro, Bernardo Santareno e Luís Francisco Rebelo (dos quais me tornei depois amigo e camarada) ….

Ao mesmo tempo tomava contacto com Fátima Desmascarada de João Ilharco, a Fabricação de Fátima de Prosper Alfaric, para além da Cova dos Leões de Tomás da Fonseca; lia, ainda, A Origem do Cristianismo de Iakov Lenstaman, A Fábula de Cristo de Guy Fau, Cristo Nunca Existiu de Emilio Bossi e O Deus que a Igreja nos Vende de António Calvinho. Estas leituras continuaram com outros autores até ao presente.

Quando Abril (de 74) já vinha perto (em 1969) abandonei um “Curso de Cristandade”, deixando, a partir de então, de ter qualquer contacto com a igreja oficial.
Embora me continuasse a declarar como “católico progressista”, a verdade é que, com a Revolução de Abril, eu tomei consciência de que, efetivamente, dentro de mim se tinha operado um grande salto qualitativo, e que, pela mão de Cristo, eu tinha chegado ao Marxismo!

A partir de então, Deus passou a ser uma invenção humana com vista a dar resposta às perguntas a que não se sabia responder; Cristo, a tal 2ªa pessoa da santíssima trindade, a ter existido historicamente, era (só) mais um herói que, à semelhança de Espártaco (que viveu mais ou menos no seu tempo histórico) morreu em luta pela libertação do seu Povo.

De resto, antes dele, já o filósofo grego Sócrates havia sido condenado à morte pela cicuta, por se atrever a ensinar os jovens atenienses a pensar…
Resumindo: a partir de certa altura (e não sei quando, pois essa “altura” foi um longo e doloroso processo histórico) dei-me conta de que, afinal, eu deixara de ser um idealista (como todos os bons católicos) e passara a ser um empedernido e convicto materialista dialético.

Nesta posição filosófica a existência de Deus deixou de fazer qualquer sentido pois se tornara numa inutilidade racional. Para mim, Deus deixou de ser preciso, pois, sem ele, eu atingira uma explicação racional, lógica e coerente do Munda e da Vida, explicação essa que me satisfazia de uma ponta à outra.

Quando atingi este “nirvana” senti-me bem e feliz como nunca até aí me havia sentido. Em boa verdade, Deus fora sempre para mim uma fonte constante de angústias, de remorsos e medos; de ameaças, de covardias e de fugas (até nas relações sexuais entre mim e minha mulher, Deus, totalitariamente, se metia!…).
Perante esse tal Deus, eu e os outros Homens só tínhamos uma maneira de estar: de joelhos; sem ele, inesperadamente, eu fiquei de pé, no centro do Universo, heroicamente, inteiro na grandeza da minha Humanidade.

A partir daí abriram-se os caminhos de uma nova moral, de uma nova ética e de uma nova estética. Mais que os mandamentos de Deus há os Direitos Universais do homem; mais do que a caridade e o amor ao próximo, há o sentimento da fraternidade e da solidariedade humana.

Depois, até a Arte dá um salto e passa a ser a realidade recreada pelos homens e mulheres, na esteira dos grandes sonhos e das grandes aspirações da Humanidade.
Sem Deus tudo fica no seu lugar, sem licença de ninguém.

Eu compreendo que haja pessoas para quem a dimensão divina da vida é essencial. Para um ateu essa dimensão não existe, mas todos os ateus, porque defensores da Liberdade, aceitam que os crentes tenham e vivam essa outra dimensão; só exigimos que eles não nos imponham essa dimensão como historicamente sempre quiseram fazer (e fizeram).
De resto, tenho muita dificuldade em discutir com um crente o meu ateísmo, pois mal eu começo a explicar-me, logo ele me trava com o argumento de que isso é o que eu penso, porque, para além de mim, Deus continua lá.
Assim nunca iremos a lado nenhum.

O que o separa de Saramago nesta faceta?
2- Pelo que li de José Saramago (O Evangelho segundo Jesus Cristo e Caim), suponho que a posição religiosa de José saramago é muito idêntica à minha.
Sobre este assunto só conversámos uma vez, em Viseu, aquando do lançamento do seu “Evangelho”. Disse-lhe que esperava que ele tivesse ido mais longe, questionado a própria existência histórica de Jesus Cristo que pode muito bem ser a humanização de um mito criado pelos “cristãos”.

Respondeu-me que não; que lhe parecia complicado uma religião como a cristã ter por base só um mito inventado e não uma qualquer experiência histórica que, depois, foi mitificada.

E sobre esse ponto, hoje em dia, a literatura é imensa. Cito apenas A Dinastia de Jesus de James D. Tabor onde a história do homem Jesus Cristo e de sua família (mãe, pai e irmãos) é contada com muitos pormenores e fundamentos documentais.

E pronto.

Nota: O que fica dito no ponto 1 é uma espécie de resumo daquilo que escrevi no meu OS DOIS PRECS NO DISTRITO DE VISEU, págs. 34/35, 75 e segs.

Jaime Gralheiro

16 de Julho, 2019 Carlos Esperança

A deriva reacionária das Igrejas e a extrema direita

Não se pode dissociar o regresso ao fascismo do comportamento das Igrejas, embora se possa discutir, na multiplicidade das causas, se a influência maior é a das Igrejas sobre a deriva política ou vice-versa.

Na Europa, há factos inquietantes que raramente merecem uma reflexão serena, como o regresso do antissemitismo, tantas vezes a pretexto do sionismo, igualmente condenável. É cada vez mais frequente, aparecem notícias sobre a vandalização de cemitérios judaicos ou ataques a sinagogas, logo atribuídas aos suspeitos do costume, os muçulmanos, que odeiam judeus e cristãos.

Qualquer pessoa minimamente informada sabe que o antissemitismo está impresso no ADN do cristianismo, o que se compreende por ter sido a primeira cisão com êxito do judaísmo. A origem comum dos monoteísmos é o Antigo Testamento, um testemunho de inegável valor histórico e literário sobre a vida e o pensamento das tribos patriarcais da Idade do Bronze. O racismo, a xenofobia e a misoginia são a herança que transmite às Religiões do Livro.

O cristianismo poderia ter enjeitado, a partir do Novo, o Antigo Testamento, e nunca o fez. Por isso, do esclavagismo à Inquisição, todas as malfeitorias encontraram aí a sua justificação. O Novo Testamento introduz um humanismo a que é alheio o Antigo, mas acrescenta-lhe duas taras, o proselitismo e o antissemitismo, este último típico de todos os trânsfugas.

Os quatro Evangelhos (Marcos, Lucas, Mateus e João) e os Atos dos Apóstolos têm, na contabilidade de Daniel Jonah Goldhagen (in A Igreja católica e o Holocausto) cerca de 450 versículos explicitamente antissemitas, «mais de dois por cada página da edição oficial católica da Bíblia».

Por sua vez, o islamismo, um plágio grosseiro do judaísmo e do cristianismo, consegue ter o pior dos dois anteriores monoteísmos, a que não é alheia a violência das tribos nómadas onde se criou um ‘profeta’ analfabeto e amoral que decorou durante vinte anos o que o arcanjo Gabriel lhe ditou, entre Medina e Meca, com a paciência do alcoviteiro que tinha alertado a mãe de Jesus para a sua gravidez, de que as mulheres só costumam aperceber-se, avisadas por anjos.

Ainda hoje me surpreendo com a bondade e generosidade dos crentes com livros que tão maus ensinamentos contêm. A generosidade humana é um bálsamo para a perversidade divina.

15 de Julho, 2019 Carlos Esperança

Madre Teresa de Calcutá e a indústria dos milagres

Deixo a biografia de Madre Teresa para os ódios de estimação e os devotos do costume. Refiro apenas a ajuda que prestou a João Paulo II na defesa da teologia do látex quando em África morriam centenas de milhares de vítimas da Sida e um cardeal afirmava que o preservativo era perigoso.

João Paulo II (JP2), amigo do peito e da hóstia de Pinochet a quem denodadamente quis defender, sem êxito, da prisão em Londres, foi mais político do que santo. Madre Teresa escapou à santidade em vida por não ser canónica antes da defunção. Recém defunta, obrou o primeiro milagre.

JP2 atribuiu a cura de uma indiana, com um tumor gástrico, à intervenção sobrenatural de Madre Teresa, um ano após a sua morte, e logo assinou um decreto confirmando a veracidade do milagre, com vista à beatificação da freira. A jovem indiana Monica Besra explicou em 1998 que foi curada de um tumor de tamanho grande no estômago mediante orações à Madre, apesar de os médicos que a trataram terem assegurado que ela não tinha cancro, mas um quisto. O Vaticano aceitou a cura como milagre em 2002.

Foi um risco encomendar o milagre em país pouco devoto ao Deus de Madre Teresa!

O papa Francisco, com o mesmo alvará para criar santos, foi mais prudente, por vergonha ou receio de que o segundo milagre fosse de novo posto em causa, mas os negócios da fé não se compadecem com pausas na máquina da santidade.

Assim, o milagre de que a bem-aventurada precisava, para ser elevada de beata a santa, foi adjudicado há 4 anos no Brasil, com menor hipótese de escândalo, também na especialidade de oncologia. Foi obrado em Santos e ‘investigado’ pelo Vaticano para canonizar Madre Teresa de Calcutá. Um homem internado em estado terminal, num dos hospitais da cidade, obteve a cura, inexplicavelmente alcançada, segundo a Cúria Diocesana de Santos.

Não espanta a vocação dos defuntos para o exercício ilegal da medicina, o que admira é o faro do Vaticano para identificar o/a autor/a.

Como é hábito, quando é aprovado o currículo para a canonização, os santos, depois de o serem, nunca mais obram novos milagres. E a falta que hoje fazem!

14 de Julho, 2019 Carlos Esperança

O Instituto para as Obras Religiosas (IOR), a máfia, os negócios e a santidade

O Banco do Vaticano, conhecido pelo pseudónimo de IOR, foi criado pelo ora santo Pio XII, com o pretexto de guardar esmolas das caixas e de outros recipientes pios onde os donativos, de quem queria lavar a alma, chegavam em quantias avantajadas.

Foi o papa Paulo VI, decidido a escapar ao cerco fiscal do Governo italiano, que exigiu “o pagamento de todos os lucros retroativos sobre investimentos, o que ultrapassava mil milhões de euros atuais”, que começou a expatriar grandes quantias de dinheiro do IOR.

Foi auxiliado pelo devoto banqueiro siciliano Michele Sindona, que controlava o envio de capitais da máfia, e pelo arcebispo Marcinkus, banqueiro de Deus. Sindona, dirigente do banco suíço Finbank e da Banca Privata Italiana, e Marcinkus controlaram “a mais maciça das exportações de capitais jamais ocorrida aos subterrâneos do Swiss Bank, em parceria com a Santa Sé”. Alargada a rede, Sindona e Marcinkus associaram ao tráfico outro banqueiro, Roberto Calvi, do Banco Ambrosiano.

Preso na prisão de alta segurança de Voghera, Sindona prometeu fazer revelações, mas morreu na sua cela, ao ingerir distraidamente café com cianeto de potássio. O inquérito sobre a morte concluiu que se tratara de suicídio. Deus não dorme.

Roberto Calvi suicidou-se, enfiando o pescoço no laço de uma corda dependurada numa ponte de Londres, suicídio que, após exumação, 16 anos depois, se demonstrou ter sido por estrangulamento em um terreno baldio, perto da ponte onde foi encontrado, e depois pendurado para simular o suicídio.

Na fraude do Banco Ambrosiano participou também Licio Gelli, que combateu ao lado de Franco, enviado por Mussolini, e foi informador da Gestapo na 2ª Guerra Mundial. Este amigo de Hermann Goering, tornou-se conhecido pelo envolvimento nas mortes de Aldo Moro, “Mino” Pecorelli, Roberto Calvi, João Paulo I e outros, além de numerosos comunistas. Acabou em prisão domiciliária, decerto dedicado à oração e à penitência.

Não se sabe se Deus existe e se perdoa, mas a máfia não desculpa, por maior que seja a devoção ou a generosidade pia dos padrinhos. Não surpreendeu, pois, que o arcebispo Marcinkus, reclamado para ser julgado em Roma, fosse protegido por João Paulo II, que negou a extradição pedida, evitando ao dileto a prisão e a si próprio alguma indiscrição que lhe dificultasse a canonização.

Há alguns meses, Francisco, o primeiro papa a ir ao coração da máfia calabresa, ousou enfrentá-la: “Aqueles que durante a vida escolheram a via do mal, como os mafiosos, estão excomungados”. A atitude inédita do papa, inverteu a política do IOR, sob pressão internacional, e perdeu provavelmente os melhores clientes.

A suspeita de que a Igreja católica beneficiou do ouro que os assassinos em série croatas roubaram às vítimas judias e sérvias possa ter ido para o Vaticano mantem-se graças à recusa em permitir o acesso aos seus arquivos, ao contrário do que fez o Governo Suíço, em relação aos seus bancos. A determinação do atual papa, em subtrair ao crime o IOR, pode esclarecer a suspeição referida, que se mantém sobre o offshore do Vaticano.

12 de Julho, 2019 Carlos Esperança

O perigo dos Irmãos Muçulmanos

O Islão não é um problema religioso, é uma questão política e, em última instância, um caso de polícia.

No pântano da fé, cujo primarismo dos 5 pilares atrai cada vez mais seguidores, há uma força – os Irmãos Muçulmanos – que se vem impondo politicamente em vários países, do Egito, onde são a causa do caos e também vítimas, até à Turquia, que a Europa e os EUA tratam com estranha benevolência.

A Europa pagou com imenso sangue a demência da fé e a origem divina do poder. Só a partir da sangrenta Guerra dos 30 Anos conseguiu libertar-se da crença imposta à força. E só a na década de 60 do século passado o Concílio Vaticano II acabou por reconhecer a liberdade religiosa pela Igreja católica, liberdade que Bento XVI nunca digeriu.

Enquanto a Declaração Universal dos Direitos Humanos não se sobrepuser à vontade de qualquer Deus, não há liberdade e felicidade a que algum homem, e sobretudo mulher, possa aspirar.

Reitero que o Islão é um caso político e como tal deve ser tratado. Não é impedindo os crentes de rezarem cinco orações diárias, de se virarem para Meca ou de viajarem com o tapete, que se resolve o problema. É reprimindo os pregadores do ódio nas madraças e mesquitas e, sobretudo, entravando a imposição, a quem não queira, de fazer jejum ou de prescindir do presunto e da cerveja.

O argumento da tradição é a monstruosidade que justifica as piores afrontas.

11 de Julho, 2019 Carlos Esperança

O Islão vai de mal a pior

O islão entrou em declínio após a última grande potência islâmica – o Império Otomano – se desmoronar, e atingiu o seu ponto mais baixo no primeiro quartel do séc. XX com a colonização, pelo Ocidente, de grande parte do mundo árabe.

O Iraque vive a deceção da pobreza e subdesenvolvimento, apesar dos amplos recursos energéticos, provocada pela invasão dos novos Cruzados e, recentemente, pela violência sunita de um alegado califa, que agravou o medo, a miséria e a fé. Vencido provisoriamente o Daesh, basta o governo confessional.

A tortura usada por forças da coligação que invadiram o Iraque em 20 de março de 2003 era a nódoa que faltava à alegada superioridade moral da civilização de que se reclamavam.

Na Turquia, o laicismo imposto por Ataturk, sobre os escombros do Império Otomano, está a ruir sob a égide do atual presidente Erdogan, ingenuamente apelidado de muçulmano moderado.

Os clérigos, em vez de modernizarem o Islão, islamizam a modernidade num perpétuo retorno ao obscurantismo. Onde o islão comanda a vida morre-se sob ditadura militar ou sob a violência de Alá.

O imperecível problema da Palestina é mais uma acha na fogueira do ódio que consome o Médio Oriente. Os sionistas procuram agravar a situação. Fazem mal tudo aquilo de que são capazes e da pior forma. Por sua vez, o Hamas, independentemente da razão que lhe asiste, exonera a inteligência da fé que o move, procura o martírio e só não mata mais porque não pode.

O mundo muçulmano é um barril de pólvora que explode continuamente, em demente proselitismo e suicídio assassino. O caso mais paradigmático é talvez o iraquiano. Ali, derrubou-se uma ditadura laica, apoiada por sunitas, que oprimia os xiitas, donde surgiu um estado teocrático onde os xiitas oprimiam os sunitas. Agora, vêm a caminho sunitas que não prescindem de oprimir todos, em particular, xiitas, e degolam todos os que se lhes opõem a caminho de um novo califado ou do velho Paraíso.

Deus não é propriamente um entusiasta da democracia e os clérigos são sempre contra.

8 de Julho, 2019 Carlos Esperança

Efeméride — 08 de julho de 2019

Há 18 anos os restos mortais de Amália Rodrigues foram trasladados para o Panteão Nacional, num ato inédito a revelar um país de excessos.

A decisão de trasladar Amália para o Panteão Nacional foi um gesto excessivo, quiçá irrefletido, uma decisão controversa, de motivações suspeitas e critérios obscuros, um precedente prenunciador de futuras injustiças. Abriu a porta a Eusébio e não se vê que Carlos do Carmo e Cristiano Ronaldo, a seu tempo, possam evitar idêntica homenagem.

No caso de Amália, não duvidei do sentimento unânime dos deputados. Surpreendeu-me, sim, a apurada intuição musical coletiva. Não haveria na Assembleia da República alguém, com tal dureza de ouvido, que se sentisse obrigado à abstenção que desafinasse o coro da unanimidade?

Admito que Amália tivesse sido a melhor voz da vida de todos nós. Mas o respeito, a admiração e a saudade não justificavam o exagero que nada acrescentou à glória de quem se pretendeu homenagear e contribui para o descrédito das homenagens nacionais.

Edith Piaf ou Maria Callas não tiveram semelhante honraria e os seus países orgulham-se tanto delas quanto Portugal de Amália. Tratou-se de uma manifestação exacerbada de sentimentalismo que traz à memória a injustiça para com Saramago, Miguel Torga ou Salgueiro Maia. Ou mesmo para Sá Carneiro. Tratou-se da total ausência do sentido das proporções.

Como redentora consolação resta-nos o facto de saber Amália rodeada de poetas. João de Deus, Almeida Garrett e Guerra Junqueiro são os vizinhos mais próximos a fazer-lhe companhia durante a eternidade. Estou certo de que, depois de ler o Campo de Flores e Flores Sem Fruto, não deixará de temperar a piedosa devoção que a devorou em vida com os versos reparadores da Velhice do Padre Eterno.

Treze anos passados já deve saber de cor os versos de ‘O Melro’:

O MELRO

O melro, eu conheci-o: 
Era negro, vibrante, luzidio, 
Madrugador, jovial; 
Logo de manhã cedo 
Começava a soltar, dentre o arvoredo, 
Verdadeiras risadas de cristal. 
E assim que o padre-cura abria a porta 
Que dá para o passal, 
Repicando umas finas ironias, 
O melro; dentre a horta, 
Dizia-lhe: “Bons dias!” 
E o velho padre-cura 
não gostava daquelas cortesias.

O cura era um velhote conservado, 
Malicioso, alegre, prazenteiro; 
Não tinha pombas brancas no telhado, 
Nem rosas no canteiro: 
Andava às lebres pelo monte, a pé, 
Livre de reumatismos, 
Graças a Deus, e graças a Noé. 
O melro desprezava os exorcismos 
Que o padre lhe dizia: 
Cantava, assobiava alegremente; 
Até que ultimamente 
O velho disse um dia:

“Nada, já não tem jeito!, este ladrão 
Dá cabo dos trigais! 
Qual seria a razão 
Por que Deus fez os melros e os pardais?!”

E o melro entretanto, 
Honesto como um santo, 
Mal vinha no oriente 
A madrugada clara, 
Já ele andava jovial, inquieto, 
Comendo alegremente, honradamente, 
Todos os parasitas da seara 
Desde a formiga ao mais pequeno inseto. 
E apesar disto, o rude proletário, 
O bom trabalhador, 
Nunca exigiu aumento de salário.

Que grande tolo o padre confessor!

Foi para a eira o trigo; 
E, armando uns espantalhos, 
Disse o abade consigo: 
“Acabaram-se as penas e os trabalhos.” 
Mas logo de manhã, maldito espanto! 
O abade, inda na cama, 
Ouvindo do melro o costumado canto, 
Ficou ardendo em chama; 
Pega na caçadeira, 
Levanta-se dum salto, 
E vê o melro, a assobiar, na eira, 
Em cima do seu velho chapéu alto!

Chegou a coisa a termo 
Que o bom do padre-cura andava enfermo; 
Não falava nem ria, 
Minado por tão íntimo desgosto; 
E o vermelho oleoso do seu rosto 
Tornava-se amarelo dia a dia. 
E foi tal a paixão, a desventura 
(Muito embora o leitor não me acredite), 
Que o bom do padre-cura 
Perdera o apetite!

Andando no quintal, um certo dia, 
Lendo em voz alta o Velho Testamento, 
Enxergou por acaso (que alegria!, 
Que ditoso momento!) 
Um ninho com seis melros, escondido 
Entre uma carvalheira.

E ao vê-los exclamou enfurecido:

“A mãe comeu o fruto proibido; 
Esse fruto era minha sementeira: 
Era o pão, e era o milho; 
Transmitiu-se o pecado. 
E, se a mãe não pagou, que pague o filho. 
É doutrina da Igreja. Estou vingado!”

E, engaiolando os pobres passaritos, 
Soltava exclamações: 
“É uma praga. Malditos! 
Dão me cabo de tudo esses ladrões! 
Raios os partam! Andai lá que enfim”

E deixando a gaiola pendurada, 
Continuou a ler o seu latim, 
Fungando uma pitada.

Vinha tombando a noite silenciosa; 
E caía por sobre a natureza 
Uma serena paz religiosa, 
Uma bela tristeza 
Harmónica, viril, indefinida. 
A luz crepuscular 
Infiltra-nos na alma dorida 
Um misticismo heroico e salutar. 
As árvores, de luz inda douradas, 
Sobre os montes longínquos, solitários, 
Tinham tomado as formas rendilhadas 
Das plantas dos herbários. 
Recolhiam-se a casa os lavradores. 
Dormiam virginais as coisas mansas: 
Os rebanhos e as flores, 
As aves e as crianças.

Ia subindo a escada o velho abade; 
A sua negra, atlética figura, 
Destacava na frouxa claridade, 
Como uma nódoa escura. 
E, introduzindo a chave no portal, 
Murmurou entre dentes:

“Tal e qual tal e qual! 
Guisados com arroz são excelentes.”

* * * * * *

Nasceu a Lua. As folhas dos arbustos 
Tinham o brilho meigo, aveludado, 
Do sorriso dos mártires, dos justos. 
Um eflúvio dormente e perfumado 
Embebedava as seivas luxuriantes. 
Todas as forças vivas da matéria 
Murmuravam diálogos gigantes 
Pela amplidão etérea. 
São precisos silêncios virginais, 
Disposições simpáticas, nervosas, 
Para ouvir falar estas falas silenciosas 
Dos mundos vegetais. 
As orvalhadas, frescas espessuras, 
Pressentiam-se quase a germinar. 
Desmaiavam-se as cândidas verduras 
Nos magnetismos brancos do luar. 
………………………………………….. 
…………………………………………..

E nisto o melro foi direito ao ninho. 
Para o agasalhar, andou buscando 
Umas penugens doces como arminho, 
Um feltrozito acetinado e brando. 
Chegou lá, e viu tudo. 
Partiu como uma frecha; e, louco e mudo, 
Correu por todo o matagal; em vão! 
Mas eis que solta de repente um grito 
Indo encontrar os filhos na prisão.

“Quem vos meteu aqui?!” O mais velho, 
Todo tremente, murmurou então:

“Foi aquele homem negro. Quando veio, 
Chamei, chamei Andavas tu na horta 
Ai que susto, que susto!, ele é tão feio! 
Tive-lhe tanto medo! Abre esta porta 
E esconde-nos debaixo da tua asa! 
Olha, já vão florindo as açucenas; 
Vamos a construir a nossa casa 
Num bonito lugar 
Ai! quem me dera, minha mãe, ter penas 
Para voar, voar!”

E o melro alucinado 
Clamou:

“Senhor! senhor! 
É porventura crime ou é pecado 
Que eu tenha muito amor 
A estes inocentes?! 
Ó natureza, ó Deus, como consentes 
Que me roubem assim os meus filhinhos, 
Os filhos que eu criei! 
Quanta dor, quanto amor, quantos carinhos, 
Quanta noite perdida 
Nem eu sei… 
E tudo, tudo em vão! 
Filhos da minha vida 
Filhos do coração!!! 
Não bastaria a natureza inteira, 
Não bastaria o Céu par voardes, 
E prendem-vos assim desta maneira! 
Covardes! 
A luz, a luz, o movimento insano, 
Eis o aguilhão, a fé que nos abrasa 
Encarcerar a asa 
É encarcerar o pensamento humano. 
A culpa tive-a eu! Quase à noitinha 
Parti, deixei-os sós 
A culpa tive-a eu, a culpa é minha, 
De mais ninguém! Que atroz! 
E eu devia sabê-lo! 
Eu tinha obrigação de adivinhar 
Remorso eterno! eterno pesadelo! 
………………………………………….

Falta-me a luz e o ar! Oh, quem me dera 
Ser abutre ou fera 
Para partir o cárcere maldito! 
E como a noite é límpida e formosa! 
Nem um ai, nem um grito 
Que noite triste!, oh, noite silenciosa!”

E a natureza fresca, omnipotente, 
Sorria castamente 
Com o sorriso alegre dos heróis. 
Nas sebes orvalhadas, 
Entre folhas luzentes como espadas, 
Cantavam rouxinóis.

Os vegetais felizes 
Mergulhavam as sôfregas raízes 
A procurar na terra as seivas boas, 
Com a avidez e as raivas tenebrosas 
Das pequeninas feras vigorosas 
Sugando à noite os peitos das leoas. 
A lua triste, a Lua merencória, 
Desdémona marmórea, 
Rolava pelo azul da imensidade, 
Imersa numa luz serena e fria, 
Branca como a harmonia, 
Pura como a verdade. 
E entre a luz do luar e os sons das flores, 
Na atonia cruel das grandes dores, 
O melro solitário 
Jazia inerte, exânime, sereno, 
Bem como outrora o Nazareno 
Na noite do calvário!

Segundo o seu costume habitual, 
Logo de madrugada 
O padre-cura foi para o quintal, 
Levando a Bíblia e sobraçando a enxada. 
Antes de dizer missa, 
O velho abade inevitavelmente 
Tratava da hortaliça 
E rezava a Deus-Padre Omnipotente 
Vários trechos latinos, 
Salvando desta forma, juntamente, 
As ervilhas, as almas e os pepinos.

E já de longe ia bradando:

“Olé! 
Dormiram bem? Estimo 
Eu lhes darei o mimo, 
Canalha vil, grandíssima ralé! 
Então vocês, seus almas do Diabo, 
Julgam que isto que era só dar cabo 
Da horta e do pomar, 
E o bico alegre e estômago contente, 
E o camelo do cura que se aguente, 
Que engrole o seu latim e vá bugiar! 
Grandes larápios! Era o que faltava 
Vocês irem ao milho, 
E a mim mandar-me à fava! 
Pois muito bem, agora que vos pilho 
Eu vos ensinarei, meus safardanas! 
Vocês são mariolões, são ratazanas, 
Têm bico, é certo, mas não têm tonsura 
E, nas manhas, um melro nunca chega 
Às manhas naturais de um padre-cura. 
O melhor vinho que encontrar na adega 
É para hoje, olé! Que bambochata! 
Que petisqueira! Melros com chouriço! 
E então a Fortunata 
Que tem um dedo e jeito para isso! 
Hei-de comer-vos todos um a um, 
Lambendo os beiços, com tal gana enfim, 
Que comendo-vos todos, mesmo assim 
Eu fico ainda quase em jejum! 
E depois de vos ter dentro da pança, 
Depois de vos jantar, 
Vocês verão como o velhote dança, 
Como ele é melro e sabe assobiar!”

Mas nisto o padre-cura, titubeante, 
Quase desfalecendo, 
Atónito de horror, parou diante 
Deste drama estupendo:

O melro, ao ver aproximar o abade, 
Despertou da atonia, 
Lançando-se furioso contra a grade 
Do cárcere. Torcia, 
Para os partir os ferros da prisão, 
Crispando as unhas convulsivamente 
Com a fúria dum leão. 
Batalha inútil, desespero ardente! 
Quebrou as garras, depenou as asas 
E alucinado, exangue, 
Os olhos como brasas, 
Herói febril, a gotejar em sangue, 
Partiu num voo arrebatado e louco, 
Trazendo, dentro em pouco, 
Preso do bico, um ramo de veneno. 
E belo e grande e trágico e sereno, 
Disse: 
“Meus filhos, a existência é boa 
Só quando é livre. A liberdade é a lei, 
Prende-se a asa mas a alma voa 
Ó filhos, voemos pelo azul! Comei!” –

E mais sublime do que Cristo, quando 
Morreu na Cruz, maior do que Catão, 
Matou os quatro filhos, trespassando 
Quatro vezes o próprio coração! 
Soltou, fitando o abade, uma pungente 
Gargalhada de lágrima, de dor, 
E partiu pelo espaço heroicamente, 
Indo cair, já morto, de repente 
Num carcavão com silveiras em flor.

E o velho abade, lívido d’espanto, 
Exclamou afinal: 
“Tudo o que existe é imaculado e é santo! 
Há em toda a miséria o mesmo pranto 
E em todo o coração há um grito igual. 
Deus semeou d’almas o universo todo. 
Tudo que o vive ri e canta e chora 
Tudo foi feito com o mesmo lodo, 
Purificado com a mesma aurora. 
Ó mistério sagrado da existência, 
Só hoje te adivinho, 
Ao ver que a alma tem a mesma essência, 
Pela dor, pelo amor, pela inocência, 
Quer guarde um berço, quer proteja um ninho! 
Só hoje sei que em toda a criatura, 
Desde a mais bela até à mais impura, 
Ou numa pomba ou numa fera brava, 
Deus habita, Deus sonha, Deus murmura! 
…………………………………………………… 
Ah, Deus é bem maior do que eu julgava”

E quedou silencioso. O velho mundo, 
Das suas crenças antigas, num momento, 
Viu-o sumir exausto, moribundo, 
Nos abismos sem fundo 
Do temeroso mar do Pensamento. 
E chorou e chorou A Igreja, a Crença, 
Rude montanha, pavorosa, escura, 
Que enchia o globo com a sombra imensa 
Dos seus setenta séculos d’altura; 
O Himalaia de dogmas triunfantes, 
Mais eternos que o bronze e que o granito, 
Onde aos profetas Deus falava dantes, 
Entre raios e nuvens trovejantes, 
Lá dos confins sidérios do infinito; 
Esse colosso enorme, em dois instantes 
Viu-o tremer, fender-se e desabar 
Numa ruína espantosa, 
Só de tocar-lhe a asa vaporosa 
Duma avezinha trémula, a expirar! 
…………………………………………. 
…………………………………………. 
E, arremessando a Bíblia, o velho abade 
Murmurou: 
“Há mais fé e há mais verdade, 
Há mais Deus concerteza 
Nos cardos secos dum rochedo nu 
Que nessa Bíblia antiga Ó Natureza, 
A única Bíblia verdadeira és tu!…”

Guerra Junqueiro

4 de Julho, 2019 Carlos Esperança

A França, o burkini e a laicidade

Há dias, um grupo de mulheres muçulmanas de Grenoble, organizado pela Aliança dos Cidadãos, que luta contra a discriminação da comunidade islâmica, surpreendeu os responsáveis de uma piscina pública quando mergulhou com burkinis, fatos de banho que, como em outras regiões francesas, é proibido. Foi uma “Operação Burkini”.

Estranha-se a repressão ao exercício de um direito individual, cada um/a vestir-se como quer, mas não é por acaso que tem provocado protestos noutros países europeus e vem sendo sucessivamente proibido em França, em nome da laicidade, um valor consensual, defendido desde 1905.

Os defensores dos fatos de banho muçulmanos usam os mesmos bons argumentos com que excelentes juristas e amigos me confrontam, surpreendidos com o apoio à proibição por quem é liberal nos costumes e inflexível na defesa dos direitos individuais.

A linha estilística de fatos de banho islâmicos é um confronto com a sociedade francesa, laica e secularizada. O uso do burkini não é um ato de rebeldia feminina, é o desafio à repressão, para manter submissa a mulher, ao homem e a Alá, obedecendo à estratégia sunita das madraças e mesquitas, contra os infiéis.

O burkini é a burka de banhos públicos, o símbolo religioso da submissão da mulher, ao serviço do proselitismo. Não é um ato de rebeldia, é o repto aplaudido por muçulmanos, ostentação do comunitarismo islâmico contra o ethos civilizacional europeu. É o desafio à proibição que privilegia a cidadania contra o comunitarismo, para instigar confrontos e procurar a vitimização dos muçulmanos, que jamais tolerariam bukinis nas praias da Arábia Saudita e de outras teocracias islâmicas que subsidiam, promovem e incitam o desafio à civilização.

A proibição do burkini parece uma limitação administrativa da liberdade do vestuário da mulher, mas é a oposição à agenda política do Islão. O burkini não se destina a cobrir o corpo da mulher, direito individual, mas a exibir a submissão à religião e ao homem, e a provocar uma sociedade secularizada e cosmopolita, que o Islão combate.
Não surpreende que as mulheres francesas, laicas e liberais se tenham solidarizado com as congéneres islâmicas. Não questionam se a situação inversa seria possível nas praias de países imbecilizado pela fé, e não sabem que onde o Islão avança, recuam os direitos das mulheres.

A proibição da exibição de símbolos religiosos ostensivos é a abertura de uma janela de oportunidades para a emancipação da mulher, da religião e da tutela masculina.
Na minha opinião, é a permissividade à invasão da esfera pública pelas religiões, neste caso pelo Islão, que alimenta os demagogos, xenófobos e e racistas que lentamente têm feito deslizar a Europa para posições nacionalistas e neofascistas.