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Poesia de António Gedeão – Química

Continuando na senda de homenagens ao professor e divulgador de ciência Rómulo de Carvalho, hoje trago um poema de António Gedeão, pseudónimo com que assinava as suas obras poéticas. Um dos poemas que mais admiro é “Lágrima de Preta”, pela capacidade de entrelaçar com mestria a química com os princípios da igualdade e do humanismo. Este é, pois, um poema anti-ódio, anti-preconceito e anti-racismo. Um poema que merece ser recordado e divulgado nos dias conturbados de intolerância que vivemos.

Este poema encontra-se no livro “Máquina de Fogo”, publicado em 1961.

Lágrima de Preta

Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.

Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.

Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.

Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.

Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:

Nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio.

António Gedeão

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